Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2019.0000593729
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0190076-89.2011.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante RESIDENCIAL MANHATTAN, é apelado JOSE OMAR MONTAGNANI.
ACORDAM, em 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores LUIZ ANTONIO DE GODOY (Presidente sem voto), CLAUDIO GODOY E AUGUSTO REZENDE.
São Paulo, 30 de julho de 2019.
CHRISTINE SANTINI
RELATOR
Assinatura Eletrônica
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1ª Câmara de Direito Privado
Apelação Cível nº 0190076-89.2011.8.26.0100(2) – São Paulo
Apelante: Residencial Manhattan
Apelado: José Omar Montagnani
Juíza Prolatora: Andréa Galhardo Palma
TJSP (Voto nº 33.567)
Apelação Cível.
Responsabilidade civil Ação de indenização por danos materiais Condomínio autor que alega ter sido vítima de fraude perpetrada pela administradora por culpa da má-gestão do réu, seu ex-síndico Sentença que julgou improcedente a ação Recurso de apelação interposto pelo condomínio autor Preliminar de intempestividade dos documentos apresentados pelo réu com suas alegações finais afastada Responsabilidade pessoal do síndico, de natureza subjetiva, não verificada
Ausência de dolo ou culpa Responsabilidade dos sócios da empresa administradora, que assinaram termo de confissão de dívida admitido o cometimento da fraude Ausência de comprovação dos atos de má-gestão atribuídos ao réu Ex-síndico que agiu amparado pela empresa administradora e pelo conselho consultivo Condomínio autor que não se desincumbiu do ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito, nos termos do artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil
Julgamento de improcedência que era de rigor
Sentença mantida Recurso desprovido.
Nega-se provimento ao recurso de apelação.
1. Trata-se de ação de indenização por danos materiais
movida por Residencial Manhattan em face de José Omar Montagnani.
Alega-se, em síntese, que o réu exerceu as funções de síndico no
condomínio autor no período de março de 2001 a julho de 2009 e
delegou à empresa Andretta Administração S.C. Ltda. a administração
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“encaminhar mensalmente, para a apreciação dos membros eleitos, … as pastas contendo todos os comprovantes de despesas, originais, para serem arquivados sob a guarda do próprio condomínio”, conforme constou da Ata de Assembleia de 31.03.2001. Contudo, apurou-se que a referida administradora provocou um desfalque nas contas do condomínio autor no montante de R$ 90.152,29. Afirma-se que o réu é responsável pelo referido desfalque, ocorrido durante sua gestão, uma vez que deixou de exigir a apresentação mensal dos comprovantes originais dos pagamentos no período de maio de 2007 a janeiro de 2009. Requer-se, assim, a condenação do réu ao ressarcimento dos prejuízos apurados em auditoria e por eventuais outros débitos existentes.
Proferida a R. Sentença de fls. 316/319, que extinguiu o processo, sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva ad causam, foi a mesma anulada pelo V. Acórdão de fls. 355/359, em razão da legitimidade de José Omar Montagnani para figurar no polo passivo da ação.
Proferida nova sentença, a ação foi julgada improcedente, com a condenação do condomínio autor ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em10% sobre o valor da causa (fls. 493/497).
Apela o condomínio autor, alegando, preliminarmente, que os documentos de fls. 470/479 foram juntados de forma extemporânea pelo réu, sendo de rigor o seu desentranhamento. No mérito, sustenta o desacerto da R. Sentença, pleiteando sua reforma para
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o julgamento de procedência da ação (fls. 501/516).
Processado o recurso, foram apresentadas contrarrazões (fls. 539/566).
Houve oposição ao julgamento virtual (fls. 570).
É o relatório.
2. Por primeiro, não prospera a alegação preliminar de que os documentos de fls. 469/478 foram juntados de forma extemporânea pelo réu.
Prevê o artigo 434 do Código de Processo Civil que incumbe à parte instruir a petição inicial ou a contestação com os “documentos destinados a provar suas alegações”. A juntada posterior somente é admitida em relação a documentos novos, quais sejam, aqueles aos quais a parte só teve acesso depois de apresentada a inicial ou peça de defesa, os destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados e aqueles utilizados em contraposição aos documentos produzidos pela parte contrária. E, na hipótese dos autos, claro está que os documentos de fls. 469/478 somente foram obtidos pelo réu quando da apresentação de suas alegações finais, tratando-se, portanto, de documentos novos. Ademais, sua apresentação em nada altera as outras provas já existentes nos autos, não havendo cogitar do exercício do contraditório pelo condomínio autor, que retardaria desnecessariamente o julgamento do recurso.
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No mérito, melhor sorte não socorre o recorrente.
Funda-se a pretensão indenizatória formulada na inicial nos atos praticados pelo réu no período em que ocupou o cargo de síndico no condomínio Residencial Manhattan, entre março de 2001 e julho de 2009.
Segundo o condomínio autor, durante a gestão do réu foi delegada à empresa Andretta Administração S.C. Ltda. a administração do condomínio, sob o compromisso expresso desta última de “encaminhar mensalmente, para a apreciação dos membros eleitos, … as pastas contendo todos os comprovantes de despesas, originais, para serem arquivados sob a guarda do próprio condomínio”, conforme constou da Ata de Assembleia de 31.03.2001. Contudo, apurou-se que a referida administradora provocou um desfalque nas contas do condomínio no montante de R$ 90.152,29. Sustenta o condomínio autor que o réu é responsável pelo referido desfalque, ocorrido durante sua gestão, uma vez que deixou de exigir a apresentação mensal dos comprovantes originais dos pagamentos no período de maio de 2007 a janeiro de 2009. Postula, assim, a condenação do réu ao ressarcimento dos prejuízos apurados em auditoria e por eventuais outros débitos existentes.
Sem razão, contudo.
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“Trata-se de ação de ressarcimento de valores usurpados pela administradora terceira, contratada pelo condomínio autor, durante sua gestão na direção do condomínio entre os anos de 2001 e 2009.
Incontroverso dos autos a ocorrência de dano às contas do condomínio autor, ocasionada pela conduta ilícita da administradora ANDRETA ADMINISTRAÇÃO, terceira, durante a gestão do réu (anos de 2001 a 2009).
Portanto, a controvérsia cinge sobre (i) a negligência do réu quanto às funções a ele atribuída na qualidade de síndico em fiscalizar a administradora terceira; (ii) a prática de ato ilícito capaz de ensejar a responsabilidade civil do réu pelos danos.
Nesse sentido, a ação é improcedente.
Com efeito, o síndico, presidente eleito da associação de moradores tem poderes de agir em nome da associação, nos limites previsto pela Convenção de Condomínio, em prol dos interesses dos condôminos que representa, devendo responder por eventuais danos causados por sua má-gestão.
No entanto, cediço dizer que a responsabilidade civil do síndico pelos atos praticados durante a sua gestão é subjetiva, ou seja, além da demonstração do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente, é necessária também prova de dolo ou culpa do síndic o.
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Nesse ponto, embora presente o dano, a parte autora não logrou demonstrar o nexo de causalidade entre o dano e a atividade do síndico réu, mormente diante da Confissão de Dívida assinada pelos sócios da administradora (Andreta Administrações), admitindo o cometimento de fraude (fls. 233 e 245/246), bem como consta na Ata da Assembleia Geral constituída em 04/04/2009, quando a patrona da administradora declarou que o seu cliente estava disposto a arcar com os prejuízos causados ao condomínio autor (fls. 41).
No mais, não há prova de dolo ou culpa por parte do requerido, cumprindo ressaltar que este não administrava o condomínio isoladamente, estando assessoradas por uma empresa especializada (que exerce, por delegação, as funções administrativas do síndico artigo 39º, parágrafo único da Convenção de Condomínio fls. 25) e, ainda, pelo Conselho Consultivo, a quem compete abrir, encerrar e rubricar o “livro caixa”, fiscalizar as atividades do síndico e examinar e dar parecer sobre as suas contas, relatórios e comprovantes (artigo 41, parágrafo único, a, c e f, da Convenção), e cujo silêncio durante todo período (oito anos) não pode ser desconsiderado.
Não obstante, o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já proferiu julgamento de que para
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acolhimento do pedido de ressarcimento, exige-se demonstração efetiva da má gestão:
…
No presente caso, não há demonstração inequívoca de que o dano tenha ocorrido em razão de uma conduta dolosa ou culposa do réu. Também não houve qualquer produção de prova no sentido de demonstrar alguma manifestação dos moradores em relação à administração do réu (exceção feita na Assembleia Geral instaurada em 04 de abril de 2009, o que ocorreu apenas após a constatação da fraude fls. 40/42) ou até mesmo alguma fiscalização por outros órgãos do condomínio.
Conforme determinação do artigo 372, inciso I do Código de Processo Civil, incumbia ao autor requerer a realização de prova pericial como forma de demonstrar as falhas na administração do réu, o que não ocorreu, pois pugnou tão somente pela produção de prova testemunhal.
Por meio da oitiva de todas as testemunhas (fls. 421/426) foi comprovado que durante todo o período em que o réu ocupou o cargo de síndico, todos os condôminos tinham acesso à pasta de contas organizada pela administradora, sendo dever, não somente dos conselheiros, mas dos próprios condôminos ter questionado o síndico à época dos fatos caso tenha sido constatado a fraude, o que não
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ocorreu.
…
Não obstante, o conjunto probatório não permite concluir que o requerido apropriou-se dos valores do autor usurpados pela administradora e, conforme o depoimento de Carlos Mathias Bocato e admitido por Raimundo Messias Nunes, testemunhas presenciais da declaração de fraude pela administradora, o réu demonstrou ter realizado todas as diligências necessárias instantaneamente, conforme demonstrou o Boletim de Ocorrência (fls. 230/232), a constituição de prova a comprovar o ilícito cometido pela Administradora terceira (fls. 233 e 245/246), bem como medidas judiciais cabíveis para garantir o ressarcimento do prejuízo ao condomínio (fls. 237/243).
Por fim, quanto a Ata de Assembleia “fictícia” elaborada pelo réu a fim de movimentar as contas bancárias, conforme admitido em depoimento pessoal e mediante o delegado de polícia (fls. 275/277), inegável a ilegalidade do ato e, por consequência, a nulidade do documento.
Todavia, além de se tratar de evidente diligência para evitar novas apropriações por parte da administradora Andreta, haja vista que esta detinha o controle das contas bancárias do condomínio autor, cumpre ressaltar que inexiste qualquer comprovação
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que o documento tenha sido efetivamente aceito pelo banco, tampouco há prova suficiente a demonstrar que o Condomínio sofreu eventuais prejuízos decorrentes desse ato.
Destarte, não configurada a demonstração da gestão fraudulenta e do enriquecimento indevido do réu no período em discussão, apesar do possível amadorismo na sua gestão, a improcedência da ação é a medida que se impõe, porém não caracterizada a má-fé do autor, pois este apenas ingressou em Juízo buscando direito que acreditava possuir.” (fls.)(g.n.).
Dessa forma, era mesmo o caso de improcedência da ação, bem decretada, devendo a R. Sentença apelada ser mantida tal como lançada.
Por derradeiro, em observância ao trabalho adicional realizado em grau recursal, ficam majorados os honorários advocatícios devidos pelo autor para 15% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, parágrafo 11º, do Código de processo Civil.
3. À vista do exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso de apelação.
Christine Santini
Relatora