Inteiro Teor
Superior Tribunal de Justiça Revista Eletrônica de Jurisprudência |
RELATOR | : | MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ |
RECORRENTE | : | ANTÔNIO ALVES DE CARVALHO |
ADVOGADO | : | JASON BARBOSA DE FARIA |
RECORRIDO | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS |
RELATOR | : | MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ |
RECORRENTE | : | ANTÔNIO ALVES DE CARVALHO |
ADVOGADO | : | JASON BARBOSA DE FARIA |
RECORRIDO | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS |
ANTÔNIO ALVES DE CARVALHO interpõe recurso especial, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (Apelação Criminal n. 2005.08.5.006598-7).
Consta dos autos que o recorrente, pronunciado nas penas do art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal (fls. 7-10), foi absolvido pelo Tribunal do Júri. A Corte de origem, ao julgar a apelação criminal do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, cassou o decisum, com fulcro no art. 593, III, d, do Código Penal. Submetido a novo julgamento, sobreveio sentença condenatória, impondo ao réu a pena de 8 anos de reclusão, em regime semiaberto, por violação do art. 121, § 2º, IV, do Código Penal.
A defesa, irresignada com o resultado do novo julgamento, e o assistente de acusação, inconformado com a pena imposta no decreto condenatório, interpuseram apelação criminal. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, à unanimidade, rejeitou as preliminares suscitadas, não conheceu do recurso da defesa e negou provimento ao apelo do assistente de acusação (fls. 1.111-1.141).
O recorrente alega violação do princípio do juiz natural, pois a Turma julgadora foi composta por um desembargador e dois juízes convocados, em um verdadeiro juízo de exceção.
Aduz, também, violação do art. 252, III, do Código de Processo Penal, ao argumento de que é nulo o acórdão proferido nos autos da apelação criminal, haja vista que participou do julgamento do recurso um juiz convocado, impedido de compor o quorum da sessão por haver sido o prolator da decisão de pronúncia.
Registra, ainda, a possibilidade de ser reconhecido o duplo privilégio no homicídio. Argumenta, então, que “a não submissão do quesito referente a homicídio privilegiado sob modalidade de domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima ao Conselho de Sentença constitui nulidade absoluta, haja vista que não foi questionado aos Jurados uma das teses apresentadas pela defesa – conforme se vê na Ata de Julgamento” (fl. 1.160), o que teria violado o art. 564, III, k, do CPP, e divergido da jurisprudência desta Corte. Complementa que “a falta de quesito obrigatório constitui nulidade absoluta nos termos da Súmula n. 156 do Supremo Tribunal Federal.
Por fim, sustenta que o decisum recorrido, ao deixar de conhecer do recurso pelo art. 593, III, d, do CPP, divergiu da Apelação Criminal n. 24826-6⁄213⁄GO, da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.
Ao final, requer o provimento do recurso para ser cassado o acórdão recorrido.
Contrarrazões às fls. 1.292-1.297.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo conhecimento parcial do recurso e, nessa extensão, pelo seu provimento (fls. 1.331-1.344).
I. Admissibilidade
Inicialmente, observo que o recurso especial suplanta o juízo de prelibação, haja vista a ocorrência do necessário prequestionamento, além de estarem presentes os demais pressupostos de admissibilidade do recurso especial (cabimento, legitimidade, interesse, inexistência de fato impeditivo, tempestividade e regularidade formal), razões pelas quais avanço na análise de mérito da controvérsia.
II. Contextualização
Consta dos autos que o recorrente, pronunciado nas penas do art. 121, § 2º, I e IV do Código Penal (fls. 7-10), foi absolvido pelo Tribunal do Júri. O Tribunal de origem, ao julgar a apelação criminal do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, cassou a decisão, com fulcro no art. 593, III, d, do Código Penal. Submetido a novo julgamento, sobreveio sentença condenatória, impondo ao réu a pena de 8 anos de reclusão, em regime semiaberto, por violação do art. 121, § 2º, IV, do Código Penal.
A defesa, irresignada com condenação, e o assistente de acusação, inconformado com a pena imposta no decreto condenatório, interpuseram apelação criminal. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, à unanimidade, rejeitou as preliminares suscitadas pela defesa e não conheceu do recurso da defesa, além de negar provimento ao apelo do assistente de acusação, nos seguintes termos (fls. 1.111-1.141):
III. Juiz Natural – Turma julgadora composta por um desembargador e dois juízes convocados
Afasto, desde já, o conhecimento do recurso especial pela alegada violação ao princípio do juiz natural, pois a matéria é de cunho eminentemente constitucional (art. 5º, XXXVII e LIII da CF⁄88).
Ainda que assim não fosse, saliento que o recorrente não apontou nenhum dispositivo de lei federal tido por violado, apenas indicando a contrariedade ao princípio constitucional do juiz natural, o que impede o conhecimento do recurso.
O Superior Tribunal de Justiça tem a função primordial, por meio do recurso especial, de uniformizar a interpretação e a aplicação do direito federal infraconstitucional. Com isso, o conhecimento do recurso, seja ele interposto pela alínea a ou pela alínea c do permissivo constitucional, exige, necessariamente, a indicação do dispositivo de lei federal que se entende por contrariado.
Assim, a ausência de indicação do dispositivo de lei federal supostamente contrariado na instância ordinária caracteriza deficiência na fundamentação, o que dificulta a compreensão da controvérsia, atraindo a incidência da Súmula n. 284 do Supremo Tribunal Federal:”É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.
Nesse sentido, menciono:
O recorrente alega que”o Juiz de Direito convocado Cesar Loyola foi o mesmo que pronunciou o recorrente”(fl. 1.156), motivo pelo qual não poderia participar do quorum para o julgamento da apelação, porque estaria impedido, nos termos do art. 252, III, do Código de Processo Penal.
Da análise dos autos, observo que o Tribunal a quo não apreciou, nem sequer implicitamente, a nulidade suscitada neste recurso.
Com efeito, a defesa, quando intimada do julgamento da apelação, não opôs embargos declaratórios para postular a anulação do acórdão proferido. Em vez disso, interpôs, diretamente, o recurso que ora se analisa.
Assim, constato a ausência de prequestionamento da matéria, o que atrai a incidência das Súmulas n. 282 e 356 do STF. Nesse sentido:
De qualquer sorte, muito embora reconheça manifesta ilegalidade na participação do Desembargador Cesar Loyola no julgamento da apelação criminal – à época Juiz convocado para compor quorum do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, pois efetivamente atuou nos autos da ação penal, em primeira instância, prolatando, inclusive, a decisão de pronúncia. –, não entendo ser necessária a cassação do referido decisum.
Com efeito, este Superior Tribunal possui o entendimento de que o impedimento de magistrado no julgamento colegiado, ainda que capaz de promover a nulidade de seu voto, como na hipótese, não é suficiente para, por si só, acarretar a nulidade do julgado, quando evidenciado que a sua participação no julgamento do recurso não foi decisiva para o resultado.
Nesse sentido, colaciono o seguinte precedente:
Ainda, menciono o seguinte julgado, que trata de hipótese praticamente idêntica, em que a Corte Especial deste Superior Tribunal decidiu:
Assim, uma vez que, no caso, o decisum impugnado foi unânime, dúvidas não há de que a declaração de nulidade do voto proferido pelo Juiz convocado Cesar Loyola não implicaria alteração do resultado do julgamento, de modo que não vejo como reconhecer a alegada nulidade do acórdão proferido na apelação criminal.
Em outros termos, ainda que retirado o voto do Juiz convocado do julgamento da apelação, o resultado do decisum seria o mesmo porquanto o julgamento foi unânime.
IV. Violação do art. 564, III, k, do CPP, e divergência jurisprudencial – falta de quesito obrigatório
Dispõe o art. 564, III, k, do Código de Processo Penal que:
O recorrente considera que é perfeitamente possível a existência de homicídio duplamente privilegiado e, assim, alega a ocorrência de nulidade absoluta do julgamento porque, ao ser respondido afirmativamente o quesito anterior, referente ao crime cometido por motivo de relevante valor moral, não poderia ter sido interrompida a quesitação em relação a outra tese apresentada pela defesa, qual seja, homicídio privilegiado sob modalidade de domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima.
Com efeito, verifico que não houve nenhuma impugnação da defesa na ata de julgamento a respeito de quesito obrigatório (fl. 956-957), o que torna preclusa a irresignação do recorrente.
Nesse sentido:
Ademais, como bem ressaltado pelo Tribunal de origem, o réu foi beneficiado com a redução máxima, por força do reconhecimento do privilégio relativo à prática do crime cometido por motivo de relevante valor moral, o que afasta a hipótese de haver sofrido prejuízo.
Em matéria de nulidade, rege o princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual não há nulidade sem que o ato tenha gerado prejuízo para a acusação ou para a defesa. Não se prestigia, portanto, a forma pela forma, mas o fim atingido pelo ato. Por essa razão, a desobediência às formalidades estabelecidas na legislação processual penal só poderá acarretar o reconhecimento da invalidade do ato quando a sua finalidade estiver comprometida, em prejuízo às partes da relação processual.
Assim, agiu com acerto o Tribunal de origem, ao afastar a preliminar de nulidade com base nesses fundamentos, o que atrai a incidência, na espécie, da Súmula n. 83 do STJ, in verbis:”Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.”
Registro, ainda, que a aplicação do óbice da Súmula n. 83 do STJ alcança ambas as alíneas do permissivo constitucional. Nesse sentido, menciono o seguinte julgado:” […] A consonância do acórdão recorrido com o entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, atrai a incidência do verbete sumular n. 83⁄STJ, aplicável pelas alíneas a e c do permissivo constitucional. […]”(AgRg no REsp n. 1.215.547⁄PR, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, 5ª T., DJe 11⁄10⁄2012).
V. Segunda apelação pelo mesmo fundamento de decisão manifestamente contrária à prova dos autos
O art. 593, III, d, § 3º, do Código de Processo Penal dispõe que:
É vedado expressamente, portanto, a admissão de nova apelação contra o veredicto popular que se funda em idêntico fundamento que promoveu a anulação anterior, de modo a evitar a prorrogação infindável do litígio, pela reiterada interposição de recurso.
Com efeito, esta Corte entende que” a proibição prevista no referido dispositivo é absoluta e representa verdadeiro pressuposto recursal negativo objetivo, inserido na legislação processual penal pátria com a importante missão de preservar os veredictos do júri e impedir que os litígios se eternizem, pela reiterada interposição de recursos”(AgRg no AREsp n. 317.372⁄PR, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, 5ª T., DJe 14⁄8⁄2014).
Assim, ainda que interposta pela outra parte, com teses, por certo, diferentes, fundando-se a segunda apelação na mesma alínea – decisão manifestamente contrária à prova dos autos (art. 593, III, d, do CPP)–, o segundo recurso encontra óbice no art. 593, § 3º, do Código de Processo Penal.
Nesse sentido:
Dessa forma, verifico que o Tribunal de origem, ao concluir pelo não conhecimento da segunda apelação fundamentada em decisão manifestamente contrária à prova dos autos, decidiu em consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, incidindo, também, o enunciado da Súmula n. 83 do STJ acima mencionado.
VI. Dispositivo
À vista do exposto, conheço parcialmente do recurso especial e, nessa extensão, nego-lhe provimento.
Número Registro: 2009⁄0011156-2 | PROCESSO ELETRÔNICO |
REsp 1.111.241 ⁄ DF |
MATÉRIA CRIMINAL |
PAUTA: 30⁄06⁄2016 | JULGADO: 30⁄06⁄2016 |
RECORRENTE | : | ANTÔNIO ALVES DE CARVALHO |
ADVOGADO | : | JASON BARBOSA DE FARIA |
RECORRIDO | : | MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS |
CORRÉU | : | JOSÉ HILDO MENDES DA SILVA |
CORRÉU | : | JOSÉ LUCIANO RODRIGUES MATIAS |
Documento: 1524515 | Inteiro Teor do Acórdão | – DJe: 01/08/2016 |