Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
Registro: 2019.0000133603
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 1005886-58.2016.8.26.0565, da Comarca de São Caetano do Sul, em que é apelante SIRUSS RIBEIRO ABRARPOUR, é apelado CONDOMÍNIO RESIDENCIAL FATTO SÃO CAETANO.
ACORDAM, em 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores FRANCISCO CASCONI (Presidente sem voto), ANTONIO RIGOLIN E ADILSON DE ARAUJO.
São Paulo, 26 de fevereiro de 2019.
PAULO AYROSA
RELATOR
ASSINATURA ELETRÔNICA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
Apelação Nº 1005886-58.2016.8.26.0565
Apelante : SIRUSS RIBEIRO ABRARPOUR
Apelada : CONDOMÍNIO RESIDENCIAL FATTO SÃO CAETANO
Comarca : São Caetano do Sul – 6ª Vara Cível
Juiz (a) : Gustavo Sampaio Correia
V O T O Nº 39.820
CONDOMÍNIO EM EDIFÍCIO AÇÃO ANULATÓRIA DE MULTA CONDOMINIAL C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA, C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO
REALIZAÇÃO DE OBRAS PELO AUTOR EM SUA UNIDADE CONDOMINIAL ALEGAÇÃO DE ALTERAÇÃO DE FACHADA E COMPROMETIMENTO DA ESTRUTURA E SEGURANÇA
AÇÃO IMPROCEDENTE RECURSO NÃO PROVIDO. O artigo 1.336, III, do Código Civil, tem por objetivo resguardar a harmonia do edifício e manter a igualdade entre os condôminos, uma vez que a alteração da fachada e de partes externas pode provocar desvalorização para as unidades autônomas ou impor ônus indevido para os demais condôminos, no caso de terem de arcar com obras particulares para a manutenção do conjunto arquitetônico. Além disso, a remoção de parede externa do edifício, de fechamento do apartamento, não pode ser permitida em razão do envidraçamento da varanda, pois continua sendo parte da estrutura externa do edifício, e do projeto de construção do prédio. A remoção não foi autorizada pelo condomínio, tendo o autor ciência deste fato. Manutenção da improcedência da ação, vez que devida a multa por descumprimento das normas do condomínio.
SIRUSS RIBEIRO ABRARPOUR propôs ação anulatória de multa condominial c/c pedido de tutela antecipada, c/c consignação em pagamento frente à CONDOMÍNIO RESIDENCIAL FATTO SÃO CAETANO.
A r. sentença de fls. 289/291, cujo relatório se adota, julgou improcedente a ação, condenando o autor ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, fixados em R$1.000,00.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
Inconformado, apela o autor almejando a reforma da decisão, alegando, em síntese, que: apesar de ser proibida a alteração da fachada, a parede removida não faz mais parte dela, vez que a varanda foi toda fechada com vidros; a alegação de que a parede removida poderia comprometer a segurança do edifício não foi comprovada tecnicamente; o apelante realizou consulta com engenheiro civil acerca da remoção da parede; o apelante juntou manual do condomínio com expressa informação de que a parede não é estrutural; a parede passou a ser interna, e não altera a fachada do edifício; a sentença está incompleta e incongruente com os fatos, pois não houve total observância e enfrentamento de todos os argumentos deduzidos no processo; a parede foi removida após autorização verbal do síndico; há inúmeros condôminos que alteraram o layout dos apartamentos, retirando parede para expansão dos cômodos; houve cerceamento de defesa com a não produção de prova testemunhal, conforme requerido; a sentença omitiu-se quanto ao pedido consignatório (fls. 297/305).
O apelado ofertou contrarrazões, batendo-se pelo não provimento do recurso (fls. 310/318).
É O RELATÓRIO .
Conheço do recurso, e lhe nego provimento.
Inicialmente, não há que se falar em cerceamento de defesa, pois desnecessária a produção de prova testemunhal para o deslinde do feito. Estando presentes os requisitos autorizadores, correto o pronto julgamento.
Conforme se depreende dos autos, o autor é proprietário de um apartamento no edifício réu, unidade 125-B, usando o imóvel como seu lar, e alega ter feito algumas pequenas reformas no apartamento para deixá-lo mais agradável. Afirma que foi aprovado em assembleia a colocação o fechamento da sacada com vidros e a colocação de cortinas, além da remoção da porta que separa a varanda da sala. O autor realizou estas obras, e também retirou a parede que separa a sala da varanda, já que esta passou a ser interna com o fechamento da sacada. No entanto, recebeu notificação, e posteriormente multa do condomínio, por ter alterado a fachada do edifício, motivo pelo qual propôs a presente ação.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
O condomínio réu alega, por sua vez, que a reforma não só alterou a fachada externa do edifício, mas também compromete a segurança do mesmo, motivo pelo qual a multa é devida, e a obra precisa ser desfeita, para retorno ao status quo ante.
A ação foi julgada improcedente. Inconformado, o autor recorreu, não merecendo acolhida seu apelo.
Consoante estabelece o artigo 1.336, inciso III, do Código Civil:
Art. 1.336. São deveres do condômino:
(…)
III não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;
Ao interpretar este dispositivo legal, Francisco Eduardo Loureiro ensina que:
“A razão da regra é simples: as paredes externas do edifício constituem área comum e a unidade arquitetônica interessa a todos os condôminos, de modo que não podem ser mudadas a critério de um deles. De outro lado, prevalece o entendimento de que o limite da proibição é o interesse coletivo. Toleram-se, assim, pequenas alterações na fachada, desde que ditadas por necessidade, como a colocação de grades de proteção ou a substituição de esquadrias obsoletas, originalmente feitas de material não mais existente no mercado (RT 758/270).
Também se admite a colocação de equipamentos que visem ao conforto dos moradores e compatíveis com a vida moderna, como exaustores e aparelhos de ar-condicionado, desde que a agressão à fachada não seja gritante nem cause incômodo aos demais condôminos.” (Código Civil Comentado Doutrina e Jurisprudência, Coordenação Ministro Cesar Peluso. Barueri, SP: Editora Manole, 1ª edição, 2007, p. 1199).
O fechamento da sacada e a colocação de cortinas, bem como a retirada da porta balcão que separa a sala da varanda foram devidamente aprovadas na assembleia realizada em 22.11.2012 (fls. 17/24). No entanto, a retirada da parede foi levada à discussão na assembleia realizada em 02/07/2015 (fls. 185/192), e diante da polêmica sobre o assunto, e falta de quórum para
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
alteração, foi novamente discutida em assembleia específica para este assunto, realizada em 17.03.2016 (fls. 181/184), na qual restou decidido que não poderia ser realizada:
“Após apresentação das opiniões, declarações e defesas sobre as ocorrências de remoção da parede divisória da sala e a sacada, ou seja, dado como concluído a avaliação se o fato pode ser considerado ou não como infração, foi colocada em votação: – se a remoção dessa parede trata-se de infração contra o Regimento Interno. Pela maioria dos condôminos foi aprovado que a remoção da parede altera a fachada e, portanto, trata-se de infração quanto o que menciona a Convenção e o Código Civil.” (fl. 183)
O autor foi regularmente notificado sobre a decisão da Assembleia, e a necessidade de reconstruir a parede, voltando ao que era antes da obra, mas não atendeu à determinação, vindo a receber multa, conforme previamente estabelecido.
Assim sendo, não há que se falar em anulação da multa, que foi corretamente aplicada conforme o que foi estabelecido em Assembleia.
Como bem constou da sentença:
“Da análise dos documentos carreados aos autos, infere-se que ainda que o autor tenha procedido à instalação do envidraçamento e cortinas, seguindo a padronização fixada em assembleia, não havia expressa autorização para a demolição da parede que separa a sala da varanda.
Não pode o requerente, sob a alegação de que o envidraçamento impede a visualização externa das reformas realizadas no interior da unidade, submeter o espaço que ocupa a alterações estruturais que julgar convenientes, em detrimento da coletividade condominial.
Ademais, no próprio documento juntado pelo autor a fim de comprovar que as alvenarias não possuem características estruturais, observo, porque oportuno, a existência da advertência de que “(…) a sua retirada poderá gerar uma acomodação nos apartamentos lindeiros (superior e inferior) que podem apresentar fissuras provenientes desta acomodação (…)” – fls. 242. Ora, na hipótese de todos os moradores entenderem que podem fazer as modificações internas que lhes convierem, a pretexto de não causarem abalos na estrutura do imóvel, tornar-se-iam insustentáveis a conservação e segurança predial.
Nessa toada, afasto o pedido de declaração de inexistência da
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
multa; ora, tendo em vista que a Assembleia Condominial (fls. 181/184) deliberou que a remoção da parede que separa a sala da sacada acarreta alteração na fachada, restou caracterizada como infração a retirada realizada pelo autor, passível de ser punida com a multa em questão.
Insta salientar que o art. 6º, a da Convenção de Condomínio (fls. 112), traz a expressa proibição aos condôminos de “mudar a forma, cor ou aspecto externo da edificação e, particularmente a fachada dos edifícios, aí incluídas as sacadas, varandas e terraços, salvo permissão unânime de todos os condôminos.”
Anote-se que antes da aplicação da multa, decidiu-se pela advertência dos moradores para que procedessem à reconstrução da parede em 45 dias e, no caso de descumprimento, incidiria multa, penalidade prevista no regulamento interno (fls. 136). Ambas as providências, devidamente comprovadas a fls. 193/194, foram deliberadas em assembleia condominial da qual presume-se a participação do requerente, tendo em vista que este fato foi afirmado pelo réu e não foi impugnado pelo autor. Desse modo, óbice não há para a aplicação e exigibilidade da multa.”
Neste sentido temos julgados:
CONDOMÍNIO EDILÍCIO. Ação que visa ao cumprimento de obrigação de fazer. Sentença de improcedência do pedido de condenação dos réus ao restabelecimento da fachada do imóvel. Apelação do condomínio autor. Agravo retido interposto na vigência do CPC de 1.973 conhecido e rejeitado. Dever dos condôminos de não alterar a fachada do edifício. Art. 1.336, III, do CC. Alteração da fachada pelos réus comprovada por meio de prova pericial. Assembleia do Condomínio que concedeu prazo de 120 dias para que os proprietários das unidades restabelecessem as portas-balcão e a coluna do terraço ao status quo ante. Réus que têm o dever de cumprir o que foi decidido em Assembleia. Sentença reformada. RECURSO PROVIDO. (TJSP; Apelação 0120157-76.2012.8.26.0100; Relator (a): Carmen Lucia da Silva; 25ª Câmara de Direito Privado; Julgamento: 22/11/2018)
CONDOMÍNIO OBRA COM ALTERAÇÃO DA FACHADA DO PRÉDIO AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLEIA – OBRIGAÇÃO DE RESTABELECER A ARQUITETURA ORIGINAL COM IMPOSIÇÃO DE MULTA CABIMENTO – MODIFICAÇÃO VEDADA POR LEI E PELA CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO, COM PREVISÃO DE MULTA AO CONDÔMINO INFRATOR – PROCEDÊNCIA DA AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO DECLARATÓRIA PROMOVIDA PELOS CONDÔMINOS – JULGAMENTO CONJUNTO – HONORÁRIOS FIXADOS EM VALOR SUPERIOR À SOMA DOS VALORES DAS CAUSAS
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
DESCABIMENTO REDUÇÃO DEVIDA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP; Apelação 1000566-98.2015.8.26.0003; Relator (a): Andrade Neto; 30ª Câmara de Direito Privado; Julgamento: 11/07/2018)
Apelação – Condomínio Alteração de fachada. Demonstrada alteração de fachada, com impacto na harmonia arquitetônica do condomínio, tendo sido determinada a correção da infração, pela maioria da assembleia condominial, correta a condenação da ré à obrigação de fazer, consistente no retorno da parede ao estado original – A suposta prática de alteração da fachada por outros condôminos não permite que se pratique a mesma infração, incumbindo à assembleia e ao síndico a análise de cada questão, individualmente
É devida multa se, após notificada, a condômina não soluciona a infração
Correta a substituição da base de cálculo da multa, prevista em salário de referência, pelo salário mínimo Não pode haver a aplicação de mais de uma multa pelo mesmo fato gerador; a persistência da irregularidade deve ser combatida por meio da via adequada Eventual obrigação do condomínio perante à condômina, quanto a supostas obras necessárias em sua unidade, é questão que deve ser arguida na via adequada, não lhe sendo permitido cometer infração à convenção como forma de retaliação O direito da parte à justiça gratuita é amparado também na Constituição da República e na Constituição do Estado de São Paulo; trata-se de garantia fundamental da pessoa humana, incontrastável por lei de hierarquia inferior, e imediatamente aplicável. Apelação provida em parte. (TJSP; Apelação 1019250-43.2015.8.26.0562; Relator (a): Lino Machado; 30ª Câmara de Direito Privado; Julgamento: 14/12/2016)
VOTO DO RELATOR EMENTA CONDOMÍNIO EDIFÍCIO
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER Competência desta Turma Julgadora, por força de julgamento de agravo de instrumento extraído dos mesmos autos
Parcial procedência Prova pericial conclusiva, no sentido de que as reformas efetuadas pelos autores culminaram na alteração da fachada do edifício (demolição de esquadrias e paredes, mudança de cor das paredes externas)
Descumprimento de dever legal estampado no art. 1336, inciso III, do Código Civil Correta a determinação de regularização das obras, na forma delimitada pela perícia que, por seu turno, concluiu que o terraço do 22º andar pertence à unidade dos autores, não se cuidando de área comum Valor da multa, pelo descumprimento da tutela antecipada (R$ 100.000,00) que, no entanto, é excessivo – Impossibilidade de subversão da natureza da multa, que visa compelir o cumprimento de determinação judicial e não possui caráter indenizatório
Cominação de astreintes que não faz coisa julgada material Possibilidade assegurada pelo art. 461, § 6º, do CPC, de o julgador rever, a qualquer tempo, inclusive de ofício, o valor da multa arbitrada que, aqui, fica reduzida à importância de R$ 20.000,00 Recurso dos réus parcialmente provido para este fim, improvido o do autor.
(TJSP; Apelação 0125596-05.2011.8.26.0100; Relator (a): Salles Rossi; 8ª Câmara de Direito Privado; Julgamento: 01/06/2016)
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
31ª Câmara de Direito Privado
OBRIGAÇÃO DE FAZER Reformas irregulares realizadas pela ré Procedência em Primeiro Grau Recurso da ré Sustenta que tem direito de modificar sua propriedade de acordo com o art. 19 da lei 4591/64 e que as reformas não geram consequências negativas para o condomínio autor, não tendo motivo para serem repudiadas Não cabimento Laudo pericial Reforma na sacada que faz com que todo o condomínio fique irregular perante legislação municipal Alteração externa da fachada bem caracterizada Remoção parcial de parede interna que, apesar de isolada não gerar efeitos negativos, se generalizada gerará consequências sérias a estrutura do edifício Recurso desprovido. (TJSP; Apelação 0006653-71.2012.8.26.0010; Relator (a): Galdino Toledo Júnior; 9ª Câmara de Direito Privado; Julgamento: 02/08/2016)
Logo, de rigor a manutenção da sentença. Nos termos do art. 85, § 11 do novo CPC, considerando-se a natureza da causa, e o trabalho realizado pelo advogado, bem como a atuação em segundo grau, elevo os honorários advocatícios já fixados em primeiro grau para R$ 1.500,00.
Posto isto, nego provimento ao recurso.
PAULO CELSO AYROSA M. ANDRADE
Relator