Inteiro Teor
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
Órgão 5ª Turma Cível
Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0729220-66.2019.8.07.0001
APELANTE (S) CONDOMÍNIO RURAL CHACARAS OURO VERMELHO
APELADO (S) JOSE DANTAS PIMENTEL
Relator Desembargador ANGELO PASSARELI
Acórdão Nº 1235926
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. CONDOMÍNIO.
CONVOCAÇÃO PARA ASSEMBLEIA GERAL EXTRAORDINÁRIA. AQUISIÇÃO DE
GLEBA DE TERRA. MODIFICAÇÃO DA ÁREA COMUM E DE SUA FINALIDADE.
POSSÍVEL REMANEJAMENTO DE LOTES E PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO.
QUÓRUM QUALIFICADO DE 2/3. ART. 1.342 DO CC. APLICAÇÃO POR ANALOGIA.
POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA.
Em que pese a ausência de previsão legal específica sobre o quórum necessário para a aprovação da deliberação consistente na aquisição de gleba de terra pelo condomínio, para fins de aquisição e
ampliação da área comum, com alteração de sua finalidade, verifica-se que, além de envolver valores consideráveis, a deliberação pode ensejar a modificação de áreas comuns do condomínio e/ou de sua respectiva utilização pelos condôminos, inclusive com o remanejamento de alguns lotes e pagamento de indenização, o que justifica a aplicação, por analogia, do disposto 1.342 do Código Civil, com o
quórum especial de 2/3 (dois terços) dos condôminos, ante a relevância da discussão.
Apelação Cível desprovida.
ACÓRDÃO
Brasília (DF), 11 de Março de 2020
Desembargador ANGELO PASSARELI
Relator
RELATÓRIO
Adoto, em parte, o relatório da sentença (Doc. Num. 13910655), in verbis:
“ José Dantas Pimentel propôs ação de conhecimento submetida ao procedimento comum, com
pedido de tutela provisória de urgência, em desfavor do Condomínio Rural Chácaras Ouro
Vermelho I, partes devidamente qualificadas nos autos do processo em epígrafe.
Disse, em síntese, que foi convocado para assembleia geral extraordinária, a ser realizada no dia
28.09.2019, às 08:30h em primeira convocação, com quórum mínimo representativo de 2/3 do total das frações ideais, ou às 09:00h, em segunda e última chamada, com qualquer número de
condôminos.
Asseverou que referida assembleia tinha como pauta a apreciação e votação de proposta feita ao
réu, em 10.09.2019, pelo Sr. Valdir de Castro Miranda, proprietário de uma gleba de terras
conhecida como Peito do Pombo, consistente na aquisição da área pelo réu, por R$ 1.500.000,00, no compromisso de remanejamento ou indenização, por parte do réu, dos lotes que viessem a ser
desconstituídos pelos órgãos competentes, e no compromisso, por parte do Sr. Valdir, de transferir, para o réu, a propriedade definitiva do remanescente da matrícula 28.141 no CRI 2º Ofício, em
nome da sociedade empresarial Serrana Participações e Agropecuária Ltda.
Aduziu que tal questão já foi devidamente apreciada e debatida nos autos de ação popular
(tombados sob o n. 2011.01.1.169908-3), em que pleiteada a declaração de nulidade de termo de
acordo de transferência da área registrada sob o n. 28.141 e da área remanescente objeto da
matrícula 90.437 no CRI 2º Ofício, assim como das escrituras públicas, por indícios de fraude à
execução, de violação a áreas de preservação ambiental e de desmembramento irregular de lotes –
pedidos julgados procedentes por sentença transitada em julgado.
Afirmou que a iminente possibilidade de se admitir a transferência de tais glebas de terra ao réu
afronta a referida decisão judicial, não havendo qualquer fato novo que possa infirmar as razões
nela expendidas.
Apontou, ademais, vício formal no ato que convocou os condôminos para a assembleia geral
extraordinária, por não respeitar o quórum qualificado de unanimidade ou, no mínimo, de 2/3 dos votos para deliberar sobre aquisição/transferência de glebas de terras para ampliação do
condomínio, bem como mudança/remanejamento de lotes.
Requereu, em sede de tutela provisória de urgência, a suspensão da assembleia geral extraordinária a ser realizada no dia 28.09.2019; sucessivamente, pleiteou que a assembleia somente fosse
realizada com quórum qualificado – unanimidade ou 2/3 dos condôminos.
Juntou documentos.
Determinações de emenda à inicial (id. 45784049 e 45851864) atendidas (id. 45809581 e 45872265).
Tutela provisória de urgência deferida (id. 45876383). Interposto agravo de instrumento, não foram antecipados os efeitos da tutela recursal (id. 47760197).
Citado, o réu ofereceu contestação e reconvenção (id. 46806977).
Afirmou que ‘não se observa na convocação para a assembleia ou mesmo de qualquer outro
documento apresentado pelo autor, nada que possa levar a conclusão de que a transferência da
gleba ao Condomínio pudesse importar na criação de uma nova quadra com lotes disponibilizados
para moradia e, muito menos violação ao meio-ambiente, já que o processo de regularização do
condomínio encontra-se em avançado estágio, com seus limites já definidos e sem qualquer pedido
ou procedimento que venha a visar que a gleba poderia ser destinada a estes fins’.
Sustentou que a gleba ‘será destinada à preservação ambiental do parcelamento, não tendo ocorrido qualquer contrariedade aos termos do que foi objeto de apreciação e julgado nos autos de n.
2011.01.1.169908-3, especialmente considerando que no cumprimento de sentença na ação civil
pública promovida pelo MP nos autos de nº 0008511-13.2003.8.07.0001, houve a regular garantia
do resultado útil da execução a partir do gravame do patrimônio do sócio da empresa SERRANA,
inclusive com a designação da realização de hasta pública do imóvel, seguindo um curso processual que não se constitui em qualquer tipo de ameaça aos possuidores de imóveis no condomínio réu’.
Salientou que o autor, ex-subsíndico do condomínio, movido por interesses pessoais, tem proposto
sucessivas demandas judiciais em desfavor do réu e de seus administradores.
Mencionou que o processo de regularização do condomínio se encontra em avançado estágio, com
projeto ambiental já aprovado pelo IBRAM e plano urbanístico em análise na SEDUH, o que afasta as alegações de desmatamento em área de preservação permanente, desmembramento irregular de
lotes e fraude à execução, até porque, definida a poligonal, não há meios de anexar, à sua área,
qualquer outa gleba com a finalidade de parcelamento ou ocupação de qualquer ordem, a denotar
que a aquisição do chamado Peito de Pombo se dará meramente para fins de preservação ambiental e qualidade de vida dos condôminos e da comunidade local.
Argumentou com a existência de antinomia entre a sentença proferida na ação popular tombada sob o n. 2011.01.1.169908-3 e o teor do edital de convocação da assembleia impugnada.
Alegou, por fim, que não há amparo legal à exigência de quórum qualificado para a deliberação
acerca da compra da referida gleba de terras.
Em sede reconvencional, pediu a condenação do autor ao pagamento, a título de indenização por
danos materiais, de valor equivalente ao gasto efetuado com a preparação e realização da
assembleia – R$ 3.884,59 (três mil, oitocentos e oitenta e quatro reais e cinquenta e nove centavos).
Réplica e contestação à reconvenção apresentadas (id. 48071877). ”
Acrescento que o MM Juiz a quo julgou procedentes os pedidos formulados na petição inicial, para
impor ao Réu a obrigação de fazer consistente em observar o quórum qualificado de 2/3 (dois terços)
dos condôminos para aprovação de deliberação, em Assembleia Geral, que verse sobre a aquisição de área ou gleba de terra pelo condomínio. Condenou o Réu ao pagamento das custas processuais e dos
honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.
vez acolhido o pedido subsidiário deduzido na inicial, o pleito reconvencional não comporta
acolhimento, já que não se pode impor ao autor o ônus de arcar com os gastos oriundos de
assembleia condominial que deixou de observar requisito formal de validade ” (Doc. Num. 13910655 – Pág. 06). Condenou, ainda, o Réu/Reconvinte ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (Reconvenção).
Irresignado, o Réu interpõe recurso de Apelação (Doc. Num. 13910658).
Sustenta que o art. 1342 do Código Civil impõe a observância de quórum qualificado apenas quando a questão discutida verse sobre obras e não sobre aquisição de bem, razão pela qual não há que se falar
em exigência de quórum especial na deliberação discutida nos autos.
Afirma que “ em se mantendo a r. sentença importará em prejuízo à coletividade, pois, se a área for vendida a terceiros, o seu único acesso será por meio das vias internas do condomínio,
caracterizando portanto a SERVIDÃO. Ou seja, o Apelante, terá dentro de seu condomínio, acesso de pessoas sem qualquer tipo de controle, o que por certo, trará insegurança para mais de 700
famílias ali estabelecidas ” (Doc. Num. 13910658 – Pág. 07).
Assevera que “ sendo reformada a sentença deve o Apelado arcar com oscausados ao Apelante
quando, por sua iniciativa, foi suspensa a assembleia,importando em prejuízo, pois desembolsados valores para arcar com as despesas darealização da assembleia ” (Doc. Num. 13910658 – Pág. 08).
Colaciona jurisprudência que entende abonar a sua tese.
Requer, por fim, o conhecimento e o provimento do recurso, a fim de que seja reformada a sentença,
para que sejam julgados improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, com o acolhimento
do pedido reconvencional.
Preparo regular (Doc. Num. 13910659).
Contrarrazões apresentadas pelo Apelado (Doc. Num. 13910662), pelas quais propugna desprovimento do recurso.
É o relatório .
VOTOS
O Senhor Desembargador ANGELO PASSARELI – Relator
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
aquisição de área ou gleba de terra pelo condomínio. Condenou o Réu ao pagamento das custas
processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor
atualizado da causa.
Ademais, julgou improcedente o pedido formulado em Reconvenção, sob o fundamento de que “ uma vez acolhido o pedido subsidiário deduzido na inicial, o pleito reconvencional não comporta
acolhimento, já que não se pode impor ao autor o ônus de arcar com os gastos oriundos de
assembleia condominial que deixou de observar requisito formal de validade ” (Doc. Num.
13910655 – Pág. 06). Condenou, ainda, o Réu/Reconvinte ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa
(Reconvenção).
Sustenta o Apelante, em síntese, que o art. 1.342 do Código Civil impõe a observância de quórum
qualificado apenas quando a questão discutida verse sobre obras e não sobre aquisição de bem, razão pela qual não há que se falar em exigência de quórum especial na deliberação discutida nos autos.
Razão, todavia, não lhe assiste.
Compulsando os autos, constata-se que o Autor/Apelado ajuizou a presente demanda objetivando, em síntese, a suspensão da realização da Assembléia Geral Extraordinária do condomínio Réu, ora
Apelante, designada para o dia 28/09/2019, bem como para que fosse observado o quórum qualificado consistente na unanimidade ou de, no mínimo, 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos para a
aprovação de pauta que tenha por objeto a aquisição de área ou glebas de terra pelo condomínio.
Com efeito, conforme Edital de Convocação de Assembleia Geral Extraordinária colacionado aos
autos (Doc. Num. 13910441 – Pág. 01), verifica-se que fora prevista a realização de tal assembleia no dia 28/09/2019, às 08h30, em primeira convocação com quórum mínimo que represente 2/3 (dois
terços) das frações ideais do condomínio, e às 9h00, em segunda e última chamada, com qualquer
número de condôminos presentes.
Destarte, a Assembleia Geral Extraordinária em questão tinha como pauta a seguinte matéria, in
verbis:
“ 1) Apreciação e votação da proposta feita ao condomínio Ouro Vermelho 1, em 10 de dezembro de 2019, pelo Sr. Valdir de Castro Miranda, legítimo proprietário de uma gleba de terras conhecida
como Peito de Pombo, com área total de 09ha.77a.72ca (nove hectares, setenta e sete hectares e
setenta e dois centiares), devidamente registrada sob o n. 90.437 no cartório 2 OFÍCIO DO
REGISTRO DE IMÓVEIS DO DISTRITO FEDERAL, conforme CERTIDÃO datada de
10.09.2019, que certificou a propriedade do imóvel, bem como declarou que: revendo os livros de
registros e arquivos daquele Serviço Registral, deles não constam quaisquer ônus reais, bem como registro de citações de ações reais ou pessoais reipersecutórias sobre o imóvel objeto desta
matrícula. Em síntese a proposta consiste na aquisição da área pelo Condomínio Ouro Vermelho 1 pelo preço de R$ 1.500.000.00 (um milhão e quinhentos mil reais) e o compromisso de
remanejamento ou indenização por parte do condomínio dos lotes que vierem a ser desconstituídos pelos órgãos competentes. Integra a proposta o compromisso do Sr. Valdir de Castro Miranda,
transferir para a propriedade definitiva do condomínio Ouro Vermelho 1, o remanescente da
matrícula 28.141 no CRI – 2 OFÍCIO onde estamos assentados, de 98ha.86a.28ca (oitenta e nove
hectares, oitenta e seis ares e vinte e oito centiares) registrada sob o n. 28141 até hoje em nome de sua empresa.
No tocante ao anterior ajuizamento de Ação Popular pelo Autor/Apelado e à análise de sua relação de prejudicialidade ou não com a questão discutida no presente Feito, peço vênia para transcrever os
fundamentos adotados pelo Magistrado de origem, destacando, ainda, que não houve insurgência das partes quanto ao ponto. Confira-se, in verbis :
“ Extrai-se dos autos, ademais, que o ora autor já havia proposto ação popular, pretendendo a
invalidação de termo de acordo de transferência de imóvel celebrado pelo condomínio e a sociedade empresarial Serrana Participações e Agropecuária Ltda, referendado em assembleia geral
extraordinária, sob a alegação de irregularidades consistentes em desmatamento de áreas de
preservação permanente, desmembramento irregular de lotes e indícios de fraude à execução de
sentença proferida em ação civil pública.
No referido feito, tombado sob o n. 2011.01.1.169908-3, sobreveio sentença – transitada em julgado – que julgou procedente o pedido e declarou a nulidade do termo de acordo e das escrituras por ele originadas.
Para tanto, consignou, de um lado, sob o influxo do princípio da precaução, a possibilidade de o
referido termo ‘ocasionar gravame nos danos ambientais já ocorridos em razão da implementação de novo desmembramento de terras para criação de novas frações condominiais’. E de outro lado, que ‘a transferência de patrimônio sem qualquer ônus para o primeiro réu, aliada à ausência de
quitação do débito existente na ação civil pública demonstra a presença dos indicativos de que o
termo de acordo para transferência da gleba e as respectivas escrituras públicas caracterizam atos prejudiciais ao patrimônio da coletividade, na medida em que retiram da Serrana Participações
Ltda patrimônio apto a garantir o cumprimento da sentença proferida na ação civil pública’.
Do cotejo entre o quanto decidido na referida ação civil pública e as alegações ora trazidas a lume pelo réu, não é possível divisar que o condomínio réu esteja a pretender furtar-se aos termos do
pretérito pronunciamento judicial.
Há, com efeito, elementos suficientes a autorizar a constatação de que a situação fática atual difere substancialmente daquele vivenciada por ocasião do julgamento da ação popular, o que permite
concluir pela possibilidade de convocação de nova assembleia geral para deliberar sobre a matéria.
Senão, vejamos.
No que diz respeito à afirmação de que a aquisição e incorporação da gleba oferecida ao réu
poderia redundar em desmatamento de áreas de preservação permanente e em desmembramento
irregular de lotes, é bem de ver que Condomínio Ouro Vermelho 1 já conta com projeto ambiental aprovado pelo IBRAM, conforme se infere do documento id. 46807405), que se reporta a parecer
técnico favorável à aprovação do ‘Relatório Ambiental de Análise das Interferências do
Condomínio Ouro Vermelho I nos Espaços Legalmente Protegidos’.
Oportuno, ademais, mencionar que em resposta a questionamento formulado pelo réu, o IBRAM
informou que a área de 9,77 há, contígua ao Condomínio Ouro Vermelho I, entre os condomínios Verde e o Condomínio Ouro Vermelho II, encontra-se em Zona de Ocupação Especial de Interesse Ambiental, nos termos da Lei 5.344/2014, que, inclusive, permite novos parcelamentos urbanos,
desde que atendidas determinadas condições (art. 13).
De outro lado, no que toca à alegação, então acolhida, de que a transferência redundaria em
fraude à execução, cabe consignar que a análise dos autos do cumprimento da sentença proferida na ação civil pública sugere que ele já se encontre suficientemente garantido por força da penhora de imóveis de propriedade do devedor.
Demais disso, não se pode desconsiderar a possibilidade, em tese, de o valor eventualmente pago
pelo réu ao Sr. Valdir de Castro Miranda, por força da venda da gleba de terras ao condomínio,
reverter-se em favor da satisfação do débito exequendo, sabido que o art. 4º, da Lei 9.605/98, prevê a hipótese de desconsideração da personalidade jurídica quando ela se apresentar como obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.
Enfim, não subsistem os óbices que, em momento anterior, levaram à invalidação do ajuste então
celebrado com vistas à transferência de gleba de terras ao réu, de sorte que, sob o aspecto da
eficácia decorrente da sentença proferida na ação popular, não se identifica qualquer impedimento a que o condomínio volte a deliberar sobre a matéria. ” (Doc. Num. 13910655 – Págs. 05/06).
Dessa forma, tal como reconhecido pela r. sentença vergastada, em capítulo não impugnado pelas
partes, não há óbices para que o Condomínio Apelante realize Assembleia Geral para que delibere
sobre a compra de glebas de terra pertencentes aos Sr. Valdir de Castro Miranda, limitando-se a
controvérsia recursal à análise de qual seria o quórum necessário para tal deliberação.
Nesse descortino, efetivamente não há disciplina legal específica no Código Civil acerca do quórum
necessário para a tomada de decisões no caso ora em análise, qual seja, compra pelo condomínio de
área de terra, no valor de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), para fins de aquisição e ampliação da área comum do condomínio. Igualmente, a Convenção do Condomínio não dispõe sobre o tema.
Ademais, conforme reconhece o próprio Apelante, tal aquisição de terras teria como finalidade
transformar a área adquirida em Reserva Particular de Patrimônio Natural, a ser instituída dentro dos limites do condomínio.
Não bastasse isso, o próprio Edital de Convocação previu que, em virtude da compra da área em
questão e do objetivo de instituir tal categoria de unidade de conservação, o condomínio assumiria o
compromisso de remanejamento ou indenização dos lotes que vierem a ser desconstituídos pelos
órgãos competentes, o que demonstra, assim, que a compra da área discutida pode vir a afetar a
configuração dos lotes de alguns condôminos, bem como acarretar despesas para o Condomínio
Réu/Apelante, caso seja necessário o pagamento de indenização.
Nesse descortino, em que pese a ausência de previsão legal específica sobre o quórum necessário para a aprovação da deliberação, verifica-se que a deliberação ora em análise, além de envolver valores
consideráveis, pode ensejar a modificação de áreas comuns do condomínio e/ou de sua respectiva
finalidade e utilização pelos condôminos, inclusive com o remanejamento de alguns lotes, nos termos expostos pelo Edital de Convocação da Assembleia Geral.
Percebe-se, assim, que, ao contrário do que defende o ora Apelante, a proposta de compra da área pelo condomínio, caso seja efetivada, pode impactar a utilização de áreas comuns pelos condôminos, bem como alterar a destinação da referida área, posto que o próprio Condomínio Réu/Apelante admite a
intenção de transformá-la em Reserva Particular de Patrimônio Natural.
“ Art. 1.342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por
qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns. ” (grifei)
Não se desconhece, por óbvio, qual tal artigo trata sobre a realização de obras em partes comuns do condomínio. Entretanto, conforme exaustivamente exposto, não há dispositivo legal específico no
Código Civil acerca do quórum necessário para a tomada de decisões no caso ora em análise,
tampouco na Convenção do Condômino, razão pela qual, conforme regras comezinhas de
interpretação do direito, afigura-se possível a utilização da analogia a fim de solucionar a presente
lide, mormente levando-se em conta as peculiaridades do caso em questão, acima expostas.
Destarte, como bem asseverado pelo MM Juiz a quo , “ tomando-se por base o critério estabelecido
pelo Código Civil, ao exigir, para resoluções mais relevantes, quórum qualificado (seja ele de
unanimidade ou de 2/3 dos votos), não é o caso de se admitir que deliberação tão sensível à massa condominial possa ser tomada por maioria simples ” (Doc. Num. 13910655 – Pág. 07).
Sendo assim, há de ser mantida a determinação de observância do quórum qualificado de 2/3 (dois
terços) dos votos dos condôminos, restando prejudicado, assim, o pleito reconvencional, formulado a fim de que o Autor/Apelado arcasse com os custos de convocação de nova assembleia.
Por fim, ressalte-se que a jurisprudência utilizada nas razões recursais, além de não ser vinculante,
também não é aplicável ao caso em questão, pois não guarda similitude fática com a situação descrita nos autos.
Com tais considerações, nego provimento ao recurso, mantendo incólume a r. sentença.
Diante do disposto no art. 85, § 11, do CPC, majoro em 2% (dois por cento), os honorários de
sucumbência fixados pelo Juízo de primeiro grau em desfavor do Réu/Reconvinte.
É como voto .
O Senhor Desembargador JOSAPHÁ FRANCISCO DOS SANTOS – 1º Vogal
Com o relator
A Senhora Desembargadora ANA CANTARINO – 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO
CONHECER. NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME.