Inteiro Teor
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – ADMINISTRATIVO – PREVIDENCIÁRIO – PROCESSUAL CIVIL – SERVIDOR MILITAR – AUXÍLIO-INVALIDEZ – LEI ESTADUAL – INCONSTITUCIONALIDADE – INCIDENTE DE ARGUIÇÃO – QUÓRUM DE APROVAÇÃO – CASO ANÁLOGO – APLICAÇÃO OBRIGATÓRIA. 1. Em incidente, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) declarou a inconstitucionalidade da lei estadual que instituiu auxílio-invalidez em favor de militar, por ofensa à Constituição Estadual. 2. Decisão que acolhe incidente de inconstitucionalidade, por maioria de no mínimo dois terços, é de aplicação obrigatória em casos análogos, conforme norma regimental deste Tribunal de Justiça. 3. É improcedente o pedido de cobrança de vantagem pecuniária assegurada em lei inconstitucional.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.13.040548-3/004 – COMARCA DE BELO HORIZONTE – APELANTE (S): WILSON DA SILVA ROCHA – APELADO (A)(S): ESTADO DE MINAS GERAIS
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, À UNANIMIDADE, EM NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
DES. OLIVEIRA FIRMO
RELATOR.
DES. OLIVEIRA FIRMO (RELATOR)
V O T O
I – RELATÓRIO
Trata-se de APELAÇÃO interposta por WILSON DA SILVA ROCHA da sentença (f. 207-209v) publicada na vigência do CPC/2015 e prolatada em “AÇÃO COMINATÓRIA CC TUTELA ANTECIPADA” que moveu contra o ESTADO DE MINAS GERAIS. Ao fundamento de que este Tribunal declarou incidentalmente a inconstitucionalidade da norma da Lei Complementar estadual (LCE) nº 109/2009, que assegurava o direito à percepção de auxílio invalidez ao militar, a sentença julgou improcedente o pedido de cobrança daquela vantagem pecuniária, e condenou o requerido ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, com base no art. 85, § 3º, I do CPC/2015, com correção monetária pela tabela da Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (CGJ/TJMG), a partir da sentença, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, na forma do art. 406, do Código Civil (CC), a partir do trânsito em julgado, condenação sob condição suspensiva, por ser beneficiário da gratuidade da justiça; sentença não submetida a reexame necessário.
O apelante alega, em síntese, que a decisão em sede de controle difuso de inconstitucionalidade, salvo hipóteses de processos afetados com repercussão geral, possui eficácia inter partes, de modo que o incidente em que se fundamenta a sentença não possui eficácia no presente processo nem aptidão para modificar situações jurídicas já consolidadas. Nesses termos, requer o provimento da apelação e a reforma da sentença (f. 203-216).
Preparo: parte isenta (art. 10, I, da Lei estadual nº 14.939/2003).
Contrarrazões: pela confirmação da sentença, ao argumento de que a norma que criou o auxílio-invalidez é inconstitucional por violar dispositivos da Constituição Estadual (CE), devendo ser observado, no caso, o art. 300 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (RITJMG). Com base no princípio da eventualidade, alega que o direito só é assegurado ao militar acometido de invalidez permanente e total, tanto para a carreira policial, quanto para qualquer atividade laborativa, não sendo o caso. Acrescenta que o acolhimento da pretensão inicial colide com a norma do art. 194, da Constituição Federal (CF), por ter fundamento legal idêntico ao da aposentadoria por invalidez, ensejando enriquecimento sem causa (f. 218-227).
Ministério Público: denegou manifestação (f. 232).
É o relatório.
II – JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
Vistos os pressupostos de admissibilidade, recebo a APELAÇÃO nos efeitos suspensivo e devolutivo.
III – MÉRITO
O art. 59, da Lei nº 5.301/1969,(1) com as alterações da LC nº 109/2009, assegurou ao pessoal da Polícia Militar o direito à percepção de vantagens remuneratórias, dentre elas o auxílio-invalidez, parcela devida em qualquer situação em que o servidor se encontre, desde que satisfeitas as condições para sua concessão inicial e, por óbvio, ressalvadas as restrições legais (art. 58, da Lei nº 5.301/1969).(2)
A mesma LC nº 109/2009 introduziu o parágrafo único no art. 44, I, b, da Lei Delegada nº 37/1989, que reestruturou a remuneração do pessoal da PMMG e estabeleceu as condições para o recebimento do auxílio-invalidez, verbis:
Art. 44. O militar da ativa, ao ser reformado, perceberá soldo:
I – Integral:
a) (…)
b) se for julgado, mediante laudo da Junta Militar de Saúde, incapaz para o desempenho de suas atividades em decorrência de acidente no serviço ou por moléstia profissional ou alienação mental, cegueira, estado avançados da doença de Paget (osteíte deformante), paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, contaminação por radiação, síndrome de imunodeficiência adquirida, fibrose cística (mucoviscidose), doença de Parkinson, neoplasia maligna, espondiloartrose ancilosante, hepatopatia grave ou doença que o invalide inteiramente, qualquer que seja o tempo de serviço:
(…)
Parágrafo único. Ao militar reformado em virtude de invalidez permanente, considerado incapaz para o exercício de serviço de natureza de policial-militar ou bombeiro-
militar, em consequência de acidente no desempenho de suas funções ou de ato por ele praticado no cumprimento do dever profissional, é assegurado o pagamento mensal de auxílio-invalidez, de valor igual à remuneração de seu posto de graduação, incorporado ao seu provento para todos os fins. (destaquei).
Da leitura da norma depreende-se que é hipótese de concessão da vantagem, entre outras, a reforma por invalidez permanente, em razão da incapacidade para os atos da vida policial-militar, por consequência de acidente em serviço ou de ato praticado no exercício da profissão. Além disso, a LC em referência estendeu o benefício aos militares que já se enquadrassem nas condições legais, verbis:
Art. 18. O benefício a que se refere o parágrafo único do art. 44 da Lei Delegada no 37, de 1989, acrescentado por esta Lei Complementar, será concedido aos militares que se encontrarem nas condições nele previstas, sem direito à retroação.
Entretanto, o Órgão Especial deste Tribunal de Justiça, no julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade nº 1.0024.11.193251-3/003,(3) por unanimidade, declarou a inconstitucionalidade do art. 44, parágrafo único da LD nº 37/1989; o art. 59, I, ‘f’ da Lei estadual nº 5.301/1969, todos com a redação dada e acrescida pelos art. 3º, 15 e 18 da LC nº 109/2009, por vício de iniciativa, reconhecida a violação dos art. 66, III, b e 68, I, ambos da Constituição Estadual (CE). É do referido incidente:
EMENTA: INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE – ARTIGO 44, PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI DELEGADA Nº 37/89, ARTIGO 59, INCISO I, ALÍNEA ‘F’, COM A REDAÇÃO DADA, RESPECTIVAMENTE, PELOS ARTIGOS 15, 3º E 18, DA LC ESTADUAL Nº 109/2009 – ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE SOB ASPECTO DO VÍCIO FORMAL – ADMISSIBILIDADE – RELEVÂNCIA DA ARGUIÇÃO – PROJETO DE LEI DE INICIATIVA DO PODER EXECUTIVO – INSTITUIÇÃO, POR MEIO DE EMENDA PARLAMENTAR, DE VANTAGEM AO SERVIDOR MILITAR – INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA – OFENSA AOS ARTIGOS 66, III, ‘B’ E 68, I, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – ARGUIÇÃO ACOLHIDA. 1. É relevante a argüição incidental de inconstitucionalidade quando se constata que os dispositivos legais impugnados não foram apreciados quanto à observância do devido processo legislativo (vício de inconstitucionalidade formal). 2. Em se tratando de projeto de lei de iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo, admite-se que o Poder Legislativo apresente emendas supressivas ou restritivas, não lhe sendo permitido oferecer emendas ampliativas, as quais geram aumento da despesa, assim como aquelas que veiculam matérias alheias ao projeto de lei originário. 3. É inconstitucional a lei cujo projeto enviado pelo Chefe do Poder Executivo Estadual à Assembleia Legislativa, quando de sua iniciativa, tenha sofrido alterações por meio de emendas parlamentares que acarretam aumento de despesa pública sem a correspondente fonte de custeio e versem sobre matéria estranha ao projeto de lei, em clara ofensa ao princípio da harmonia e separação dos poderes.
Na forma do art. 300, do RITJMG, a decisão que acolhe o incidente de inconstitucionalidade, proferida por maioria de dois terços, como no caso, constitui decisão de aplicação obrigatória em casos análogos. O apelante não demonstra motivo relevante que justifique provocar novo pronunciamento do Órgão Especial sobre a matéria, nem este Relator o vislumbra de ofício, tendo em vista que a inconstitucionalidade foi declarada sob o aspecto formal, por vício de iniciativa, sem deixar margem a eventual mutação da interpretação.
Destarte, e considerando a declaração de inconstitucionalidade dos referidos dispositivos legais, e não havendo qualquer outra previsão sobre o auxílio-invalidez na forma como aqui requerida, o pedido há de ser julgado improcedente.
IV – CONCLUSÃO
POSTO ISSO, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO.
Ante a sucumbência total do apelante, em sede recursal majoro sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios para 12% (doze por cento) do valor atualizado da causa, levando em consideração a simplicidade da atuação, limitada à apresentação de contrarrazões; a longa duração do trabalho adicional em grau recursal, julgada a apelação em cerca de 12 (doze) meses; e a prestação do serviço na Comarca onde se estabelece o advogado público, (art. 85, § 2º do CPC/2015), suspensa a condenação, uma vez que beneficiário da gratuidade da justiça (art. 98, § 3º do CPC/2015).
Custas: requerente, isento (art. 10, II da LE nº 14.939/2003).
É o voto.
DES. WILSON BENEVIDES – De acordo com o (a) Relator (a).
DESA. ALICE BIRCHAL – De acordo com o (a) Relator (a).
SÚMULA: “À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO”
1 – Art. 59. São as seguintes as vantagens atribuídas ao pessoal da Polícia Militar, nas condições estabelecidas neste Estatuto ou regulamento próprio:
I – constantes:
(…)
f) auxílio-invalidez;
2 – Art. 58. Para os efeitos deste Estatuto, as vantagens são consideradas:
I – constantes: as que, satisfeitas as condições legais para sua concessão inicial, são devidas ao servidor, em qualquer situação em que estiver, ressalvadas as restrições desta lei; (…).
3 – IAI 1.0024.11.193251-3/003 – OE – Rel. Des. EDILSON FERNANDES – j. 25.11.2015 – pub. 4.12.2015.
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