Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2016.0000443986
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0007996-43.2011.8.26.0526, da Comarca de Salto, em que são apelantes GERALDO PIRES DE ESPINDOLA (E OUTROS (AS)), ANA CLAUDIA CHIARI e FRANCELITA SARAIVA DE NOVAES RIBEIRO, são apelados ALFREDO MENDES STEFFEN (E OUTROS (AS)), ARNALDO PASSAFINI NETO, GUAZI RAGUES CHAHDA, HERMES DA FONSECA FILHO, JULIO CESAR BERSELLI e LUCIANA AVESANI CACACE TABARIN.
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto da Relatora, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores LUIS MARIO GALBETTI (Presidente sem voto), RÔMOLO RUSSO E LUIZ ANTONIO COSTA.
São Paulo, 27 de junho de 2016.
Mary Grün
Relatora
Assinatura Eletrônica
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VOTO Nº: 8377
APELAÇÃO Nº: 0007996-43.2011.8.26.0526
COMARCA: SALTO
APTEs.: GERALDO PIRES DE ESPINDOLA, ANA CLAUDIA CHIARI e
FRANCELITA SARAIVA DE NOVAES RIBEIRO
APDOs.: ALFREDO MENDES STEFFEN, ARNALDO PASSAFINI NETO,
GUAZI RAGUES CHAHDA, HERMES DA FONSECA FILHO, JULIO CESAR BERSELLI e LUCIANA AVESANI CACACE TABARIN
DANOS MORAIS. PARECER DE CONSELHO FISCAL EM ASSEMBLEIA DE COOPERATIVA. Parecer proferido em assembléia prevista para análise das contas da administração. Mérito do parecer que não pode ser objeto de análise. Conteúdo técnico, em linguagem respeitosa e adequada ao fim a que se destina. Questionamentos e apontamentos de ilegalidade que são inerentes à posição de administradores de cooperativa. Danos moral não configurado. Improcedência mantida. Honorários advocatícios. Verba reduzida para adequação à complexidade do caso. Recurso parcialmente provido.
Vistos .
Trata-se de ação indenizatória por danos morais
decorrentes de divulgação do parecer do Conselho Fiscal da
Unimed Salto-Itu Cooperativa de Trabalho Médico, em
Assembléia Geral Ordinária de 02/03/2011, acerca da
administração do exercício 2010. A ação é movida por membros
da administração da cooperativa em face de membros do
Conselho Fiscal. Os danos morais são estimados em
“R$109.000,00 (cento e nove mil reais) ou o equivalente a 200
(duzentos) salários mínimos a ser pago por cada um dos Réus aos
A u t o r e s , s e n d o m e t a d e a o P r i m e i r o e o r e s t a n t e r e p a r t i d o i g u a l m e n t e
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entre a S egunda e Terceira Autoras” (fls. 22).
A r. sentença (fls. 500/501v), complementada pela r. decisão que acatou os embargos de declaração (fls. 507), julgou improcedente a ação e condenou os autores “no pagamento de custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor da causa, devidamente atualizado, a ser rateado igualitariamente entre os advogados dos requeridos atuantes no feito”.
O fez sob os fundamentos de que “Assistindo aos DVDs que registraram a Assembléia, em que teria ocorrido o dano (fls. 65/68), o que se percebe é que os requeridos apenas tornaram público o parecer do Conselho Fiscal, com ressalvas e apresentações de irregularidades aos seus associados, os quais têm direito de receber informações sobre os rumos da Associação e sobre o quanto se concluiu e apurou. Houve tão somente a leitura de documentos, tornando de conhecimento de todos os presentes, o entendimento do mencionado conselho. A veiculação de informações com dados numéricos, sem deturpação dos fatos e com o fim de informar os associados não configura ilícito. O utrossim, não ficou suficientemente comprovado nos autos, que os réus fizeram críticas e acusações infundadas aos autores, com intuito de ofender a sua honra e moral. C onstata-se apenas a intenção de narrar dados com conteúdo meramente informativo, procurando esclarecer os associados das irregularidades verificadas no parecer do Conselho Fiscal. Não foi utilizada expressão injuriosa ou leviana que pudesse desabona-los ou atentar contra a honra e imagem dos autores, nem tampouco houve comentários pessoais, que transcendessem o decoro e o respeito, ou que revelassem opiniões particulares desabonadoras a respeito dos demandantes”.
A p e l a m o s a u t o r e s ( f l s . 5 1 0 / 5 1 8 p e t i ç ã o
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protocolizada em 26/03/2015) afirmando que o que fizeram os apelados “foi, dolosamente, desmoralizar os Apelantes perante a plateia que implicou inevitavelmente no agravamento do dano sofrido, com intento totalmente alheio ao dever-poder a estes conferido. Agiram, portanto, maliciosamente, pois tinham plena ciência da regularidade nos atos de gestão cooperativa,eram estatutariamente responsáveis pela fiscalização e apontamento das irregularidades diretamente à Administração. No entanto, não o fizeram, apresentando o citado Parecer em AGO, expondo sobremaneira os Apelantes, burlando a função precípua dos cargos ocupados e utilizando-se da indigitada Assembléia como meio à promoção política, com a finalidade exclusiva de denegrir a imagem dos Apelantes, perante a um público totalmente heterogêneo”. Requerem a total procedência da ação, com condenação dos apelados ao pagamento de indenização por danos morais.
Subsidiariamente, pugnam pela redução do percentual dos honorários advocatícios, “considerando a natureza e importância da causa e dos atos do processo praticados, como também o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço”.
Tempestivo e com as respectivas custas recolhidas, o recurso foi recebido no duplo efeito (fl. 522) e devidamente processado.
Contrarrazões às fls. 526/532, com adução de preliminar de falta de impugnação específica da r. sentença.
É o relatório .
Primeiramente, quanto à preliminar aduzida em c o n t r a r r a z õ e s , n ã o h á n a a p e l a ç ã o f a l t a d e i m p u g n a ç ã o e s p e c í f i c a
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da decisão, uma vez que as razões possuem relação direta com os argumentos expostos pela r. sentença, mesmo que se repita fundamentos já manifestados em peças anteriores.
Sobre o tema, já decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
“Apelação. Art. 514 do Código de Processo Civil. R epetição de argumentos utilizados na contestação. P recedentes da C orte.
1. A Corte tem inúmeros precedentes indicando que a reprodução de argumentos utilizados em 1º grau não servem para afastar o conhecimento da apelação, ainda mais quando, no caso, a parte apelante atacou com suficiente claridade os temas decididos pela sentença.
2. Recurso especial conhecido e provido.”
(REsp 766163/PR, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 3ªT., j. 05/10/2006, DJ 13/11/2006, p. 258)
Por tais motivos, fica afastada a preliminar.
No mérito, o recurso não comporta provimento.
Observa-se que o parecer do Conselho Fiscal da Unimed Salto-Itu Cooperativa de Trabalho Médico acerca da administração do exercício 2010 foi feito em Assembléia Geral Ordinária, de 02/03/2011, destinada, entre outros, à “Item 1 -P restação de contas do exercício anterior, compreendendo: 1.1
Relatório do Conselho de Administração; 1.2 Balanço Patrimonial levantado em 31 de dezembro de 2010, com Demonstrativo da conta Sobras e Perdas e Parecer do Conselho Fiscal” (ata fls. 51).
Assim, observa-se que o Parecer do Conselho Fiscal foi realizado em assembléia que compreendia tal objeto.
O conteúdo do parecer lido em Assembléia se apresenta puramente técnico, em linguagem respeitosa e a d e q u a d a a o f i m a q u e s e d e s t i n a .
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Destaca-se que o mérito do parecer não pode
ser objeto da análise desta ação. Os apelantes, pelo cargo que
decidiram ocupar, estão sujeitos a questionamentos de pessoas,
destacadamente o Conselho Fiscal, cuja razão de ser é justamente
a de fiscalizar, não havendo que se falar em ato proposital para
atingir a moral dos apelantes, mas sim exercício de um dever
funcional.
Ademais, a posição do Conselho Fiscal não é
soberana, tanto é que foi posteriormente sujeita à análise
aprofundada, com direito de defesa pelos apelantes.
Assim, se o parecer identificou irregularidades
na administração, ainda que sem razão, é mero aborrecimento
inerente à posição que os apelantes ocupavam.
Tendo a exposição do parecer sido feita de
forma técnica e respeitosa, conforme se extrai da gravação em
vídeo da audiência, não há dano moral indenizável na hipótese.
Em casos similares, já decidiu este Egrégio
Tribunal, inclusive esta Colenda Câmara:
DANOS MORAIS Autor que, na qualidade de exdiretor da comercial da U nimed Campinas, sentiu-se ofendido pelo comportamento dos réus, que integravam o conselho fiscal da empresa, e teriam exorbitado os poderes de fiscalização sobre seus atos, encaminhando emails para os demais cooperados e atuado de forma desproporcional, acarretando a publicação de três reportagens em jornal de grande circulação na cidade A legação de que tais abusos acarretaram danos morais Ausência de prova de má-fé Réus que atuaram dentro do exercício regular de um direito Sentença de improcedência mantida Apelo desprovido. (…)
D esta forma, cabe ao Conselho Fiscal, fiscalizar os atos diretivos, noticiando ao conselho de administração eventuais irregularidades constatadas, solicitando p r o v i d ê n c i a s p a r a t a n t o .
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Sem embargo da douta fundamentação que se fundamenta o reclamo não restou demonstrado nos autos que os réus-apelados, no exercício de suas funções, tenham agido de má-fé e sem ética. Atuaram, pelo contrário, com responsabilidade, questionando possíveis irregularidades constatadas.
Tais irregularidades, com efeito, foram objeto de deliberação no âmbito de reunião extraordinária do conselho fiscal (fls. 33/37), tal qual determinado no inciso X do art. 63 acima transcrito.
Assim, muito embora o autor-apelante tenha se sentido ofendido e violado em sua honra, pessoal e profissional, não ocorre, no caso, abuso ou exorbitância propalados, porquanto noticiados os fatos dentro dos aspectos de normalidade.
O s réus, com escusas pela reiteração, na qualidade de conselheiros fiscais, apenas atuaram dentro de suas atribuições, não se verificando qualquer excesso ou extrapolação.
A esse respeito, como adequadamente colocado na sentença, “as questões levantadas não ultrapassam as funções atribuídas aos requeridos. N ão há ofensa direta a honra do autor, mas sim questionamentos acerca do exato cumprimento das normas estatutárias por todos aqueles que são, ou melhor, eram, na época dos fatos, responsáveis pela administração da cooperativa.” (fl. 688).
(TJSP, Ap. 9195568-54.2007.8.26.0000, 7ª Câm. de D ir. Privado, Rel. Des. Ramon Mateo J únior, j. 31/07/2013 – g.n.)
APELAÇÃO. ASSOCIAÇÃO. Ação anulatória ajuizada pelo ex-presidente da D iretoria E xecutiva da Associação Residencial Ecológica Patrimônio do Carmo – AREPC . Pretensão de anulação de decisão tomada em assembleia, que rejeitou as contas do exercício de 2011. Sentença de improcedência. Inconformismo. Não acolhimento. Biênio 2010/2011. Contas submetidas à auditoria independente, contratada pela associação. Parecer posterior do Conselho Fiscal e do Conselho D eliberativo. C aráter não vinculante de quaisquer dos pareceres. A ssembleia Geral soberana. A usência de caracterização de propósito político no parecer do Conselho F iscal. Ausência de induzimento a erro dos participantes da Assembleia Geral. N ão configurado d a n o m o r a l . I n c a b í v e l i n d e n i z a ç ã o . S e n t e n ç a
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confirmada. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. (TJSP, Ap. 0001477-95.2013.8.26.0586, 3ª Câm. de D ir. Privado, Rel. Des. Viviani Nicolau, j. 18/11/2015 – g.n.)
Dessa forma, foi bem a r. sentença em julgar pela improcedência da ação.
Quanto aos honorários advocatícios, a causa não possui tamanha complexidade a ponto de ser justo o arbitramento dos honorários em 20% sobre o valor da causa, que é de quantia elevada (R$763.000,00) em virtude de provimento de agravo de instrumento em impugnação ao valor da causa (fls. 79/82). Não houve sequer a necessidade de dilação probatória e a questão é demasiadamente pontual, com pedido único.
Desse modo, deve ser a verba honorária reduzida para 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973.
Ante o exposto, dá-se parcial provimento ao recurso para reduzir os honorários sucumbenciais ao patamar de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.
MARY GRÜN
Relatora