Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO |
PROCESSO nº 0021015-50.2015.5.04.0523 (RO)
RECORRENTE: IVONE ZAMADEI SANTOLIN
RECORRIDO: COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS DO NORTE DO RIO GRANDE DO SUL E OESTE DE SANTA CATARINA – SICREDI NORTE RS/SC
RELATOR: LAIS HELENA JAEGER NICOTTI
ESTABILIDADE PROVISÓRIA. MEMBRO DO CONSELHO FISCAL. O membro do sindicato, eleito para o Conselho Fiscal, tem assegurada a garantia ao emprego e, pois, a estabilidade provisória prevista no art. 543, § 3º, da CLT. Entendimento que se funda na premissa de que o trabalhador, ao atuar nas questões afetas à área administrativo-financeira da entidade sindical, age na defesa dos interesses da categoria que representa. Recurso ordinário da reclamante a que se dá provimento parcial, no aspecto.
Vistos, relatados e discutidos os autos.
ACORDAM os Magistrados integrantes da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE, Ivone Zamadei Santolin, para, nos termos da fundamentação, condenar a reclamada ao pagamento de indenização substitutiva pelo período estabilitário. Custas processuais de R$ 800,00, calculadas sobre o valor ora arbitrado à condenação de R$ 40.000,00, revertidas à reclamada.
Intime-se.
Porto Alegre, 08 de novembro de 2017 (quarta-feira).
Inconformada com a sentença de improcedência proferida pela Juíza Paula Silva Rovani Weiler (Id 069f341), a reclamante recorre.
Pelas suas razões recursais (Id 7a0da50), pretende a revisão do decidido quanto à estabilidade provisória e ao dano moral.
Sem apresentação de contrarrazões, vêm os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE
1. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. MEMBRO DE CONSELHO FISCAL
Fundada na Orientação Jurisprudencial nº 365 da SDI-I do TST, a Magistrada da origem concluiu que a reclamante não tem direito à estabilidade provisória sindical, pois seu cargo – membro de conselho fiscal -, não lhe concederia tal garantia. Fundamentou que o § 2º do artigo 522 da CLT especifica que a competência do conselho fiscal é apenas de fiscalizar a gestão financeira do sindicato, não havendo prerrogativa para que seus membros representem e defendam os interesses da categoria perante os poderes públicos e as empresas. Desta feita, rejeitou o pedido de indenização substitutiva – requerida face à impossibilidade de reintegração.
A reclamante recorre, reafirmando seu entender de que, quando da despedida, estava sob o abrigo da estabilidade até 26/11/2015, uma vez titular do conselho fiscal do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Erechim. Aduz que a sua estabilidade, além de prevista no artigo 543 da CLT, também encontra guarida no artigo 8º, VIII, da CRFB, de modo que o exercício da fiscalização da gestão financeira da entidade sindical não afastaria a aludida garantia. Aduz que não há norma constitucional ou legal restringindo o alcance da estabilidade. Cita doutrina e jurisprudência. Requer, pois, a reforma do julgado, com a condenação no pagamento da indenização substitutiva.
Examino.
A reclamante laborou para a reclamada no período de 01/10/1993 a 05/01/2015, exercendo os cargos de atendente, auxiliar e assistente administrativo. Sua despedida foi imotivada, por iniciativa da reclamada (ficha de registro, Id 862a94f; TRCT, Id 539c7ef). Consta também que a reclamante exerceu o cargo titular de conselheira fiscal do sindicato de sua categoria, em mandato que se prolongou de 26/11/2010 a 26/11/2014 (Ids 054bb46, 3ddd6ad e 73633dc).
Dispõe o art. 8º, VIII, da Constituição da República, que: “é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da Lei”.
O art. 543, § 3º, da CLT, por sua vez, prevê: “Fica vedada a dispensa do empregado sindicalizado ou associado, a partir do momento do registro de sua candidatura a cargo de direção ou representação de entidade sindical ou de associação profissional, até 1 (um) ano após o final do seu mandato, caso seja eleito, inclusive como suplente, salvo se cometer falta grave devidamente apurada nos termos desta Consolidação.”
O art. 522, caput, do mesmo diploma, por sua vez, preceitua que “A administração do sindicato será exercida por uma diretoria constituída, no máximo, de sete e, no mínimo, de três membros e de um conselho fiscal composto de três membros, eleitos esses órgãos pela assembleia geral.” E, no seu § 2º, que “A competência do Conselho Fiscal é limitada à fiscalização da gestão financeira do Sindicato.”
Sopesados os dispositivos citados, entendo que a garantia a que se referem é dirigida a todos aqueles ocupantes de cargos que se dedicam a conduzir os rumos da entidade sindical. Este é o caso do membro do Conselho Fiscal porque, tendo como atribuição precípua o acompanhamento de como estão sendo utilizados os recursos da entidade que representa os trabalhadores, por óbvio, está a atuar nos rumos e no interesse da categoria, podendo, inclusive, opor-se à atuação da Diretoria.
Em assim sendo, deixo de aplicar a Orientação Jurisprudencial nº 365 da SDI-I do TST.
De outro lado, há de se observar limitações impostas pelo artigo 522 da CLT. Quanto ao tema, transcrevo trecho do acórdão nº 0000066-88.2014.5.04.0733 RO, relatado nesta 1ª Turma pela Desembargadora Rosane Serafini Casa Nova, em julgamento do qual participei, e cujos fundamentos também seguem aqui adotados como razões de decidir:
(…) em que pese o sindicato detenha plena autonomia quanto à sua organização e mesmo quanto à deliberação sobre o número de dirigentes ou representantes que devem compor sua administração, a oposição da garantia de emprego contra terceiros (empregadores), se restringe ao quantum máximo de dirigentes e representantes previsto em lei (CLT, art. 522). Entendimento contrário importaria estimular o exercício abusivo do direito, com evidente desvirtuamento dos fins sociais a que a lei se destina.
Consoante lições trazidas por Arnaldo Süssekind e Délio Maranhão : “se o direito do sindicato de eleger seus dirigentes – porque daí decorre o direito de estabilidade dos mesmos – vai interferir na relação entre o empregado eleito e seu empregador, restringindo o direito a este constitucionalmente assegurado, como regra, de resilir unilateralmente o contrato de trabalho, é evidente que a questão extrapola a autonomia interna do sindicato, atingido direito de outrem. Desta simples e intuitiva razão decorre que a lei (não o Governo) há de dispor sobre o número dos componentes da Diretoria do Sindicato. Com isso, não sofre violação o princípio da autonomia sindical. Apenas se preserva, como frisou a Assembleia das Nações Unidas, o respeito aos ‘direitos e liberdades de outrem (art. 8º, c, do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966). … enquanto a lei não dispuser, prevendo outro critério de limitação do número de diretores do sindicato, há de prevalecer a norma do art. 522 da CLT, sob pena de sujeitar-se o empregador, na relação contratual com seu empregado, ao arbítrio da entidade sindical, o que não se coaduna, obviamente, com a própria ideia de direito”. (in Instituições de Direito do Trabalho, 13ª. ed., São Paulo, LTr, 1992, pág. 635)
Também o Tribunal Superior do Trabalho se posiciona no sentido de que o artigo 522 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal, consoante item II da Súmula 369:
“DIRIGENTE SINDICAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA.
(…)
II – O art. 522 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Fica limitada, assim, a estabilidade a que alude o art. 543, § 3.º, da CLT a sete dirigentes sindicais e igual número de suplentes.”
Tem-se, assim, que a eleição para integrar o sindicato como representante sindical não gera, por si só, a garantia provisória de emprego de que trata o inciso VIII do artigo 8º da Constituição Federal, impondo-se a observância do número de cargos previstos em lei.
Portanto, na falta de outra norma reguladora, vinga o exposto no artigo 522 da CLT, de sorte que, a teor do inciso VIII do artigo 8º da Constituição Federal e do § 3º do artigo 543, os dirigentes sindicais contemplados pela estabilidade constitucional e legalmente prevista são os membros da Diretoria, em número máximo de sete, e os do Conselho Fiscal, em número máximo de três, assim como seus suplentes, perfazendo, assim, um total de vinte integrantes eleitos da categoria profissional com direito à estabilidade provisória. (…)
(TRT da 4ª Região, 1ª Turma, 0000066-88.2014.5.04.0733 RO, em 10/12/2015, Desembargadora Rosane Serafini Casa Nova – Relatora. Participaram do julgamento: Desembargadora Iris Lima de Moraes, Desembargadora Laís Helena Jaeger Nicotti)
No caso, a reclamante é a segunda de uma relação de cinco membros titulares do Conselho Fiscal (Id 73633dc), figurando, portanto, dentro dos limites impostos pelo artigo 522 da CLT.
Nesse contexto, ao contrário do entendimento adotado na origem, julgo que a reclamante, eleita como membro do Conselho Fiscal da categoria, estava ao abrigo da estabilidade provisória no emprego desde o registro da candidatura até um ano após o final do mandato, ou seja, até 26/11/2015, garantia que era, ou deveria ser, de conhecimento da empregadora.
Destarte, dou provimento ao recurso ordinário da reclamante para, reconhecendo a sua estabilidade sindical provisória, ora já exaurida, condenar a reclamada ao pagamento de indenização substitutiva abrangendo a soma de todas as parcelas remuneratórias que seriam devidas da despedida – 05/01/2015 – ao fim da estabilidade – 26/11/2015 -, considerando-se salários, gratificações e adicionais, férias com 1/3, 13º salário e FGTS com 40%.
2. DANO MORAL
Em face da improcedência do pedido, a Julgadora da origem reputou não haver o que perquirir-se acerca da indenização por dano moral. Considerou, assim, prejudicada a análise do pedido.
A reclamante recorre, confiando no reconhecimento de sua estabilidade provisória. Sustenta que o ato de dispensa irregular veio a causar-lhe danos de ordem extrapatrimonial, “comprometendo a capacidade de suportar rotineiros compromissos financeiros, prejudicando a própria subsistência, e da sua família, situação que torna incontroverso os prejuízo que justificaram o presente pedido“. Requer a reforma do julgado.
Analiso.
Consoante determinam o art. 5º, X, da Constituição Federal e os artigos 186 e 927, caput, do Código Civil, o dano moral se caracteriza por ser um ato ilícito que ofende a personalidade de alguém (direitos relacionados à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem da pessoa), gerando-lhe prejuízos em seu convívio social. Para a sua configuração é necessária a comprovação do dano, da existência de culpa do agente, bem como do nexo causal entre o ato e o dano sofrido pela vítima.
No presente caso, contudo, não considero que o ato de dispensa da reclamante tenha lhe gerado qualquer dano moral, ainda que tenha se dado na pendência de estabilidade provisória. Destaco que é assegurado ao empregador o direito de despedir o empregado sem justo motivo, de modo que a dispensa imotivada, em si, não constitui fato ensejador de reparação por dano moral. Complemento, ademais, que nem mesmo se ventilou qualquer postura de discriminação ou perseguição à reclamante. Fato é que, ante o direito potestativo do empregador de rescindir os contratos de trabalho de seus empregados, por certo, eventual prejuízo financeiro haveria de ser compensado pelos haveres rescisórios e, principalmente, pelo saque da multa de 40% do FGTS, cuja função não é outra senão a indenização pela dispensa sem justa causa.
Logo, nego provimento ao recurso.
II – DECORRÊNCIAS DA REVERSÃO DA DECISÃO
1. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
As parcelas da condenação deverão ser apuradas em liquidação de sentença, acrescidas de juros e correção monetária, na forma da lei vigente à época. Eventuais critérios de apuração deverão ser equacionados na fase de liquidação de sentença, sendo imprópria, neste momento processual, a discussão acerca da matéria.
2. DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS
Diante da natureza indenizatória da parcela deferida, não há recolhimentos previdenciários ou fiscais.
3. COMPENSAÇÃO
Não verificada a existência de haveres pagos a maior, ou mesmo a igual título, rejeito o requerimento de compensação.
4. DAS CUSTAS PROCESSUAIS
Considerando o parcial provimento do recurso ordinário da reclamante, que resultou na reforma da sentença de improcedência da ação, reverto à reclamada o pagamento das custas processuais de R$ 800,00, calculadas sobre o valor de R$ 40.000,00, que ora se arbitra à condenação.
LAIS HELENA JAEGER NICOTTI
Relator
PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:
DESEMBARGADORA LAÍS HELENA JAEGER NICOTTI (RELATORA)
DESEMBARGADOR FABIANO HOLZ BESERRA
DESEMBARGADORA ROSANE SERAFINI CASA NOVA