Inteiro Teor
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
2ª Câmara Cível
Agravo de Instrumento – Nº 1413775-92.2020.8.12.0000 – Campo Grande
Relator – Exmo. Sr. Des. Marco André Nogueira Hanson
Agravante : Condomínio Residencial Saint Martin
Advogado : Gabriel Gallo Silva (OAB: 19100/MS)
Agravado : Oséias dos Santos Pereira de Oliveira
Advogado : Mayara Hortência Cardoso Gonçalves (OAB: 16323/MS)
Advogado : Ana Claudia Mendes Saliba (OAB: 19757B/MS)
Advogado : Bruno Marques Maia (OAB: 22193/MS)
EMENTA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – TUTELA DE URGÊNCIA EM AÇÃO ANULATÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER – SUSPENSÃO/PARALISAÇÃO DE OBRAS DE PAVIMENTAÇÃO E COBRANÇA DE TAXA EXTRA E DE INSTALAÇÃO DE SERVIÇO DE TROCA DO SISTEMA DA PORTARIA – PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO REJEITADA – IMPUGNAÇÃO DAS RAZÕES – MÉRITO RECURSAL – AUSÊNCIA DE PRÉVIA DELIBERAÇÃO ACERCA DA ADMINISTRAÇÃO DE CONDOMÍNIO – ASSEMBLEIA NÃO REALIZADA – VOTAÇÃO POR URNA – MEIOS ALTERNATIVOS QUE DEVERIAM SER IMPLEMENTADOS – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
I – Não há ofensa ao princípio da dialeticidade, porquanto se verifica que as razões da peça recursal são suficientes para atacar minimamente os fundamentos da sentença, indicando claramente a insurgência acerca da improcedência dos pedidos iniciais.
II – Ainda que não se olvide que a atual realidade do mundo impôs diversas alterações na rotina das pessoas, devido ao obrigatório distanciamento social imposto pela pandemia decorrente do Coronavírus (COVID-19), esta circunstância não pode deixar de observar a necessidade de prévia discussão acerca da administração e seus reflexos em um condomínio, especialmente quando estes impliquem em ônus aos seus proprietários, como ocorre no caso.
A C Ó R D Ã O
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
Campo Grande, 29 de janeiro de 2021
Des. Marco André Nogueira Hanson
Relator do processo
R E L A T Ó R I O
O Sr. Des. Marco André Nogueira Hanson.
Condomínio Residencial Saint Martin , qualificado nos autos, interpôs agravo de instrumento em razão da decisão proferida pelo juízo da 8ª Vara Cível desta Capital, nos autos da ação anulatória c/c obrigação de fazer nº 0834406-06.2020.8.12.0001, ajuizada por Oséias dos Santos Pereira de Oliveira , a qual manteve a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela pleiteada pelo autor, determinando a suspensão e/ou paralisação do início das obras de pavimentação e respectiva cobrança extra, objeto da deliberação da Ata da Assembleia Geral Extraordinária do Condomínio Residencial Saint Martim, bem como suspenda a troca do Sistema de Portaria, tudo sob pena de multa diária de R$ 300,00 (trezentos reais), limitada a 30 (trinta) dias (f. 127-129/TJMS e f. 203-204/TJMS).
Aduziu que, diversamente do que afirmou o agravado, a administração do condomínio agravante, fez circular um comunicado esclarecendo que, diante do alto custo da portaria remota (R$ 4.486,00) e de inúmeras reclamações referentes as falhas com a aludida portaria, procedeu estudos e consulta de mercado, e chegou à conclusão que a compra de equipamentos para a implantação de portaria autônoma seria a melhor opção, visto que o investimento total seria de aproximadamente R$ 30.000,00.
Defendeu que a proposta da administração e o que foi aprovada pela maioria dos votos, foi a compra da portaria autônoma, visto que com o valor pago mensalmente à empresa Represeg em apenas 06 (seis) meses, o condomínio quita todo o investimento e passa a economizar o montante de R$ 4.486,00, por mês.
Alegou que a reforma da portaria, não deve ser suspensa, sob o argumento de que há eminente risco a segurança dos condôminos, além da economia mensal de R$ 4.486,00, que refletirá na saúde financeira, beneficiando todos os condôminos.
Dispôs que a administração do condomínio, publicou um comunicado, informando que seria marcado uma assembleia para votação sobre a mudança da modalidade da portaria, bem como para a reforma das ruas internas em 28/08/2020.
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
implementação no local, com vistas a melhorar a acessibilidade de parte dos moradores e que foi aprovada pela maioria válida dos votos dos condôminos.
Salientou que a obra de pavimentação é uma obra necessária, pois equipara-se a acessibilidade, bastando para tanto, o voto da maioria dos presentes e não de quorum qualificado, notadamente porque adveio de discussão dos moradores.
Aduziu que a votação ocorreu mediante cédulas, onde cada condômino, pode votar de forma livre e sigilosa, alegando que desde a publicação do edital, não houve sequer qualquer contestação ao método utilizado pela administração, em razão da pandemia decorrente da Covid 19.
Pleiteou a antecipação dos efeitos da tutela recursal, a fim de que seja suspensa a decisão agravada e, por consequência, determinar, de imediato, que seja dado continuidade nos referidos serviços autorizados em Assembleia realizada pelo condomínio agravante.
O pedido de antecipação da tutela recursal foi indeferido (f. 225-229).
O juízo a quo prestou informações acerca do processo de origem (f. 234).
A parte agravada apresentou resposta ao recurso (f. 235-246), em que arguiu preliminar de não conhecimento da insurgência recursal e, no mérito, pugnou pelo seu não provimento, pleiteando a condenação da agravante ao pagamento de multa por litigância de má-fé.
É o relatório.
V O T O
O Sr. Des. Marco André Nogueira Hanson. (Relator)
Conforme relatado, Condomínio Residencial Saint Martin , qualificado nos autos, interpôs agravo de instrumento em razão da decisão proferida pelo juízo da 8ª Vara Cível desta Capital, nos autos da ação anulatória c/c obrigação de fazer nº 0834406-06.2020.8.12.0001, ajuizada por Oséias dos Santos Pereira de Oliveira , a qual manteve a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela pleiteada pelo autor, determinando a suspensão e/ou paralisação do início das obras de pavimentação e respectiva cobrança extra, objeto da deliberação da Ata da Assembleia Geral Extraordinária do Condomínio Residencial Saint Martim, bem como suspenda a troca do Sistema de Portaria, tudo sob pena de multa diária de R$ 300,00 (trezentos reais), limitada a 30 (trinta) dias (f. 127-129/TJMS e f. 203-204/TJMS).
Preliminar contrarrecursal
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
insurgência recursal alegando que as razões recursais não impugnam de forma específica os fundamentos da decisão recorrida.
Como é cediço, o recurso interposto pela parte deve ser dialético, isto é, necessita demonstrar, de forma clara, os fundamentos de fato e de direito de seu inconformismo, atacando diretamente as razões da decisão proferida pelo Juízo singular.
Na hipótese, ao contrário do alegado, extrai-se que o presente recurso devolve de maneira suficiente a matéria impugnada, permitindo sua compreensão pela parte recorrida e também pelo julgador, consignando sua irresignação, com o objetivo de reforma da decisão de primeira instância, que concedeu a favor da parte agravada a tutela de urgência pleiteada.
Diante disso, essa arguição preliminar não deve ser acolhida.
Assim, presentes os pressupostos e condições recursais, conheço deste agravo de instrumento e passo à análise de seus fundamentos.
Mérito recursal
A controvérsia recursal a ser dirimida neste agravo de instrumento limita-se a apurar os requisitos para a concessão da tutela de urgência.
A decisão agravada deferiu a favor do agravada tutela de urgência, com vistas a obstar o início das obras de pavimentação e respectiva cobrança extra, objeto da deliberação da Ata da Assembleia Geral Extraordinária do Condomínio Residencial Saint Martim, bem como suspenda a troca do Sistema de Portaria, tudo sob pena de multa diária de R$ 300,00 (trezentos reais), limitada a 30 (trinta) dias (f. 127-129/TJMS e f. 203-204/TJMS).
Inconformado, o condomínio agravante defendeu que, diversamente do que afirmou o agravado, a administração do condomínio agravante, fez circular um comunicado esclarecendo que, diante do alto custo da portaria remota (R$ 4.486,00) e de inúmeras reclamações referentes às falhas com a aludida portaria, procedeu estudos e consulta de mercado, e chegou à conclusão que a compra de equipamentos para a implantação de portaria autônoma seria a melhor opção, visto que o investimento total seria de aproximadamente R$ 30.000,00.
Acerca da pavimentação das ruas internas, declinou que como o agravado não reside no condomínio agravante, deixa de observar a necessidade desta implementação no local, com vistas a melhorar a acessibilidade de parte dos moradores e que foi aprovada pela maioria válida dos votos dos condôminos.
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
Aduziu que a votação ocorreu mediante cédulas, onde cada condômino, pode votar de forma livre e sigilosa, alegando que desde a publicação do edital, não houve sequer qualquer contestação ao método utilizado pela administração, em razão da pandemia decorrente da Covid 19.
Segundo o art. 300 do CPC, são requisitos gerais para a concessão das tutelas provisórias de urgência: a demonstração da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Sobre os requisitos elencados na norma supracitada, segue a doutrina:
A probabilidade do direito a ser provisoriamente satisfeito/realizado é a plausibilidade de existência desse mesmo direito. O bem conhecido fumus boni iuris (ou fumaça do bom direito).
O magistrado precisa avaliar se há “elementos que evidenciem” a probabilidade de ter acontecido o que foi narrado e quais as chances de êxito do demandante (art. 300, CPC).
Inicialmente, é necessária a verossimilhança fática, com a constatação de que há um considerável grau e plausibilidade em torno das narrativas dos fatos trazida pelo autor. É preciso que se visualize, nessa narrativa, uma verdade provável sobre os fatos, independentemente da produção de prova.
Junto a isso, deve haver uma plausibilidade jurídica, com a verificação de que é provável a subsunção dos fatos à norma invocada, conduzindo aos efeitos pretendidos. (Didier Jr., Fredie; Braga, Paula Sarno; Oliveira, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória. Volume 2. 11ª edição. Salvador; Ed. Jus Podivm, 2016, pp. 608/609)
Enfim, a tutela provisória é medida necessária simplesmente porque não é possível esperar, sob pena de o ilícito ocorrer, continuar ocorrendo, ocorrer novamente, não ser removido ou de dano não ser reparado ou reparável no futuro, razão pela qual imprescindíveis o perigo de dano e/ou risco ao resultado útil do processo.
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
mesmo tempo: a) concreto (não hipotético ou eventual), b) atual (na iminência de ocorrer ou já em curso) e c) grave (de grande ou médica intensidade, com o condão de prejudicar ou impedir a fruição de determinado direito pela parte).
Outrossim, por “probabilidade do direito”, ou fumus boni iuris, entende-se a plausibilidade na existência do direito alegado, cabendo ao magistrado a análise, no caso concreto, da existência dos elementos que evidenciem ou não a verossimilhança dos fatos narrados, assim como as chances de êxito do demandante.
Ademais, a lesão que se pretende evitar deve ser irreparável, isto é, aquelas cujas consequências são irreversíveis ou, ainda, de difícil reparação. Trata-se, em outras palavras, do receio de que a demora normal do processo cause à parte um dano iminente ou permita a perpetuação deste ou, ainda, implique na ocorrência de um ilícito, já praticado ou em vias de se efetivar.
Na hipótese sob julgamento, a parte agravada ingressou com pedido de tutela de urgência visando suspensão da obra de pavimentação e a cobrança de taxa extra, sob o argumento de que houve irregularidade da sessão da assembléia extraordinária realizada dia 21/09/2020 no condomínio agravante, em afronta à legislação aplicável, que resultou na cobrança de taxa extra em desfavor dos condôminos, a despeito do atual estado de calamidade ocasionado pela pandemia decorrente da Covid-19.
Na hipótese, restou evidenciada a probabilidade do direito alegado pelo demandante, ora agravado, vez que a deliberação acerca da aprovação de mudança de modelo de portaria atual, para portaria autônoma, bem como de orçamento para a reforma de pavimentação das ruas internas do condomínio, com a instituição de taxa extra, adveio de “votação realizada por meio de cédulas preenchidas pelos moradores”, sem prévio debate acerca do assunto pelos condôminos.
Ressalta-se que, não obstante o atual cenário mundial, decorrente da pandemia causada pelo Covid-19, que impõe à toda a sociedade o devido distanciamento e precauções para evitar contaminação por aquele causada, mostra-se imprescindível a deliberação acerca dos temas acima declinados e deliberados por intermédio de cédulas e uma urna afixada na portaria e preenchidas pelos próprios moradores, por intermédio de uma forma alternativa, via eletrônica, conforme vem acontecendo em outras áreas, inclusive, ensino.
Desta forma, a assembleia como órgão soberano do condomínio não foi devidamente constituída, a mera votação na forma como ocorrida não demonstra ser regular e, por isso, defeso manter sua eficácia em detrimento dos condôminos.
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
entre o “sim”, e o “não”! (f. 16/TJMS).
Assim, ainda que não se olvide que a atual realidade do mundo impôs diversas alterações na rotina das pessoas, devido ao obrigatório distanciamento social imposto pela pandemia decorrente do Coronavírus (COVID-19), esta circunstância não pode deixar de observar a necessidade de prévia discussão acerca da administração e seus reflexos em um condomínio, especialmente quando estes impliquem em ônus aos seus proprietários, como ocorre no caso.
Por fim, cumpre registrar que, a despeito de o condomínio agravante defender a imprescindibilidade da realização das alterações nas estruturas físicas e funcionais já declinadas, a tutela deferida pelo juízo a quo limitou-se a aferir o vício formal do ato que ensejou a cobrança de taxa extra e a realização de obras de pavimentação e não a imprescindibilidade ou não destas, o que não impõe qualquer análise, neste momento processual, por este órgão colegiado.
Isto porque, ainda que se conclua que referida obra e alteração da portaria se mostrem imprescindíveis ao condomínio, esta conclusão não tem o condão de atingir o desfecho do juízo a quo, no sentido de que se mostra imprescindível prévia deliberação, em assembleia de moradores, para que se concretize decisões relevantes ao condomínio.
Logo, não prospera a insurgência recursal, impondo-se a manutenção da decisão recorrida como proferida.
Dispositivo
Ante todo o exposto, rejeito a preliminar suscitada em contrarrazões, conheço deste agravo de instrumento interposto por Condomínio Residencial Saint Martin, mas nego-lhe provimento.
D E C I S Ã O
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR
Presidência do Exmo. Sr. Des. Marco André Nogueira Hanson
Relator, o Exmo. Sr. Des. Marco André Nogueira Hanson
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
Campo Grande, 29 de janeiro de 2021.
in