Inteiro Teor
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
Órgão 1ª Turma Cível
Processo N. APELAÇÃO 0004875-43.2016.8.07.0014
APELANTE (S) HESA 20 – INVESTIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA. e EBM
DESENVOLVIMENTO URBANO E INCORPORACOES S/A
APELADO (S) EDSON LIMA COSTA e DEYSE ANNY MAGALHAES SILVA
Relator Desembargador HECTOR VALVERDE SANTANA
Acórdão Nº 1157238
EMENTA
apelação. direito do consumidor. preliminar de ilegitimidade ativa. teoria da asserção. impossibilidade de imposição de obrigação de fazer. realização de vistoria nas unidades imobiliárias nas quais não
foram realizadas as trocas de piso, nas áreas comuns do condomínio, e de elaboração e execução do
cronograma de obras. contrato de empreitada. sentença dentro dos limites da lide. princípio da
congruência. persuasão racional do juiz. má execução da obra. entrega dos apartamentos com vícios.
necessidade de substituição do piso. barulho e ruídos excessivos provocados pelas obras. fato
incontroverso. violação de direitos da personalidade. paz, sossego, sadia qualidade de vida,
tranquilidade, dentre outros. danos morais configurados. compensação. honorários advocatícios.
sucumbência recíproca.
1. Os autores têm legitimidade para postular em Juízo a compensação pelos danos morais que alegam ter sofrido. A teoria da asserção se mostra mais adequada à teoria abstrata do direito de ação. Tem ação aquele que afirma ter o direito, não necessariamente quem efetivamente o possua. Adotando-se a teoria da asserção, as condições da ação são analisadas de plano, em vista da petição inicial e, sendo
necessária uma maior cognição sobre a matéria, esta passa a ser entendida como mérito. Rejeitada a
preliminar.
2. Não cabe aos autores exigir a realização de vistoria nas unidades imobiliárias nas quais não foram
realizadas as trocas de piso, uma vez que não possuem legitimidade e interesse para isso.
3. Cada adquirente de unidade imobiliária do condomínio poderá, de acordo com sua conveniência,
acionar as requeridas para o reparo em seus apartamentos no prazo previsto no art. 618 do Código
Civil. Não se mostra razoável a imposição às rés da obrigação de fazer consistente na elaboração e
execução do cronograma de obras.
5. O processo civil brasileiro adotou como sistema de valoração das provas o da persuasão racional,
também chamado sistema do livreconvencimentomotivado, segundo o qual o magistrado é livre para
formar seu convencimento, exigindo-se apenas que apresente os fundamentos de fato e de direito na
decisão. Não dependem de prova os fatos afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária, os admitidos no processo como incontroversos, dentre outras hipóteses. (Art. 374 do Código de
Processo Civil).
6. Nos contratos de empreitada, o empreiteiro responsabiliza-se pela solidez e adequação técnica da
obra e deve responder pelos prejuízos decorrentes da má execução do serviço.
7. A conduta das rés violou alguns dos direitos da personalidade dos autores, como a paz, o sossego, a sadia qualidade de vida, a tranquilidade, dentre outros, na medida em que, ao entregar os apartamentos com o piso defeituoso, deu ensejo à prática de obras generalizadas no condomínio, gerando barulho e ruídos excessivos, frustrando a legítima expectativa dos autores, adquirentes do imóvel, que se viram impossibilitados de permanecer na própria casa sem os transtornos provocados pelas obras.
8. O valor a ser fixado para reparação dos danos morais deverá observar as seguintes finalidades:
compensatória, punitiva e preventiva, além do grau de culpa do agente, do potencial econômico e
características pessoais das partes, a repercussão do fato no meio social e a natureza do direito violado, obedecidos os critérios da equidade, proporcionalidade e razoabilidade.
9. Se o autor pediu um determinado valor a título de danosmoraise recebeu menos do que desejava,
para fins de pagamento das despesas processuais, ele não é considerado como vencido. Em outras
palavras, se o autor pediu um valor como danosmoraise recebeu menos, não houve sucumbência
recíproca, ou seja, somente o réu deverá arcar com as despesas processuais e honoráriosde
sucumbência.
10. Apelaçõesdesprovidas.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores do (a) 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e dos Territórios, HECTOR VALVERDE SANTANA – Relator, TEÓFILO CAETANO – 1º
Vogal e SIMONE LUCINDO – 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador RÔMULO DE ARAÚJO MENDES, em proferir a seguinte decisão: CONHECER DOS RECURSOS, REJEITAR
A (S) PRELIMINAR (ES) E, NO MÉRITO, NEGAR-LHES PROVIMENTO. DECISÃO UNÂNIME. , de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 27 de Fevereiro de 2019
Desembargador HECTOR VALVERDE SANTANA
Relator
Trata-se de apelações interpostas, uma delas na forma adesiva, contra a sentença proferida pelo Juízo
da Vara Cível do Guará que, nos autos da ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por
danos morais, proposta por Deyse Anny Magalhães Silva e edson Lima Costa contra Hesa 20 –
Investimentos Imobiliários LTDA e Ebm incorporações S/A, julgou parcialmente procedentes os
pedidos formulados na petição inicial, na forma do art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil.
O Juízo sentenciante condenou as rés a pagar, solidariamente, a cada autor, a importância de R$
6.000,00 (seis mil reais), como compensação pelos danos morais causados. Fundamentou que a
conduta praticada pelas rés causou danos extrapatrimoniais aos autores, os quais vêm suportando mais do que mero aborrecimento, estão tendo maculados os direitos personalíssimos de sossego, sadia
qualidade de vida, paz em seu lar, dentre outros, causados por barulho e poeira excessivos, decorrentes de constantes reformas nas unidades do condomínio. Entendeu que o incomodo causado ultrapassa o
razoável e decorre de má execução da empreitada, que não atentou para as normas técnicas ao fixar os pisos e os azulejos de quase a totalidade das unidades imobiliárias.
Diante da sucumbência recíproca, condenou ambas as partes, em percentuais iguais, ao pagamento de custas e despesas processuais, bem como com honorários advocatícios sucumbenciais, arbitrados em
10% sobre o valor da causa.
A parte autora narrou na petição inicial que adquiriu, em 27.06.2014, da segunda ré (Hesa 20 –
Investimentos Imobiliários Ltda), o apartamento 505, do Bloco D, do Condomínio Isla Life Style,
localizado nos lotes E/F da Área Especial n. 4, Guará II/DF. Explicou que antes de ingressar no imóvel, por ocasião da vistoria, foram localizados diversos vícios em sua unidade, dentre eles a constatação de que o piso e os azulejos dos dois banheiros estavam com risco de soltura devido à má execução da
obra. Mais tarde, descobriu que o problema não se restringia à sua unidade, mas a todas do
condomínio, que totalizam 586, divididas em 4 torres de 26 andares. Afirmou que a execução da obra ficou a cargo da primeira ré (EBM Desenvolvimento Urbano e Incorporações S/A) que, em parceria
comercial com a segunda, divulgou, edificou e vendeu as unidades do empreendimento. Alegou que,
passados mais de 2 anos da entrega da obra, ainda está sendo realizada a correção do vício, que
consiste na retirada do piso de cerâmica, correção do contrapiso e recolocação das novas peças.
Ressaltou que os mesmos problemas começaram a aparecer também nas áreas comuns do condomínio. Afirmou que a execução da empreitada acarreta ruídos acima do razoável, além de muita poeira, o que, inclusive, acarretou problemas de saúde na autora Deyse Anny Magalhães Silva. Informou que entrou em contato com a ré EBM para saber o termo final da obra, mas foi avisada de que não há previsão
para tanto.
Os pedidos formulados na ação foram: i) a determinação à parte ré para que proceda à vistoria em
todas as unidades imobiliárias nas quais não foram realizadas as trocas de piso e azulejos, bem como
nas áreas comuns do condomínio, para que identifique a necessidade da obra e confeccione
cronograma de execução; ii) a determinação às rés para que executem o cronograma aprovado, no
prazo estabelecido, sob pena de multa revertida a eles, demandantes; iii) a condenação da parte ré ao
pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 35.000,00 para cada autor.
A parte ré apela da sentença. Sustenta, preliminarmente, a ilegitimidade ativa dos autores. No mérito,
alega a inexistência de ato ilícito a ensejar a compensação por danos morais. Afirma que não há provas dos fatos constitutivos do direito dos autores. Ressalta que não houve a inversão do ônus da prova.
Aduz que a sentença ampliou a dimensão dos fatos narrados pelos autores na petição inicial. Esclarece que não foi realizada perícia nas obras, de modo que não é possível afirmar a existência de ruídos
acima de 100 decibéis ou de barulhos excessivos. Sustenta que não é possível afirmar que o prédio foi mal executado, tendo em vista que o Poder Público atestou a execução da obra de acordo com as
normas técnicas. Argumenta que não há comprovação de que os problemas médicos da autora Deyse
Anny Magalhães Silva estejam relacionados com a obra. Afirma que a distribuição dos honorários
advocatícios deve ser feita de forma proporcional à sucumbência das partes.
Requer o conhecimento e o provimento do recurso para: i) acolher a preliminar de ilegitimidade ativa e extinguir o processo sem exame do mérito; ii) reconhecer a extrapolação dos limites da lide pelo Juízo de Primeiro Grau; iii) afastar a condenação ao pagamento de indenização por danos morais.
A parte autora interpõe apelação de forma adesiva. Argumenta que não pode suportar cinco anos de
insalubridade apenas porque esse é o prazo de garantia da obra. Sustenta que as rés devem ser
condenadas na obrigação de fazer pleiteada na petição inicial. Alega a existência de duplo ato ilícito,
consistente na má-fé na venda do imóvel com omissão quanto aos defeitos nos pisos e azulejos, e na
violação ao direito subjetivo à paz, ao sossego, ao silêncio e à não importunação. Aduz que a parte ré nada mencionou quanto ao primeiro aspecto da ilicitude, de modo que referido fato é incontroverso.
Defende que os danos morais devem ser majorados.
Requer o conhecimento e o provimento do recurso para: i) determinar às rés que procedam à vistoria
em todas as unidades imobiliárias nas quais não foram realizadas as trocas de piso e azulejos, bem
como nas áreas comuns do condomínio, para que identifiquem a necessidade da obra e confeccionem cronograma de execução; ii) determinar às rés que executem o cronograma aprovado; e iii) majorar o valor dos danos morais para R$ 20.000,00 para cada autor.
Preparos efetivados.
Contrarrazões apresentadas.
É o relatório.
VOTOS
O Senhor Desembargador HECTOR VALVERDE SANTANA – Relator
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.
Trata-se de apelações interpostas, uma delas na forma adesiva, contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Cível do Guará que, nos autos da ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, proposta por Deyse Anny Magalhães Silva e edson Lima Costa contra Hesa 20 –
Investimentos Imobiliários LTDA e Ebm incorporações S/A, julgou parcialmente procedentes os
pedidos formulados na petição inicial, para condenar as rés a pagar, solidariamente, a cada autor, a
importância de R$ 6.000,00 (seis mil reais), como compensação pelos danos morais causados.
A parte ré requer o conhecimento e o provimento do recurso para: i) acolher a preliminar de
ilegitimidade ativa e extinguir o processo sem exame do mérito; ii) reconhecer a extrapolação dos
limites da lide pelo Juízo de Primeiro Grau; iii) afastar a condenação ao pagamento de indenização
por danos morais.
A parte autora requer o conhecimento e o provimento do recurso para: i) determinar às rés que
procedam à vistoria em todas as unidades imobiliárias nas quais não foram realizadas as trocas de piso e azulejos, bem como nas áreas comuns do condomínio, para que identifiquem a necessidade da obra e confeccionem cronograma de execução; ii) determinar às rés que executem o cronograma aprovado; e iii) majorar o valor dos danos morais para R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para cada autor.
O caso deve ser regido pelo sistema jurídico autônomo instituído pelo Código de Defesa do
Consumidor (Lei Federal n. 8.078/1990) que, por sua vez, regulamenta o direito fundamental de
proteção do consumidor, previsto no art. 5º, inc. XXXII, da Constituição Federal.
1. Preliminarmente – da legitimidade ativa
Os autores têm legitimidade para postular em Juízo a compensação pelos danos morais que alegam ter sofrido. Consta da petição inicial, em síntese, que a má execução da empreitada por parte das rés
ocasionou obras generalizadas no condomínio após a entrega das unidades imobiliárias, gerando
barulhos e ruídos que violaram o direito à paz, saúde, sossego, silêncio, não importunação, dentre
outros.
A teoria da asserção se mostra mais adequada à teoria abstrata do direito de ação. Tem ação aquele
que afirma ter o direito, não necessariamente quem efetivamente o possua. Adotando-se a teoria da
asserção, as condições da ação são analisadas de plano, em vista da petição inicial e, sendo necessária uma maior cognição sobre a matéria, esta passa a ser entendida como mérito.
Rejeito a preliminar.
2. Do mérito
Dos pedidos de realização de vistoria nas unidades imobiliárias nas quais não foram realizadas as
trocas de piso, bem como nas áreas comuns do condomínio, e de elaboração e execução do
cronograma de obras
O art. 618, caput, do Código Civil dispõe que: “Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras
construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo
irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.”
Os vícios e defeitos que aparecerem no prazo de garantia de cinco anos implica na responsabilidade
do empreiteiro sem que haja necessidade de se investigar qualquer conduta baseada na culpa ou na má execução do serviço. Trata-se de responsabilidade objetiva. Quanto aos vícios e defeitos
supervenientes ao prazo de cinco anos, a responsabilidade do empreiteiro somente ocorrerá se tiverem como causa conduta culposa que tenha gerado dano ao dono da obra.
Esse prazo é estabelecido em favor de cada consumidor individualmente. Cada adquirente de unidade imobiliária do condomínio poderá, de acordo com sua conveniência, acionar as requeridas para o
reparo em seus apartamentos. Não pode a construtora impor prazo para sanar o vício.
Logo, não se mostra razoável a imposição às rés da obrigação de fazer consistente na elaboração e
execução do cronograma de obras. E mesmo que se pudesse impor esse cronograma às requeridas,
eventual multa por descumprimento não poderia ser destinada aos autores, mas sim a todos os
condôminos prejudicados pela dilação do prazo.
Da alegação de que o Juízo sentenciante teria extrapolado os limites da lide
O art. 492 do Código de Processo Civil dispõe que “É vedado ao juiz proferir decisão de natureza
diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que
lhe foi demandado.” Trata-se do princípio da congruência, adstrição ou correlação, segundo o qual o juiz não poderá julgar ultra, extra ou citra petita.
Destaque-se que o magistrado deve se limitar aos fatos narrados na petição inicial, mas não a
literalidade das palavras utilizada pelos autores.
Da alegação de ausência de provas do fato constitutivo do direito do autor
O processo civil brasileiro adotou como sistema de valoração das provas o da persuasão racional,
também chamado sistema do livreconvencimentomotivado, segundo o qual o magistrado é livre para formar seu convencimento, exigindo-se apenas que apresente os fundamentos de fato e de direito na decisão.
O art. 374 do Código de Processo Civil dispõe que não dependem de prova os fatos afirmados por
uma parte e confessados pela parte contrária, os admitidos no processo como incontroversos, dentre
outras hipóteses.
Constou da sentença que as rés não impugnaram a alegação de que executaram as obras narradas na
petição inicial para correção dos vícios em diversos apartamentos do condomínio. Também não foram impugnados os áudios contidos na mídia de f. 57, que contém gravações de barulhos excessivos
ouvidos no interior do apartamento dos autores em dias distintos.
Não há que se falar, portanto, que os autores não comprovaram os fatos constitutivos de seus direitos.
Da condenação na compensação por danos morais
O dano moral decorre de uma violação de direitos da personalidade, atingindo, em última análise, o
sentimento de dignidade da vítima. Pode ser definido como a privação ou lesão de direito da
personalidade, independentemente de repercussão patrimonial direta, desconsiderando-se o mero
mal-estar, dissabor ou vicissitude do cotidiano.
A sanção consiste na imposição de uma indenização, cujo valor é fixado judicialmente, com a
finalidade de compensar a vítima, punir o infrator e prevenir fatos semelhantes que provocam
insegurança jurídica.
ilícito. Assim, o dano moral é in re ipsa, ou seja, de acordo com Sérgio Cavalieri Filho[1] “deriva
inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de modo que, provada a ofensa (…) está demonstrado o
dano moral”.
À parte lesada cumpre apenas provar os fatos ensejadores da reparação pretendida, sendo
desnecessária a prova da violação ao direito da personalidade.
Na hipótese dos autos, a conduta das rés violou alguns dos direitos da personalidade dos autores,
como a paz, o sossego e a tranquilidade, na medida em que, ao entregar os apartamentos com o piso
defeituoso, deu ensejo à prática de obras generalizadas no condomínio, gerando poeira, barulho e
ruídos excessivos, frustrando a legítima expectativa dos autores, adquirentes do imóvel, que se viram impossibilitados de permanecer na própria casa sem os transtornos provocados pelas obras.
Os autores narraram que por diversas vezes foram despertados pelos barulhos das obras e que em
várias ocasiões tiveram que sair de sua própria casa para aliviar o estresse causado pela empreitada.
A alegação de que as obras foram executadas em conformidade com as normas do condomínio não se presta a afastar a responsabilização pelos transtornos provocados pelas rés. Isso porque, a má
execução do prédio foi a causa das obras, que perduraram por mais de três anos após a entrega dos
apartamentos. A principal obrigação do empreiteiro é executar a obra, tal qual lhe foi encomendada. Cuida-se de uma obrigação de resultado, porque se obriga pela boa execução da obra, de modo a
garantir sua segurança, solidez e capacidade para atender ao objetivo para o qual foi encomendada.
Os termos segurança e solidez devem ser interpretados em sentido amplo, abrangendo os problemas
que impeçam a regular fruição do bem, tal como o demonstrado no presente caso. Não pode ser
considerada segura e sólida uma construção que não proporcione condições normais de habitabilidade e salubridade às pessoas.
Defeitos na obra, aparentes ou ocultos, configuram violação do dever de segurança do construtor,
verdadeira obrigação de garantia, ensejando-lhe o dever de reparação de danos independentemente de culpa, conforme art. 618 do Código Civil e arts. 12, 14, 18 e 20 do Código de Defesa do Consumidor.
Não há um critério matemático ou padronizado para se estabelecer o valor do dano moral, que deve
ser fixado de modo a atingir as finalidades da reparação.
atenuar a dor, o sofrimento, aflição, preocupação, desgosto. No caso do dano moral, a reparação
pecuniária vem abrandar o sentimento inato de vingança da vítima, confortar o seu espírito ultrajado, contribuir para a superação de fatos desagradáveis do passado.
A segunda finalidade refere-se ao caráter punitivo, em que o sistema jurídico responde ao agente
causador do dano, sancionando-o com o dever de reparar a ofensa imaterial com parte de seu
patrimônio. O enfoque da finalidade punitiva da reparação do dano moral é quanto à pessoa do
ofensor, ou seja, é o mecanismo de resposta do sistema jurídico voltado à sanção do agente causador do ato ilícito, e não mais a específica preocupação com a pessoa da vítima, que por seu lado tem a
atenção devida na finalidade compensatória. Desta forma, considerando que a violação dos direitos da personalidade é um ato contrário aos objetivos do sistema jurídico, bem como a circunstância de que toda agressão a direito subjetivo tem a respectiva resposta jurídica, torna-se consequência lógica que a sanção é medida imperativa, indeclinável.
A terceira finalidade da reparação do dano moral relaciona-se ao aspecto preventivo, entendido como uma medida de desestímulo e intimidação do ofensor, mas com o inequívoco propósito de alcançar
todos integrantes da coletividade, alertando-os e desestimulando-os da prática de semelhantes
ilicitudes. O caráter preventivo da reparação do dano moral está indissociavelmente vinculado à
necessidade de adoção de medidas que evitem a eclosão de conflitos no cenário social, com reflexos no subsistema das relações de consumo.
O valor a ser fixado deverá observar, ainda, os critérios gerais da equidade, proporcionalidade e
razoabilidade, bem como atender a critérios específicos, tais como o grau de culpa do agente, o
potencial econômico e características pessoais das partes, a repercussão do fato no meio social e a
natureza do direito violado, esclarecendo-se que o valor do dano moral não pode promover o
enriquecimento ilícito da vítima e não deve ser ínfimo a ponto de aviltar o direito da personalidade
violado.
À míngua de parâmetros legais, matemáticos ou exatos, o juiz deve utilizar o seu prudente arbítrio, o bom senso, a proporcionalidade ou razoabilidade para valorar o dano moral. A atuação do juiz
dirige-se a encontrar uma quantia que não seja ínfima, simbólica, que não represente uma mera
censura judicial, ou reduzida a ponto de desmerecer a relevante natureza jurídica do bem da vida
violado (direitos da personalidade).
O valor fixado pelo Juízo de Primeiro Grau observou o grau de culpa do agente (gravidade da
conduta), o potencial econômico e características pessoais das partes, a repercussão do fato no meio
social e a natureza do direito violado, obedecidos os critérios da equidade, proporcionalidade e
razoabilidade.
Da sucumbência recíproca
O Código de Processo Civil, com relação a atribuição do valor da causa pela parte autora trouxe a
seguinte previsão em seu art. 292, inciso V: “O valor da causa constará da petição inicial ou da
reconvenção e será: V – na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor
pretendido;”.
O art. 85, § 2º do Código de Processo Civil contêm o regramento quanto a base de cálculo a ser
observada pelo magistrado no momento em que for condenar a parte sucumbente em honorários
advocatícios, confira-se: “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado
do vencedor. (…) § 2 Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por
cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I – o grau de zelo do profissional; II – o lugar de
prestação do serviço; III – a natureza e a importância da causa; IV – o trabalho realizado pelo
advogado e o tempo exigido para o seu serviço.”
O art. 86, do Código de Processo Civil, prevê regramento para hipótese em que há sucumbência
recíproca “ Art. 86. Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente
distribuídas entre eles as despesas”.
Da leitura dos artigos supra poder-se-ia chegar à conclusão de que de fato o Código de Processo Civil passou a tratar aquele que pede determinado valor de danos morais e recebe quantia menor como
sucumbente em relação àquilo que deixou de ganhar, contrariando, inclusive, posição consolidada do Superior Tribunal de Justiça quando da vigência do Código de Processo Civil de 1973.
Esse, todavia não é a posição que prevalece na doutrina e nos tribunais, que seguem adotando o
enunciado da Súmula 326 do Superior Tribunal de Justiça, que permanece em perfeita harmonia com a nova legislação em vigor, dado que, muito embora tenha havido inovação com relação ao
arbitramento do valor da causa pela parte autora ao pedir danos morais, perdura a problemática fática que deu origem a criação do referido enunciado, que é justamente a inexistência de um critério de
equivalência absoluta, uma medida certa que represente a restituição integral do prejuízo imaterial.
A falta de tarifamento ou parâmetro para a reparação do dano moral, exigência do princípio da
reparação integral da lesão, acaba por transferir para o juiz a fixação do seu respectivo montante em dinheiro, mediante arbitramento, considerados os diversos critérios postos à sua disposição.
sentido de ser uma mera indicação do valor pretendido, já que inexiste um determinado valor em
dinheiro que corresponda especificamente à compensação da vítima, ou outro montante em dinheiro
referente à finalidade punitiva, ou distinta quantia para atender ao caráter preventivo da indenização.
Ao entender em sentido diverso estar-se-ia indo em sentido contrário não só a Súmula 326 do
Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que “Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca”, mas também contra a Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça, que firmou o entendimento de que “A correção
monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”.
A partir desse entendimento firmado, tem-se que se o autor pediu um determinado valor a título de
danos morais e recebeu menos do que desejava, para fins de pagamento das despesas processuais, ele não é considerado como vencido. Em outras palavras, se o autor pediu um valor como danos morais e recebeu menos, não houve sucumbência recíproca, ou seja, somente o réu deverá arcar com as
despesas processuais e honorários de sucumbência.
Nesse passo, não se pode dar o mesmo tratamento ao dano moral que se dá ao dano material, pois este é de valor auferível pela parte posto que há o seguro parâmetro de equivalência entre a indenização e a diminuição econômica produzida pela lesão. Aquele, no entanto, depende de tantas circunstâncias e
variáveis que mesmo diante da intensa produção doutrinaria e jurisprudencial acerca do tema, não se chegou a nenhum critério que pudesse pacificar uma forma de quantificação do dano moral.
Deve ser considerado que os autores sucumbiram quanto ao pedido de imposição da obrigação de
fazer (realização de vistoria nas unidades imobiliárias nas quais não foram realizadas as trocas de
piso, bem como nas áreas comuns do condomínio, e de elaboração e execução do cronograma de
obras), e as rés sucumbiram em relação à condenação ao pagamento de compensação por danos
morais.
Correta, portanto, a distribuição equânime das custas e despesas processuais e dos honorários
advocatícios sucumbenciais.
Ante o exposto, nego provimento aos recursos.
Em atenção ao art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, majoro os honorários advocatícios
anteriormente arbitrados para 12% sobre o valor atualizado da causa.
É como voto.
[1]CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 86.
O Senhor Desembargador TEÓFILO CAETANO – 1º Vogal
Com o relator
A Senhora Desembargadora SIMONE LUCINDO – 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO
CONHECER DOS RECURSOS, REJEITAR A (S) PRELIMINAR (ES) E, NO MÉRITO,
NEGAR-LHES PROVIMENTO. DECISÃO UNÂNIME.