Inteiro Teor
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
18ª CÂMARA CÍVEL
_____________________________________________________________________________ APELAÇÃO CÍVEL Nº 0234336-48.2017.8.19.0001
5º VARA CÍVEL DA COMARCA DA CAPITAL
APELANTE: ANDRÉ MOREAU LOUZEIRO
APELADO: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA
APELADO: DOMINGOS JOÃO MEIRELLES
RELATORA: DES. MARGARET DE OLIVAES VALLE DOS SANTOS
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. Anulação de sentença homologatória. Associação Brasileira de Imprensa – ABI. Anulação de eleição da Diretoria, do Conselho Consultivo, do Conselho Fiscal e de dois terços do Conselho Deliberativo em 2016. Alegação de vício insanável a implicar ilicitude e ilegitimidade do resultado. Pretensão ajuizada por dois associados representados por um único advogado. Homologação de acordo firmado, em 06/05/2019, pelo patrono dos autores e dos réus. Comprovado que um dos autores acordantes falecera em 24/04/2019. Fato novo e relevante que deve ser levado em consideração pelo julgador. Artigo 371 do Código de Processo Civil. Procuração outorgada pelo autor sobrevivente, sem reconhecimento de firma, que não ostentava poderes específicos para transigir. Entendimento do STJ. Acordo que, ademais, envolveu fatos que não integravam o pedido original a afastar cabalmente a legitimidade do patrono para firmá-lo em nome de seu constituinte. Matéria de ordem pública que pode ser conhecida de ofício. Sentença homologatória que decorreu de error in procedendo a impor sua desconstituição, como ocorreu no caso dos autos. Manutenção da sentença que decidiu os embargos declaratórios, embora por outro fundamento. Desprovimento do recurso.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos da apelação cível nº 0234336-48.2017.8.19.0001 , estando as partes acima nominadas ACORDAM os Desembargadores que compõem a Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO , para manter a sentença que que decidiu os embargos declaratórios, nos termos do voto da relatora.
RELATÓRIO
Trata-se de ação declaratória de nulidade com pedido de tutela de urgência proposto por ANDRÉ MOREAU LOUZEIRO e MÁRIO AUGUSTO JAKOBSKIND em face de ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA – ABI e DOMINGOS JOÃO MEIRELLES , objetivando a parte autora a declaração de nulidade da eleição 2016 de um terço do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Imprensa – ABI, ante a presença de ilegalidades e nulidades que julgam insanáveis.
Afirmaram os autores que encabeçavam a chapa, provisoriamente, denominada “VILLA-LOBOS”, que disputava a eleição da Associação Brasileira de Imprensa para eleger o Conselho Consultivo, o Conselho Fiscal, a Diretoria e dois terços do Conselho Deliberativo, efetivos e suplentes em 2016, cuja eleição, marcada para 28/04/2016, foi suspensa pelo Presidente da Comissão Eleitoral, ficando deliberado que nova data seria designada na audiência de conciliação a ser realizada perante o Juízo de Direito da 30ª Vara Cível da
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Comarca da Capital, sendo este ato publicado no Jornal do Comércio para ciência de todos os associados.
Não obstante estarem as eleições suspensas por decisão da Comissão Eleitoral, os réus, agindo à revelia e ao arrepio da decisão do presidente da Comissão eleitoral, realizaram as eleições no dia previamente designado, dia 28/04/2016, a qual, a exceção daqueles que apoiavam a chapa liberada e apoiada pelo 2º réu, não comparecerem a maioria dos 6.000 associados da ABI, devidamente informados da suspensão da data de eleição através da publicação realizada em jornal de circulação nacional.
Destacaram os autores a ilicitude e a ilegitimidade do pleito e de seu consequente resultado – a eleição da chapa liberada pelo 2º réu com 59 votos, configurando prejuízo da participação democrática dos demais 6.000 associados, que não compareceram a sede da ABI para votar.
Decisão indeferindo a tutela provisória de urgência (pasta 63).
Audiência de conciliação, sem êxito (pasta 81).
Em defesa, os réus suscitaram a litispendência e, no mérito, alegaram que o anúncio de suspensão foi pago por um diretor em litígio com a entidade e que não tinha legitimidade para conduzir os trabalhos da comissão eleitoral. Afirmaram que os autores integravam uma chapa inadimplente que não possuía legitimidade para concorrer ao pleito eleitoral. Requereram a improcedência do pedido.
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Réplica do autor (pasta 120).
Em provas os autores pugnam pela audiência de conciliação ou mediação (pasta 145).
Em audiência realizada em 06/05/2019 (pasta 171), presidida por uma conciliadora, foi firmado um acordo entre o patrono dos dois autores e o patrono dos réus, posteriormente, homologado, por sentença, que julgou extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, III, b, do Código de Processo Civil.
Embargos de declaração de terceiro interessado, informando que o 2º autor, MARIO AUGUSTO JACKOBSKIND já havia falecido à data da realização do acordo, destacando que este teria cancelado a eleição de 2019 que não era objeto do pedido, prorrogando, indevidamente, mandato do Presidente da ABI, no caso o 2º Réu desta ação, tendo, ainda, admitido ingresso na eleição de 2019, de chapa presidida pelo 1º autor, que há mais de três anos não paga a prestação associativa, estando assim impedido de se candidatar.
Diante das alegações e da documentação acostada pelo terceiro interessado, adveio sentença de pasta 173 que anulou, de ofício, a sentença que homologou o acordo, determinando o prosseguimento do feito, regularizando o autor sua representação processual.
A sentença desafiou embargos de declaração do 1º autor ANDRÉ MOREAU LOUZEIRO (pasta 321) e dos réus, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
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IMPRENSA – ABI e DOMINGOS JOÃO MEIRELLES (pasta 326) que foram
rejeitados (pastas 324 e 394).
Apelo do autor arguindo, preliminarmente, a nulidade da sentença
que teria afrontado a vontade soberana das partes, homologada à pasta 171,
pugnando por sua reforma restabelecendo-se a sentença (pasta 356).
Sem contrarrazões (pasta 400).
VOTO
Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade
recursal, que deve ser conhecido.
Trata-se de pretensão de anular eleição da Diretoria, do Conselho Consultivo, do Conselho Fiscal e de dois terços do Conselho Deliberativo da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA – ABI, em 2016, a alegação de vício insanável a implicar ilicitude e ilegitimidade do resultado.
A pretensão foi ajuizada por dois associados representados por um único advogado que acostou aos autos procuração, sem reconhecimento de firma, que não ostentava poderes específicos para transigir.
Em audiência preliminar de conciliação realizada em
06/05/2019 (pasta 171), foi firmado um acordo entre as partes firmado pelo
patrono dos dois autores e o patrono dos réus nos seguintes termos:
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“Considerando que as partes possuem ações neste juízo e em outro, considerando que ABI é uma casa democrática, as partes ajustam e acordam que a eleição da ABI será realizada no dia 12/06/2019 das 10h às 20h. Fica a chapa, denominada Villa Lobos, em condições de concorrer as eleições de 2019, pelo fato de não ter podido participar do pleito de 2016. A Chapa Villa-Lobos terá a partir da homologação, publicação e intimação deste acordo o prazo de até 20 dias para realizar a sua inscrição. A ABI cederá um espaço para a referida chapa no décimo primeiro andar, especificamente na sala recém-reformada, considerando-se que a chapa 2 beneficiou-se da utilização da sala Belisário de Souza durante a composição de seu grupo eleitoral. As partes concordam ainda com a manutenção da atual diretoria, conselhos e comissão eleitoral até o dia da próxima eleição. Por sugestão do autor, André Moreau, a ABI concorda em recebê-lo como integrante de uma futura comissão para a reforma do regulamento eleitoral, independentemente do resultado das eleições. Por fim acordam as partes, um dia após a homologação, publicação e intimação deste acordo a desistência de todas as ações em que litigam, sob pena de ineficácia das questões aqui mencionadas. Fica assim estabelecido pela determinação das partes que a Coordenação da chapa Villa-Lobos ocupará o espaço imediatamente
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após a homologação, publicação e intimação deste
acordo.
O acordo assim celebrado foi homologado por sentença que julgou
extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, III, b,
do Código de Processo Civil.
Foram interpostos embargos de declaração de terceiro que, embora
não integrasse a relação processual, afirmou ter sido prejudicado com a
decisão que teria cancelado a eleição de 2019 da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
DE IMPRENSA – ABI, de que seria associado, prorrogando, indevidamente,
mandato de seu presidente, comprovando que o 2º autor, MARIO AUGUSTO
JACKOBSKIND já havia falecido à data da realização do acordo.
Embora não demonstrado o interesse jurídico do embargante e a
impropriedade do recurso interposto, comprovado nos autos que um dos
autores acordantes, MÁRIO AUGUSTO JAKOBSKIND, falecera em
24/04/2019, antes, portanto, da celebração do acordo, esta prova de fato novo
e relevante deve ser levada em consideração pelo julgador independente de
quem a tenha promovido nos autos, consoante artigo 371 do Código de
Processo Civil.
E não só isso.
A procuração outorgada pelo autor sobrevivente ao seu patrono, sem reconhecimento de firma, não ostentava poderes específicos para transigir.
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Ressalta-se que à procuração geral ad judicia et extra dispensa o reconhecimento de firma e está autorizada por Lei a ser utilizada em autos de processo judicial” (RF 359/252 e Bol. AASP 2.219/1.881, acórdão unânime da Corte Especial do STJ), entretanto, para a validade dos poderes especiais, se contidos no mandato, o que sequer ocorreu nos autos, necessariamente há de ser reconhecida a firma do constituinte.
Veja-se:
PROCESSUAL CIVIL. PROCURAÇÃO. PRÁTICA DE ATOS PROCESSUAIS EM GERAL.PODERES ESPECIAIS. ART. 38, DO CPC. LEI 8.906/94 (ESTATUTO DA ADVOCACIA). RECONHECIMENTO DE FIRMA DO CONSTITUINTE. O art. 38, do CPC e o § 2º, do art. 5º, da Lei 8.906/94, prestigiam a atuação do advogado com dispensar o reconhecimento da firma, no instrumento de procuração, do outorgante para a prática de atos processuais em geral. Para a validade, contudo, dos poderes especiais, se contidos no mandato, necessariamente há de ser reconhecida a firma do constituinte. Precedentes. Recurso conhecido e provido. (REsp 616.435/PE, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 04/08/2005, DJ 05/09/2005, p. 461)
O acordo, ademais, envolveu fatos que não integravam o pedido original a afastar cabalmente a legitimidade do patrono para firmá-lo em nome de seu constituinte.
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Sentença homologatória decorreu de error in procedendo a impor sua desconstituição, de ofício, como ocorreu no caso dos autos, já que a matéria que autoriza sua anulação é de ordem pública, a impor a manutenção da sentença inquinada.
Por estas razões e fundamentos, VOTO por NEGAR PROVIMENTO
AO RECURSO , para manter a sentença dos embargos de declaração que
anulou a sentença homologatória, em razão de evidente error in procedendo.
Rio de Janeiro, 02 de outubro de 2019.
MARGARET DE OLIVAES VALLE DOS SANTOS
DESEMBARGADORA RELATORA
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