Inteiro Teor
PROCESSO: 0000050-85.2014.5.04.0232 AIRR
EMENTA
RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE.
MEMBRO DE CONSELHO FISCAL DO SINDICATO. GARANTIA DE EMPREGO INDEVIDA. A competência do conselho fiscal limita-se à fiscalização da gestão financeira do sindicato, circunstância que deixa claro que o conselheiro fiscal não exerce cargo de direção ou representação sindical e, portanto, não está ao abrigo da garantia constitucional prevista no inciso VIII do art. 8º da Constituição da República. Adoção da Orientação Jurisprudencial n. 365 da SBDI-1 TST. Recurso negado.
ACÓRDÃO
por maioria, vencido em parte o entendimento do Exmo. Desembargador Marcelo José Ferlin D’Ambroso, dar parcial provimento ao recurso ordinário do autor para (a) declarar ocorrida a extinção contratual no dia 13/01/2014 (dia seguinte à retomada da capacidade), condenando a demandada a pagar as diferenças salariais em relação ao período de 25/12/2013 a 13/01/2014, com reflexos em gratificação natalina, remuneração de férias com um terço e FGTS com 40%, e a retificar a CTPS do trabalhador a fim de indicar a extinção contratual no dia 13/01/2014; (b) condenar a ré ao pagamento de honorários advocatícios, no percentual de 15% sobre o valor bruto da condenação; (c) condenar a reclamada ao pagamento de juros e correção monetária sobre os valores devidos, cujos critérios deverão ser definidos em fase de liquidação; e (d) autorizar os descontos previdenciários e fiscais cabíveis, em liquidação de sentença, observando-se a Instrução Normativa da Receita Federal n.1.1277/11 e a Súmula n.3688, itens II e III, do TST. Valor da condenação fixado em R$ 2.000,00 e custas em R$ 40,00, para os efeitos legais.
RELATÓRIO
Contra a sentença de improcedência lavrada pelo Exmo. Juiz Mateus Crocoli Lionzo (fls. 475-80v.), o demandante interpõe recurso (fls. 489-500v.).
Pretende a reforma quanto à garantia de emprego do dirigente sindical, à inaptidão no ato da dispensa, à doença do trabalho, e aos honorários de advogado.
A acionada apresenta contrarrazões (fls. 508-14).
Os autos são remetidos a este Tribunal para julgamento do apelo.
VOTO RELATOR
JUIZ CONVOCADO CARLOS HENRIQUE SELBACH:
I – RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE.
Os tópicos serão analisados conforme a ordem de prejudicialidade das matérias.
1. DOENÇA DO TRABALHO. Garantia de Emprego. Reparação de Danos.
Em Primeira Instância, foram acolhidas as conclusões periciais, segundo as quais não há nexo de causalidade ou concausalidade entre a doença desenvolvida pelo autor (hérnia abdominal) e o trabalho, sendo afastada a responsabilidade civil da empregadora. Por consequência, a garantia de emprego também não foi reconhecida, haja vista a ausência de preenchimento dos requisitos do art. 118 da Lei n. 8.213/91 e da Súmula n. 378, item II, do TST.
O demandante interpõe recurso, destacando o teor dos arts. 20 e 21 da Lei n. 8.213/91. Discorre a respeito das causas da hérnia abdominal, asseverando haver risco ergonômico nas atividades desempenhadas em seu trabalho. Cita o laudo pericial. Argumenta estar configurada doença ocupacional. Objetiva ter seu plano de saúde restabelecido e receber o pagamento correspondente à reparação de danos e à garantia de emprego acidentária. Destaca, por fim, haver ocorrido afastamento superior a quinze dias, enquadrando-se as circunstâncias na previsão da Súmula n. 378, item II, do TST.
O acionante trabalhou na função de Operador de Produção junto à demandada pelo período de 05/05/2003 a 25/12/2013 (anotação na CTPS na fl. 20; ficha de registro na fl. 107; contrato de trabalho nas fls. 108-10; termo de extinção contratual nas fls. 123-5). O reclamante já foi anteriormente reintegrado aos quadros da ré, mediante determinação judicial exarada na reclamação n. 00884-2007-232-04-00-6 (decisões nas fls. 47-59).
Na inicial, o autor narra haver adquirido hérnia abdominal devido às condições de trabalho, notadamente por envolverem esforço físico e movimentos repetitivos, circunstância que acarretou o afastamento por quinze dias (fls. 3-4).
A reclamada apresenta, com a defesa (fls. 81-106), dentre outros documentos, perfil profissiográfico previdenciário (fls. 130-4) e atestados de saúde ocupacional (fls. 135-48).
Segundo o laudo das fls. 276-85, elaborado pelo Dr. João Alberto Maeso Montes, especialista em Medicina do Trabalho, o demandante apresenta cicatriz cirúrgica de 4cm na região supra umbilical, com hipertrofia queloidiana (fl. 279), sendo que a hérnia apresentada se trata de uma diastase de reto, sem relação com o trabalho, e teve boa resolução cirúrgica (fl. 281). A cicatriz pode ser visualizada nas fotografias das fls. 283 e 285. As conclusões periciais são ratificadas em laudo complementar (fls. 337-8).
O acionante apresenta impugnação (fls. 392-8v.).
Em audiência, a testemunha do reclamante, João Pedro, diz “que o autor acondicionava as peças em um dispositivo para o robô poder operar; que para movimentar as peças não havia necessidade de fazer força mas apenas para eventualmente encaixá-las melhor” (fl. 437v.).
Nesse contexto, não há como acolher os argumentos lançados pelo demandante. As conclusões periciais são claras no sentido de não reconhecer o nexo de causalidade entre a doença e o trabalho, afastando a configuração das situações previstas nos arts. 20 e 21 da Lei n. 8.213/91. A possibilidade de a hérnia abdominal ser causada por esforços em demasia no seu posto de trabalho, como defende o recorrente, não é suficiente, por si só, para configurar a doença ocupacional, notadamente porque a testemunha do acionante afirma ser eventual a necessidade de o reclamante, em suas atividades, “fazer força”.
Além disso, como indica o texto transcrito pelo autor na fl. 495, a hérnia da parede abdominal ocorre em decorrência do enfraquecimento do tecido protetor dos órgãos internos do abdômen. Este quadro, por sua vez, pode ter origem congênita ou estar associado a esforços em demasia que deixam a parede abdominal fragilizada, situação que não ocorre somente a partir de esforços físicos, como o recorrente alega, mas também em razão de outras circunstâncias, como a obesidade, a qual foi constatada no demandante durante o exame pericial (peso de 95kg a altura de 1,76 – fl. 279).
Portanto, sob qualquer perspectiva, não é possível afastar as conclusões periciais, as quais acolho, assim como o Magistrado da Primeira Instância.
Não havendo relação de causalidade da doença com a execução do contrato de emprego, não há falar em aplicação da Súmula n. 378, item II, do TST.
Provimento negado.
2. INCAPACIDADE NO CURSO DO AVISO PRÉVIO.
Como consequência do afastamento do nexo causal entre a doença e o trabalho, e tendo em vista que na data da dispensa (29/10/2013) o contrato de trabalho estava em vigor, sem qualquer causa suspensiva ou interruptiva, em Primeiro Grau, a extinção da relação de emprego não foi declarada nula. Por esse motivo, foram indeferidos os pedidos de reintegração e de pagamento de indenização substitutiva à garantia provisória no emprego.
Inconformado, o acionante alega ser inválida a extinção de seu contrato de trabalho, pois, à época, estava inapto. Menciona ter sido comunicado da dispensa em 29/10/2013, projetando-se o aviso-prévio até 25/12/2013. Destaca haver realizado cirurgia corretiva de hérnia abdominal, com inaptidão por 30 dias, de 13/12/2013 a 13/01/2014. Ressalta haver sido constatado pela acionada seu problema de saúde, mediante exames periódicos de saúde e ausências ao trabalho sob essa justificativa. Sucessivamente à declaração de nulidade da dispensa, postula seja considerado o término do contrato de trabalho na data em que retomou a aptidão para o trabalho (14/01/2014), fazendo jus ao recebimento das diferenças de parcelas resilitórias.
O atestado médico da fl. 18 indica que o reclamante esteve impossibilitado de trabalhar, para recuperação pós-operatória de patologia CID K46, pelo período de 30 dias a contar de 13/12/2013, até 12/01/2014.
É incontroverso haver sido extinto o contrato de trabalho no dia 25/12/2013, termo final do período de aviso prévio (anotação na carteira de trabalho na fl. 20; ficha de registro na fl. 107; contrato de trabalho nas fls. 108-10; termo de extinção contratual nas fls. 123-5).
No período em que o trabalhador se encontra incapacitado para o trabalho há interrupção ou suspensão contratual, não sendo possível a extinção contratual por iniciativa do empregador.
No caso, o rompimento do vínculo ocorreu no 12º dia de afastamento ao trabalho, ocasião em que o contrato se encontrava interrompido, incumbindo ao empregador o pagamento dos salários, conforme o art. 60, § 3º, da Lei n. 8.213/91 (“Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral“).
A partir do 16º dia de afastamento, o empregado teria direito ao auxílio-doença, considerando-se em licença não remunerada, estando suspenso o seu contrato de trabalho (art. 60, caput, da Lei n. 8.213/91 c/c art. 476 da CLT).
Conforme o critério interpretativo previsto na Súmula n. 371 do TST, quando há superveniência de licença por motivo saúde no curso do aviso prévio, os efeitos da dispensa só se concretizam após a retomada da capacidade laborativa pelo empregado:
“AVISO PRÉVIO INDENIZADO. EFEITOS. SUPERVENIÊNCIA DE AUXÍLIO-DOENÇA NO CURSO DESTE (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 40 e 135 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005. A projeção do contrato de trabalho para o futuro, pela concessão do aviso prévio indenizado, tem efeitos limitados às vantagens econômicas obtidas no período de pré-aviso, ou seja, salários, reflexos e verbas rescisórias. No caso de concessão de auxílio-doença no curso do aviso prévio, todavia, só se concretizam os efeitos da dispensa depois de expirado o benefício previdenciário. (ex-OJs nºs 40 e 135 da SBDI-1 – inseridas, respectivamente, em 28.11.1995 e 27.11.1998)“.
Registro não constituir óbice ao reconhecimento da suspensão contratual o fato de o empregado não haver recebido auxílio-doença, pois sua incapacidade foi demonstrada mediante atestado médico.
Portanto, dou provimento parcial ao recurso ordinário para declarar ocorrida a extinção contratual no dia 13/01/2014 (dia seguinte à retomada da capacidade), condenando a demandada a pagar as diferenças salariais em relação ao período de 25/12/2013 a 13/01/2014, com reflexos em gratificação natalina, remuneração de férias com um terço e FGTS com 40%, e a retificar a CTPS do trabalhador a fim de indicar a extinção contratual no dia 13/01/2014.
3. MEMBRO DE CONSELHO FISCAL DO SINDICATO. Garantia de Emprego.
Em sentença, o Magistrado singular manifestou não deter direito à estabilidade provisória o membro do conselho fiscal do sindicato, nos termos dos arts. 543, § 3º, da CLT e 8º, VIII, da Constituição da República, conforme prevê a OJ n. 365 da SDI-1 do TST, uma vez que o empregado neste cargo não atua diretamente na defesa dos direitos da categoria profissional.
O autor recorre, salientando o teor dos arts. 8º, VIII, da Constituição da República; 522 e 543 da CLT. Argumenta haver sido demitido quando detinha garantia no emprego, porque era suplente do conselho fiscal do sindicato. Requer seja declarada nula a sua resilição contratual, com a determinação para que seja reintegrado ao emprego na mesma função e com o mesmo salário.
O Conselheiro Fiscal não detém a garantia de emprego, prevista no art. 8º, VIII, da Constituição da República, porquanto não exerce, efetivamente, cargo de direção ou representação sindical, previsto no art. 522 da CLT.
O inciso VIII do art. 8º da Constituição da República estabelece:
“é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei“.
Por sua vez, prevê o art. 522 da CLT e seus parágrafos:
“Art. 522. A administração do sindicato será exercida por uma diretoria constituída no máximo de sete e no mínimo de três membros e de um Conselho Fiscal composto de três membros, eleitos esses órgãos pela Assembleia Geral.
§ 1º A diretoria elegerá, dentre os seus membros, o presidente do sindicato.
§ 2º A competência do Conselho Fiscal é limitada à fiscalização da gestão financeira do sindicato.
§ 3º Constituirão atribuição exclusiva da Diretoria do Sindicato e dos Delegados Sindicais, a que se refere o art. 523, a representação e a defesa dos interesses da entidade perante os poderes públicos e as empresas, salvo mandatário com poderes outorgados por procuração da Diretoria, ou associado investido em representação prevista em lei” (grifo atual).
O § 3º do art. 543 da CLT, antes da vigência da norma constitucional, já estabelecia:
“Fica vedada a dispensa do empregado sindicalizado ou associado, a partir do momento do registro de sua candidatura a cargo de direção ou representação de entidade sindical ou de associação profissional, até 1 (um) ano após o final do seu mandato, caso seja eleito inclusive como suplente, salvo se cometer falta grave devidamente apurada nos termos desta Consolidação” (destaque atual).
Ora, há garantia de emprego ao empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura e, se eleito, até um ano após o término do mandato, se exercente de cargo de direção ou representação sindical e, apesar do conselheiro fiscal compor órgão que conjuntamente com a diretoria do sindicato, o administra, detém o conselheiro fiscal, restritamente, a fiscalização da gestão financeira da entidade.
A lei não contém palavras inúteis e, se a intenção fosse ampliar a garantia de emprego, já prevista na CLT, por óbvio que o texto constitucional não referiria expressamente a garantia de emprego àqueles que exercem cargo de direção ou representação sindical, o que não se confunde com cargos/órgãos destinados à administração do sindicato, em que, aí sim, se incluem os de conselheiros fiscais.
Igualmente, a leitura das disposições do art. 522 e parágrafos da CLT permite essa conclusão, pois expressamente há referência de que a competência do conselho fiscal se limita à fiscalização da gestão financeira do sindicato, circunstância que deixa claro que o conselheiro fiscal não exerce cargo de direção ou representação sindical e, portanto, não está ao abrigo da garantia constitucional prevista no inciso VIII do art. 8º da Constituição da República.
Tal entendimento é corroborado pelas disposições da Orientação Jurisprudencial n. 365 da SBDI-1 TST, as quais adoto:
“365. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. MEMBRO DE CONSELHO FISCAL DE SINDICATO. INEXISTÊNCIA (DJ 20, 21 e 23.05.2008). Membro de conselho fiscal de sindicato não tem direito à estabilidade prevista nos arts. 543, § 3º, da CLT e 8º, VIII, da CF/1988, porquanto não representa ou atua na defesa de direitos da categoria respectiva, tendo sua competência limitada à fiscalização da gestão financeira do sindicato (art. 522, § 2º, da CLT)“.
Em razão do exposto, nego provimento.
4. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
Como consequência da reforma da sentença de improcedência postulada, o demandante requer seja a ré condenada ao pagamento de honorários de advogado, destacando constar nos autos declaração de pobreza e credencial sindical.
No caso, estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 14 da Lei n. 5.584/70, na forma do que estabelecem as Súmulas n. 219 e 329 do TST, constando a declaração de pobreza na fl. 13 e a credencial sindical na fl. 16.
Dessa forma, dou provimento ao recurso ordinário do acionante para condenar a reclamada ao pagamento de honorários advocatícios, no percentual de 15% sobre o valor bruto da condenação.
II – QUESTÕES DECORRENTES DA REVERSÃO DO JUÍZO DE IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
1. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
Determino a incidência de juros e correção monetária sobre os valores devidos ao reclamante, cujos critérios deverão ser definidos em fase de liquidação.
2. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. DESCONTOS FISCAIS.
Incidem contribuições previdenciárias segundo o art. 43 da Lei n. 8.212/91, com redação conferida pela Lei n. 8.620/93, observando-se o teor da Súmula n. 368, item III, do TST [“Em se tratando de descontos previdenciários, o critério de apuração encontra-se disciplinado no art. 276, § 4º, do Decreto n º 3.048/1999 que regulamentou a Lei nº 8.212/1991 e determina que a contribuição do empregado, no caso de ações trabalhistas, seja calculada mês a mês, aplicando-se as alíquotas previstas no art. 198, observado o limite máximo do salário de contribuição“].
As contribuições fiscais serão feitas no momento em que os valores se tornem disponíveis para o beneficiário, nos termos do art. 46 da Lei n. 8.541/92. Destaco, nesse sentido, o teor da Súmula n. 368, item II, do TST [“É do empregador a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias e fiscais, resultante de crédito do empregado oriundo de condenação judicial, devendo ser calculadas, em relação à incidência dos descontos fiscais, mês a mês, nos termos do art. 12-A da Lei n.º 7.713, de 22/12/1988, com a redação dada pela Lei nº 12.350/2010“].
Portanto, autorizo os descontos previdenciários e fiscais cabíveis, em liquidação de sentença, observando-se a Instrução Normativa da Receita Federal n. 1.127/11 e a Súmula n. 368, itens II e III, do TST.
III – PREQUESTIONAMENTO.
O presente acórdão representa o entendimento desta Turma Julgadora a partir da análise de todos os argumentos expostos pelas partes e das normas invocadas pelo recorrente e em contrarrazões, as quais são consideradas devidamente prequestionadas, conforme disposições da Súmula n. 297, item I, do Colendo TST: “Diz-se prequestionada a matéria ou questão quando na decisão impugnada haja sido adotada, explicitamente, tese a respeito“.
Eventual inconformidade, portanto, deverá ser manifestada por meio de recurso próprio.
7273.
DESEMBARGADORA TÂNIA ROSA MACIEL DE OLIVEIRA:
Acompanho o voto do Exmo. Juiz Convocado Carlos Henrique Selbach, Relator.
DESEMBARGADOR MARCELO JOSÉ FERLIN D AMBROSO:
I – RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE.
Os tópicos serão analisados conforme a ordem de prejudicialidade das matérias.
1. DOENÇA DO TRABALHO. Garantia de Emprego. Reparação de Danos.
Peço vênia ao nobre Relator para divergir quanto à doença do trabalho.
Na petição inicial, o autor referiu que “adquiriu hérnia abdominal, doença que têm dentre os fatores de risco o esforço físico e movimento repetitivos.” Junto com a petição inicial, trouxe atestados médicos, datados de 20/12/2013, dando conta que (fl. 18): “Atesto que o paciente acima foi tratado cirurgicamente por mim devido à hérnia da parede abdominal. Esta patologia está relacionada às condições próprias do paciente e à (sic) esforços físicos intensos. Atesto que o paciente acima está impossibilitado de trabalhar por 30 dias a contar do dia 13/12/13 para recuperação pós-operatório da patologia CID K46.
No PPP do autor (fls. 130/134) consta que durante todo o contrato de trabalho atuou como operador de produção, efetuando atividades de montagem de peças/produto, utilizando-se de dispositivos adequados a operação. Nos atestados de saúde ocupacionais periódicos, de 2007 em diante, está assinalado risco ergonômico nas atividades do demandante (fls. 135/141). Por fim, realizada perícia ergonômica constou do laudo (fl. 518v): ” Sob o ponto de vista da Ergonomia e da Norma Regulamentadora NR-17 indica-se que havia condições de trabalho desfavoráveis em termos de conforto e de saúde ocupacional dentre as tarefas desempenhadas durante seu contrato com a reclamada “.
Desta forma, é nítido que as atividades do autor, na montagem de peças, com esforço físico, ao menos atuaram como concausa para o desencadeamento da patologia diagnosticada (hérnia abdominal).
Assim, não há como afastar as atividades realizadas pelo recorrente como fator agravador da doença diagnosticada, mormente diante da análise das atividades desempenhadas pelo obreiro, supra referidas. Destarte, é evidente que os movimentos repetitivos, com esforço físico, ao menos agravaram desencadeando o quadro clínico do demandante.
Muito embora o expert tenha declarado que a patologia apresentada é de origem não ocupacional (fl. 281), não aponta qualquer elemento de prova robusto a fim de amparar a sua tese. Nesse sentido oportuno referir, aind,a que o profissional que produziu o laudo é médico do trabalho, sem a qualificação técnica necessária a fim de aferir as peculiaridades da hérnia do autor, relativa às condições ergonômicas do labor prestado fato que também deve ser levado em consideração.
Neste norte, destaco ainda que incumbia à ré a apresentação da documentação obrigatória, consubstanciada no PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário), PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais), PCMSO (Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional) e LTCAT (Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho), cuja guarda, fornecimento ao empregado e/ou disponibilização às autoridades competentes são obrigatórios, nos termos dos itens 9.3.8.1 a 9.3.8.3 da NR-9, bem como dos arts. 157, I, da CLT, arts. 19, § 1º e 58, § 1º, da Lei 8213/91.
Portanto, é de inequívoca incumbência do empregador o encargo de trazer aos autos os documentos pertinentes às condições ambientais de trabalho (LTCAT), às atividades desenvolvidas pelo empregado (PPP) e aos riscos inerentes ao ambiente e a estas atividades (PPRA e PCMSO).
Ou seja, a teor do disposto no art. 818 da CLT, c/c art. 373, I e II, do CPC, estas obrigações ambientais desdobram-se, em sede processual, no dever dos empregadores de demonstrar, nos autos, de forma cabal, o correto cumprimento das medidas preventivas e compensatórias do ambiente de trabalho, para evitar danos aos trabalhadores. E, para isto, não basta tão somente a juntada de programas ambientais laborais, sem que, de fato, sejam adotadas e comprovadas as necessárias medidas para reduzir/neutralizar a sinistralidade laboral.
No caso, a ré juntou apenas o PPP; presumindo-se, portanto, que não houve adoção das medidas necessárias para preservação da saúde dos seus trabalhadores, causando a eclosão da doença do autor. Não há, também, qualquer sinal, nos autos, de que a ré tenha elaborado, implementado ou cumprido com as normas do programa de controle de riscos relacionados à ergonomia dos seus trabalhadores.
Portanto, não comprovado pela parte demandada através das provas hábeis que a doença se desenvolveu por motivos alheios ao trabalho, os elementos de convicção supramencionados autorizam concluir com segurança pela responsabilização da ré quanto aos agravos de saúde sofridos pelo trabalhador, no mínimo, por concausa.
Assim, concluo que restou comprovado nos autos que o labor atuou ao menos como concausa com a patologia diagnosticada. Dessa forma, e considerando-se a lesão diagnosticada (hérnia abdominal), não há como excluir a responsabilidade da empresa, a partir do nexo causal entre o agravo à saúde e o labor desenvolvido pelo recorrente.
Portanto, estão inegavelmente presentes os requisitos caracterizadores da responsabilidade civil, quais sejam, a existência de dano (lesão à integridade física do trabalhador), o nexo de causalidade entre as atividades desenvolvidas na ré e doença desenvolvida e a culpa da ré.
Não obstante, considerando que a Turma, por maioria, entende que, no presente caso, não deve ser reconhecida doença ocupacional relacionada ao trabalho, deixo de apreciar as indenizações decorrentes.
3. MEMBRO DE CONSELHO FISCAL DO SINDICATO. Garantia de Emprego.
Peço vênia ao nobre Relator para divergir quanto à estabilidade decorrente do cargo de suplente do conselho fiscal do sindicato.
O autor, em poimento pessoal, disse que (fl. 437): ” ocupava o cargo de suplente do conselho fiscal do sindicato; que o conselho fiscal era composto por 3 membros e 3 suplentes.”
O preposto da ré em audiência, referiu que (fl. 437): ” a ré não sabia o cargo que o autor ocupava mas sabia que ela (sic) possuía envolvimento com o sindicato; que a ré sabia que o autor havia sido eleito para algum cargo do sindicato; que o sindicato comunicou a ré todos os candidatos que haviam sido eleitos inclusive o autor; que não sabe ao certo quando findou o mandato do autor, mas sabe que é de um ano mais o ano seguinte; (…)
A estabilidade do dirigente sindical, prevista no art. 8º da Constituição da República, atua como “limitação temporária ao direito potestativo de resilição contratual por parte do empregado” e tem como objetivo “propiciar ao representante da categoria independência e segurança no exercício do mandato” (Barros, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 5ª ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 1250).
A garantia de emprego do dirigente sindical não se mantém, todavia, caso o trabalhador cometa alguma das justas causas elencadas no art. 482 da CLT, não sendo este o caso dos autos.
Na espécie, restou demonstrado que o autor foi eleito para o cargo de suplente do conselho fiscal do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Gravataí e dispensado sem justa causa em 25/10/2013.
Neste norte, entendo que o fato do autor ter sido eleito como suplente do conselho fiscal do sindicato representativo de sua categoria profissional não afasta o direito à estabilidade. Com efeito, o art. 8º, inciso VIII, da Constituição da República, estabelece que “é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei”.
Entendo que a limitação prevista no art. 522 da CLT não foi recepcionada pelo art. 8º da CF que garante a não intervenção do estado na gestão sindical. Ora, cabe à entidade sindical indicar quais dos eleitos possui a estabilidade do art. 522 da CLT, não se podendo, pois, excluir, de plano a garantia alegada.
Assim, faz jus o autor à estabilidade prevista no art. 8º, VIII, da Constituição da República, na medida em que foi eleito como suplente em cargo de dirigente sindical, ainda que relativo a cargo de conselho fiscal.
Não obstante, considerando que a Turma, por maioria, entende que, ao membro do conselho fiscal não é reconhecida a estabilidade do dirigente sindical, deixo de apreciar a indenização correspondente ao período estabilitário e consectários.