Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.568.906-8
DA 4.ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA
APELANTE: ARNALDO PEREIRA GUIMARÃES
APELADO: CONDOMÍNIO EDIFÍCIO SORBONNE
RELATOR: DES. LUIZ LOPES
APELAÇÃO CÍVEL “AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE TUTELA LIMINAR” CONDOMÍNIO DEVOLUÇÃO DE BEM DO PATRIMÔNIO COLETIVO PRESCRIÇÃO APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL PREVISTO NO ARTIGO 206, § 3.º, INCISO V DO CÓDIGO CIVIL – APROVAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE OBRAS ASSEMBLEIAS REALIZADAS ANTERIORMENTE AO AJUIZAMENTO DA DEMANDA QUE DELIBERARAM SOBRE O TEMA, TENDO 90% DE APROVAÇÃO CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO QUE PREVÊ, PARA ESTE TIPO DE OBRA, A NECESSIDADE DE APROVAÇÃO POR 2/3 DOS PROPRIETÁRIOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS MANTIDOS SENTENÇA MANTIDA HONORÁRIOS RECURSAIS CABIMENTO. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO.
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 1.568.906-8, da 4.ª Vara Cível de CURITIBA, em que é apelante ARNALDO PEREIRA GUIMARÃES, e apelado, CONDOMÍNIO EDIFÍCIO SORBONNE.
Trata a espécie de “Ação de Obrigação de Fazer”. Na inicial, relatou o autor que, no dia 04.06.13, quando da realização da Assembleia Geral Ordinária do Condomínio Edifício Sorbonne, foi aprovado, com voto contrário seu, que os assuntos relativos ao condomínio seriam decididos por consenso e bom senso dos moradores, e que deveriam ser feitas concessões às regras e leis que norteiam o condomínio.
Diante disso, ponderou que, tal aprovação, não tem validade jurídica, pois nenhum ato deve ser contrário ao Regimento Interno, à Convenção, à Lei de Condomínio e, principalmente, ao Código Civil. Seguiu narrando que, posteriormente, foram aprovados dois projetos de decoração, um relativo ao salão de festas e outro referente à área de churrasqueira, no valor de
R$3.700,00. Todavia, consoante restou convencionado na ata da Assembleia Geral Extraordinária de 09.07.13, o orçamento para aprovação e execução das obras seriam apresentados em futura Assembleia, o que não ocorreu.
Pontuou que, independente de prévia aprovação assemblear, foram realizadas obras com custo total de R$74.117,79, com a mudança de áreas comuns. No entanto, referidas obras foram realizadas sem a devida aprovação dos condôminos e, ainda, sem respeitar as normas da construção civil municipal. Ressaltou que as obras se encontram desprovidas de qualquer respaldo técnico, visto que, em nenhum momento, verificou-se qualquer anotação de responsabilidade técnica (ART), ou mesmo qualquer documento que ateste a regularidade das mesmas, como um alvará de construção ou de reforma. Não obstante, aduziu que o registro e distribuição aos condôminos das atas das Assembleias, após meses de sua realização, não espelhou a verdade real do discutido, deliberado e combinado. Ainda, afirmou que, por inúmeras vezes indagou o representante do condomínio acerca das irregularidades apontadas, entretanto, jamais obteve resposta, o que acarretou a total inobservância do artigo 13, § 10 do Regimento Interno do Condomínio Edifício Sorbonne. Frisou que, a Assembleia realizada no dia 13.01.14, informou que o saldo de caixa do condomínio era de R$59.117,79, o que estava errado, pois, em 31.07.13, havia um saldo de R$54.730,23, sendo que os gastos com as obras somaram R$74.117,79,
sendo o valor arrecadado de R$15.000,00, ou seja, a soma dos valores apresenta um saldo negativo de R$4.387,56, e não um saldo positivo de R$59.117,79.
Relatou que, outro ponto importante, foi a mudança de rotina de procedimento interno, com comunicação apenas verbal através do porteiro, portanto, sem aprovação de que o livro de protocolo não poderia mais ser utilizado para registro de correspondências internas enviadas pelos condôminos ao síndico e/ou conselheiros. Ademais, ressaltou que o suplicado jamais poderia ter se desfeito de uma grade de elevado valor histórico e financeiro, pois, durante a realização de obras na portaria, o síndico, sem qualquer aprovação da Assembleia, autorizou um operário a levar a grade dourada, de ferro trabalhado, projetada pelo conceituado arquiteto Bruno Di Franco, da Construtora Moro, sob o fundamento que esta foi objeto de troca, servindo como parte do pagamento.
Assim, requereu, na inicial, que: i) o requerido respeite a convenção e o regimento interno; ii) o desfazimento de todas as obras não aprovadas, com o retorno do status quo, especialmente em relação às obras do salão de festas, churrasqueira e casa do zelador; iii) o retorno da utilização do livro de correspondências; iv) a devolução da grade dourada.
Devidamente citado, CONDOMÍNIO EDIFÍCIO SORBONNE apresentou Contestação (Movimento Projudi n.º 29.1), arguindo, preliminarmente: i) a generalidade do pedido para que o síndico respeite a
legislação pátria, convenção e regimento interno do condomínio; ii) a sua ilegitimidade passiva, vez que o autor deveria ter demandado contra o síndico; iii) a prescrição da pretensão do autor, por se tratar de reparação civil, cujo prazo é de três anos. No mérito, ponderou que as obras e os orçamentos foram aprovados por 90% dos condôminos, em Assembleia Geral Extraordinária realizada no dia 22.05.15. Ademais, frisou que o livro de correspondência nunca foi retirado da portaria e está em pleno uso pelos condôminos. Quanto a devolução da grade de ferro, afirmou que o pleito está totalmente prescrito, eis que o objeto fora permutado com a atual porta de vidro em meados de 1995. Assim, pugnou pelo desprovimento da demanda.
Impugnação à Contestação fora apresentada ao Movimento Projudi n.º 35.1.
Conclusos para sentença, o d.
Magistrado singular reconheceu a prescrição do direito à exigibilidade da pretensão do pedido formulado no item `d’ (devolução da grade dourada) da petição inicial, julgando o processo, com resolução de mérito, na forma do disposto no artigo 269, inciso IV do Código de Processo civil de 1973. Quanto aos demais pleitos, declarou extinto o processo, sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual (artigo 267, inciso VI do Código de Processo Civil de 1973). Quanto aos ônus sucumbenciais, condenou o autor ao pagamento
das custas e honorários advocatícios, os quais foram fixados no importe de R$1.500,00, com fulcro no artigo 20, § 4.º do Código de Processo Civil de 1973.
Inconformado com o teor da r.
sentença, ARNALDO PEREIRA GUIMARÃES interpôs o recurso em lume (Movimento Projudi n.º 50.1), ponderando, em resumo, que restou claro que a obra apontada na exordial foi realizada sem a aprovação dos orçamentos, bem como, sem respeitar a legislação atinente à matéria, tanto que o condomínio precisou aprovar referido ato extemporaneamente (posterior ao ajuizamento da presente demanda), ou seja, no dia 22.05.15. Diante disso, afirma que, o fato de ter realizado Assembleia posterior, superveniente à demanda, demonstra o reconhecimento do alegado por si, pois confirma a inexistência de aprovação prévia.
Assim, aduz que, a aprovação tardia não pode gerar qualquer efeito, visto que não há qualquer previsão para tanto no edital convocatório. Ademais, também pondera que o demandado não apresentou qualquer elemento que comprove a exata data em que houve a retirada da grade, limitando-se a mencionar que já faz mais de 03 anos, razão pela qual a prescrição deve ser afastada, bem como não se trata de ação de reparação de danos, mas sim de obrigação de fazer, razão pela qual o prazo prescricional aplicável é o de 10 anos.
Por fim, requer que os ônus sucumbenciais sejam redirecionados ao demandado.
Devidamente intimado, CONDOMÍNIO EDIFÍCIO SORBONNE apresentou Contrarrazões (Movimento Projudi n.º 56.1), pugnando pelo desprovimento da demanda.
É o relatório.
Em presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de Apelação.
Cinge-se a controvérsia em verificar: i) o prazo prescricional aplicável para a devolução da grade dourada, bem como seu termo inicial; ii) se existiu aprovação em Assembleia anterior as obras realizadas no condomínio, bem como se a aprovação em 22.05.15 é válida; iii) se os ônus sucumbenciais devem ser alterados.
DA PRESCRIÇÃO PARA A DEVOLUÇÃO DA GRADE DOURADA:
Antes de mais nada, cumpre aferir qual prazo prescricional é o aplicável no presente caso, se o previsto no artigo 206, § 3.º, inciso V do Código Civil (reparação civil 03 anos), ou o previsto no artigo 205 do Código Civil (10 anos).
Pois bem. Tratando-se de um bem que, segundo relato do condomínio, fora permutado a muito tempo, não se poderia mais imputar a este a devolução
da grade, até mesmo porque, como muito bem consignou o d. Magistrado singular em sua sentença, “os terceiros que a receberam sequer foram indicados na inicial como sendo recebedores”. Em assim sendo, a obrigação se converte em perdas e danos, a qual, a título de prazo prescricional, segue o disposto no artigo no artigo 206, § 3.º, inciso V do Código Civil (03 anos reparação civil).
Porém, antes de aplicar referido prazo, cumpre aferir o momento em que ocorreu a permuta da grade dourada, pois, se anterior a entrada em vigor da nova legislação cível, deve-se observar a regra de transição prevista no artigo 2.028 do Código Civil, segundo o qual “serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”.
Pois bem. Dos autos, extrai-se que 90% dos condôminos acordaram, na Assembleia Geral Extraordinária realizada no dia 22.05.15 (antes da apresentação de Contestação), que a grade de ferro que se encontrava na entrada do edifício, fora retirada pela Incorporadora e Construtora Moro, em meados dos anos 90, ressaltaram, ainda, que, à época, houve consenso dos moradores, uma vez que “o portão foi substituído por um novo desenho da portaria, com fachada de vidro.”. Por fim, restou apontado que nenhum dos presentes (90%) tinha a intenção de reaver
o portão ou seus valores.
Diante desse fato, como a incorporação do Condomínio, ao que dos autos consta (Convenção de Condomínio datada de 1995), ocorreu em 1995, e se considerar que a partir deste ano a grade fora retirada, tem-se que não decorreu mais da metade do prazo prescricional previsto no Código Civil de 1916, até a entrada em vigor do novo Codex, a justificar a sua aplicação, razão pela qual o termo inicial do prazo prescricional é 12.01.03 (Código Civil de 2002).
Assim sendo, como o autor apenas ajuizou a demanda em 17.12.14, por certo que sua pretensão com relação a este pedido está prescrita, como muito bem pontuado pelo r. Juízo a quo.
DA APROVAÇÃO PARA AS OBRAS:
Quanto a aprovação das obras, diferentemente do que entende o autor, estas não foram aprovadas na Assembleia realizada no dia 22.05.15 (posteriormente ao ajuizamento da demanda), esta apenas ratificou o que foi decidido nas Assembleias anteriores, que deliberaram sobre o tema (aprovação de orçamento realização de obras), senão veja-se:
“(…) 3) Ratificar as Assembleias anteriores, para aprovação de orçamento, aprovação das obras realizadas e prestação
de contas; Todos os presentes ratificam integralmente todas as assembleias anteriores, e que todos os recursos dispendidos em obras estão corretos.
Todos os presentes testemunham que o condômino do 5 andas pagou parte das parcelas extras e encontra-se inadimplente com as 4 últimas parcelas.” (sic)
Cumpre mencionar, ainda, que o edital de convocação fez constar, expressamente, o tema, senão veja-se:
“(…) Ratificar as Assembleias anteriores, para aprovação de orçamento, aprovação das obras realizadas e prestação de contas.” (Movimento Projudi n.º 29.8)
A Ata de referida Assembleia restou assinada por 90% dos condôminos, sendo que, os 10% restantes, representam o autor (10 apartamentos no condomínio), morador do apartamento 501.
Não fosse, verifica-se da própria documentação carreada na inicial, que as obras foram temas de várias Assembleias, como, por exemplo, a do dia 05.08.13, onde foi apresentada a Sr.ª Elizabeth Egas, responsável pelo confecção do projeto para reforma do salão de festas e da churrasqueira, a qual apresentou o melhor preço entre os propostos (sendo que referida profissional fora escolhida na Assembleia realizada no dia 09.07.13 Movimento Projudi n.º 1.7).
Ainda, restou discutido e aprovado, que as obras e a
decoração relativas ao salão de festas deveriam ser consideradas como manutenção do prédio, e as da churrasqueira, como melhoria das suas instalações, restando convencionado que ambas seriam executadas de acordo com a disponibilidade de recursos disponíveis.
Por fim, restou assentado que “deixada livre a palavra”, ninguém dela fez uso.
Em 13.01.14, fora realizada Assembleia Extraordinária, na qual fora apresentada a prestação de contas das obras do salão de festas e churrasqueira, bem como solicitado um reforço de caixa, diante da situação deficitária do condomínio. Vale ressaltar que, em referida Assembleia, o autor compareceu, inclusive mencionando a necessidade de reparos das pastilhas nas paredes externas do condomínio, o que estava ocasionando infiltração.
No dia 24.06.14, o assunto das obras entrou novamente em pauta, pois o Sr. Arnaldo (autor) indagou a respeito das reformas realizadas no condomínio, momento em que a Sr.ª Márcia Graf mencionou que “se a maioria dos condôminos aprovou o que foi realizado de obras no condomínio e uma única unidade não concorda, não pode ficar imune de pagar os valores devidos.” e, ainda, mencionou que só ocorreu alteração nos valores de R$500,00 para R$2.500,00, a serem pagos pelo condomínio, porque o ora requerente não autorizou a entrada em seu apartamento, do Sr. Marcos, para que este efetuasse os reparos na parte hidráulica.
Diante disso, o que se verifica é que, de fato, a realização das obras fora aprovada em Assembleias anteriores a do dia 22.05.15, e esta, apenas serviu para ratificar o conteúdo já debatido e aprovado pela maioria dos condôminos (90%), razão pela qual a sentença também deve ser mantida quanto a este ponto.
Ademais, quanto a aplicação da legislação vigente, tem-se que, da Convenção do Condomínio, extrai-se a exigência de maioria qualificada (representando 2/3 dos proprietários de unidades autônomas art. 15, parágrafo único, alínea `a’) para a realização de benfeitorias meramente úteis e inovações no edifício, o que ocorreu, já que as reformas foram aprovadas por 90% dos condôminos.
Como não houve alteração do julgado, os ônus sucumbenciais devem ser mantidos tais como lançados na sentença.
HONORÁRIOS RECURSAIS:
Por derradeiro, em atenção ao disposto no artigo 85, § 11 do atual Código de Processo Civil1 e, considerando a apresentação de Contrarrazões
1 Art. 85 […] § 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2o a 6o, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2o e 3o para a fase de conhecimento.
pela parte adversa, elevo para R$2.500,00 os honorários advocatícios sucumbenciais fixados em favor do procurador do requerido (sobremaneira sabido que a fixação dos honorários recursais tem dois objetivos principais: i) remunerar o trabalho do Advogado que atuou também na fase de recurso; e, ii) desestimular a interposição de recursos protelatórios).
Ex positis, o voto é no sentido de negar provimento ao recurso de Apelação interposto pelo autor.
ACORDAM OS DESEMBARGADORES INTEGRANTES DA DÉCIMA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO.
Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores ÂNGELA KHURY e ALBINO JACOMEL GUERIOS.
Curitiba, 14 de dezembro de 2017.
DES. LUIZ LOPES
Relator