Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO
Identificação
PROCESSO nº 0011382-79.2015.5.01.0561 (AP)
AGRAVANTE: HELENILCE COSTA BARRETO
AGRAVADO: JUSSARA PEIXOTO ALVES
RELATOR: CARLOS HENRIQUE CHERNICHARO
EMENTA
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.
SOCIEDADE SEM FINS LUCRATIVOS. CABIMENTO.
RESPONSABILIDADE DA PRESIDENTE DO CONSELHO FISCAL.
EXCLUSÃO. Após esgotados os meios de execução da sociedade
executada, cabível a desconsideração da personalidade jurídica, com
vistas à penhora de bens de propriedade de diretor ou presidente,
desde que com poderes de gestão e após a necessária citação
pessoal. Deve ser afastada a responsabilidade patrimonial da
Presidente do Conselho Fiscal que comprovadamente não detém
poderes de mando, gestão ou administração da entidade, tampouco
recebe remuneração.
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de agravo de
petição, em que são partes: HELENILCE COSTA BARRETO, como agravante e JUSSARA
PEIXOTO ALVES, como agravada.
Agravo de petição interposto pela Presidente do Conselho Fiscal da
executada (Id 8036945), inconformada com a decisão sob Id 6feb61d, proferida pelo MM. Juiz
André Luiz Serrão Tavares, da 1ª Vara do Trabalho de Maricá, que por meio da qual julgou
improcedente o pedido formulado em sede de embargos opostos por terceiro.
vantagem ou benefício, que ensejasse invasão ao seu patrimônio pessoal.
Sem contraminuta, conforme certificado no Id fa8add8, embora o agravado tenha sido regularmente intimado (Id 574fa53).
Sem parecer do Ministério Público do Trabalho, nos termos do ofício n. 214/13-GAB, de 11.3.2013, encaminhado pela Procuradoria da Primeira Região.
Éo relatório.
VOTO
CONHECIMENTO
Conheço do agravo, porque atendidos os pressupostos legais de admissibilidade.
MÉRITO
Decidiu o MM. Juízo de origem pela improcedência do pedido formulado em sede de embargos opostos por terceiro, sob os seguintes fundamentos (Id 6feb61d):
“Não há que prosperar as alegações da Embargante, ao contrário do alegado, a decisão prolatada nos autos principais (Pje0010334-56.2013.5.01.0561- id.339d209), devidamente fundamentada, desconsiderou a personalidade jurídica da Executada e especificou quais os responsáveis legais que deveriam integrar o polo passivo.
Quanto ao argumento de que o estatuto da executada a classifica como entidade filantrópica, tal fato não exclui a responsabilidade de seus diretores, não havendo qualquer óbice legal para a desconsideração da personalidade jurídica.
Ressalte-se, ainda que os membros do Conselho Fiscal têm os mesmos deveres dos administradores e respondem pelos danos resultantes de omissão no cumprimento de seus deveres e de atos praticados com culpa ou dolo, ou com violação da lei ou do estatuto. Sendo a excipiente Presidente do Conselho Fiscal deve responder pela presente execução, solidariamente com os demais membros da diretoria, tendo em vista a dissolução irregular da pessoa jurídica e contumaz inadimplência em centenas de execuções trabalhistas.”
Afirma não se impor às entidades filantrópicas sem fins lucrativos a desconsideração da personalidade jurídica, mormente por depender de prova do abuso ou desvio de finalidade e, ainda, a confusão patrimonial.
Aduz sequer ter havido nos autos originários decisão fundamentada para tanto.
Destacou ser absolutamente impenhoráveis seus proventos de aposentadoria.
Com razão, em parte.
Trata-se de execução referente à reclamação trabalhista proposta por Jussara Peixoto Alves em face de Associação dos Centros Integrados de Assistência à Criança -AÇÃOMEDVIDA, cujo pedido foi julgado parcialmente procedente e a ré condenada a anotar o término do contrato de trabalho, na CTPS da autora, com a data de 08.11.2012 e ao pagamento das parcelas resilitórias, inclusive multa prevista no art. 477 da CLT, além de horas extraordinárias pela não concessão do intervalo intrajornada e de indenização por danos morais (R$ 1.905,10), consoante sentença sob Id 3483959 (RT).
Transitada em julgado a decisão, sem interposição de recursos (Id 4911024 – RT), procedeu-se à liquidação, atualização e homologação dos cálculos (Id 8b6f2fc -RT).
Citada da ré ao pagamento, por mandado (Id 880bcef e Id 99da4fb -RT), não se manifestou (Id 04d4368 – RT).
Ativado o convênio do BacenJud, para penhora on line, não foi localizado numerário nas contas bancárias da executada (Id 37a7056 e Id 7115ed1 – RT). Também não logrou êxito a consulta ao RenaJud (Id 344cb57 – RT).
Decidiu o MM. Juízo de origem em desconsiderar a personalidade jurídica da ré, em despacho fundamentado sob o Id facef85 (26.3.2015 – RT) e determinou a inclusão no polo passivo da demanda dos responsáveis, à época: André Luis de Oliveira Sant’Anna (Presidente), Márcio Pereira Guimarães (Primeiro Vice-Presidente), Débora Maia da Costa (Primeira Tesoureira) e Helenice Costa Barreto (Presidente do Conselho Fiscal).
Ordenou, ainda, a citação por edital dos dois primeiros e da última, por estarem em local incerto e não sabido, “conforme já constatado em diversos processos neste MM. Juízo”.
Intimados os réus ao pagamento (Id 8b2c6e7; Id ed0741e; 9fd50a9 -RT), quedaram-se inertes (Id a6bc674 – RT).
Ativado o convênio BacenJud, com referência à ré e seus representantes legais, mais uma vez não foi encontrado numerário (Id 7860d22 e Id a0082ee -RT), tampouco veículos que pudessem garantir a execução (RenaJud – Id 999f80f – RT).
Opôs Helenice Costa Barreto exceção de pré-executividade, insurgindo-se contra a decisão que a ela direcionou a execução (Id c22cd06 – RT).
Rejeitada a exceção, consoante decisão sob Id 7369694 (RT), sob os mesmos fundamentos lançados na decisão agravada.
Dessa feita, ajuizou a agravante embargos de terceiro (Id 2589867), cujo pedido foi julgado improcedente, nos termos do julgado ao início transcrito.
Merece reforma parcial.
Cumpre destacar, primeiramente, que, ao contrário do alegado na exceção de pré-executividade, na petição inicial dos embargos de terceiro e no presente agravo de petição, houve, sim, decisão fundamentada desconsiderando a personalidade jurídica da ré (vide Id facef85 na RT).
Conquanto sejam absolutamente impenhoráveis os proventos de aposentadoria, ainda não se deu, nos autos originários, constrição judicial de qualquer bem.
Ademais, diante do total esgotamento dos atos executórios com relação ao empreendimento, não nos parece haver outro caminho senão o da desconsideração da personalidade jurídica, ainda que se trate de entidade beneficente.
Nenhuma entidade ou empreendimento pode ser imune à execução, quando utiliza a força de trabalho alheia (ajenidad) e explora mão de obra, envolvendo pessoas num objetivo comum, porém deixando créditos a descoberto ao longo dessa atividade. Mesmo em se tratando a executada dos autos de entidade associativa beneficente, não se exime do cumprimento da lei, que, no caso em exame, é a CLT, com todas as suas normas de proteção ao trabalho, que não podem ser ignoradas.
A autora, conforme inicial, laborou para a ré de 17.6.2011 an10.10.2012, exercendo a função de auxiliar de serviços gerais. Prestava serviços em prol do Hospital Conde Modesto Leal de Maricá, por meio de contrato de terceirização, contribuindo, assim, ativamente, com sua força de trabalho para a consecução da atividade finalística primeira da instituição.
Tratando-se de verba alimentar (diferenças de horas de trabalho não pagas, das quais se beneficiou a demandada, não obstante seu objetivo filantrópico), há que se levantar o véu a fim de atingir aqueles que se encontram por detrás da instituição e que com sua má gestão deixaram impunemente créditos pendentes de ex-empregados. Não obstante sua natureza filantrópica, repita-se, utilizaram-se da força de trabalho alheia, a qual não podem repor, devendo haver reparação.
Após esgotados os meios de execução da sociedade executada, entende-se ser cabível a desconsideração da personalidade jurídica, com vistas à penhora de bens de propriedade de diretor ou presidente, desde que com poderes de gestão e após a necessária citação pessoal.
Cabendo, portanto, a administração da sociedade à Diretoria (na qual se inclui o Presidente e os Vice-Presidentes da entidade, artigo 20 do Estatuto, Id 2603c79 -página 23), justifica-se a inclusão no polo passivo da execução dos dirigentes gestores.
No entanto, ocupa a agravante o cargo de Presidente do Conselho Fiscal, que não detém poderes de mando, gestão ou administração da entidade, tampouco recebe remuneração, consoante artigos 21 a 23 do Estatuto Social (mesmo Id – página 24).
Com relação a ela não se pode, de fato, imputar responsabilidade pela gerência do negócio e pagamento do crédito trabalhista.
Não há o que modificar no tocante à desconsideração da personalidade jurídica da ré, devendo, contudo, a agravante ser excluída do polo passivo da execução, na qualidade de ocupante do cargo de Presidente de Conselho Fiscal da entidade.
Dou parcial provimento.
Conclusão do recurso
Conheço do agravo de petição e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, para, a despeito de manter a decisão que desconsiderou a personalidade jurídica da ré, determinar a exclusão da agravante do polo passivo da execução, na qualidade de ocupante do cargo de Presidente de Conselho Fiscal da entidade.
ACÓRDÃO
A C O R D A M os Desembargadores que compõem a Quarta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por unanimidade, conhecer do agravo de petição e, no mérito, dar-lhe parcial provimento, para, a despeito de manter a decisão que desconsiderou a personalidade jurídica da ré, determinar a exclusão da agravante do polo passivo da execução, na qualidade de ocupante do cargo de Presidente de Conselho Fiscal da entidade.
CARLOS HENRIQUE CHERNICHARO
Juiz Convocado
Relator