Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro TJ-RJ – APELAÇÃO : APL 0016370-89.2016.8.19.0066

[printfriendly]

Inteiro Teor

TRIBUNAL DE JUSTIÇA 16

VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

RELATOR: DES. MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES

APELAÇÃO Nº 0016370-89.2016.8.19.0066

APTES : (1) OLICON CONSTRUÇÕES LTDA. (1) e CARLOS HENRIQUE

ARAÚJO TEIXEIRA (2)

(2) ADEMIR SILVA ABRANTES (1) , ANTÔNIO DOS SANTOS ALBUQUERQUE (2) , HEBERT MADUREIRA FARIA NEVES BRASIL (3) , JERÔNIMO PEREIRA DOS SANTOS (4), JORGE LUIZ DE LIMA TEIXEIRA (5) , LUIZ FERNANDO SOARES CARDOSO (6) e ROBERTO CARLOS BARBOSA LIMA (7)

APDOS: FLÁVIO AUGUSTO DO AMARAL MARQUES (1) , MIRYAM SELMA

OLIVEIRA CASTRO MARQUES (2) , SANDRO AMANTE GOMIDE (3) e FLÁVIA LANDA SARGENTELLI TEIXEIRA (4)

Apelações. Incorporação imobiliária. Ação de rescisão contratual. Promessa de compra e venda. Paralisação das obras. Destituição do incorporador e sub-rogação dos adquirentes nos direitos e obrigações relativos à incorporação (arts. 43, V, c/c 31-F, §§ 2º e 11 da Lei nº 4.591/64). Intervenção do condomínio de adquirentes. Assistência litisconsorcial.

1. O reconhecimento da natureza litisconsorcial, e não apenas simples, do assistente do réu não autoriza o juízo a condenar o terceiro como se réu fosse.

2. O condomínio de adquirentes que destitui o incorporador moroso e toma as rédeas do empreendimento é assistente litisconsorcial do antigo incorporador na ação de rescisão de promessa de compra e venda, porque o desfazimento do contrato afeta seu direito de cobrar o saldo do preço das frações ideais (art. 31-F, § 12, inciso I, da Lei nº 4.591/64).

Todavia, não pode ser condenado a restituir os valores pagos pelos autores, seja porque não os recebeu, seja porque não liquidado o patrimônio de afetação, seja ainda porque tal pedido foi formulado exclusivamente em face do antigo incorporador (de sorte que a condenação do assistente descamba em violação do princípio dispositivo).

3. Não pode o juízo de competência cível acolher, ou sequer conhecer, pedido de condenação do incorporador ao pagamento de multa de natureza penal, prevista como sanção

para hipótese de contravenção contra a economia popular (art. 66, inciso VI, da Lei nº 4.591/64).

É impossível a cumulação de pedidos quando não é competente para conhecê-los o mesmo juízo (art. 327, § 1º, II, CPC), vício que deveria ter sido objeto de ordem de emenda pelo juízo a quo. Não observada essa inépcia da peça inicial, a solução é a improcedência dessa parte do pedido.

4. Provimento parcial do primeiro recurso e integral do segundo. Retificação da autuação , por ato de ofício, para constar como assistente o Condomínio de Adquirentes, e não as pessoas físicas que integram sua Comissão de Representantes. Parcial confirmação da tutela provisória , para que a ordem de indisponibilidade recaia, não sobre todo o imóvel indiviso — pondo em xeque a segurança jurídica necessária à continuação do empreendimento —, mas apenas sobre as futuras unidades autônomas objeto dos negócios rescindidos.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação nº 0016370-89.2016.8.19.0066, em que figuram como apelantes (1) OLICON CONSTRUÇÕES LTDA. E OUTRO e (2) ADEMIR SILVA ABRANTES E OUTROS, sendo apelados FLÁVIO AUGUSTO DO AMARAL MARQUER E OUTROS,

ACORDAM os Desembargadores que compõem a Vigésima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (1) determinar, de ofício, a retificação da autuação , para que conste como assistente litisconsorcial o CONDOMÍNIO DOS ADQUIRENTES DO EMPREENDIMENTO RESIDENCIAL FELICITÀ, e não as pessoas físicas dos integrantes de sua Comissão de Representantes, (2) dar provimento parcial ao primeiro recurso , (3) dar provimento integral ao segundo recurso e (4) confirmar em parte a tutela provisória concedida initio litis, tudo nos termos do voto do relator. Decisão unânime.

* * *

Cuida-se de recursos de apelação, o primeiro interposto pelos dois réus da demanda, e o segundo pelos sete membros da Comissão de Representantes do condomínio de adquirentes (que figuram como assistentes litisconsorciais dos mesmos réus), ambos contra a sentença de e-fls. 871/876, que julgou procedente o pedido formulado pelos dois casais ora apelados, para a finalidade de [i] resolver, a partir de 25-5-2016, os quatro contratos de promessa de compra e venda firmados entre os autores (dois contratos por casal), na condição de promitentes-compradores, e a construtora primeira ré, na condição de

promitente-vendedora, bem como [ii] condenar “os Réus/Assistentes Litisconsorciais a devolverem aos 1º e 2º Autores a quantia de R$ 285.731,90, bem como aos 3º e 4º Autores a de R$ 245.523,00, assim como a pagarem multa no limite de 20 salários mínimos para cada Autor, tudo atualizado com juros de mora de 1% ao mês, desde a constituição em mora (25/05/2016), e correção monetária, a partir da distribuição da ação”. No mesmo ato decisório, o juízo ainda indeferiu o requerimento dos assistentes de expedição de novos ofícios a cartórios extrajudiciais, nos seguintes termos: “Sob pena de incorrer em supressão de instância e afrontar o acórdão definitivo de fls. 681/696, não é juridicamente possível a este juízo de primeiro grau inovar a parte dispositiva do referido julgado, motivos pelos quais a expedição de ofício dever ser realizada nos exatos termos de fls. 696, item (ii)”.

Em suas razões (e-fls. 911/933), os primeiros apelantes alegam, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva ad causam, considerando a sub-rogação legal da Comissão de Representantes nos direitos e obrigações do empreendimento imobiliário, nos termos do art. 31-F, § 7º, da Lei nº 4.591/64, e da Lei nº 10.931/2004. Ainda em sede preliminar, alegam que a sentença feriu o princípio da igualdade de tratamento das partes e o direito de ampla defesa dos recorrentes, ao impedir a dilação probatória para fins de demonstrar que, ao tempo do ajuizamento da demanda, as obras não haviam paralisado, fato que a própria assembleia de adquirentes só constatou a partir de setembro de 2016, quando os ora apelados já haviam, unilateralmente, suspendido o pagamento das prestações por eles devidas. No mérito, afirmam o descabimento da condenação na multa prevista no art. 66, inciso VI, da Lei nº 4.591/64, considerando a sua natureza jurídica de pena pela prática de contravenção, a ser aplicada pelo juízo criminal. Acrescem que um exame mais cuidadoso da prova dos autos evidencia que a obra não se encontrava paralisada ao tempo do ajuizamento da demanda, de modo que não se pode considerar, como apta a constituir os apelantes em mora, a notificação de e-fls. 96/99, enviada pelos apelados antes da propositura da demanda e adotada pelo juízo a quo como termo inicial dos juros moratórios. Sustentam que a ordem de restituição imediata e integral dos valores pagos atenderá exclusivamente ao interesse particular dos ora apelados, em detrimento do interesse coletivo de todos os demais adquirentes, que decidiram, em assembleia geral, envidar esforços pela quitação de dívidas do empreendimento e continuação das obras. Asseveram que somente com a conclusão do empreendimento ou com a liquidação do patrimônio de afetação é que se poderá proceder à recomposição do investimento dos adquirentes, em pé de igualdade, na proporção de suas frações ideais e dos valores efetivamente pagos. Por último, a título subsidiário, pugnam pela adoção da data da citação como termo inicial do cômputo dos juros de mora.

Já os segundos apelantes, nas razões de e-fls. 945/960, suscitam o princípio da igualdade, que alegam ter sido violado pela sentença, que teria concedido aos apelados uma posição de privilégio em relação a todos os demais adquirentes, os quais somaram esforços para quitar a dívida do empre

endimento junto ao agente financeiro e viabilizar a continuação da incorporação imobiliária. Acrescem que os apelantes conseguiram persuadir o juízo a quo de que a boa vontade e colaboração dos demais adquirentes constituísse fraude e má-fé, obtendo uma ordem de indisponibilidade do terreno e ineficácia de quaisquer negócios jurídicos por parte do juízo a quo, que pôs em xeque todos os esforços dos demais promitentes-compradores. Afirmam que, apesar do acórdão desta câmara de retificar a decisão do juízo a quo, de modo a não prejudicar o andamento das obras, o juízo de primeiro grau indeferiu a expedição de novos ofícios, com esclarecimentos aos cartórios competentes, a fim de garantir a eficácia da decisão deste Tribunal de Justiça, que até hoje não se cumpriu a contento. Alegam que “os Apelados jamais cumpriram as obrigações deliberadas em Colegiado [assembleia de adquirentes] e sempre atravancaram qualquer tipo de solução a este empreendimento”. Reprisam a preliminar de ofensa ao contraditório e à ampla defesa, já aduzida pelos primeiros apelantes. Argumentam que a solução conferida pelo juízo a quo ignora a função social da propriedade, o interesse da coletividade de adquirentes, os acórdãos desta câmara cível e as disposições da Lei nº 10.931/2004, especialmente o art. 31-F da Lei nº 4.591/64, por ela introduzido. Reitera a alegação de impropriedade de condenação ao pagamento de multa, seja pela incompetência do juízo cível, seja pelo alegado enriquecimento sem causa dos apelados.

Certidão cartorária à e-fl. 961, atestando a tempestividade de ambos os recursos, e a suficiência do preparo, quanto ao segundo.

Decisão à e-fl. 963, deferindo gratuidade de justiça à construtora primeira ré, ora primeira apelante.

Contrarrazões às e-fls. 977/985, prestigiando a sentença.

É o relatório. Voto:

É incontroverso que, em alguma altura do ano de 2016, quer antes ou pouco depois do ajuizamento da presente demanda, restaram paralisadas, por dificuldades financeiras da incorporadora ré, as obras para construção do empreendimento do qual os autores figuram como promitentes compradores de unidades privativas.

O primeiro casal de autores firmou com a incorporadora ré o contrato de promessa de compra e venda de unidade imobiliária por construir, em 25-6-2014. O segundo casal de autores fez o mesmo, em 29-4-2015. O prazo de construção do empreendimento era de 36 meses a contar de junho de 2014, prorrogável por outros doze meses, o que implica termo final da obrigação de fazer em junho de 2018.

A presente demanda foi ajuizada em 3-8-2016, quando ainda faltavam 22 meses para o exaurimento do prazo contratual de construção.

Apesar disso, era decerto notório o descompasso entre o andamento das obras e o prazo contratual, a ponto de os autores haverem notificado a incorporadora ré, em 24-5-2016, de sua decisão de suspenderem o pagamento das prestações do preço do imóvel enquanto as obras não avançassem em progresso proporcional ao vencimento das parcelas do preço (cf. e-fls. 96/99).

A própria incorporadora respondeu à notificação dos autores reconhecendo a “paralisação momentânea”, ainda que por “fato alheio à nossa vontade”, e informando um “novo cronograma de obra, inclusive com a terceirização da estrutura das torres, minimizando os efeitos da paralisação momentânea ocorrida”, de modo a permitir “o retorno do pagamento sem multas” (e-fl. 100).

Passados dois meses dessa notificação de suspensão de pagamentos, os autores ingressaram com a presente demanda para rescindir o contrato e obterem a restituição integral dos valores pagos, sem prejuízo da multa prevista no art. 66, inciso VI, da Lei nº 4.591/64. Obtiveram, em sede liminar, e por meio de decisão não recorrida, a decretação da indisponibilidade do bem imóvel — cuja matrícula é única, não tendo sido desmembrada entre as muitas unidades do futuro empreendimento.

Outros quatro meses depois, mas ainda muito antes da citação ou da ciência de terceiros quanto à existência desta demanda, os adquirentes das unidades do empreendimento reuniram-se em assembleia para eleger uma Comissão de Representantes e deliberar sobre a destituição do incorporador e continuação das obras, nos termos do art. 31-F, §§ 1º e 2º, c/c art. 43, inc. VI, ambos da Lei nº 4.591/64. 1

1 “Art. 31-F. […] § 1 o Nos sessenta dias que se seguirem à decretação da falência ou da insolvência civil

do incorporador, o condomínio dos adquirentes, por convocação da sua Comissão de Representantes ou, na sua falta, de um sexto dos titulares de frações ideais, ou, ainda, por determinação do juiz prolator da decisão, realizará assembléia geral, na qual, por maioria simples, ratificará o mandato da Comissão de Representantes ou elegerá novos membros, e, em primeira convocação, por dois terços dos votos dos adquirentes ou, em segunda convocação, pela maioria absoluta desses votos, instituirá o condomínio da construção, por instrumento público ou particular, e deliberará sobre os termos da continuação da obra ou da liquidação do patrimônio de afetação (art. 43, inciso III); havendo financiamento para construção, a convocação poderá ser feita pela instituição financiadora. § 2 O disposto no § 1 aplica-se também à hipótese de paralisação das obras prevista no art. 43, inciso VI.”

“Art. 43. Quando o incorporador contratar a entrega da unidade a prazo e preços certos, determinados ou determináveis, mesmo quando pessoa física, ser-lhe-ão impostas as seguintes normas: VI – se o incorporador, sem justa causa devidamente comprovada, paralisar as obras por mais de 30 dias, ou retardarlhes excessivamente o andamento, poderá o Juiz notificá-lo para que no prazo mínimo de 30 dias as reinicie ou torne a dar-lhes o andamento normal. Desatendida a notificação, poderá o incorporador ser destituído pela maioria absoluta dos votos dos adquirentes, sem prejuízo da responsabilidade civil ou penal que

A referida Comissão, representando o condomínio de adquirentes, viria a quitar a dívida com a Caixa Econômica Federal e, por conseguinte, cancelar a alienação fiduciária que gravava o imóvel. Além disso, costurou-se, pelo preço dessa quitação do saldo devedor do empréstimo antes tomado pela incorporadora junto ao agente financeiro, a venda e compra do terreno aos adquirentes que prosseguiram na intenção de levar a obra a bom termo. Por fim, de posse de mandato outorgado pela antiga incorporadora, efetuou a Comissão cedeu, em nome da incorporadora, os direitos da incorporação e o patrimônio de afetação a uma nova construtora (Atus Construções Ltda.), tudo conforme atas assembleares de e-fls. 316/325 e certidão de ônus reais de e-fls. 448/462.

Os autores da presente demanda vislumbraram nesses atos um esvaziamento patrimonial e uma desobediência à ordem de indisponibilidade, e por isso requereram — e o juízo a quo deferiu — a declaração de ineficácia dos aludidos atos negociais e a imposição de multa por ato atentatório à dignidade da justiça, o que foi objeto de reforma por este tribunal no julgamento de quatro agravos de instrumento. 2

Além desses quatro recursos, este Tribunal também julgou outro agravo de instrumento, interposto pelas pessoas físicas integrantes da Comissão de Representantes (ora segundos apelantes) contra a decisão interlocutória que indeferiu o pedido de assistência por eles formulado. Concluiu este colegiado, no referido recurso, 3 que se tratava de hipótese de assistência litisconsorcial. Com fundamento nessa conclusão, o juízo a quo, ao proferir sentença, não só rescindiu o contrato entre as partes, como ainda condenou os réus e os assistentes (sem esclarecer se o fazia a título solidário) a restituírem os valores pagos pelos autores, bem como a pagarem a multa pleiteada.

Por fim, dizem os segundos apelantes que, malgrado a decisão deste Tribunal no já referido julgamento conjunto dos agravos de instrumento, até hoje não foram expedidos ofícios com teor suficiente a imprimir eficácia à decisão desta Corte e permitir a retomada das obras pela nova construtora.

Assim delineados os fatos, passemos ao desate do imbróglio, em grande parte causado pela atuação, com todas as vênias, errática das partes litigantes e do próprio juízo a quo.

couber, sujeito à cobrança executiva das importâncias comprovadamente devidas, facultando-se aos interessados prosseguir na obra.”

2 Agravos de instrumento nº 0066910-77.2018.8.19.0000, nº 0068033-13.2018.8.19.0000, nº 0070165-43.2018.8.19.0000 e nº 0070869-56.2018.8.19.0000.

3 Agravo de instrumento nº 0043381-29.2018.8.19.0000.

Em primeiro lugar, a discussão sobre o momento exato da paralisia das obras só tem um interesse para a presente lide: fixar o termo inicial dos juros moratórios, que o juízo sentenciante determinou como a data da notificação encaminhada pelos autores à incorporadora ré.

Acontece que aquela notificação se limitou a comunicar o uso legítimo da exceção do contrato não cumprido, de modo a suspender o pagamento das parcelas do preço até que as obras retomassem andamento compatível. Em momento algum os autores da presente demanda externaram, naquela notificação, o desejo de desfazerem a promessa de compra e venda e de serem restituídos os valores pagos até então. Essa pretensão somente veio a ser veiculada por meio destes autos, e não na referida notificação.

Por isso mesmo, ao contrário do que entendeu o juízo a quo em sua apreciação açodada dos fatos em torno da lide, a notificação de e-fls. 9699 não constituiu os réus em mora quanto à obrigação de restituição dos valores pagos pelos autores . Foi somente com a citação válida nestes autos (o que só se deu em junho de 2018, cf. e-fls. 368/369) que a incorporadora e seu sócio, ambos réus na presente demanda, tomaram ciência da pretensão rescisória, com restituição de valores pagos e pagamento de multa. Logo, só então foram constituídos em mora quanto à obrigação de restituir os valores pagos pelos autores, pretensão que até então não lhes havia sido manifestada.

Logo, é irrelevante, para os termos desta lide, fixar se as obras paralisaram em maio de 2016 (como alegam os autores) ou em setembro de 2016 (como dizem os réus e os assistentes). Num caso ou noutro, estará configurado o inadimplemento contratual do incorporador, a justificar o pleito de rescisão, mesmo porque os adquirentes autores não são obrigados a colaborar com os denodados esforços —louváveis, diga-se de passagem — dos demais adquirentes no sentido de tentar salvar o empreendimento.

O direito dos autores à rescisão do contrato é inquestionável, como também inquestionável é o fato de que não deram causa a essa rescisão, a qual, pelo contrário, deve ser atribuída exclusivamente ao inadimplemento contratual da incorporadora ré.

Todavia, os autores e o juízo a quo partiram para soluções — renovadas as vênias — desproporcionais e espalhafatosas para a controvérsia. Pois, se é verdade que os autores não estavam obrigados a somar esforços aos demais adquirentes para quitar a dívida junto à Caixa Econômica Federal e tentar salvar o empreendimento do desastre completo, por outro lado também é evidente que deveriam ter evitado de atrapalhar os interesses dessa coletividade.

Por meio de frequentes (e certamente) longas assembleias, além do dispêndio suplementar de investimentos que não haviam sido previstos por nenhum dos adquirentes, logrou-se a quitação de dívida que gravava o imóvel com alienação fiduciária, e que tinha o potencial de levar o terreno (com suas inacabadas acessões) a leilão extrajudicial, pondo por terra todo o investimento de todos os adquirentes de unidades do empreendimento. Se tal coisa acontecesse, os autores da presente demanda, junto com todos os adquirentes, estariam severamente prejudicados, dependendo exclusivamente do sopro de ventos financeiros mais favoráveis na vida da incorporadora ré para, um dia, talvez, obterem a restituição dos valores investidos.

Conseguiu-se atrair interesse de outras construtoras, e por fim os adquirentes deliberaram — ao que parece — por uma em específico, para prosseguir com as obras e entregar o empreendimento.

O juízo a quo, no entanto, decretou a ineficácia tout court desses negócios jurídicos, e depois, apesar do claríssimo acórdão deste tribunal, não expediu ofícios adequados ao cumprimento da decisão da corte, sob o especioso argumento de que, se o fizesse, estaria descumprindo os termos do acórdão. Ainda assim, para somar à sequência de atos falhos que compõem estes autos, os interessados não propuseram a cabível reclamação perante esta corte, para fazer valer a autoridade de suas decisões (art. 988, II, CPC).

A se fiar no que dizem os membros da Comissão de Representantes, as obras não puderam ser retomadas por ausência de segurança jurídica do empreendimento — o que, embora não comprovado, é crível.

Em sede de sentença, o juízo a quo — que parece não ter lido, com todas as vênias, as decisões deste tribunal — ainda estendeu aos assistentes litisconsorciais a condenação de pagamento de quantia, que os autores formularam exclusivamente em face dos réus, o que equivale a julgar pedido jamais formulado.

Evidentemente, quando este Tribunal esclareceu que a Comissão de Representantes interviria como assistente litisconsorcial — e não simples —, foi porque considerou que a rescisão do contrato influiria na relação jurídica entre os autores e o condomínio de adquirentes, nos termos do art. 124 do CPC (uma vez que afetaria o direito da comissão de representantes à cobrança do saldo do preço das frações ideais, nos termos do art. 31-F, § 12, inciso I, da Lei nº 4.591/64). Mas isso, evidentemente, pelos mais comezinhos princípios processuais, não autoriza o juízo a condenar o assistente litisconsorcial quando o pedido foi formulado exclusivamente em face do réu!

O juízo a quo tratou os assistentes como se fossem substitutos ou sucessores processuais da incorporadora, o que em momento algum foi

decidido nem pelo próprio juízo a quo, nem por este tribunal. Aliás, eles ingressaram espontaneamente no feito, contra a vontade dos próprios autores. Como poderiam, magicamente, na sentença, ser condenados (ao que parece, solidariamente) a restituir valores que jamais receberam, pois pagos à antiga incorporadora? A condenação dos assistentes malfere, a mais não poder, o princípio dispositivo.

Por outro lado, o pedido de condenação ao pagamento da multa prevista no art. 66, inciso VI, da Lei nº 4.591/64, é absolutamente inepto. A rigor, deveria o juízo a quo ter determinado a emenda da petição inicial na sua análise liminar do feito, uma vez que os autores cumularam pedidos para os quais não é competente o mesmo juízo (art. 327, § 1º, inc. II, c/c art. 330, § 1º, inc. IV, do CPC).

O caput do art. 66 da Lei nº 4.591/64 evidencia o caráter penal da sanção e a conseguinte competência do juízo criminal, e não cível: “São contravenções relativas à economia popular, puníveis na forma do artigo 10 da Lei nº 1.521, de 26 de dezembro de 1951: VI – paralisar o incorporador a obra, por mais de 30 dias, ou retardar-lhe excessivamente o andamento sem justa causa”.

A multa de que trata o inciso não é sanção civil, mas sim pena no sentido próprio do termo, afeito ao direito penal.

Logo, essa parte do pedido não pode ser acolhida.

Quanto à tutela provisória de indisponibilidade do bem, que o juízo a quo não esclareceu se restou confirmada ou não, é preciso retocá-la para, finalmente, expurgar-lhe o efeito nefasto da insegurança jurídica sobre o empreendimento imobiliário: o que deve ficar em garantia do direito dos autores não é todo o imóvel, mas sim as futuras unidades que eles prometeram comprar e pelas quais já pagaram parte substancial do preço.

Finalmente, observo que há certa impropriedade, não notada antes, em admitir como assistentes as pessoas físicas que integram a Comissão de Representantes: a composição dessa Comissão pode alterar-se ao longo do tempo. Em verdade, os segundos apelantes intervêm nestes autos na condição de representantes legais do condomínio de adquirentes, que destituiu a incorporadora ré e tomou em mãos a tentativa de prosseguir com o empreendimento.

Ante o exposto, encaminho meu voto no sentido de:

[i] retificar a autuação , por disposição de ofício, para que

conste como assistente litisconsorcial o CONDOMÍNIO DOS ADQUIRENTES DO EMPREENDIMENTO RESIDENCIAL FE

LICITÀ, e não as pessoas físicas dos integrantes de sua Comissão de Representantes;

[ii] dar parcial provimento ao primeiro recurso , para excluir a condenação ao pagamento de multa cuja natureza é de direito penal, e não civil, bem como fixar o termo inicial dos juros moratórios na data de citação dos réus;

[iii] dar provimento integral ao segundo recurso , para excluir os assistentes litisconsorciais da condenação de pagar quantia, deduzida exclusivamente perante os réus;

[iv] confirmar apenas em parte a tutela provisória, para decretar a indisponibilidade apenas das futuras unidades imobiliárias que os autores prometeram comprar e os réus prometeram vender, até que seja integralmente cumprida a obrigação de restituir os valores pagos pelos autores;

[v] determinar a imediata expedição de ofícios, pela Secretaria desta Câmara , aos seguintes cartórios:

[a] 4º Ofício de Barra Mansa, para que anote a restauração da eficácia jurídica dos negócios jurídicos relacionados à escritura de compra e venda, cessão de direitos de incorporação e cessão de patrimônio de afetação lavrada em 31 de agosto de 2018, às folhas 174/177, Ato 120, livro 172; e

[b] 2º Ofício de Volta Redonda (Registro de Imóveis da 2ª Circunscrição), para que:

[b.1] cancele as averbações nº 37 (“INDISPONIBILIDADE”), nº 38 (“INEFICÁCIA DE ATOS”), nº 40 (“INDISPONIBILIDADE”) e nº 41 (“RETIFICAÇÃO DA AVERBAÇÃO”), todos da matrícula nº 5.261, e

[b.2] averbar a indisponibilidade das futuras unidades autônomas A-19 e A-59 (respectivamente, o apartamento nº

503 da Torre I e o apartamento nº 501 da Torre II).

Ficam os réus condenados ao pagamento da integralidade das despesas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, considerando que os autores decaíram de parte relativamente pequena do pedido (art. 86, parágrafo único, CPC).

Rio de Janeiro, 21 de julho de 2021.

MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES

DESEMBARGADOR RELATOR

Compartilhe:

Conteúdo relacionado:

Para concluir sua associação, precisamos garantir o cumprimento e a aceitação deste TERMO ASSOCITATIVO, pois o mesmo norteia a relações e as ações entre o ASSOCIADO e a ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL – ANACON.

Sendo assim, constam as os termos que definem e norteiam a relação associativa da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL  – ANACON.

O TERMO ASSOCIATIVO não tem como objetivo detalhar como o ASSOCIAÇÃO BRASILEIRO DE IMOBILIÁRIO – ANACON utiliza e trata os seus dados pessoais para a finalidade de associação, bem como de qualquer outra finalidade. Dessa forma, para ter as informações completas de como tratamos os seus dados pessoais é necessário observar a Política de Privacidade.

Mediante o aceite do presente TERMO ASSOCIATIVO, o ASSOCIADO inscrito no Formulário de cadastro que se encontra no site da ANACON, endereço eletrônico www.anacon.avd.br, expressa o seu desejo  de participação ao quadro associativo da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL, declarando estar ciente e concordar com as NORMAS ESTATUTÁRIAS, assim como sobre a Política de Privacidade, submetendo-se às mesmas e às cláusulas a seguir.

CLÁUSULA PRIMEIRA – DO OBJETO.

O presente termo tem como objeto a aceitação de associados junto a ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL – ANACON, garantindo ao ASSOCIADO direito a uso de todos os benefícios ofertados pela ASSOCIAÇÃO mediante o aceite deste termo, de acordo com o plano de assinatura que se encontra no endereço eletrônico www.anacon.avd.br/associe-se.

PARÁGRAFO ÚNICO.

O envio do formulário com todos os dados solicitados em nosso site, bem como o pagamento do plano de assinatura, não são garantias automáticas de aceite nos quadros associativos da ANACON, pois o aceite dependerá de deferimento da COMISSÃO DE ADMISSÃO. Sendo assim, você não vai receber login e senha antes do pedido ser analisado.

CLÁUSULA SEGUNDA – DA ASSOCIAÇÃO.

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL – ANACON é uma associação sem fins lucrativos nem filiação partidária; de cunho científico, técnico e pedagógico; e tem por objeto precípuo

a pesquisa, a divulgação de trabalhos acadêmicos, a promoção de grupos

de estudo, a realização de trabalhos pro bono, o aperfeiçoamento a celebração de convênios

para cooperação acadêmica, cursos, congressos e conferências, e o permanente debate de temas ligados ao Direito Condominial, inclusive com a atuação junto a todas as esferas e/ou órgãos dos governos municipais, estaduais e federal.

CLÁUSULA TERCEIRA – DO ASSOCIADO.

Apenas serão aceitos como ASSOCIADOS os advogados, formados e atuantes que se dediquem a atividades ligadas ao Direito Condominial, Administração de Condomínios, OUTROS.

CLÁUSULA QUARTA – DOS DIREITOS DOS ASSOCIADOS.

São direitos dos ASSOCIADOS:

  1. A) Participar das reuniões e Assembleias Gerais para as quais forem convocados, inclusive

das eleições para cargos eletivos, debatendo, votando e deliberando, nos termos

do Estatuto Social;

  1. B) Gozar de todos os benefícios, serviços e promoções proporcionados pela ASSOCIAÇÃO,

após a aprovação;

  1. C) Apresentar visitantes e propor sua inscrição como novo ASSOCIADO; e
  2. E) Solicitar o desligamento do quadro de associados a qualquer tempo.

PARÁGRAFO PRIMEIRO.

Somente poderão exercer os direitos supramencionado os ASSOCIADOS quites com as suas

obrigações.

CLÁUSULA QUINTA – DOS DEVERES DOS ASSOCIADOS.

São deveres dos ASSOCIADOS:

  1. A) Respeitar e cumprir este TERMO ASSOCIATIVO, além do Estatuto Social da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL, e as deliberações das Diretorias e

da Assembleia Geral, a Política de Privacidade da ASSOCIAÇÃO e outras normas, políticas

e diretrizes emitidas pela ASSOCIAÇÃO;

  1. B) Pagar pontualmente suas contribuições;
  2. C) Aceitar ou recusar os cargos ou missão que lhes forem propostos;
  3. D) Propugnar pelo engrandecimento e prestígio da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL, proporcionando-lhe eficiente e constante cooperação, concorrendo

para a realização dos fins sociais;

  1. E) Zelar pela conservação dos bens da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL,

indenizando qualquer prejuízo que tenham causado. Agir com cordialidade, alteridade

e respeito a todos associados e não associados, em qualquer ambiente.

CLÁUSULA SEXTA – DO VALOR DA ASSOCIAÇÃO.

O valor da ASSOCIAÇÃO disponibilizada pela ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL  – ANACON no endereço eletrônico https://anacon.adv.br/associe-se/, garantindo ao ASSOCIADO todos os benefícios previstos no plano de associação.

PARÁGRAFO PRIMEIRO.

Será cobrada multa por atraso no pagamento, conforme permitido pela legislação vigente,

bem como taxa bancária para reemissão de boletos emitidos e não pagos dentro do prazo

de vencimento.

PARÁGRAFO SEGUNDO.

Não haverá devolução do valor da contribuição sob nenhuma hipótese.

PARÁGRAFO TERCEIRO.

O pagamento será realizado por meio de cartão de crédito ou PIX através do endereço eletrônico

https://www.asaas.com/c/357364993779 ou, ainda, mediante boleto bancário, que poderá ser

pago via internet banking ou lotérica.

PARÁGRAFO QUARTO.

O titular do cartão de crédito pode ser pessoa física ou jurídica distinta do titular do plano.

PARÁGRAFO QUINTO.

Ao finalizar a associação, o ASSOCIADO concorda com a cobrança do valor em faturas futuras,

de acordo com a periodicidade escolhida.

PARÁGRAFO SEXTO.

Quando do pagamento da primeira mensalidade, para fins de associação, o pedido somente

será confirmado após a confirmação do pagamento.

CLÁUSULA SÉTIMA – DO PRAZO DE VIGÊNCIA.

O prazo de associação é indeterminado, sendo garantido ao ASSOCIADO o direito de desligamento

do quadro de associados a qualquer tempo, observadas as condições previstas no presente TERMO ASSOCIATIVO, não lhe sendo cobrado qualquer forma de fidelização ou compromisso além dos previstos nas cláusulas deste TERMO ASSOCIATIVO.

CLÁUSULA OITAVA – DO DESLIGAMENTO.

O desligamento do ASSOCIADO se efetivará automaticamente caso deixe de adimplir regularmente

a contribuição associativa devida no período de vigência.

PARÁGRAFO PRIMEIRO.

ASSOCIADO desligado com base em qualquer uma das formas previstas neste termo e/ou,

ainda, no estatuto do ASSOCIAÇÃO NACIONAL DA ADVOCACIA CONDOMINIAL  – ANACON poderá

ser readmitido, mas desde que invalidado o motivo do desligamento e/ou satisfeita sua obrigação

de contribuição.

PARÁGRAFO SEGUNDO.

A contribuição referente a um período de associação, ainda que haja abandono por parte do

ASSOCIADO no período vigente, não poderá ser utilizada pelo ASSOCIADO para a obtenção de benefícios em período posterior, não sendo a referida contribuição convertida em crédito

futuro.

CLÁUSULA NONA – DA PRIVACIDADE E PROTEÇÃO DE DADOS

O titular de dados pessoais possui o direito de solicitar do site ANACON, através do canal específico de tratamento, a qualquer momento, mediante requisição formal, informações referentes aos seus dados.

Os pedidos serão analisados conforme previsto em legislação vigente dentro de um prazo de 72 horas, salvo determinação legal e/ou objeto de lei.

Os titulares de dados, segundo o texto da LGPD, podem exercer os seus direitos por meio de:

  • Confirmação da existência de tratamento;
  • Acesso aos seus dados pessoais;
  • Correção de dados incompletos, inexatos ou desatualizados;
  • Anonimização, bloqueio ou eliminação de dados desnecessários, excessivos ou tratados em desconformidade com o disposto nesta Lei;
  • Portabilidade dos dados a outro fornecedor de serviço ou produto, mediante requisição expressa, de acordo com a regulamentação da autoridade nacional, observados os segredos comercial e industrial;
  • Eliminação dos dados pessoais tratados com o consentimento do titular;
  • Informação das entidades públicas e privadas com as quais o controlador realizou uso compartilhado de dados;
  • Informação sobre a possibilidade de não fornecer consentimento e sobre as consequências da negativa;
  • Revogação do consentimento.

Como exercer os seus direitos de titular de dados?

  • Para alterar seus dados pessoais acesse a opção “Minha conta”;
  • Se não quiser receber nossas comunicações de marketing, pode cancelar os próximos envios clicando no link enviado junto ao e-mail de marketing;
  • Para mudar suas preferências em relação às notificações (incluindo as comunicações de marketing) acesse a opção “Minha conta”;
  • Para as demais solicitações em relação aos direitos do titular de dados pessoais, entre em contato conosco através do nosso formulário;

CLÁUSULA DÉCIMA – DAS CONDIÇÕES GERAIS.

ASSOCIADO, qualificado na inscrição virtual declara que: A) está ciente e de pleno acordo

com as condições estabelecidas no presente TERMO ASSOCIATIVO e previstas no Estatuto

Social do ASSOCIAÇÃOB) está ciente que deverá cumprir com todas as obrigações societárias,

durante a vigência da sua associação; C) sua assinatura por meio de serviço de assinatura eletrônica é, para os fins do art. 10, §2º da Medida Provisória nº 2.200 de 2001, plenamente vinculante e eficaz.

CLÁUSULA DÉCIMA PRIMEIRA – DO FORO.

Para dirimir quaisquer dúvidas oriundas de interpretação ou casos omissos do presente contrato,

fica eleito o foro da comarca de Cuiabá – Mato Grosso, excluindo-se qualquer outro, por mais privilegiado que seja.

Saiba quem são nossos Advogados Especialistas!!