Inteiro Teor
agravo de instrumento. condomínio. obras de reforma efetuadas pelo ente condominial, com ocupação de área privativa de propriedade do agravante, o qual sustenta ter sofrido danos materiais e morais. decretação, em despacho saneador, da prescrição da pretensão indenizatória. obra continuada, com execução que se protrai no tempo. termo inicial da contagem do prazo prescricional trienal.
1. Cabimento do agravo de instrumento, pois interposto contra decisão interlocutória que versa sobre o mérito da demanda, nos termos do inc. II do art. 1.015 do NCPC. Preliminar contrarrecursal de não conhecimento rejeitada.
2. Tratando-se de “obra continuada”, cuja execução se estende no tempo, o marco para o início da contagem do prazo prescricional é a data de cessação do problema (da obra que o causa). Precedente.
3. informações dadas a conhecer nessa instância recursal que indicam ter sido concluída a obra em data posterior a de ingresso das ações indenizatórias, sequer tendo início – de consequência – a contagem do prazo previsto no art. 206, § 3º, do Código Civil.
preliminar contrarrecursal rejeitada. agravo de instrumento provido.
Agravo de Instrumento
|
Décima Nona Câmara Cível |
Nº 70076897339 (Nº CNJ: 0054945-97.2018.8.21.7000)
|
Comarca de Vacaria |
ANDRE VITORIO PAIM BASSO
|
AGRAVANTE |
CONDOMÍNIO COMERCIAL DO EDIFICIO FROZI
|
AGRAVADO |
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em rejeitar a preliminar contrarrecursal e dar provimento ao agravo de instrumento.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des. Voltaire de Lima Moraes (Presidente) e Des. Eduardo João Lima Costa.
Porto Alegre, 12 de julho de 2018.
DES.ª MYLENE MARIA MICHEL,
Relatora.
RELATÓRIO
Des.ª Mylene Maria Michel (RELATORA)
Trata-se de agravo de instrumento interposto por ANDRÉ VITÓRIO PAIM BASSO contra decisão que, proferida nos autos das ações de arbitramento de aluguel e reparação de danos (cadastradas, respectivamente, sob os n.ºs 038/1.17.0000324-2 e 038/1.17.0000323-4) em que contende com CONDOMÍNIO COMERCIAL DO EDIFÍCIO FROZI, extinguiu ambos os feitos quanto à pretensão indenizatória, em face da prescrição.
Transcrevo a decisão agravada; in verbis:
Vistos.
Passo ao saneamento dos processos 038/1.17.000323-4 e 038/1.17.0000624-2, nos termos do art. 357, do NCPC.
I) Questões processuais pendentes:
Processo nº 038/1.17.0000324-2 (apenso):
a) A preliminar de prescrição aventada pela parte ré merece acolhida no que tange aos danos morais e materiais postulados pelo demandante.
Com efeito, o prazo prescricional no caso em tela é de três anos, nos termos do art. 206, § 3º do Código Civil.
A pretensão do demandante, no que tange à indenização, é que a condenação se dê em face da reforma ocorrida no condomínio. Diante do empreendimento, a parte ré teria se utilizado de parte do imóvel de titularidade do demandante com a ocupação dos terraços leste, sul e oeste, além de construção de escadaria. Tais ocorrências teriam gerado danos morais e materiais ao demandante.
Ocorre que, conforme se verifica das Atas juntadas pela parte ré, verifica-se que a reforma iniciou-se no ano de 2012 (fls. 106-125). Assim, a pretensão do autor, no que tange aos danos, está prescrita, eis que ação foi ajuizada apenas em 26/01/2017, pelo que julgo EXTINTO o feito 038/1.17.0000324-2 apenas no que tange à pretensão indenizatória (danos morais e materiais), com fulcro no art. 487, II do CPC.
b) A impugnação ao valor da causa não merece acolhida. Com efeito, conforme art. 292, V, do CPC, nas ações indenizatórias, deverá a parte indicar o valor que entende devido, não havendo que se falar, portanto, em valor de alçada.
c) Afasto, outrossim, a ilegitimidade ativa aventada pela parte ré. Sendo o autor proprietário do imóvel, poderá requerer a fixação de aluguel em seu favor, mesmo que não resida no imóvel.
Processo nº 038/1.17.0000323-4:
a) A preliminar de prescrição no que tange à indenização, também merece acolhida.
A pretensão do demandante, no que tange à indenização, é que a condenação se dê em face da colocação de caixas d’água em local que seria de sua propriedade, o que teria gerado danos morais e materiais ao demandante.
Ocorre que, conforme narrado pelo demandado, as caixas d’água estão no local desde a construção do prédio, há mais de trinta anos. Assim, a pretensão do autor, no que tange aos danos, está prescrita, eis que ação foi ajuizada apenas em 26/01/2017, pelo que julgo EXTINTO o feito 038/1.17.0000324-2 apenas no que tange à pretensão indenizatória (danos morais e materiais), com fulcro no art. 487, II do CPC.
b) A alegada ilegitimidade passiva, todavia, não merece acolhida. Sendo o autor o proprietário do imóvel indicado na exordial, o condomínio é parte legítima para responder à presente ação.
II) As questões de fato estão expressas na exordial e na contestação.
Da leitura das peças, verifica-se que incontroverso que o demandante é proprietário do imóvel indicado na exordial de ambos os feitos.
Controverso, entretanto, o pedido de fixação de aluguéis em face do autor.
No que tange ao feito 038/1.17.0000323-4, a parte ré afirma que as caixas d’água foram instaladas em área de uso comum, fazendo parte do edifício e não do apartamento do demandante. Quanto ao feito 038/1.17.0000324-2, a parte demandada que o pedido não encontra amparo na legislação vigente, além de afirmar que os materiais utilizados na reforma eram adquiridos mediante a necessidade e armazenados em área de uso comum situada no subsolo.
São estas, pois, as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória no presente feito;
III) No que tange à distribuição do ônus da prova, esclareço que incumbe à parte autora o ônus de comprovar os fatos constitutivos do seu direito, nos termos do art. 373, I, do NCPC.
IV) As questões de direito relevantes consistem na aplicabilidade dos dispositivos pertinentes do Código Civil e da Lei 8245-91.
V) Intimem-se as partes para que, no prazo de 10 dias, indiquem as demais provas que pretendem produzir, justificando a necessidade. Ressalto que as provas deverão referir-se aos fatos controversos, referidos nos itens supra, sob pena de indeferimento.
Em caso de prova oral, no mesmo prazo antes assinalado, deverão trazer aos autos o rol de suas testemunhas, observando o número máximo de 10 testemunhas, sendo 3, no máximo, para a prova de cada fato (art. 357, § 6º, CPC). Deverão as partes, ainda, esclarecerem expressamente se possuem interesse na tomada do depoimento pessoal da parte adversa, sob pena de perda da prova.
Esclareço que, em princípio, as testemunhas eventualmente arroladas deverão ser trazidas a depor independentemente de intimação judicial, conforme art. 455, caput, do CPC, sob pena de perda da prova.
Saliente-se que deverá o Cartório proceder a intimação judicialmente nas hipóteses que se enquadrarem no art. 455, § 4º do NCPC.
Frise-se que é facultado ao procurador proceder na intimação das testemunhas na forma prevista no § 1º do art. 455 do CPC, sendo que, neste caso, apenas se aventará da intimação pelo juízo, em casos de frustração da intimação realizada pelo procurador e desde que este demonstre a necessidade de intimação judicial da testemunha.
A partir da publicação deste despacho, passa a correr o prazo de 5 dias previsto no art. 357, § 1º do NCPC.
A instrução de ambos os feitos se dará neste processo.
Intimem-se.
(…).
Sustenta o agravante, em síntese: a) a decisão agravada está equivocada, pois se arrima em informação extraída de ato do condomínio agravado para chegar à conclusão da prescrição dos pedidos indenizatórios; b) foi tomada uma decisão de mérito com base em prova unilateral, sem considerar o contraditório e a vasta documentação juntada, sequer considerando o Juízo que as obras executadas pelo condomínio agravado não estão concluídas; c) a contagem do prazo prescricional somente se iniciaria passados 3 (três) anos da conclusão das obras, pois a violação do direito é continuada e os atos se sucedem em sequência, de modo que a prescrição deve ser caracterizada a partir do último desses atos; d) ademais, a decisão não pode ser aplicada a ambos os feitos, pois um trata de danos por uso contínuo da propriedade do autor durante as obras de reforma e o outro por uso contínuo (invasão de propriedade) das caixas d’água localizadas nessa mesma propriedade.
Requer o provimento do recurso, para o fim de reformar a sentença agravada, com o fim de afastar a prescrição da pretensão indenizatória por danos materiais e morais.
Em contrarrazões, preliminarmente, a parte agravada pugna pelo não conhecimento do recurso, eis que a decisão atacada não se encontra no rol do art. 1.015 do NCPC. Tocante ao mérito, postula o desprovimento do agravo.
Em sessão de julgamento realizada em 26/4/2018, a egrégia Décima Sexta Câmara Cível, para a qual foi originalmente distribuído o presente agravo de instrumento, declinou da competência interna para uma das câmaras integrantes do 9º ou 10º Grupos Cíveis desta Corte
Foi então o agravo, por sorteio automático, redistribuído a minha relatoria.
É o relatório.
VOTOS
Des.ª Mylene Maria Michel (RELATORA)
Eminentes Colegas.
O inc. II do art. 1.015 do NCPC prevê o cabimento do agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre o “mérito do processo”. Assim, considerando que a prescrição está relacionada ao mérito da causa (e que não está o magistrado impedido de examiná-la em sede de despacho saneador), cabível a interposição do agravo de instrumento.
Rejeito, pois, a preliminar contrarrecursal.
Passo ao exame do agravo de instrumento.
Como referido na própria decisão hostilizada, a parte autora aforou duas ações indenizatórias contra o condomínio agravado em razão de obras de reforma realizadas por este último, as quais tiveram início no ano de 2012, com ocupação de parte do imóvel do agravante – mormente os terraços leste, sul e oeste –, obstando ou prejudicando a fruição do bem pelo proprietário.
O magistrado singular, em despacho saneador exarado às fls. 103-131 dos autos do feito cadastrado sob o n.º 038/1.17.0000323-4, acolheu a prefacial de mérito arguida pelo condomínio em contestação, reconhecendo a prescrição trienal operada na espécie e, de consequência, extinguindo a pretensão indenizatória relativamente aos dois processos (o próprio feito em que proferido o despacho e também aquele sob o n.º 038/1.17.0000324-2).
Considerou o julgador que, iniciando as obras no ano de 2012 e havendo as ações indenizatórias sido ajuizadas apenas em janeiro de 2017, o prazo trienal aludido pelo art. 206, § 3º, V, do Código Civil transcorrera integralmente, caracterizando-se a prescrição da pretensão autoral.
Contudo, tratando-se de “obra continuada”, cuja execução se estende no tempo, o marco para o início da contagem do prazo prescricional é a data de cessação do problema (da obra que o causa, enfim).
Para ilustrar (grifei):
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE VIZINHANÇA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. AGRAVO RETIDO. PRESCRIÇÃO. OBRA CONTINUADA. TERMO INICIAL. O prazo prescricional conta a partir do momento em que a parte lesada, sob o ponto de vista jurídico e fático, pode exercer a pretensão indenizatória. No caso de obras esse momento é quando cessa a conduta lesiva consolidando a situação que provoca a lesão. – Circunstância dos autos em que se impõe manter a decisão que afastou a prescrição. APELAÇÃO. INDENIZAÇÃO. OBRAS EM PRÉDIO VIZINHO. (…). RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70067523571, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Moreno Pomar, Julgado em 14/04/2016)
No caso em exame, alega o autor/agravante que sequer foi concluída a obra pelo condomínio, o que não é esclarecido pelo agravado em sede de contrarrazões. As contestações ofertadas na origem, no bojo das ações indenizatórias, também não são esclarecedoras quanto ao término da obra e em que data teria o mesmo ocorrido, apenas se alega, prefacialmente, que transcorreram quatro anos entre o início das obras no prédio e a data de propositura das ações.
Por outro lado, com as contrarrazões foram juntadas fotografias datadas de setembro de 2017, com o escopo de mostrar as melhorias no local (o comparativo é feito com fotografias obtidas em momento anterior ao início das obras, as quais também foram colacionadas pela parte).
As “Fotografias do mês de setembro de 2017”, conforme identificadas pelo próprio condomínio, mostram que a obra, aparentemente, está acabada. Contudo, a data em questão é posterior a de ingresso das ações, ambas em 26/01/2017.
De maneira que sequer teria iniciado a contagem do prazo prescrional ao tempo da propositura das ações, cumprindo levantar a prescrição decretada na origem.
Evidentemente, poderá o juízo da causa, no decorrer da instrução processual, com o aperfeiçoamento da prova, vir a concluir pela prescrição – todavia, nos limites deste agravo e com base nas informações dadas a conhecer nessa instância recursal, a decisão agravada não pode ser mantida.
Com essas considerações, rejeito a preliminar contrarrecursal e dou provimento ao agravo de instrumento para reformar a decisão recorrida, levantando a prescrição relativamente à pretensão indenizatória do autor/agravante nos processos cadastrados sob os n.ºs 038/1.17.0000324-2 e 038/1.17.0000323-4.
É o voto.
Des. Eduardo João Lima Costa – De acordo com o (a) Relator (a).
Des. Voltaire de Lima Moraes (PRESIDENTE) – De acordo com o (a) Relator (a).
DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES – Presidente – Agravo de Instrumento nº 70076897339, Comarca de Vacaria: “REJEITARAM A PRELIMINAR CONTRARRECURSAL E DERAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNÂNIME.”
Julgador (a) de 1º Grau:
8