Inteiro Teor
DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO N. 0184433.84.2016.8.09.0089
COMARCA DE IVOLÂNDIA
AUTOR : NILSON RODRIGUES DA SILVA
RÉU : PODER LEGISLATIVO MUNICIPAL
RELATOR : DES. AMARAL WILSON DE OLIVEIRA
V O T O
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da remessa obrigatória.
Cuida-se de DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO face a sentença proferida nos autos da AÇÃO
DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE JULGAMENTO DE CONTAS PÚBLICAS COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA proposta por NILSON RODRIGUES DA SILVA em desfavor do PODER
LEGISLATIVO MUNICIPAL DE MOIPORÁ.
Na peça exordial, narra o autor que o Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás apreciou e
rejeitou as contas anuais do Município de Moiporá, referentes aos exercícios de 2013, que
estavam sobre a sua responsabilidade, por supostas irregularidades, defendendo que ele não
teve direito à defesa e tampouco recurso de revisão; advertindo que vários vereadores se
ausentaram da sessão, tendo o parecer prévio do Tribunal de Contas sido rejeitado por apenas
04 vereadores, em afronta à Lei Orgânica e ao Regimento Interno da Casa.
Processado o feito, foi proferida a sentença de procedência do pedido, declarando a nulidade do Decreto Legislativo 001/2015, editado pela Câmara Municipal de Moiporá, que rejeitou as contas públicas anuais referentes ao exercício de 2013, período em que o autor era Prefeito daquele
Município.
Pois bem. Em análise meticulosa do caderno processual, não vislumbro motivos a modificar a
sentença censurada, que foi proferida de acordo com o conjunto probatório dos autos.
Extrai-se dos autos que a rejeição das Contas do Prefeito referente ao exercício de 2013 foi feita de forma irregular, sem atentar para o Regimento Interno da Casa Legislativa, eis que não havia o quorum qualificado de presença de vereadores necessária para o julgamento em voga, qual seja, de 2/3 (dois terços) para votação das contas públicas.
Restou comprovado nos autos que haviam somente 04 (quatro) vereadores presentes na sessão.
Vale destacar que a fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal,
mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.
Dentre as competências constitucionalmente atribuídas aos Tribunais de Contas, temos a do
inciso I do art. 71 da Constituição Federal que consiste na emissão de parecer prévio sobre as
contas globais dos Poderes Executivo e Legislativo, as quais, posteriormente, são submetidas ao julgamento perante as Casas Legislativas.
O professor José Nilo de Castro, em seu livro Direito Municipal Positivo, Del Rey, 5ª edição, Belo Horizonte, com a autoridade e a profundidade que imprime ao tema, ensina que “a apreciação
das contas anuais” do Poder Executivo e do Poder Legislativo “constitui uma das mais elevadas
atribuições do Tribunal de Contas, a quem compete examiná-las de forma global, mediante
Parecer Prévio, no que concerne aos seus aspectos de legalidade, legitimidade e
economicidade”(José Nilo de Castro, in Direito Municipal Positivo, 5ª ed. Editora Del Rey, pág.
433).
Assim, por determinação constitucional, as contas tanto do Chefe do Executivo quanto da Mesa
Diretora da Câmara Municipal devem ser, antes de tudo, encaminhadas ao Tribunal de Contas
dos Municípios – TCM –, para que este possa emitir o seu indispensável Parecer Prévio,
conforme determina a Constituição Federal, artigo 31, a saber:
“Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante
controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei. § 2º O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas que o Prefeito deve
anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da
Câmara Municipal”.
Portanto, a votação deve ser em plenário, com todos os membros presentes; sendo que o
Parecer Prévio do Tribunal de Contas dos Municípios só deixará de prevalecer pelo voto de 2/3
(dois terços) dos membros do Poder Legislativo Municipal.
Frise-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) em julgamento conjunto dos
Recursos Extraordinários (REs) 848826 e 729744, ambos com repercussão geral reconhecida,
que discutiam qual o órgão competente – se a Câmara de Vereadores ou o Tribunal de Contas – para julgar as contas de prefeitos, e se a desaprovação das contas pelo Tribunal de Contas gera inelegibilidade do prefeito (nos termos da Lei da Ficha Limpa), em caso de omissão do Poder
Legislativo municipal. Por maioria de votos, o Plenário decidiu, no RE 848826, que é
exclusivamente da Câmara Municipal a competência para julgar as contas de governo e as
contas de gestão dos prefeitos, cabendo ao Tribunal de Contas auxiliar o Poder Legislativo
municipal, emitindo parecer prévio e opinativo, que somente poderá ser derrubado por decisão de 2/3 dos vereadores.
Na hipótese sob exame, depreende-se da leitura da Ata 36º e 37º, relativas a Sessão Ordinária
da Legislatura 2015, da Câmara Municipal de Moiporá, realizada no dia 14/10/2015, bem como da Ata 38º e 39º, da Sessão Ordinária da Legislatura 2015, da Câmara Municipal de Moiporá,
realizada no dia 29/10/2015, que não houve quórum qualificado de 2/3 (dois terços) para a
votação das contas públicas anuais decorrentes do exercício de 2013 (docs. 0005).
Neste ponto, denota-se que de fato ocorreu violação ao preceito constitucional constante do
artigo 31, § 2º, respectivamente pela inobservância do quórum de 2/3 (dois terços), porquanto
proferida decisão rejeitando as contas anuais, inerentes ao exercício de2013, com apenas quatro vereadores.
Sobre o tema em foco:
“Para os fins do artigo 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar 64/1990, a apreciação das
contas de Prefeito, tanto as de governo quanto as de gestão, será exercida pelas Câmaras
Municipais, com auxílio dos Tribunais de Contas competentes, cujo parecer prévio somente
deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos vereadores.” STF. Plenário. RE 848826/DF,
rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, julgado em
10/8/2016 (repercussão geral) (Info 834).
“AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO LEGISLATIVO – JULGAMENTO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS
DE EX-PREFEITO AJUIZADA CONTRA A CÂMARA MUNICIPAL – INOBSERVÂNCIA DO
CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA – SUA NECESSIDADE TAMBÉM NOS JULGAMENTOS
POLÍTICOS – FALTA DE REGULARIDADE FORMAL DO PROCESSO – CONSEQÜENTE
INEFICÁCIA DO ATO POR FALTA DO QUORUM MÍNIMO EXIGIDO PRA APRECIAÇÃO DAS
CONTAS. – Embora caiba ao Legislativo julgar e fiscalizar as ações do Executivo, ao fazê-lo, no
procedimento de julgamento das contas apresentadas pelo Prefeito, não pode dispensar a
instalação do contraditório administrativo, nem de possibilitar ao interessado os meios de defesa que lhe são constitucionalmente garantidos. O art. 5º, inciso LX, da CF, é, aliás, expresso no
sentido de que, ”’aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”, não
mais prevalecendo o princípio da ”’verdade sabida”’, a possibilitar a aplicação imediata de pena. -Não observado o princípio do contraditório, ao Poder Judiciário permite a lei que se examine o
aspecto formal da sessão convocada para a apreciação das contas do Chefe do Executivo
Municipal. – Não observado o quorum exigido para o julgamento das contas, confirma-se a
decisão que anulou a respectiva Resolução emitida pela Câmara.(TJ-MG 101830407176250011 MG 1.0183.04.071762-5/001 (1), Relator: WANDER MAROTTA, Data de Julgamento: 28/10/2008, Data de Publicação: 07/11/2008)
“DUPLO GRAU DE JURISDICAO. APELACAO. AÇÃO DECLARATORIA DE
NULIDADE. REJEICAO DE CONTAS DO PREFEITO MUNICIPAL PELA CÂMARA.
LEGISLATIVA. SENTENCA EXTRA PETITA. INOCORRENCIA. AUSENCIA DE MOTIVACAO.
PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. I – NAO OCORRE SENTENCA EXTRA PETITA
SE O JULGADOR DECIDE A LIDE ESTRITAMENTE DENTO DO QUE FOI POSTULADO. II – E DE SE MANTER A SENTENCA MONOCRATICA QUE DECLAROU NULA A DECISAO DA
CÂMARA LEGISLATIVA MUNICIPAL AO REJEITAR AS CONTAS APRESENTADAS
PELO PREFEITOMUNICIPAL SEM A DEVIDA MOTIVACAO, E SEM OBSERVANCIA DO
DEVIDO PROCESSO LEGAL. REMESSA E APELACAO CONHECIDAS E IMPROVIDAS.”
(TJGO, 1ª Câm. Cível, Des. Ney Teles de Paula, DGJ 9210-4/195 – DJ 14496 de 19/04/2005)
Assim, verificando que houve vício na sessão de votação do Plenário da Casa Legislativa de
Moiporá quando do julgamento das contas do Prefeito com relação ao quórum, mostra-se correta a sentença que declara a sua nulidade.
Ademais, o Ministério Público opinou pela confirmação da sentença.
Ao teor do exposto, conheço da remessa necessária e desprovejo-a para confirmar a sentença de instância primeira.
Éo voto.
Desembargador AMARAL WILSON DE OLIVEIRA
Relator
DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO N. 0184433.84.2016.8.09.0089
COMARCA DE IVOLÂNDIA
AUTOR : NILSON RODRIGUES DA SILVA
RÉU : PODER LEGISLATIVO MUNICIPAL
RELATOR : DES. AMARAL WILSON DE OLIVEIRA
EMENTA. REMESSA NECESSÁRIA. JULGAMENTO DE CONTAS DE PREFEITO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE QUORUM DA CÂMARA LEGISLATIVA. 1 – Para os fins do artigo 1º, inciso I,
alínea g, da Lei Complementar 64/1990, a apreciação das contas de Prefeito, tanto as de governo quanto as de gestão, será exercida pelas Câmaras Municipais, com auxílio dos Tribunais de
Contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de prevalecer por decisão de dois
terços dos vereadores. 2 – No caso dos autos, verificando a ausência do quorum qualificado para o julgamento em sessão da Casa Legislativa, impõe-se a nulidade do Decreto Legislativo
001/2015, editado pela Câmara Municipal de Moiporá, que rejeitou as contas públicas anuais
referentes ao exercício de 2013, período em que o autor era Prefeito daquele Município.
REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDA.
A C Ó R D Ã O
VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos de Duplo Grau de Jurisdição nº
0184433.84.2016.8.09.0089, Comarca de Ivolândia, sendo autor NILSON RODRIGUES DA
SILVA e réu PODER LEGISLATIVO MUNICIPAL.
ACORDAM os componentes da Quarta Turma Julgadora da 2ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade, em conhecer e desprover a Remessa Necessária, nos termos do voto do Relator.
VOTARAM, com o Relator, os Juízes José Carlos de Oliveira (em substituição ao Des. Ney Teles de Paula) e Maurício Porfírio Rosa (em substituição ao Des. Zacarias Neves Coêlho).
PRESIDIU o julgamento o Desembargador Carlos Alberto França.
PRESENTE a Dra. Dilene Carneiro Freire, Procuradora de Justiça.
Goiânia, 07 de novembro de 2017.
Desembargador AMARAL WILSON DE OLIVEIRA
Relator