Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2020.0000066187
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2249116-93.2019.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante MANOEL EDILBERTO FERNANDES MODESTO, é agravado CONDOMÍNIO EDIFÍCIO VILLE CAP FERRAT.
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 35ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores ARTUR MARQUES (Presidente sem voto), MORAIS PUCCI E FLAVIO ABRAMOVICI.
São Paulo, 5 de fevereiro de 2020.
GILBERTO LEME
Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Agravo de instrumento n.º 2249116-93.2019.8.26.0000
Comarca: São Paulo
Agravante: Manoel Edilberto Fernandes Modesto
Agravado: Condomínio Edifício Ville Cap Ferrat
TUTELA DE URGÊNCIA. PRETENSÃO DE QUE O AGRAVADO SEJA OBRIGADO A REALIZAR OBRA NA FACHADA DO EDIFÍCIO DE FORMA A SANAR OS PROBLEMAS DE INFILTRAÇÃO QUE ATINGEM A UNIDADE DO DEMANDANTE. ASSEMBLEIA DE CONDOMÍNIO APROVOU A REALIZAÇÃO DAS OBRAS. INFILTRAÇÃO QUE ATINGE OUTRAS UNIDADES DO CONDOMÍNIO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM O PERIGO DE DANO OU O RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO ANTES DA APRESENTAÇÃO DO CONTRADITÓRIO. ART. 294 C.C. ART. 300 DO NCPC. DECISÃO MANTIDA. Segundo o disposto no artigo 294 do novo Código de Processo Civil a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência, registrando o artigo 300 do mesmo diploma legal que a tutela provisória será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou ao resultado útil do processo. Não evidenciada a urgência e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, para a concessão da tutela antes da apresentação do contraditório, de rigor a manutenção do seu indeferimento.
Recurso desprovido.
VOTO N.º 25.030
Trata-se de recurso de agravo de
instrumento interposto à r. decisão que em ação de obrigação
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de fazer c.c. reparação de danos materiais e morais ajuizada contra o condomínio, indeferiu a tutela de urgência por entender que não estão presentes os requisitos para a concessão antes da apresentação do contraditório.
O agravante alega que a infiltração na suíte máster do imóvel proveniente da fachada do edifício já atingiu a outra suíte, sendo de conhecimento da síndica, que desde março deste ano nenhuma providência tomou para sanar o problema. Destaca que conforme laudo de engenharia as infiltrações são causadas por vazamentos provenientes da fachada do edifício, de responsabilidade do condomínio. Afirma que as paredes e teto do apartamento estão estufados. Frisa que o imóvel está à venda ou locação, sendo impossível alguém se interessar por um apartamento de alto padrão nessa situação. Pugna pela concessão da antecipação de tutela de urgência para determinar ao agravado o imediato estancamento das infiltrações, realização de obra de impermeabilização e todos os reparos devidos na fachada do prédio, assim como no interior do seu imóvel.
Agravo tempestivo, recebido sem a concessão do efeito ativo e remetido diretamente para julgamento virtual em razão de o agravado ainda não ter sido citado.
É o relatório.
O atual Código de Processo Civil, em atenção à construção doutrinária já consagrada, previu duas espécies do gênero tutela provisória, a de urgência e de
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evidência (art. 294). A primeira, destinada a eliminar o perigo de dano grave e de difícil reparação, à qual denominouse tutela de urgência. Para obtê-la, necessária a demonstração do motivo capaz de comprometer a efetividade da tutela final e definitiva (periculum in mora), além da verossimilhança do direito alegado (fumus boni iuris), registrando o art. 300 do mesmo diploma legal que a tutela será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, permitindo o § 2º desta última disposição que a medida pode ser deferida liminarmente.
Para a concessão da tutela de urgência pretendida, destinada a eliminar o perigo de dano grave e de difícil reparação, necessária a demonstração do motivo capaz de comprometer a efetividade da tutela final e definitiva (periculum in mora), além da verossimilhança do direito alegado (fumus boni iuris). Assim, o pedido da tutela deve se fundar na ocorrência de perigo e plausibilidade do direito.
Pois bem. No caso em tela, o agravante alega, em síntese, que desde março, ou seja, há 7 meses, está sofrendo com infiltração no interior de seu apartamento, proveniente da fachada do edifício. Ressalta que a síndica está ciente da situação que piora a cada dia, mas nenhuma providência efetiva foi tomada.
Pretende a concessão da tutela de urgência consistente na realização de obras na fachada do prédio para sanar de imediato o problema de infiltração,
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assim como a reparar o seu imóvel danificado, com manchas de umidade pelo teto e paredes.
Cabe ressaltar que conforme troca de e.mails entre o agravante e o condomínio, ficou evidenciado que o referido problema de infiltração não atinge apenas a unidade do agravante, mas também outras do edifício, razão pela qual foi aprovada em assembleia, realizada em 6.8.19, o refazimento da fachada.
É certo que assiste direito ao proprietário do imóvel de sanar os problemas advindos de infiltração da parte externa do edifício. Contudo, considerando que o problema atinge outras unidades do condomínio, a questão não deve ser resolvida de forma individual, o que está evidenciado pelos documentos acostados com a petição inicial da ação principal, demonstrando que o réu está diligenciando no sentido de resolver a situação em todas as unidades afetadas.
A assembleia foi realizada em 6 de agosto, sendo certo que por ser uma obra de grande vulto, enseja a contratação de empresa especializada, cujo processo já foi iniciado pelo condomínio que conforme informado na contra notificação enviada ao agravante, possui dinheiro em caixa para a execução da obra (fl. 55).
Todavia, não basta para a concessão da tutela apenas a probabilidade do direito se não houver a urgência indicada no artigo 294 do NCPC e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, previsto no artigo 300
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do mesmo diploma legal, os quais efetivamente não se encontram presentes no caso concreto.
A concessão da tutela antecipada reclama alguns pressupostos: prova inequívoca que confira verossimilhança às alegações do requerente, ou seja, prova segura que revele uma certeza a respeito da existência do direito alegado; fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação e inexistência de perigo de irreversibilidade do provimento pleiteado. Ausentes tais pressupostos ou algum deles, inviabiliza-se a antecipação da tutela.
Com efeito, a providência antecipa os efeitos da tutela final como se estivesse ela sendo concedida no limiar do processo ou em outro momento que não o apropriado, daí a necessidade, em função do princípio da bilateralidade da audiência, constitucionalmente consagrado, de ensejar-se à parte adversa que se manifeste sobre aquilo que poderá vir a prejudicá-la.
“Embora admissível a antecipação antes de o réu integrar o contraditório, tal solução adverte JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS BEDAQUE – mostra-se absolutamente excepcional, pois o juiz terá, como elementos de informação, apenas a visão unilateral do fenômeno apresentada pelo autor.” (Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias e de Urgência, pág. 400, Malheiros, 2009).
No mesmo sentido: JOÃO BATISTA LOPES [Tutela Antecipada no processo civil brasileiro, n.º 3.8,
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pág. 120, e n.º 5.7, pág. 175 (referente ao art. 461, § 3.º), entendendo sempre possível, porém, a concessão inaudita altera parte em casos especiais n.º 3.8, pág. 120, e n.º 5.7, pág. 176], LUIZ GUILHERME MARINONI (Antecipação da Tutela, n.º 4.7.1, pág. 158, RT, 2009), SÉRGIO BERMUDES (A Reforma do Código de Processo Civil, n.º 3, pág. 36, Freitas Bastos, 1995), BRUNO VASCONCELOS CARRILHO LOPES (Tutela Antecipada Sancionatória, n.º 19, págs. 82/83, Malheiros, 2006), MARCUS VINICIUS RIOS GONÇALVES (Novo Curso de Direito Processual Civil, vol. 1, págs. 298/299, Saraiva, 2011), ALEXANDRE FREITAS CÂMARA (Lições de Direito Processual Civil, vol. I, pág. 476, Lumen Juris Ed., 2010), HUMBERTO THEODORO JÚNIOR (Curso de Direito Processual Civil, vol. II, n.º 1.188-i, págs. 671/672, Forense, 2009) e J. J. CALMON DE PASSOS (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. III, n.º 7.5, pág. 83, Forense, 2004).
O juízo de verossimilhança não compreende apenas a aparência de veracidade dos fatos, fazendo-se necessário que haja prova, cujo grau de convencimento permita um juízo seguro acerca do direito invocado.
No caso, a decisão agravada indeferiu apenas por ora a tutela provisória de urgência, podendo ser o pedido novamente analisado dependendo da defesa a ser apresentada pelo agravado.
Entretanto, conquanto os documentos, em tese, comprovem o direito do pedido do agravante, por ora não são suficientes para vislumbrar receio de dano irreparável ou de difícil reparação a ensejar a concessão da tutela de
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urgência, mormente considerando que é exatamente o pedido
final a ser concedido desde logo e que segundo informações do
condomínio as medidas já estão sendo tomadas para sanar os
problemas de todas as unidades atingidas pela infiltração.
Portanto, não se legitima, por ora, o deferimento da tutela
antecipada.
Dessa forma, em um juízo de cognição
sumária, não entrevejo urgência na medida pretendida, sem que
seja, no mínimo, apresentado o contraditório.
No mesmo sentido, confiram-se julgados
dessa col. Corte:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO – DIREITO DE VIZINHANÇA – VAZAMENTOS NO APARTAMENTO DO AUTOR – OBRIGAÇÃO DE FAZER TUTELA ANTECIPADA IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA DADA A UNILATERALIDADE DO LAUDO JUNTADO PELO AGRAVANTE
INSTAURAÇÃO DO CONTRADITÓRIO NECESSIDADE DECISÃO
MANTIDA.” (Agravo de Instrumento n.º
2078314-38.2014.8.26.0000, Rel. Des. Jayme Queiroz Lopes, 36ª Câmara de Direito Privado, j. 5.6.2014)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO DIREITO DE VIZINHANÇA – AÇÃO DE
OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM ANTECIPAÇÃO DA TUTELA -AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS PARA A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA -NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE LAUDO PERICIAL SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO – AGRAVO NÃO PROVIDO.” (Agravo de Instrumento n.º 2059308-79.2013.8.26.0000, Rel. Des. Luiz Eurico, 33.ª Câmara de Direito Privado, j. 17.3.2014)
Ademais, após a contestação, com maiores
elementos fáticos, poderá o juiz reexaminar, se for o caso,
novo pedido de antecipação de tutela.
Por fim, “A simples demora na solução da
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demanda não pode, de modo genérico, ser considerada como caracterização da existência de fundados receio de dano irreparável ou de difícil reparação, salvo em situações excepcionalíssimas” (STJ, Resp 113.368-PR, 1.ª T., rel. Min. José Delgado, j. 7.4.97, deram provimento ao recurso, v.u. DJU 19.5.97, p. 20.593)
Pelo meu voto, pois, nego provimento ao agravo.
GILBERTO LEME
Relator