Inteiro Teor
JMG
Nº 71008865354 (Nº CNJ: 0056176-42.2019.8.21.9000)
2019/Cível
RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DE MULTA POR AGRESSÃO VERBAL AO SÍNDICO. PARTE AUTORA NOTIFICADA POR ?excesso de velocidade? E ?agressão verbal?. DEMANDADOS ALEGAM QUE o Conselho Consultivo de Condomínio optou por aplicar apenas uma penalidade, no valor de R$ 375,00, a fim de evitar excessos. AUSÊNCIA DE ATA OU DOCUMENTO VERBAL SOBRE TAL DELIBERAÇÃO. Ônus dos demandados, a teor do art. 373, II, do CPC. Multa desconstituída, em razão da ocorrência de agressões verbais mútuas entre autor e síndico. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. UNÂNIME.
Recurso Inominado
Quarta Turma Recursal Cível
Nº 71008865354 (Nº CNJ: 0056176-42.2019.8.21.9000)
Comarca de Farroupilha
CARLOS ALBERTO WASKIEVICZ
RECORRENTE
CONDOMÍNIO RESIDENCIAL ALVORADA I
RECORRIDO
ALEXANDRE DA COSTA
RECORRIDO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Juízes de Direito integrantes da Quarta Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em dar provimento ao recurso.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Dr. Oyama Assis Brasil de Moraes (Presidente) e Dr. Luis Antonio Behrensdorf Gomes da Silva.
Porto Alegre, 24 de agosto de 2020.
DR. JERSON MOACIR GUBERT,
Relator.
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso inominado interposto por CARLOS ALBERTO WASKIEVICZ contra sentença (fls. 74/75) que, nos autos da ação desconstituição de multa condominial movida em desfavor de CONDOMÍNIO RESIDENCIAL ALVORADA I e ALEXANDRE DA COSTA, julgou improcedente o pedido.
Em suas razões de recurso (fls. 80/83), o requerente sustentou que foi notificado por andar em excesso de velocidade e multado pelo condomínio, por agressão verbal, situação que não foi devidamente apurada nos autos, devendo ser desconstituída a multa. Pugnou pelo provimento do recurso para julgar procedente o pedido.
Deferida a AJG na fl. 97.
Apresentadas as contrarrazões nas fls. 103/108.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTOS
Dr. Jerson Moacir Gubert (RELATOR)
Eminentes Colegas.
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade estipulados pelo art. 42 da Lei n. 9.099/95, passo ao exame do recurso.
Compulsando detidamente os autos, entendo que merece ser provido o recurso.
Explico.
A inconformidade do recorrente fundamenta-se no fato de ter sido notificado por trafegar em excesso de velocidade dentro do condomínio e ter sido multado por agressão verbal ao síndico. Discorreu sobre a ausência de prova acerca da agressão verbal que lhe foi imputada.
Por sua vez, os demandados indicaram, através da documentação anexada, que ambas as notificações ocorreram em face de fato ocorrido no dia 19/02/2019, ocasião em que o recorrente, conduzindo veículo de placas IJS 2120, ingressou em alta velocidade na garagem do condomínio. E, em razão do ocorrido, o síndico abordou o recorrente, a fim de adverti-lo verbalmente, tendo ocorrido agressões verbais por parte do autor ao síndico, que culminaram no registro de ocorrência da fl. 57.
A alegação de que foram encaminhadas duas notificações, uma por ter ingressado no condomínio em alta velocidade, e outra por ter agredido verbalmente o síndico, encontra-se provada nas fls. 56/62.
Ocorre que no documento de cobrança anexado à fl. 06 consta que a multa foi por agressão verbal. Nada constou sobre o excesso de velocidade.
O argumento dos demandados para que na cobrança da multa tenha constatado ?Multa Agressão Verbal? é de que o Conselho Consultivo de Condomínio optou por aplicar apenas uma penalidade, no valor de R$ 375,00, a fim de evitar excessos.
Ocorre que não foi juntada ata ou documento formal sobre tal deliberação, quando incumbia ao réu tal demonstração, nos termos do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil.
Apesar de o juízo a quo ter entendido que as alegações do autor sobre as ofensas sofridas por parte do síndico não tenham relação direta com o pedido formulado, entendo que elas são essenciais para apurar a indignação do autor para com a aplicação da multa.
Desse modo, apesar de as provas produzidas terem constatado que o autor realmente excedeu o limite de velocidade, uma vez que tanto a testemunha como o informante ouvidos em juízo corroboraram as assertivas, a discussão do autor é sobre a aplicação da multa por agressão verbal, a qual não se encontra cristalina nos autos. Pelo contrário, há informação de que houve exasperação mútua por parte do condômino e do síndico, incluindo agressões físicas, conforme se depreende do relato do zelador, Fabio Viana Farias (fls. 71/72), ao declarar que:
?(?) Então Alexandre pegou o autor pelo braço, acha que o síndico se irritou. (?) No momento foram até o carro do autor, bateram no vidro e esperaram. O autor estava demorando e ai se irritaram, ele começou a ofender o síndico e o síndico ofender ele. Se agarraram. Então o síndico explicou ao autor. Ocorreu uma discussão mútua e troca de palavras entre o síndico e o autor?.
A elaboração de boletim de ocorrência por parte do síndico não afasta eventual responsabilidade sobre o ocorrido, pois se trata de documento produzido unilateralmente.
Assim, considerando que o contexto probatório não é claro sobre a ocorrência de agressão verbal do autor contra o síndico, entendo que o valor pago por descumprimento de norma do condomínio deve ser ressarcido ao autor, isto é, a quantia de R$ 375,00, que deverá ser corrigida pela Selic, a contar da data do pagamento.
Por fim, quanto à atualização do valor condenatório, faço as seguintes considerações:
No tocante aos juros de mora, para efeito do art. 406 do Código Civil, esta Turma recentemente passou a adotar a incidência da Taxa Selic, a teor do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial (EREsp n. 727842/SP), no seguinte sentido:
CIVIL. JUROS MORATÓRIOS. TAXA LEGAL. CÓDIGO CIVIL, ART. 406. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC.
1. Segundo dispõe o art. 406 do Código Civil, \Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional\.
2. Assim, atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02).
3. Embargos de divergência a que se dá provimento.
(EREsp 727.842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 08/09/2008, DJe 20/11/2008).
O acórdão paradigmático, de relatoria do então Ministro Teori Zavascki, restou assim ementado:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. HONORÁRIOS. SÚMULA 07/STJ. JUROS MORATÓRIOS. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. TERMO INICIAL. CITAÇÃO. TAXA DE JUROS. SELIC.
1. A ausência de debate, na instância recorrida, sobre os dispositivos legais cuja violação se alega no recurso especial atrai, por analogia, a incidência da Súmula 282 do STF.
2. O questionamento acerca do critério adotado para fixação dos honorários advocatícios (aplicação do art. 21 do CPC) demanda o reexame do grau de sucumbimento de cada parte para fins de fixação e distribuição da verba, ensejando análise de matéria fática, incabível em recurso especial (Súmula 07/STJ).
3. O termo inicial da incidência dos juros moratórios, em se tratando de responsabilidade civil contratual, é a data da citação (art. 405 do CC).
4. \Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional\ (art. 406 do CC).
5. A taxa à qual se refere o art. 406 do CC é a SELIC, tendo em vista o disposto nos arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02.
6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.
(REsp 710.385/RJ, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/11/2006, DJ 14/12/2006, p. 255). Grifei
No mesmo sentido, recente decisão monocrática:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.426.955 – SP (2019/0005588-7)
RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI
(…)
Decido.
A irresignação merece prosperar, em parte.
(…)
Na espécie, a parte insurgente alegou omissão quanto à aplicabilidade da Selic como critério para quantificar os juros moratórios e no tocante à obrigatoriedade dos precedentes firmados pelo STJ em recursos repetitivos.
No entanto, essas matérias foram apreciadas de modo fundamentado pelo Tribunal de origem, embora em sentido contrário ao pretendido pela parte e à jurisprudência sedimentada no STJ. Entendeu, nesse aspecto, que os juros moratórios legais não podem ser calculados com base na SELIC, pois esse índice pode ser alterado unilateralmente pela Administração Pública, tornando insegura a incidência dos encargos de mora.
Afasto, assim, a tese de negativa de prestação jurisdicional.
2. Conforme previsto no art. 927 do NCPC, os juízes e tribunais devem observar os precedentes fixados pelo STJ em recursos especiais repetitivos.
Assim, há clara ofensa à lei federal na recusa do TJSP de seguir o entendimento firmado por esta Corte Superior no REsp 1.102.552/CE, assim ementado:
FGTS. CONTAS VINCULADAS. CORREÇÃO MONETÁRIA. DIFERENÇAS. JUROS MORATÓRIOS. TAXA DE JUROS. ART. 406 DO CC/2002. SELIC.
1. O art. 22 da Lei 8.036/90 diz respeito a correção monetária e juros de mora a que está sujeito o empregador quando não efetua os depósitos ao FGTS. Por sua especialidade, tal dispositivo não alcança outras situações de mora nele não contempladas expressamente.
2. Relativamente aos juros moratórios a que está sujeita a CEF – por não ter efetuado, no devido tempo e pelo índice correto, os créditos de correção monetária das contas vinculadas do FGTS-, seu cálculo deve observar, à falta de norma específica, a taxa legal, prevista art. 406 do Código Civil de 2002.
3. Conforme decidiu a Corte Especial, \atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo [art. 406 do CC/2002] é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02)\ (EREsp 727842, DJ de 20/11/08).
4. A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem (REsp – EDcl 853.915, 1ª Turma, Min. Denise Arruda, DJ de 24.09.08; REsp 926.140, Min. Luiz Fux, DJ de 15.05.08; REsp 1008203, 2ª Turma, Min. Castro Meira, DJ 12.08.08; REsp 875.093, 2ª Turma, Min. Eliana Calmon, DJ de 08.08.08).
5. Recurso especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08.(REsp 1102552/CE, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/03/2009, DJe 06/04/2009)
O entendimento tem sido reiterado pelas Turmas da Segunda Seção:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DANO MORAL. MATÉRIA JORNALÍSTICA. CRIMES IMPUTADOS AO AUTOR. SUSTENTAÇÃO ORAL. INSCRIÇÃO NTEMPESTIVA. REEXAME DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR. SÚMULA N. 7 DO STJ. JUROS DE MORA. TAXA SELIC. DECISÃO MANTIDA.
(…)
5. A taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil de 2002 é a SELIC.
6. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no REsp 1717052/AL, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26/02/2019, DJe 08/03/2019)
O acórdão de 2º grau, portanto, deve ser reformado.
3. Ante o exposto, conheço do agravo para dar parcial provimento ao recurso especial, determinando que os juros moratórios sejam calculados conforme a taxa Selic do período correspondente.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 10 de abril de 2019.
MINISTRO MARCO BUZZI
Relator (Ministro MARCO BUZZI, 15/04/2019). Suprimi e grifei.
Portanto, levando em conta o entendimento da Corte Superior, nos casos como na espécie, a teor do art. 406 do CC
, os juros moratórios devem ser calculados com base na taxa Selic.
Voto, pois, por dar provimento ao recurso, a fim de condenar os demandados ao pagamento de R$ 375,00, (trezentos e setenta e cinco reais), corrigidos pela SELIC, a contar da data do pagamento.
Sem sucumbência, a teor do artigo 55 da Lei 9.099/95.
Dr. Oyama Assis Brasil de Moraes (PRESIDENTE) – De acordo com o (a) Relator (a).
Dr. Luis Antonio Behrensdorf Gomes da Silva – De acordo com o (a) Relator (a).
DR. OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES – Presidente – Recurso Inominado nº 71008865354, Comarca de Farroupilha: \DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME.\
Juízo de Origem: JUIZADO ESPECIAL CIVEL ADJUNTO FARROUPILHA – Comarca de Farroupilha
? Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional\
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