Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO |
PROCESSO nº 0001176-29.2011.5.04.0022 (AP)
AGRAVANTE: DANILO VASQUES MARTINS
AGRAVADO: MIGUEL DA CUNHA VARGAS FILHO, FUNDACAO CONESUL DE DESENVOLVIMENTO
RELATOR: LUIS CARLOS PINTO GASTAL.
AGRAVO DE PETIÇÃO DO EXECUTADO. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. PRESIDENTE DO CONSELHO FISCAL. FUNDAÇÃO CONESUL. Entendimento da maioria do Colegiado, vencido o Relator, de que o mero fato de integrar o conselho fiscal, em entidade onde ocorreram irregularidades, que ensejaram a sua extinção, onde expressivo valor foi desviado e realmente foram constatadas irregularidades, não pode, por si só, ser objeto de redicionamento a todo e qualquer membro da entidade. Apelo do executado provido, por maioria, para afastar sua responsabilidade.
Vistos, relatados e discutidos os autos.
ACORDAM os Magistrados integrantes da Seção Especializada em Execução do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por maioria, dar provimento ao agravo de petição do executado DANILO VASQUES MARTINS para excluir sua responsabilidade.
Intime-se.
Porto Alegre, 15 de julho de 2021 (quinta-feira).
Inconformado com a sentença proferida pelo Juiz Edson Pecis Lerrer (fls. 675/678 do PDF), o executado DANILO VASQUES MARTINS interpõe Agravo de Petição de fls. 690/701 do PDF.
Busca a reforma da decisão quanto ao redirecionamento da execução contra si.
Com contraminuta do exequente (fls. 709/712 do PDF), sobem os autos a este Tribunal para julgamento do recurso.
É o relatório.
AGRAVO DE PETIÇÃO DO EXECUTADO
DO REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. RESPONSABILIDADE DE INTEGRANTE DO CONSELHO FISCAL
Insurge-se o agravante contra a sentença que manteve o redirecionamento da execução contra a sua pessoa. Assevera não ter sido responsabilizado em ação civil pública. Considera que no caso deve ser verificada a ocorrência de abuso da personalidade jurídica, por se tratar de Fundação e ao contrário do considerado na sentença afirma a sua inocorrência. Considera não ter havido uso abusivo da personalidade jurídica ou confusão patrimonial pois não houve sentença condenatória na ação civil pública instaurada, e o art. 165 da Lei nº 6.404/1976 não autoriza a responsabilização por se tratar de entidade sem fins lucrativos. Entende que por integrar o conselho fiscal da Fundação Conesul de Desenvolvimento – FCD, não pode ter a execução direcionada contra si. Refere não ter havido condenação, apenas bloqueio de bens em ação cautelar de produção antecipada de provas. Além disso alega não ter sido administrador, apenas integrante do conselho fiscal e nesta função não possuía qualquer ingerência na administração das atividades da fundação. Pondera não haver prova de sua participação em atos ilegais, não podendo ser responsabilizado pelos eventos lesivos praticados pela administração, pois só era membro do conselho fiscal. Destaca a existência de depoimento testemunhal que o exime de qualquer responsabilidade pelos fatos investigados naquele processo. Sustenta que nos termos da Lei nº 6.404/1976 não pode ser responsabilizado pelos atos ilícitos de outros membros.
A decisão agravada assim decidiu (ID. 958d0af):
“2.1 Do redirecionamento da execução:
Pretende o embargante a sua exclusão do polo passivo, calcando-se na premissa de que jamais fora administrador da pessoa jurídica executada, mas tão-só integrante do seu conselho fiscal. Acrescenta que não foi condenado, tampouco declarados ilegais os atos que praticou.
Colaciona sua defesa na ação civil pública nº 1.11.0228385-2.
Resta incontroverso que o ora embargante foi Presidente do Conselho Fiscal da extinta Fundação Conesul de Desenvolvimento, consoante Ata de Eleição de Diretoria e Conselho Fiscal presente na folha 81 e seguintes. E como tal, nos termos do artigo 165 da Lei nº 6.404/76, tem a mesma responsabilidades que a dos administradores da extinta fundação.
Na ação civil pública nº 1.11.0228385-2, cujo objeto trata justamente da responsabilidade civil da diretoria da Fundação Conesul, verifico que não foi proferida sentença até o presente momento.
Cumpre destacar que o redirecionamento da execução com base na Teoria Objetiva (Teoria Menor) da Desconsideração da Personalidade Jurídica, adotada pelo Direito Processual do Trabalho, pela qual o mero inadimplemento da dívida trabalhista, aliado à inexistência de bens da pessoa jurídica, autoriza a afetação do patrimônio particular dos sócios e administradores para quitação dos débitos da pessoa jurídica.
Alçando a um grau de destaque os princípios da efetividade e celeridade necessários para satisfação de verbas de cunho alimentar.
Dessa forma, no processo trabalhista, não se cogita em perquirir acerca de abuso da personalidade jurídica do empregador a autorizar o redirecionamento da execução contra o patrimônio de seus sócios e administradores, sendo suficiente o inadimplemento do crédito alimentar em execução e a ausência de bens para garantia do pagamento, por aplicação analógica do artigo 28, caput, e § 5º, in litteris, do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
(…)
§ 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
Assim, mesmo que não haja condenação até o presente momento do ora embargante na ação civil pública, tal fato não impede a sua responsabilização na execução trabalhista.
Aliás, entre os elementos de convicção utilizados na sentença que extinguiu a Fundação Conesul de Desenvolvimento, citam-se possíveis indícios de fraude pelos diretores e conselheiros afastados, consoante excertos:
Com a obtenção do efeito suspensivo ao agravo, ainda que o juízo não compreendesse, quiçá e muito provavelmente por sua total ignorância em economia e contabilidade, o desaparecimento da ampla fonte de valores de que se locupletavam, supostamente, os diretores e conselheiros afastados, passou o administrador nomeado a eleger os pagamentos prioritários, a fim de buscar, tal qual apontava o Ministério Público, manter a Fundação em funcionamento.
(…)
Como se vê, de longa data a desconfiguração da pessoa jurídica Fundação Conesul de Desenvolvimento para fora dos moldes do previsto no art. 62 do Código Civil e seu parágrafo único, quer porque afastada de seus fins educacionais, filantrópicos e sociais, tal qual disposto em seu estatuto, quer porque não havia mais suporte material patrimonial a atender tais finalidades. Não releva ao mérito desta demanda declaratória de que forma a Fundação, antes do ingresso da cautelar, obtinha renda tal que permitia lucros e benefícios pessoais de considerável monta, pelo que indica o expediente extrajudicial conduzido pelo Ministério Público e, posteriormente, não se conseguiu manter sequer para despesas ordinárias. (Grifei) (Sentença processo nº 0181199-73.2012.8.21.0001, 18ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre)
Nesse contexto, o uso abusivo da Personalidade Jurídica, caracterizado pela dívida acumulada e ausência de pagamento, autoriza, nos termos do artigo 50 do Código Civil, a desconsideração da pessoa jurídica.
Assim, mantenho o redirecionamento da execução contra o ora embargante.
Improcedentes os embargos.
”
Analiso.
Observo na Ata de Fundação e na Ata de Eleição de Diretoria e Conselho Fiscal que o agravante fez parte do conselho fiscal da reclamada (Fundação Conesul), desde a fundação (fls. 70/84 do PDF).
Na sentença que declarou a extinção da Fundação consta: “a) Há indicativos contundentes de que os diretores e demais membros afastados utilizaram-se da Fundação para aquisição de bens, serviços e créditos e, proveito próprio, celebrando vários contratos em que nada favoreciam a Fundação e os fins a que se destinava. Prova disso a tutela de indisponibilidade de bens deferida e a ação penal de que se tem notícia.” (fl. 491 do PDF).
E ainda, “Não releva ao mérito desta demanda declaratória de que a forma da Fundação, antes do ingresso da cautelar, obtinha renda tal que permitia lucros e benefícios pessoais de considerável monta, pelo que indica o expediente extrajudicial conduzido pelo Ministério Público, e, posteriormente não se conseguiu manter sequer para as despesas ordinárias.” (fls. 493/494 do PDF).
Em que pese ainda não proferida sentença na ação civil pública de nº 1.11.0228385-2, cujo objeto trata justamente da responsabilidade civil da diretoria da Fundação Conesul, todos os elementos indicam a administração irregular da atividade, autorizando o redirecionamento da execução.
Assim, nos termos do artigo 50 do Código Civil, por aplicação analógica, a OJ 31 da SEEX deste TRT e, a declaração de extinção da executada, é o embargante responsável pelos créditos exequendos.
Isso posto, improcede a alegação de que não é responsável.
Nego provimento ao agravo de petição do executado DANILO VASQUES MARTINS.
LUIS CARLOS PINTO GASTAL.
Relator
DESEMBARGADOR MARCELO GONÇALVES DE OLIVEIRA:
Com a devida vênia ao Relator, acompanho a divergência da Desembargadora Lucia Ehrembrink em que dá provimento ao agravo de petição para excluir a responsabilidade do agravante.
DESEMBARGADORA LUCIA EHRENBRINK:
RESPONSABILIDADE DE CONSELHEIRO FISCAL
Divirjo do voto condutor, pois a atuação do conselheiro fiscal não se equipara àquela prevista no art. 50 do CC.
O mero fato de integrar o conselho fiscal, em entidade onde ocorreram irregularidades, que ensejaram a sua extinção, onde expressivo valor foi desviado e realmente foram constatadas irregularidades, não pode, por si só, ser objeto de redicionamento a todo e qualquer membro da entidade.
Veja-se que o conselho fiscal analisa dados objetivos, de contabilização, não existindo nos autos um elemento que dê conta da efetiva atuação do agravante em prejuízo na gestação da reclamada.
Nesta linha:
AGRAVO DE PETIÇÃO DO QUINTO EXECUTADO (Daniel Vinicius Alberini Schrickte). RESPONSABILIDADE. CONSELHEIRO ELEITO. SOCIEDADE POR AÇÕES. Na desconsideração da personalidade jurídica da sociedade por ações, é imprescindível para o redirecionamento da execução e consequente excussão dos bens dos administradores, conselheiros ou diretores a comprovação de conduta em infração à lei ou ao estatuto que revele abuso da personalidade jurídica, o qual se caracteriza pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial. Simples prova do inadimplemento do crédito trabalhista e da insolvência da sociedade empresarial, por meio do deferimento da recuperação judicial, que não caracterizam as hipóteses previstas na Orientação Jurisprudencial nº 31 da SEEx. (TRT da 4ª Região, Seção Especializada em Execução, 0000224-24.2013.5.04.0008 AP, em 06/06/2018, Desembargadora Maria da Graca Ribeiro Centeno)
COOPERATIVA. RESPONSABILIZAÇÃO DOS ADMINISTRADORES. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. Caso em que não restou comprovado que o agravante, na condição de Conselheiro de Administração da Cooperativa, tenha cometido ato fraudulento com dolo ou culpa, restando inviável o redirecionamento da execução contra seu patrimônio, nos termos do art. 49 da Lei nº 5.764/71. Agravo de petição do executado parcialmente provido. (TRT da 4ª Região, Seção Especializada em Execução, 0020200-66.2017.5.04.0302 AP, em 09/11/2020, Desembargador Janney Camargo Bina)
Em instituições, como o caso de fundação, empresas com conselhos, se exige ao menos algum indício de onde ocorreu a má gestão. A condição do agravante era apenas de conselheiro e esta função não se equipara àquela de gestão.
Dado provimento ao agravo de petição para excluir a responsabilidade do agravante.
DESEMBARGADOR JOÃO BATISTA DE MATOS DANDA:
Peço vênia ao Ilustre Relator, para acompanhar a divergência apresentada pela Des.ª Lucia Ehrenbrink, por seus próprios fundamentos.
DESEMBARGADOR JANNEY CAMARGO BINA:
AGRAVO DE PETIÇÃO DO EXECUTADO
RESPONSABILIDADE DE CONSELHEIRO FISCAL
Peço vênia ao eminente Relator, mas acompanho o voto divergente lançado pela Desembargadora Lúcia Ehrenbrink, no sentido de dar provimento ao agravo de petição para excluir a responsabilidade do agravante.
DEMAIS MAGISTRADOS:
Acompanham o voto do (a) Relator (a).
PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:
JUIZ CONVOCADO LUIS CARLOS PINTO GASTAL (RELATOR)
DESEMBARGADOR MARCELO GONÇALVES DE OLIVEIRA (REVISOR)
DESEMBARGADOR JOÃO ALFREDO BORGES ANTUNES DE MIRANDA (NÃO VOTA)
DESEMBARGADORA LUCIA EHRENBRINK
DESEMBARGADOR JOÃO BATISTA DE MATOS DANDA
DESEMBARGADOR JANNEY CAMARGO BINA