Inteiro Teor
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
23 de julho de 2019
1ª Câmara Cível
Remessa Necessária Cível – Nº 0800526-78.2017.8.12.0049 – Agua Clara
Relator – Exmo. Sr. Des. Marcelo Câmara Rasslan
Juízo Recorr. : Juiz (a) de Direito da Comarca de Água Clara
Recorrido : Gerolina da Silva Alves
Advogado : Bento Adriano Monteiro Duailibi (OAB: 5452/MS)
Advogada : Camila Cavalcante Bastos (OAB: 16789/MS)
Advogado : Matheus Sayd Bellé (OAB: 18543/MS)
Recorrido : Presidente da Câmara Municipal de Água Clara – MS
Interessado : Câmara Municipal de Água Clara-MS
E M E N T A – REMESSA NECESSÁRIA – MANDADO DE SEGURANÇA – ILEGALIDADE DE INSTAURAÇÃO DA COMISSÃO PROCESSANTE – PRETENSÃO DO IMPETRANTE DE ANULAR ATO – ILEGALIDADE DEMONSTRADA – AUSÊNCIA DE QUÓRUM – SEGURANÇA CONCEDIDA – RECURSO OBRIGATÓRIO DESPROVIDO.
Se a instauração de Comissão Processante não observou a legislação
pertinente, correta é a sentença que, concede a segurança e declara a nulidade do
procedimento.
Recurso obrigatório desprovido.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos, por unanimidade, negar provimento ao recurso, com o parecer, nos termos do voto do Relator.
Campo Grande, 23 de julho de 2019.
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
R E L A T Ó R I O
O Sr. Des. Marcelo Câmara Rasslan.
O Juiz de Direito da 4.ª Vara Única da Comarca de Água Clara submete a reexame deste Tribunal de Justiça, nos termos do art. 14, § 1.º, da Lei n.º 12.016/2009, a sentença (f. 180-3) proferida nos autos de mandado de segurança impetrado por Gerolina da Silva Alves , que concedeu a segurança, ratificando a decisão liminar de f. 146-7 que anulou o ato que permitiu a instauração da Comissão Processante.
Não houve recurso voluntário de nenhuma das partes.
A Procuradoria-Geral de Justiça opina, às f. 202-5, pelo desprovimento do recurso obrigatório.
V O T O
O Sr. Des. Marcelo Câmara Rasslan. (Relator)
O Juiz de Direito da 4.ª Vara Única da Comarca de Água Clara submete a reexame deste Tribunal de Justiça, nos termos do art. 14, § 1.º, da Lei n.º 12.016/09, a sentença (f. 180-3) proferida nos autos de mandado de segurança impetrado por Gerolina da Silva Alves , que concedeu a segurança, ratificando a decisão liminar de f. 146-7 que anulou o ato que permitiu a instauração da Comissão Processante
Não houve recurso voluntário de nenhuma das partes.
A Procuradoria-Geral de Justiça opina, às f. 202-5, pelo desprovimento do recurso obrigatório.
Pois bem.
A questão cinge-se em analisar a legalidade do procedimento adotado pela Comissão Processante da Câmara de Vereadores do Município de Água Clara, a fim de apurar a conduta da impetrante.
Infere-se dos autos que a impetrante exercia o cargo de vereadora no Município de Água Clara e foi apresentada denúncia contra seu mandato pelo presidente da Câmara Municipal Vicente Amaro de Souza Neto.
A sentença posta sob reexame merece ser mantida incólume, pelos seus próprios fundamentos.
A legislação aplicável ao caso é o Decreto-Lei n.º 201/67, em razão da inexistência de lei estadual a respeito da matéria, assim sendo, o inciso II do art. 5.º do decreto, dispõe que:
Art. 5.º O processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito, se outro não for estabelecido pela legislação do Estado respectivo:
II – De posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o seu recebimento. Decidido o recebimento, pelo voto da maioria dos presentes, na mesma sessão será constituída a Comissão processante, com três Vereadores sorteados entre os desimpedidos, os quais elegerão, desde logo, o Presidente e o Relator.
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Assim, de posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o seu recebimento, sendo necessário, para tanto, o voto da maioria dos presentes.
Ao analisar a Ata n.º 29/2017, às f. 30-5, em consonância com o magistrado de primeiro grau, verifico que votaram pelo recebimento da denúncia os vereadores Eliseu Pereira da Silva e Saylon Cristiano de Moraes, além dos suplentes Edenilson e Lúdio. Por outro lado, votaram contrariamente os vereadores Gustavo G. Guiraldelli, Eulojari F. de Souza e Cláudio de S. Ferreira, sendo que o suplente Waldenir absteve-se de proclamar seu voto. Com relação à vereadora Simone Oliveira Batuta, cabe esclarecer que referida parlamentar estava ausente em razão de licença maternidade.
Pela análise da ata, apenas 04 (quatro) votos foram proclamados para o recebimento da denúncia, o que, consequentemente, corrobora a ilegalidade do ato de instauração do processo de cassação, eis que para o recebimento da denúncia de cassação seria necessário, no mínimo, o voto da maioria dos presentes, segundoo Decreto-lei n.º 201/67 e que, no caso, seriam 05 (cinco) votos.
Necessário ressaltar que a doutrina e a jurisprudência já vêm firmando que, nesta parte, a referida norma não foi recepcionada pela Constituição da República, que passou a exigir o quorum qualificado de 2/3 da Câmara Municipal, que no caso seriam cinco, como ensina Tito Costa, verbis:
É importante lembrar que o quorum para votação do recebimento da denúncia tem de ser de dois terços dos membros da Câmara, e não a maioria absoluta dos presentes como dizia o Dec-lei 201/67. E assim há de ser por duas razões, entre outras: em primeiro lugar, para que se cumpra a simetria entre situações semelhantes no âmbito federal e no estadual. O Município não pode, nesse particular, ter comportamento diferenciado, em desfavor da garantia do acusado. A Constituição, no seu art. 52, par. Ún., assim como art. 86, exige o quorum de dois terços para a declaração de perda de mandatos federais. As Constituições dos Estados contemplam de maneira igual a exigência. Não haverá de ser diferente no âmbito municipal. O modelo federal impõe aos demais níveis dos poderes estaduais e municipais o paralelismo das formas, em decorrência da necessidade de rigorismo cumprimento das regras constitucionais.
Bem por isso o Tribunal de Justiça de São Paulo, no julgamento da ação direta de inconstitucionalidade de preceito inserido em lei orgânica municipal, assim deixou decidido: “… patente que o Dec-lei 201/67 só foi recepcionado pela Constituição Federal vigente no tocante ao quorum da condenação. Quanto ao necessário para o recebimento da denúncia, vale aquele de dois terços previsto constitucionalmente. Em segundo lugar, porque não se pode aceitar que para a cassação final se exija quorum qualificado de dois terços dos membros da Câmara, se o processo cassatório, possa dar-se por maioria ocasional dos presentes à sessão. A incoerência, nesse particular, da lei de exceção, está sendo corrigida, agora pela nova Constituição, sob o prestigiamento de julgados de nossos mais importantes tribunais judiciários. Até mesmo por razões de política dos acusados, que, assim sendo, ficariam sujeitos à deliberação muitas vezes apressada e equivocada de eventual maioria simples de parlamentares presentes à sessão.
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No caso dos autos, dúvida não há acerca da ilegalidade no recebimento da denúncia por suposto crime de responsabilidade da impetrante, sendo necessária a concessão da ordem eis que, ainda que se entendesse que bastava a maioria dos vereadores, tal número não foi atingido.
Portanto, tendo a sentença concedido a segurança e não havendo recurso voluntário de nenhuma das partes, a mesma deve ser prestigiada, até porque obedeceu a legislação e jurisprudência pátrias.
Diante do exposto e de acordo com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, conheço do reexame necessário, porém, lhe nego provimento, ratificando todos os termos da sentença recorrida.
D E C I S Ã O
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, COM O PARECER, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.
Presidência do Exmo. Sr. Des. Marcelo Câmara Rasslan
Relator, o Exmo. Sr. Des. Marcelo Câmara Rasslan.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Des. Marcelo Câmara Rasslan, Des. Divoncir Schreiner Maran e Juiz José Eduardo Neder Meneghelli.
Campo Grande, 23 de julho de 2019.
RBX