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Inteiro Teor
RELATOR
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FERNANDO QUADROS DA SILVA
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APELANTE
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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF
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MARCO ANTONIO DA SILVA STANCK
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JAQUELINE SILVEIRA DE SOUZA
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ADVOGADO
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OTAVIANO APOLINARIO VIANA
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INTERESSADO
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CALCULUS PROJETOS E CONSTRUCOES LTDA
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ADVOGADO
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Fabio Sadi Casagrande
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EMENTA
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA. SFH. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL POPULAR. PARALISAÇÃO DAS OBRAS. RESPONSABILIDADE DA CEF E DA CONSTRUTORA/ ENTIDADE ORGANIZADORA. DANO MATERIAL E MORAL.
1. Nos casos de contrato celebrado entre o mutuário e o agente financeiro e que tem como objeto a disponibilização de empréstimo em dinheiro para a construção ou a aquisição de imóvel e a constituição de garantia sobre o respectivo bem, tenho entendido que a CEF não deve este responder por eventuais danos no imóvel, decorrentes de vícios construtivos.
2. No caso dos autos, no entanto, a controvérsia gira em torno da indenização pelo atraso na entrega do imóvel, cuja obra foi financiada em caráter associativo pela empresa pública no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação. Como visto, se trata de situação essencialmente diversa, que não se confunde com a alegação de vícios construtivos.
3. No caso em comento, de acordo com a previsão expressa do contrato celebrado entre as partes (inclusive a ré CALCULUS PROJETOS E CONSTRUÇÕES LTDA na qualidade de Construtora e Entidade Organizadora), esta detém a responsabilidade sobre a execução e a conclusão das obras.
4. A função do agente financeiro de aferir a regularidade fiscal e financeira da construtora ou da entidade organizadora do empreendimento, assim como as medições regulares, não o transforma, por si só, em único responsável por eventual prejuízo causado ao mutuário.
5. No caso, restou devidamente configurada a culpa da ré CALCULUS na modalidade imperícia (pois não teve capacidade técnica para bem conduzir as obras) e negligência (já que abandonou o empreendimento).
6. Além disso, resta configurada a responsabilidade da CEF (na condição de gestora do programa habitacional), por inexplicavelmente postergar por longo tempo a substituição da construtora – o que era obrigada a fazer caso a obra não fosse concluída no prazo fixado, de acordo com as disposições contratuais.
7. Nessa equação, ambas as rés (CEF e CALCULUS) devem responder pelos danos materiais e morais verificados em razão do descumprimento contratual consistente no atraso na entrega do imóvel, na proporção de metade cada uma.
8. É assente na jurisprudência que o dano moral decorrente do abalo gerado pela impossibilidade de usufruir de imóvel adquirido é conhecido pela experiência comum e considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de setembro de 2016.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8520978v3 e, se solicitado, do código CRC 380B473E. | |
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RELATOR
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FERNANDO QUADROS DA SILVA
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APELANTE
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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF
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MARCO ANTONIO DA SILVA STANCK
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JAQUELINE SILVEIRA DE SOUZA
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ADVOGADO
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OTAVIANO APOLINARIO VIANA
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CALCULUS PROJETOS E CONSTRUCOES LTDA
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Fabio Sadi Casagrande
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RELATÓRIO
MARCO ANTONIO DA SILVA STANCK e JAQUELINE SILVEIRA DE SOUZA ajuizaram ação ordinária em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF e CALCULUS PROJETOS E CONSTRUÇÕES LTDA, objetivando a indenização por danos materiais e morais decorrentes de atraso na entrega de imóvel adquirido por meio de mútuo celebrado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação.
Instruído o feito, sobreveio sentença nos seguintes termos:
Ante o exposto:
a) reconheço a inépcia da petição inicial relativamente à pretensão de condenação ao pagamento de multa de 10% (dez por cento), e EXTINGO O PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO no tocante a tal pleito, nos termos dos artigos 267, I, e 295, I, ambos do Código de Processo Civil;
b) afasto a preliminar de ilegitimidade passiva argüida pela Caixa Econômica Federal e, no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para condenar solidariamente as rés Calculus Projetos e Construções Ltda. e Caixa Econômica Federal ao pagamento de indenização pelos danos materiais, correspondentes aos alugueres despendidos pela parte autora entre maio de 2010 e maio de 2014, respeitada a prescrição, nos termos da fundamentação, e à devolução dos valores cobrados dos autores a título de prêmio de seguro DFI, até a data em que o imóvel foi entregue, tudo devidamente atualizado, e também pelos danos morais experimentados, que fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais), na forma da fundamentação, acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento), a partir da citação e correção monetária a contar do arbitramento da indenização; e extingo o processo com julgamento do mérito, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil.
Considerando que os autores decaíram de parte mínima do pedido, condeno as rés em rateio ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, com base no art. 21, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
Apela a CEF. Em suas razões, defende sua ilegitimidade passiva e a ausência de responsabilidade pelo atraso e paralisação das obras. Aponta que tanto o termo de cooperação firmado com a entidade organizadora quanto o contrato de mútuo celebrado com a autora preveem a responsabilidade exclusiva da construtora pela execução e conclusão das obras. Assevera a inocorrência de dano material ou moral, bem como a inexistência de ato ilícito a si imputável para justificar a sua condenação. Afirma que cumpriu com sua obrigação de substituir a construtora, acionando a seguradora para promover a conclusão da obra. Por fim, afirma a inexistência de previsão de responsabilidade solidária ao caso.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório. Peço dia.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8520976v3 e, se solicitado, do código CRC A1CC5CEA. | |
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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF
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MARCO ANTONIO DA SILVA STANCK
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JAQUELINE SILVEIRA DE SOUZA
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Fabio Sadi Casagrande
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VOTO
(I) legitimidade passiva da CEF
Nos casos de contrato celebrado entre o mutuário e o agente financeiro e que tem como objeto a disponibilização de empréstimo em dinheiro para a construção ou a aquisição de imóvel e a constituição de garantia sobre o respectivo bem, tenho entendido que a CEF não deve este responder por eventuais danos no imóvel, decorrentes de vícios construtivos.
É o que mostra o precedente desta Turma:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SFH. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. Tendo como objeto o contrato de mútuo firmado entre o mutuário/comprador e o agente financeiro (no caso a Caixa Econômica Federal) tão somente a disponibilização de empréstimo em dinheiro para a construção de imóvel, bem como a constituição de hipoteca sobre o respectivo bem, não deve este responder por eventuais vícios construtivos.
– AC 2007.71.18.000095-0, 3ª Turma, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, D.E. 10/01/2012
No caso dos autos, no entanto, a controvérsia gira em torno da indenização pelo atraso na entrega do imóvel, cuja obra foi financiada em caráter associativo pela empresa pública no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, com a utilização de recursos do FGTS. Como visto, se trata de situação essencialmente diversa, que não se confunde com a alegação de vícios construtivos.
Ora, se a empresa pública financiou a obra, sendo responsável pela liberação dos valores, é possível sim que tenha sido responsável pelo atraso na entrega do imóvel. Nesse sentido:
SFH. CEF. LEGITIMIDADE. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA.
1. Nas ações que visam à resolução do contrato e à indenização por danos materias e morais por vícios de construção ou atraso na entrega da obra, a legitimidade passiva da CEF é excepcional.
2. A Caixa Econômica Federal, em que pese não seja a responsável imediata pelo atraso da entrega do imóvel, é a responsável mediada, em tese, agindo por omissão na fiscalização do andamento da obra e liberação de valores.
3. Sendo assim, a CEF deve ser mantida no polo passivo da ação para apuração de eventual responsabilidade da instituição financeira.
– AG 5026331-91.2014.404.0000, Terceira Turma, Relatora Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 30/04/2015
Bem por isso, não merece provimento a apelação no ponto.
Atraso na entrega do imóvel – responsabilidade
Em suas razões de recurso, a CEF afirma que a responsabilidade pela paralisação das obras é exclusivamente da entidade organizadora, de acordo com o contrato celebrado.
Quanto ao tema, é bem verdade que a empresa pública, na condição de responsável pela implementação de plano governamental de habitação popular, é quem seleciona e aprova a entidade organizadora do empreendimento. No entanto, este simples fato não se mostra suficiente para a responsabilização do agente financeiro como garantidor universal.
É este o entendimento manifestado por esta Turma em julgados recentes em situações símiles. Nos autos da AC nº 5008797-19.2010.404.7100/RS, a eminente Desembargadora Marga Inge Barth Tessler proferiu voto-vista, no qual examina muito criteriosamente a situação do Condomínio Delta do Jacuí (que também sofreu atrasos e teve as obras paralisadas). É teor do voto, cujos fundamentos adoto como razões de decidir:
O negócio entabulado entre as partes é complexo. Temos a CEF como mutuante e executando a política habitacional, com linha de crédito coletivo com recursos do FGTS para o financiamento e produção de unidades habitacionais e produção de lotes urbanizados, vinculado a Programa de Carta de Crédito Associativo com financiamento direto às pessoas físicas, mas representadas nos atos negociais por sindicatos, cooperativas, pessoas jurídicas voltadas à produção de habitações em estados e municípios. O programa em questão destina-se a fornecer a baixo custo moradias para a população carente de moradia. Está regrado pelo Conselho Curador do FGTS, pela Resolução nº 460/518, cabendo à CEF, como principal agente financeiro para a política habitacional formalizar os termos da Cooperação e Parceria, acolhendo os projetos apresentados pelas entidades antes mencionadas e empreendedoras nos termos da Resolução em epígrafe.
Depreende-se que as entidades – Cooperativa e Construtor – em resumo estavam regularmente constituídas, tinham formalmente capacidade de pagamento e situação regular diante dos órgãos públicos (INSS, Receita Federal, etc.). No caso concreto, pelo menos de maneira formal, a cooperativa SIMACOOP e construtora escolhida por ela cumpriam os requisitos formais. Examinando a prova produzida nos autos, não caberia à CEF fazer outras exigências que não as legalmente estabelecidas, e foi o que ocorreu. Formalizado o negócio sim, sob a chancela da CEF, que cumpriu, no caso concreto, a sua parte, isto é, foi liberando os valores, segundo o cronograma estabelecido mediante vistoria. No caso concreto, a Construtora Coserge (Cooperativa de Serviços Gerais Coserge Ltda.) paralisou as obras. Embora a comprovação formal de idoneidade técnica e financeira, na prática estes requisitos não se confirmaram. Foi a SIMACOOP quem selecionou e a Construtora Coserge faliu. Nos autos da Apelação Cível nº 5061267-56.2012.404.7100/RS, resta bem claro pelo depoimento do Gerente Regional da Construção Civil da CEF, que o SIMACOOP deu causa à paralisação da obra e “entregou as chaves do empreendimento” (evento 61, vídeo 2, tempo 6:02 até 9:13) para a CEF. Isto se teria dado em maio de 2012. Ressalta-se que a CEF tomou a iniciativa de regularizar o andamento da obra, fazendo licitação para contratação de emergência. Não é fácil tocar obra abandonada.
(…)
Assim, pela prova produzida, o SIMACOOP é a principal responsável pelo insucesso do empreendimento, até porque o abandonou. Pelo contrato estabelecido que se quer rescindir (e nota-se que se postulou apenas a rescisão do mútuo e não de todo o contrato complexo, inclusive com compra e venda de terrenos pelo SIMACOOP (garantia do mútuo) deve ser observada a Cláusula Quinta do TERMO DE COOPERAÇÃO E PARCERIA ENTRE SI FAZEM A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL E A (O) SIMACOOP – SISTEMA MULTIPLICADOR DE HABITAÇÃO COOPERATIVA LTDA (ENTIDADE ORGANIZADORA), PARA VIABILIZAR O PROGRAMA CARTA DE CRÉDITO FGTS – OPERAÇÕES COLETIVAS, que vai abaixo transcrita, em especial, as letras h, i, y, “bb”, que deixam à evidência que a responsabilidade pela entrega do empreendimento construído é do SIMACOOP que descumpriu rasamente o acordado.
De fato, no caso dos autos o ‘Contrato por Instrumento Particular de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional com Fiança, Alienação Fiduciária em Garantia e Outras Obrigações – Pessoa Física – Recurso FGTS’, celebrado entre os autores, a CEF (na qualidade de mutuante) e a ré CALCULUS PROJETOS E CONSTRUÇÕES LTDA (na condição de Entidade Organizadora e Construtora), prevê (evento 1 – CONTR6):
CLÁUSULA NONA – DECLARAÇÕES E ATRIBUIÇÕES
Parágrafo Segundo – Declara a INTERVENIENTE CONSTRUTORA, expressamente, que:
(…)
m) responderá pela segurança e solidez da construção, bem como pelos requisitos técnicos indispensáveis ao bom andamento das obras;
n) não se opõe à sua substituição, se este for julgada necessária;
o) executará as obras mencionadas, de acordo com o projeto apresentado, parte integrante do presente contrato, não sendo permitida a subempreitada das mesmas;
p) sem prejuízo das obrigações impostas pela legislação civil, compromete-se a atender prontamente quaisquer reclamações dos proprietários do imóvel, decorrente de vícios de construção devidamente comprovados, sob pena de ser considerado inidôneo para firmar novos contratos com a CEF.
Como visto, a solução da controvérsia passa necessariamente pela responsabilidade prevista contratualmente. Tendo em conta que nosso ordenamento jurídico adota a teoria da responsabilidade objetiva com temperamentos, o órgão público pode eximir-se da responsabilidade se comprovar a culpa concorrente ou exclusiva de terceiros. No caso em comento, sem sombra de dúvida, restou comprovada a culpa da Construtora/Entidade Organizadora CALCULUS por imperícia (pois não teve capacidade técnica para bem conduzir as obras) e negligência (já que abandonou o empreendimento).
No entanto, o mesmo contrato prevê em sua cláusula décima (evento 1 – CONTR6):
CLÁUSULA DÉCIMA – DA SUBSTITUIÇÃO DA INTERVENIENTE CONSTRUTORA – A INTERVENIENTE CONSTRUTORA será substituída por quaisquer dos motivos previstos em lei e, ainda:
(…)
f) não for concluída a obra, objeto deste financiamento, dentro do prazo contratual;
g) ocorrer retardamento ou paralisação da obra, por período igual ou superior a 30 dias, sem motivo comprovadamente justificado e aceito pela CEF;
No caso em comento, o contrato foi celebrado em 07/11/08, com previsão de prazo de construção de 18 meses – ou seja, o imóvel deveria estar pronto em 07/05/10. Apesar disso, somente em julho de 2011 é que a CEF providenciou a notificação extrajudicial da construtora e a ativação do seguro para a conclusão da obra (evento 8 – OFIC7) – ou seja, mais de um ano após o decurso do prazo de construção do imóvel.
Ora, ainda que tenha havido imperícia e negligência da construtora/entidade organizadora, a verdade é que também houve negligência por parte da CEF, que inexplicavelmente postergou por mais de um ano a substituição da construtora – o que era obrigada contratualmente a fazer no prazo de 30 dias.
É este o entendimento manifestado por esta Corte em casos símiles:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA. SFH. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL POPULAR. PARALISAÇÃO DAS OBRAS. RESPONSABILIDADE DA CEF E DA CONSTRUTORA/ ENTIDADE ORGANIZADORA. DANO MATERIAL E MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
1. Nos casos de contrato celebrado entre o mutuário e o agente financeiro e que tem como objeto a disponibilização de empréstimo em dinheiro para a construção ou a aquisição de imóvel e a constituição de garantia sobre o respectivo bem, tenho entendido que a CEF não deve este responder por eventuais danos no imóvel, decorrentes de vícios construtivos.
2. No caso dos autos, no entanto, a controvérsia gira em torno da indenização pelo atraso na entrega do imóvel, cuja obra foi financiada em caráter associativo pela empresa pública no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação. Como visto, se trata de situação essencialmente diversa, que não se confunde com a alegação de vícios construtivos.
3. No caso em comento, de acordo com a previsão expressa do contrato celebrado entre as partes (inclusive a ré CALCULUS PROJETOS E CONSTRUÇÕES LTDA na qualidade de Construtora e Entidade Organizadora), esta detém a responsabilidade sobre a execução e a conclusão das obras.
4. A função do agente financeiro de aferir a regularidade fiscal e financeira da construtora ou da entidade organizadora do empreendimento, assim como as medições regulares, não o transforma, por si só, em único responsável por eventual prejuízo causado ao mutuário.
5. No caso, restou devidamente configurada a culpa da ré CALCULUS na modalidade imperícia (pois não teve capacidade técnica para bem conduzir as obras) e negligência (já que abandonou o empreendimento).
6. Além disso, resta configurada a responsabilidade da CEF (na condição de gestora do programa habitacional), por inexplicavelmente postergar por longo tempo a substituição da construtora – o que era obrigada a fazer caso a obra não fosse concluída no prazo fixado, de acordo com as disposições contratuais.
7. Nessa equação, ambas as rés (CEF e CALCULUS) devem responder pelos danos materiais e morais verificados em razão do descumprimento contratual consistente no atraso na entrega do imóvel, na proporção de metade cada uma.8
. É assente na jurisprudência que o dano moral decorrente do abalo gerado pela impossibilidade de usufruir de imóvel adquirido é conhecido pela experiência comum e considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato.
9. O quantum debeatur a ser pago a título de indenização deve observar o caráter punitivo e ressarcitório da reparação do dano moral. De outra banda, deve também evitar o enriquecimento ilícito, observadas as circunstâncias do caso e atendendo aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
– APELAÇÃO CÍVEL Nº 5017603-63.2012.404.7200, 3ª TURMA, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 26/11/2015
ADMINISTRATIVO. SFH. ATRASO ENTREGA DA OBRA. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESCISÃO DOS CONTRATOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS
1. Havendo discussão acerca das obrigações contratuais assumidas pela CEF, é a CEF parte legítima para figurar no pólo passivo da ação.
2. Restando comprovada a omissão culposa por parte da CEF na adoção das medidas necessárias à retomada da construção, razão pela qual está configurado o dever de indenizar, nos termos do Código Civil.
3. A demora na entrega da unidade habitacional, uma vez decorrente também da omissão da CEF em fiscalizar a obra e adotar as medidas necessárias à sua conclusão, indica responsabilidade da Caixa no pagamento de danos materiais para os autores.
– AC 5010318-19.2012.404.7200, Quarta Turma, Relatora Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 27/08/2015
FINANCIAMENTO HABITACIONAL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. LEGITIMIDADE PASSIVA – CEF.
A CEF tem legitimidade passiva em ação que trata do pedido de indenização por danos morais e materiais (inclusive a compensação de valores pagos entre a data prevista para a entrega do imóvel e a entrega das chaves, para amortização do saldo devedor), decorrentes de atraso na entrega de obra, porque sua responsabilidade está disciplinada no contrato de mútuo, inclusive a hipótese de omissão culposa na adoção das medidas necessárias à retomada da construção.
– AC 5017895-77.2014.404.7200, Quarta Turma, Relator Luís Alberto D’azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 14/04/2015
Nessa equação, por tudo o que foi exposto, tenho que ambas as rés (CEF e CALCULUS) são responsáveis pelo descumprimento contratual, consistente no atraso na entrega do imóvel financiado, motivo pelo qual ambas as rés devem arcar com a indenização pelos danos materiais e morais, na proporção de metade cada uma.
Cumpre ressaltar que de acordo com o Código Civil a solidariedade não pode ser presumida:
Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda.
Art. 265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.
No caso em comento, não há qualquer disposição (legal ou contratual) que determine que a obrigação de conclusão das obras no prazo contratado é solidária. Em razão disso, merece parcial provimento o apelo da CEF no ponto, para determinar que ambas as rés devem arcar com a indenização pelos danos materiais e morais, na proporção de metade cada uma.
Vale o registro, no ponto, de que a matéria referente à responsabilidade pela indenização dos danos material e moral foi devolvida ao Tribunal no contexto da apelação da Caixa Econômica Federal, que propugna pelo afastamento da sua responsabilização no caso, atribuindo-a à CALCULUS. Ou seja, o reconhecimento da condenação da ré CALCULUS decorre diretamente do parcial acolhimento da apelação da CEF.
A parte autora, por sua vez, que teve sentença de procedência relativamente ao seu pedido de indenização por danos materiais e morais, carecia de interesse recursal para pretender que a condenação fosse redirecionada para o outro réu. Assim, a presente decisão não desborda os limites do que foi trazido ao conhecimento desta Corte.
Danos materiais
No que diz com os danos materiais, ressalto que a parte autora comprovou as despesas tidas com o aluguel (evento 1 – CONTR12). E mais: ainda que assim não fosse, é de se concluir que o atraso na entrega do imóvel traz prejuízos aos compradores, que além de arcar com os encargos da nova moradia (que não foi entregue na data contratada), ainda se vêem obrigados a providenciar uma moradia provisória, pagando aluguel. Cumpre registrar que se trata de moradias destinadas à população de baixa renda – o que permite supor a dificuldade dos compradores em dispor de verbas suficientes para tanto.
Bem por isso, devem as rés CEF e CALCULUS arcar sim com as despesas de aluguel dos mutuários até a efetiva entrega das chaves da residência, assim como fixado em sentença.
Dano moral
Alega a CEF inocorrência de dano moral. Mais uma vez, a alegação não merece guarida.
Ora, indiscutivelmente se verifica a ocorrência de graves transtornos, tendo em vista o longo tempo de indefinição com relação ao negócio envolvendo a moradia da família. Cumpre frisar que, por se tratar de programa governamental destinado à população de baixa renda, presume-se a angústia e a dificuldade causada pela demora na entrega da casa própria, ao mesmo tempo em que o mutuário se encontrava obrigado a cumprir com as prestações assumidas na contratação do mútuo.
Aliás, é assente na jurisprudência que o dano moral decorrente do abalo gerado pela impossibilidade de usufruir de imóvel adquirido como residência é conhecido pela experiência comum e considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato. É o que mostram os seguintes precedentes:
ADMINISTRATIVO. SFH. ATRASO ENTREGA DA OBRA. LEGITIMIDADE PASSIVA – CEF. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CABÍVEL. PAGAMENTO DE ALUGUEL – CONDENAÇÃO. (…)
3. É assente na jurisprudência que o dano moral decorrente do abalo gerado pela impossibilidade de usufruir de imóvel adquirido é conhecido pela experiência comum e considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato.
– AC 5011332-38.2012.404.7200, Terceira Turma, Relator Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 31/07/2014
ADMINISTRATIVO. SFH. ATRASO ENTREGA DA OBRA. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESCISÃO DOS CONTRATOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS (…)
4. É assente na jurisprudência que o dano moral decorrente do abalo gerado pela impossibilidade de usufruir de imóvel adquirido é conhecido pela experiência comum e considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato.
– AC 5010318-19.2012.404.7200, Quarta Turma, Relatora Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 27/08/2015
Nessa equação, não merece reparos a sentença no tocante.
Por fim, registro que o parcial provimento da CEF (somente para o fim de afastar a solidariedade na condenação) não altera a distribuição sucumbencial, que permanece nos termos em que posta na sentença.
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8520977v4 e, se solicitado, do código CRC 50CCCC6E. | |
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Data e Hora: | 14/09/2016 18:59:50 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/09/2016
ORIGEM: SC 50243522820144047200
RELATOR
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:
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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PRESIDENTE
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:
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Marga Inge Barth Tessler
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PROCURADOR
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:
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Dra. Solange Mendes de Souza
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APELANTE
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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF
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APELADO
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MARCO ANTONIO DA SILVA STANCK
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JAQUELINE SILVEIRA DE SOUZA
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ADVOGADO
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OTAVIANO APOLINARIO VIANA
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INTERESSADO
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CALCULUS PROJETOS E CONSTRUCOES LTDA
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ADVOGADO
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Fabio Sadi Casagrande
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Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/09/2016, na seqüência 684, disponibilizada no DE de 25/08/2016, da qual foi intimado (a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o (a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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VOTANTE (S)
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
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Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
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José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
Documento eletrônico assinado por José Oli Ferraz Oliveira, Secretário de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8590171v1 e, se solicitado, do código CRC DFA33846. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | José Oli Ferraz Oliveira |
Data e Hora: | 14/09/2016 20:34 |