Inteiro Teor
fls.8
PROCESSO Nº TST-RR-190240-66.1984.5.01.0029
Firmado por assinatura digital em 02/02/2011 pelo sistema AssineJus da Justiça do Trabalho, conforme MP 2.200-2/2001, que instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira.
PROCESSO Nº TST-RR-190240-66.1984.5.01.0029
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A C Ó R D Ã O
(Ac. 1ª Turma)
GMWOC/mr
RECURSO DE REVISTA. AGRAVO DE PETIÇÃO. QUORUM MÍNIMO. DIREITO CONSTITUCIONAL PROCESSUAL.
A matéria afeta à definição do quorum mínimo para deliberação de Turma de Tribunal Regional do Trabalho, em desacordo com a determinação contida em normas de organização judiciária (art. 113 da CF), ostenta inequívoca índole constitucional, por tratar-se de requisito de validade do ato decisório que é ínsito ao direito constitucional de ampla defesa e ao princípio do juiz natural, sendo nulo o julgamento regional proferido com menosprezo ao quorum mínimo de três juízes. Dessa orientação divergiu o acórdão recorrido, violando os arts. 5º, LV, e 113 da Constituição Federal.
Recurso de revista conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST-RR-190240-66.1984.5.01.0029 (Convertido de Agravo de Instrumento de mesmo número), em que é Recorrente ESPÓLIO DE HENRIQUE DE AFFONSECA KERTI e Recorrida LOJAS AMERICANAS S.A.
Contra a decisão proferida às fls. 418-419, por meio da qual a Presidência do TRT da 1ª Região denegou seguimento a recurso de revista, o exequente interpõe agravo de instrumento, conforme as razões às fls. 02-17.
Houve apresentação de resposta aos recursos (fls. 425-435).
Desnecessário prévio parecer do Ministério Público do Trabalho, na forma regimental.
É o relatório.
V O T O
I – AGRAVO DE INSTRUMENTO
1. CONHECIMENTO
Presentes os pressupostos genéricos de admissibilidade, CONHEÇO do agravo de instrumento.
2. MÉRITO
AGRAVO DE PETIÇÃO. QUORUM MÍNIMO
Denegado o recurso de revista em fase de execução por não ter sido demonstrada a violação direta e literal de norma da Constituição Federal, o exequente renova os argumentos expendidos no apelo trancado, no sentido de que “é evidente que o julgamento do agravo de petição por apenas dois juízes, sem observância do quorum mínimo legal, traduz-se em manifesto prejuízo ao agravante, na medida em que se agravo foi improvido”. Nesse sentido, reputa nulo o julgamento proferido por apenas dois juízes e requer a decretação de nulidade por violação ao devido processo legal, ante a ofensa aos arts. 5º, LV, 113 e 115 da Constituição Federal.
Com efeito, deve ser provido o presente agravo, para processamento do recurso de revista, a fim de se afastar violação de norma da Constituição Federal, na forma do art. 896, § 2º, da CLT.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento e determino o processamento do recurso de revista, observada a sistemática prevista na Resolução Administrativa nº 928/2003 desta Corte Superior.
II – RECURSO DE REVISTA
1. CONHECIMENTO
Presentes os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, analiso os específicos de cabimento do recurso de revista.
AGRAVO DE PETIÇÃO. QUORUM MÍNIMO
O TRT da 1ª Região, mediante o acórdão proferido às fls. 373-380, rejeitou a preliminar de nulidade da sentença de liquidação de fls. 514/518 e, no mérito, negou provimento ao agravo de petição interposto pelo espólio exequente.
O exequente interpôs embargos de declaração, às fls. 383-390, solicitando pronunciamento da Corte de origem, dentre outras questões, acerca da existência de nulidade do julgamento do agravo de petição, por falta de quorum mínimo para deliberação previsto nos arts. 168 do Regimento Interno do TRT e 672, § 1º, da CLT, em virtude de terem participado do julgamento apenas dois juízes, já que o terceiro, convocado, dera-se por suspeito, em flagrante desrespeito ao devido processo legal e afrontando os arts. 5º, LV, e 113, da Constituição Federal.
Em resposta aos embargos de declaração, a Turma do Tribunal Regional, na decisão às fls. 392-398, assim decidiu, verbis:
Da leitura do § 1º do art. 672 da CLT afere-se inexistir no Processo do Trabalho exigência quanto à emissão de voto, na deliberação de um processo, de pelo menos três julgadores.
O que há é a declaração de imprescindibilidade da presença de três juízes para que se proceda a qualquer deliberação.
Estar um juiz presente à sessão não significa, necessariamente, que pratique ele a ação de julgar, deliberar, decidir, pois a lei estipula hipóteses em que não lhe é dado expor seu entendimento sob a questão debatida. Ou seja, obsta-lhe a participação na discussão, ainda que esteja presente.
O que o § 1º do art. 672 da CLT fixa, portanto, é o quorum mínimo para o funcionamento da Turma (quorum de presença), qual seja o de três juízes, e não para a decisão dos processos incluídos em pauta (quorum de deliberação).
O quorum de deliberação, estipulado a partir do quorum de presença, encontra-se previsto no § 2º do art. 672 da CLT. É importante não olvidar que a lei não contém palavras inúteis, e o § 1º do art. 672 da CLT refere-se à presença de três juízes, e não ao voto ou deliberação de três juízes.
(…)
O quorum mínimo de votos necessários a uma deliberação é o de dois, considerando-se o quorum de três magistrados estipulado no § 1º do art. 672 da CLT e a exigência contida no § 2º desse mesmo dispositivo quanto a tomar-se a decisão pela maioria de votos.
Ora, dois votos, em relação a um quorum de três constitui, matemática e inequivocamente, uma maioria, ao mesmo tempo simples, absoluta e qualificada. É, em seu universo, uma maioria por excelência…
Nas razões do recurso de revista, o exequente sustenta, em suma, ser “evidente que o julgamento do agravo de petição por apenas dois juízes, sem observância do quorum mínimo legal, traduz-se em manifesto prejuízo ao agravante, na medida em que se agravo foi improvido”. Afirma que a garantia do devido processo legal assegura ao litigante o direito à revisão, em duplo grau, das decisões de primeira instância, por um colegiado com quorum mínimo de deliberação. Nesse sentido, reputa nulo o julgamento proferido por apenas dois juízes e requer a decretação de nulidade por violação do devido processo legal, ante a ofensa aos arts. 5º, LV, 113 e 115 da Constituição Federal.
À análise.
Da leitura dos fundamentos do acórdão recorrido, constata-se que o Tribunal Regional firmou seu convencimento no sentido de que o quorum mínimo de votos necessários a uma deliberação é o de dois, considerando-se o quorum de três magistrados estipulado no § 1º do art. 672 da CLT e a exigência contida no § 2º desse mesmo dispositivo quanto a tomar-se a decisão pela maioria de votos.
É inconteste, portanto, que a Corte a quo, no julgamento do agravo de petição, tomou a decisão pelo voto de apenas dois juízes e, a meu ver, violou garantias constitucionais inerentes ao devido processo.
Segundo o magistério de Nelson Nery Junior, em conhecida obra, não obstante o reconhecimento doutrinário da unidade processual, é comum dizer-se didaticamente que existe um direito constitucional processual, para significar o conjunto das normas de direito processual que se encontra na Constituição Federal, de que são exemplos o art. 5º, XXXV, LIV e LV, e 8º, III etc., ao lado de um direito processual constitucional, que seria a reunião dos princípios para o fim de regular a denominada jurisdição constitucional, sendo exemplos o mandado de segurança, o habeas data, a ação direta de inconstitucionalidade etc. (“Princípios do Processo na Constituição Federal / Nelson Nery Junior. – 9.ed. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2009, pág. 41).
Os princípios do devido processo legal e da ampla defesa encartam-se no âmbito do direito constitucional processual. E, nesse campo dialético, “O devido processo (processo justo) pressupõe a incidência da isonomia; do contraditório; do direito à prova; da igualdade de armas… do direito ao juiz natural…” (obra citada, pág. 90).
Dentre os conteúdos inerentes ao princípio do juiz natural, destaca-se a observância das determinações de procedimento referentes à divisão funcional interna (op. cit., pág. 131), estabelecida, quanto à Justiça do Trabalho, no art. 113 da Constituição Federal, verbis:
Art. 113. A lei disporá sobre a constituição, investidura, jurisdição, competência, garantias e condições de exercício dos órgãos da Justiça do Trabalho. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 24, de 1999)
Regulamentando o preceito constitucional, o art. 672, §§ 1º e 2º, da CLT fixou o quorum mínimo para funcionamento de Turmas de Tribunais Regionais do Trabalho, verbis:
Art. 672 – Os Tribunais Regionais, em sua composição plena, deliberarão com a presença, além do Presidente, da metade e mais um, do número de seus juízes.
§ 1º As Turmas somente poderão deliberar presentes, pelo menos, três dos seus juízes.
§ 2º Nos Tribunais Regionais, as decisões tomar-se-ão pelo voto da maioria dos juízes presentes, ressalvada, no Tribunal Pleno, a hipótese de declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato do poder público (art. 97 da CF).
Questionado pelo recorrente acerca da incidência da norma, como acima referido, o Tribunal de origem entendeu que o quorum mínimo de votos necessários a uma deliberação é o de dois, e não o de três juízes, no que violou o princípio do juiz natural e o próprio direito de defesa do exequente.
Sob esse viés, impende registrar que a questão a ser dirimida em sede recursal de natureza extraordinária, em relação à validade do quorum de julgamento do agravo de petição, não se vincula à mera aplicação do art. 672 da CLT, e sim à necessidade de se conferir validade à decisão judicial inquinada de nulidade, dada a inobservância ao requisito da colegialidade, como decorrência do princípio do juiz natural que, com o contraditório e a ampla defesa, integra o princípio constitucional do devido processo.
Nessa dimensão teórica, forçoso reconhecer que a matéria afeta à definição do quorum mínimo para deliberação de Turma de Tribunal Regional do Trabalho, em desacordo com a determinação contida em normas de organização judiciária (art. 113 da CF), ostenta inequívoca índole constitucional, sendo nulo o julgamento regional proferido com menosprezo ao quorum mínimo de três juízes.
O quorum mínimo de deliberação judicial tem a natureza jurídica de pressuposto de validade do ato dependente de sua presença no momento em que é praticado é algo incontornável e obrigatória, verdadeira condição necessária do ato colegial (cfr. José Wilson Ferreira Sobrinho, “Teoria do quorum”, www.uj.com.br).
Assim, a deliberação da Turma do Tribunal Regional com apenas dois juízes contamina o julgamento do agravo de petição, tornando-o nulo por falta de legitimidade constitucional.
Releva sublinhar, à guia de exemplo, a previsão do art. 555 do CPC, no sentido de que, no julgamento de apelação ou de agravo, a decisão será tomada, na câmara ou turma, pelo voto de três juízes, mesmo quorum previsto no art. 101, § 1º, da LOMAN (LC nº 35/79).
A matéria em debate já foi apreciada pela c. 3ª Turma desta Corte Superior, em processo de conhecimento, nos termos do julgado transcrito a seguir:
RECURSO DE REVISTA. DECISÃO REGIONAL. QUORUM MÍNIMO. De acordo com o disposto no § 1º do art. 672 da CLT, o -quorum- mínimo para julgamento pelas Turmas dos Tribunais Regionais é de três juízes. Não observado este número, revela-se nula a decisão. Recurso de revista conhecido e provido. Processo: RR – 768366-48.2001.5.06.5555 Data de Julgamento: 18/02/2009, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 27/03/2009.
Com apoio em tais fundamentos, CONHEÇO do recurso de revista por violação dos arts. 5º, LV, e 113 da Constituição Federal, na forma do art. 896, § 2º, da CLT.
2. MÉRITO
AGRAVO DE PETIÇÃO. QUORUM MÍNIMO
No mérito, conhecido o recurso de revista por violação dos arts. 5º, LV, e 113 da Constituição Federal, DOU-LHE PROVIMENTO para decretar a nulidade do julgamento do agravo de petição proferido sem observância ao quorum mínimo de três juízes, determinando o retorno dos autos ao Tribunal Regional do Trabalho de origem, a fim de que profira novo julgamento do recurso, conforme entender de direito. Prejudicado o exame dos temas recursais remanescentes.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo de instrumento e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar o julgamento do recurso de revista. Acordam, ainda, julgando o recurso de revista, na forma do art. 897, § 7º, da CLT, dele conhecer quanto ao tema “Agravo de Petição. Quorum mínimo”, por violação dos arts. 5º, LV, e 113 da Constituição Federal, e, no mérito, dar-lhe para decretar a nulidade do julgamento do agravo de petição proferido sem observância ao quorum mínimo de três juízes, determinando o retorno dos autos ao Tribunal Regional do Trabalho de origem, a fim de que profira novo julgamento do recurso, conforme entender de direito. Prejudicado o exame dos temas recursais remanescentes.
Brasília, 02 de fevereiro de 2011.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
Walmir Oliveira da Costa
Ministro Relator