Inteiro Teor
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
Órgão 3ª Turma Cível
Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0729732-83.2018.8.07.0001
APELANTE (S) CONDOMÍNIO DO EDIFICIO NEO RESIDENCIAS MODERNAS
APELADO (S) ALICE REBOLLO CLOK
Relator Desembargador ALVARO CIARLINI
Acórdão Nº 1200195
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA. CONDOMÍNIO. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO TOMADA POR ASSEMBLÉIA. PADRONIZAÇÃO DE FECHAMENTO DE
VARANDAS. ALTERAÇÃO DE FACHADA. CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO. PREVISÃO DE QUÓRUM QUALIFICADO. ÔNUS DA PROVA. SENTENÇA MANTIDA.
1. Na presente hipótese o autor pretende obter a condenação da ré ao pagamento de multa por
descumprimento da determinação procedida pela assembleia de condomínio para padronizar o
fechamento das varandas das unidades “garden”.
2. A padronização do fechamento das varandas das unidades imobiliárias “garden” afeta diretamente a fachada do condomínio, considerada área comum.
3. De acordo com os artigos 1352 e 1353, ambos do Código Civil, as deliberações das assembleias de condomínio serão procedidas pela maioria de votos dos condôminos presentes se não for exigido
quórum especial para a decisão da matéria.
4. Diante da imposição prevista na Convenção do Condomínio para que a alteração de áreas comuns
seja aprovada por 2/3 (dois terços) dos condôminos, a exigibilidade da obrigação da padronização da
fachada do edifício deve ser condicionada à aprovação da assembleia pelo referido quórum qualificado.
5. Incumbe ao demandante o ônus de comprovar fato constitutivo de sua pretensão nos termos do art.
6. Diante da ausência de comprovação da exigibilidade da obrigação de proceder à padronização das
varandas, não é possível compelir a ré ao pagamento de multa pelo alegado descumprimento.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores do (a) 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e dos Territórios, ALVARO CIARLINI – Relator, GILBERTO DE OLIVEIRA – 1º Vogal e
FÁTIMA RAFAEL – 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador GILBERTO DE
OLIVEIRA, em proferir a seguinte decisão: CONHECER E NEGAR PROVIMENTO, UNANIME , de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 04 de Setembro de 2019
Desembargador ALVARO CIARLINI
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo Condomínio do Edifício Neo Residências Modernas contra a
sentença de fls. 1-3 (Id. 8906014), proferida pelo Juízo da 21ª Vara Cível de Brasília-DF, que julgou o pedido parcialmente procedente.
Na origem, o apelante ajuizou ação de cobrança contra Alice Rebollo Clok , com o intuito de obter a
condenação da ré ao pagamento do montante de R$ 19.208,86 (dezenove mil, duzentos e oito reais e
oitenta e seis centavos), referente às obrigações condominiais e multa por descumprimento da
determinação de padronização das varandas das unidades “garden”. Pugnou ainda pela condenação da ré ao pagamento das respectivas parcelas a vencer no curso do processo.
Decorrida a marcha processual, o Juízo singular julgou o pedido parcialmente procedente ao asseverar a impossibilidade da cobrança do pagamento de multa decorrente da modificação da fachada do prédio, bem como o reconhecimento da dívida em relação aos encargos condominiais por parte da ré (fls. 1-3, Id. 8906014).
Em suas razões recursais (fls. 1-8, Id. 8906017), o apelante alega que a demandada não utilizou
nenhuma das formas admitidas para impugnar a regularidade de decisão da assembleia condominial,
quais sejam: a) a deliberação em assembleia geral extraordinária com quórum de ¼ (um quarto) dos
condôminos; e b) ajuizamento da ação apropriada.
Aduz que a ré utilizou a contestação como sucedâneo da ação adequada para obter a anulação da
assembleia sem sequer ter formulado pedido reconvencional.
Argumenta que o fechamento da varanda não foi imposto aos condôminos, mas, se o proprietário da
unidade optasse por fazê-lo, deveria respeitar os padrões pré-definidos. Afirma que o fechamento
procedido pela ré destoa das determinações da assembleia do condomínio.
Nesse sentido, conclui que deve ser aplicada à recorrida multa por descumprimento da decisão
assemblear.
Requer, portanto, a reforma parcial da sentença para condenar a demandada ao pagamento de multa por descumprimento da determinação de padronização das varandas das unidades “garden”.
O valor do preparo foi devidamente recolhido (fl. 1, Id. 8906017).
De acordo com a certidão de fl. 1 (Id. 8906021), a apelada não ofertou contrarrazões.
É o relatório.
VOTOS
O Senhor Desembargador ALVARO CIARLINI – Relator
O recurso interposto merece ser conhecido, pois se encontram preenchidos seus pressupostos
extrínsecos e intrínsecos, sendo tempestivo e apropriado à espécie.
No presente caso, a matéria devolvida ao conhecimento deste Egrégio Tribunal de Justiça consiste na possibilidade de aplicação de multa contra a ré por descumprimento da determinação da assembleia
do condomínio autor para que os proprietários das unidades “garden” padronizassem o fechamento
das varandas de acordo com os padrões estabelecidos.
Percebe-se, nos termos da ata acostada às fls. 1-4 (Id. 8905844), que, aos 19 de setembro de 2015, foi decidido, em assembleia geral extraordinária, que as varandas das unidades “garden”, como a da
apelada, deveriam ser fechadas com cortina de vidro, senão vejamos (fl. 2, Id. 8905844):
“Dando prosseguimento à Ordem do Dia, o Síndico apresentou a proposta de fechamento das
varandas das unidades tipo Garden, com cortina de vidro transparente. O Presidente abriu para as
manifestações dos presentes. Após as considerações, foi apresentada uma segunda proposta, que seria pelo fechamento em vidro temperado de qualquer forma, com definição da cor posteriormente, caso a proposta seja aprovada, O Presidente colocou o item em votação, que teve o seguinte resultado:
Proposta 1: Fechamento com cortina de vidro de acordo com o projeto apresentado pelo Síndico=
91,5% das Frações Ideais presentes; Proposta 2: Fechamento em vidro, com definição de cor
posteriormente= 8,5% das Frações Ideais presentes. O Presidente declarou a Proposta 1 vencedora. O Plenário, por unanimidade, aprovou que deve ser dado às unidades que já fizeram o fechamento e
estão fora do padrão um prazo de 180 (cento e oitenta) dias para a adequação.”
O apelante sustenta que a ré descumpriu a determinação expedida na assembleia ao permanecer com a varanda de seu apartamento fechada, de modo diverso dos padrões estabelecidos após a fluência do
prazo fixado para o ajuste devido. Nesse sentido, aduz ser aplicável a multa em questão.
Inicialmente convém asseverar que, a despeito do que tenta fazer crer o autor, a sentença
recorrida não declarou a anulabilidade da assembleia geral extraordinária do condomínio, mas apenas asseverou a ausência de comprovação, nos autos, do quórum necessário para a aprovação do padrão
de fechamento das varandas. Nesse sentido, observe-se o seguinte trecho do julgado recorrido (fl. 3,
Id. 8906014):
“Assim, como o autor não comprova que a aprovação do padrão de fechamento se deu por votação
qualificada dos condôminos, a obrigação não pode ser cobrada da autora, sendo irregulares as multas aplicadas.”
Frise-se também que a ré, por ocasião da contestação (fls. 1-6, Id. 8905993), também não
formulou requerimento de anulação da assembleia, mas apenas postulou a inexigibilidade da
obrigação de pagar os valores correspondentes à multa. Essa tese é reforçada pelo item do pedido
referente à determinação para que o autor acostasse aos autos a lista de presença da assembleia em
questão (fl. 5, Id. 8905993).
A respeito do fechamento das varandas das unidades imobiliárias “garden”, é preciso ressaltar que sua padronização afeta diretamente a fachada do condomínio, considerada área comum. Nesse
sentido, examinem-se as seguintes ementas promanadas deste Egrégio Tribunal de Justiça:
CONDOMÍNIO. OBRIGAÇÃO DE DESFAZER OBRA.
1. Trata-se de apelação interposta contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os
pedidos autorais, condenando o réu na obrigação de fazer consistente no desfazimento da obra realizada na varanda de seu imóvel, recompondo a fachada externa ao seu estado original.
2. O apelante reconhece ter sido alertado acerca da irregularidade do avanço na varanda no transcorrer da obra, não tendo aceitado as notificações em razão da existência de obras idênticas anteriores.
3. Há nos autos documentos que demonstram a tentativa de solucionar o problema de forma amigável e extrajudicial, inclusive em relação a outros condôminos, não só contra o apelante, não havendo se
falar em tratamento diferenciado em relação aos demais.
4. Diante do descumprimento de regra prevista na convenção do condomínio, impõe-se a obrigação de desfazer a obra de fechamento da varanda.
5. Não é possível admitir como legítima a conduta do réu pelo simples fato de que outros condôminos incorreram na mesma ilegalidade, devendo o interessado, caso incomodado, buscar a aplicação das
normas condominiais em ação própria.
6. A reconvenção deve guardar conexão pelo objeto ou pela causa de pedir ou, ainda, pertinência com o fundamento da defesa, não sendo este o caso dos autos.
7. Recurso conhecido e desprovido.”
(Acórdão nº 1070137, 20160110531250APC, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA 2ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 24/01/2018, Publicado no DJE: 02/02/2018, p. 221-232) (Ressalvam-se os
grifos)
“DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO VERTICAL. EDIFÍCIO DE APARTAMENTO.
ENVIDRAÇAMENTO DEVARANDA. ALTERAÇÃO DAFACHADAEXTERNA.
CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NORMATIVA E DE APROVAÇÃO PELA
UNANIMIDADE DOS CONDÔMINOS. DEVER QUE O CONDOMÔNIO INOBSERVARA.
OBRIGAÇÃO DE FAZER. REMOÇÃO DO BLINDEX. COMINAÇÃO. LEGITIMIDADE.
PRESERVAÇÃO. MANUTENÇÃO DA ESTÉTICA DO PRÉDIO. NECESSIDADE.
1. Ofechamentodevarandade unidade imobiliária mediante a utilização de vidro temperado
inexoravelmente implica alteração dafachadaexterna do edifício, comprometendo sua estética e maculando sua harmonia arquitetônica , encontrando óbice nas normas condominiais que,
coadunadas com o autorizado pelo legislador, vedam a realização de quaisquer obras que impliquem alteração da arquitetura do edifício, salvo expressa aquiescência da unanimidade dos condôminos
(CC, art. 1336 e Lei nº 4.591/64, art. 10).
2.Subsistindo previsão regimental estabelecendo que nas varandas das unidades imobiliárias
integrantes do condomínio somente será permitido ao condômino o uso de tela de proteção e
segurança para criança com observância do modelo aprovado pela administração do condomínio, o
condômino, na exata tradução do alcance e destinação da regulação genérica, restam vinculado ao
estabelecido e obrigado a observá-la, sob pena de ser compelido a desfazer acessão realizada à
margem do permitido, notadamente quando compromete a harmonia arquitetônica do edifício.
3.As normas convencionais, destinando-se justamente a pautar internamente o uso das áreas comuns, das áreas privativas e preservar a intangibilidade do edifício, consubstanciam regulação interna apta a vincular todos os condôminos, podendo, inclusive, ensejar restrição ao uso das unidades autônomas e ao comportamento dos condôminos desde que não exorbitem o que o legislador permitira.
4.Apelação conhecida e desprovida. Unânime.”
(Ressalvam-se os grifos)
Ressalte-se ainda que, embora em sede de resposta à contestação (fls. 1-5, Id. 8906009) e em suas razões recursais (fls. 1-8, Id. 8906017) o apelante tenha verberado que a padronização do
fechamento das varandas não importa em alteração da fachada do prédio, o próprio autor indicou em sua petição inicial (fls. 1-11, Id. 8905812) os dispositivos da Convenção do Condomínio que vedam a alteração de fachada. No mesmo sentido, ao aplicar as multas contra a ré, o condomínio informa que a determinação da assembleia teria o o intuito de “preservar a harmonia e estética da fachada do
edifício” (fls. 1-2, Id. 8905858; fls. 1-2, Id. 8905862; fls. 1-2, Id. 8905866; fls. 1-2, Id. 8905870 e fls. 1-2, Id. 8905873).
Assim, não há dúvidas de que a assembleia geral extraordinária de 19 de setembro de 2015 deliberou a respeito da área comum do dondomínio.
De acordo com os artigos 1352 e 1353, ambos do Código Civil, as deliberações das assembleias de
condomínio serão procedidas pela maioria de votos dos condôminos presentes se não for exigido
quórum especial para a decisão da matéria.
Ocorre que, nos termos da cláusula trigésima primeira da Convenção do Condomínio, a
alteração de áreas comuns requer a aprovação de 2/3 (dois terços) dos condôminos, senão vejamos
(fl.25, Id. 8905823):
“Cláusula Trigésima Primeira – As decisões referentes às modificações da presente CONVENÇÃO
DE CONDOMÍNIO e do REGIMENTO INTERNO só poderão ser tomadas pelo “quorum” que
represente pelo menos 2/3 dos votos dos condôminos.
Modificações de partes comuns só poderão ser feitas com a concordância de 2/3 dos votos dos
condôminos, inclusive daqueles que estejam em débito com o condomínio . Mudança de destinação do empreendimento, ou da unidade imobiliária, depende de aprovação da unanimidade dos
condôminos. Art. 1342.” (Ressalvam-se os grifos)
O autor, no entanto, não se desincumbiu do ônus de comprovar que a padronização das varandas das unidades “garden” havia sido aprovada pelo quórum mencionado e, por isso, a multa por
descumprimento da determinação assemblear seria aplicável, nos termos do art. 373, inc. I, do CPC.
Aliás, não foi acostada aos autos a lista de presença da assembleia procedida aos 19 de setembro de
2015, cuja ata relata apenas a aprovação do item em questão por 91,5% (noventa e um vírgula cinco
por cento) dos condôminos presentes (fl. 2, Id. 8905844).
Nesse sentido, observem-se as seguintes ementas promanadas deste Egrégio Tribunal de Justiça:
AUTOR. REVELIA. EFEITOS MATERIAIS. NÃO SÃO ABSOLUTOS. RESSALVAS LEGAIS.
ALEGAÇÕES CONTRADITÓRIAS A DOCUMENTAÇÃO ACOSTADA AOS AUTOS.
RESSARCIMENTO DE VALORES. LUCROS CESSANTES. DANOS MORAIS. INDEVIDOS.
MORA DA RÉ. NÃO COMPROVADA. RESCISÃO. CULPA DO AUTOR. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
I. Na clara dicção do artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do direito, incumbe ao autor, razão pela qual é notório que o autor deve trazer documentação hábil a comprovar suas alegações, sob pena de seus pedidos serem rejeitados,
caso paire controvérsia sobre a matéria fática.
II.Embora tenha ocorrido à revelia da recorrida, certo é que, os efeitos materiais, entre eles o de
reconhecimento de veracidade dos fatos alegados não são absolutos, pois o Código de Ritos é claro ao ressalvar as situações em que não se verificará os efeitos materiais da revelia, dispostos no art. 345 do CPC, entre eles, destacando que não se verificará, quando as alegações de fato formuladas pelo autor forem inverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos.
III.Apelação Cível conhecida e, no mérito, desprovida. Sentença mantida.”
(Acórdão nº 1178558, 00048789520168070014, Relator: GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA 3ª
Turma Cível, Data de Julgamento: 12/06/2019, Publicado no DJE: 18/06/2019) (Ressalvam-se os
grifos)
“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO
DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SUBLOCAÇÃO DE BANCA NO CEASA/DF. AUSÊNCIA DE
IRREGULARIDADE. LEGITIMIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. PRESUNÇÃO
RELATIVA. AUSÊNCIA DE PROVAS DO FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR.
ÔNUS DA PROVA. SENTENÇA MANTIDA.
1. O ato administrativo goza de presunção de legitimidade e legalidade, que somente pode ser afastada mediante prova inequívoca em sentido contrário.
2. Na distribuição do ônus da prova, compete à parte autora comprovar suas alegações,
conforme determina o art. 373, inc. I, do Código de Processo Civil .
3. No caso em análise, o acervo probatório coligido aos autos é insuficiente para comprovar a efetiva ocorrência da sublocação, em desacordo com o Regulamento do Mercado.
4. Apelação conhecida, mas não provida. Unânime.”
(Acórdão nº 1138628, 07024996020188070018, Relator: FÁTIMA RAFAEL 3ª Turma Cível, Data de Julgamento: 21/11/2018, Publicado no DJE: 26/11/2018) (Ressalvam-se os grifos)
Assim, não é possível compelir a demandada ao pagamento de multa decorrente de
descumprimento da determinação assemblear referente à padronização do fechamento das varandas
das unidades do primeiro andar do edifício.
É como voto.
O Senhor Desembargador GILBERTO DE OLIVEIRA – 1º Vogal Com o relator
A Senhora Desembargadora FÁTIMA RAFAEL – 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO
CONHECER E NEGAR PROVIMENTO, UNANIME