Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2018.0000726837
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 1107975-65.2017.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante PARTIBENS LOCAÇÕES E PARTICIPAÇÕES LTDA, é apelado CONDOMÍNIO EDIFÍCIO KING WILLIAM.
ACORDAM, em 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso por V. U. Declara voto convergente o 3º juiz.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JAYME QUEIROZ LOPES (Presidente), WALTER CESAR EXNER E MILTON CARVALHO.
São Paulo, 13 de setembro de 2018.
Jayme Queiroz Lopes
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
36ª. CÂMARA
APELAÇÃO N.º 1107975-65.2017.8.26.0100
APELANTE (S): Partibens Locações e Participações Ltda.
APELADO (A)(S): Condomínio Edifício King Willian
COMARCA: São Paulo – 32ª Vara Cível
Voto n.º 30420
EMENTA:
CONDOMÍNIO AÇÃO CAUTELAR COM PEDIDO DE TUTELA ANTECEDENTE IMPROCEDÊNCIA
REFORMA AGE DE 25/10/2017 QUE DELIBEROU SOBRE LOCAÇÃO POR TEMPORADA DAS UNIDADES E PRAZO MÍNIMO A SER OBSERVADO PELO PROPRIETÁRIO LOCADOR QUÓRUM DE 2/3 DOS CONDÔMINOS NÃO OBSERVADO POR SE TRATAR DE ALTERAÇÃO DE NORMA CONVENCIONAL, ERA NECESSÁRIA A OBSERVÂNCIA DO QUÓRUM ESTIPULADO NO ART. 63 DA CONVENÇÃO, BEM COMO NO ARTIGO 1.351 DO CÓDIGO CIVIL EFEITOS DECORRENTES DA DELIBERAÇÃO ASSEMBLEAR ANULADOS COM RELAÇÃO À APELANTE AÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
Apelação provida.
Trata-se de apelação interposta contra a sentença de fls. 171/175, que
julgou improcedente a ação cautelar com pedido de tutela antecedente. Alvo de
embargos de declaração, estes foram rejeitados (fls. 183).
Alega a apelante, em síntese, que é proprietária da unidade 131,
integrante do condomínio réu; que tem, por atividade empresarial, a locação de imóveis
próprios, inclusive para temporada inferior a 90 dias; que a AGE de 25/10/2017 é nula,
pois extrapolou a ordem do dia ao proibir locações de curta temporada por prazo
inferior a 90 dias; que tal proibição exigia quórum de 2/3 dos votos dos condôminos por
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segunda convocação, não respeitando o quórum mínimo; que o artigo 48 da Lei nº 8.245/1991 permite a locação por temporada em prazo não superior a 90 dias. Requer a procedência da ação.
Recurso preparado, tempestivo e respondido (fls. 209/225).
Estando os autos aguardando julgamento, sobreveio petição do apelado (fls. 230/232), sobre a qual se manifestou a apelante.
É o relatório.
Constou da sentença:
“Verifica-se que a cláusula 1 da convenção condominial dispõe que “o uso de prédio e de suas unidades autônomas é de caráter exclusivamente residencial e familiar, sendo vedado o uso comercial ou moradia coletiva em cada apartamento” (fls. 31). O artigo 4, alínea b, por sua vez, determina que é dever do condômino “não alugar, ceder ou emprestar o apartamentopara outra finalidade que não seja a de residência familiar, impedindo o uso por pessoas de conduta duvidosa, e fazendo constar dos contratos de locação ou quaisquer outros, a obrigação do fiel cumprimento desta convenção, que ficará como parte integrante daqueles contratos” (fls. 32). Em que pese a convenção condominial não trazer cláusula que limite a duração de locação de suas unidades, certo que os dispositivos acima copiados destacam o caráter residencial e familiar do condomínio, o que significa que tendo a locação caráter preponderantemente comercial, há violação ao respectivo dispositivo. É certo que a locação por temporada, com amparo na Lei nº 8.245/91 Lei de Locações , e sem desvirtuar a finalidade do condomínio, poderia ocorrer por curtos períodos, porém, a prática reiterada, somada à necessidade de utilização da estrutura do prédio e os serviços adicionais quase sempre oferecidos (mobília, limpeza, serviços em geral), desvirtuam a locação por temporada e se enquadram no âmbito da hospedagem, que é disciplinada em lei específica, Lei nº 11.771/2008. (…). Assim, constata-se
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que a locação por diárias é atividade exclusiva de meios de hospedagem listados pela referida lei, com autorização para funcionamento e preenchimento de demais requisitos exigidos, sendo que um condomínio residencial não os possui. (…). Ademais, implica ressaltar que os Tribunais reiteradamente vêm decidindo com base na aplicação da Teoria da Pluralidade dos Direitos Limitados, constituindo uma limitação ao exercício do direito de propriedade em função da supremacia do interesse coletivo. O proprietário possui o direito a emprestar, ceder, alugar, alugar por temporada, ou seja, exercer livremente seu direito sobre o bem, escolhendo como deseja ocupa-lo. Entretanto, não lhe é permitido causar perturbação ou insegurança aos demais condôminos. (…). Ademais, no que tange à regularidade da Assembleia Geral Extraordinária realizada, não houve extrapolamento da ordem de dia, vez que um dos pontos a serem analisados na referida assembleia era justamente “apreciação, discussão e votação sobre a adoção de medidas de segurança, devido à prática de locação de apartamentos por curta temporada”, que não se pode ter por genérico (fls. 26/27). Quanto à aduzida necessidade de quórum qualificado, vale ressaltar que a limitação da locação de curta temporada ao período de 90 dias não implica alteração da convenção condominial, mas sim providência que se traduz em medida de segurança e se enquadrando no item 2 da ordem do dia prevista para a Assembleia .”
A liminar requerida na ação foi indeferida pela decisão de fls. 63/64, a qual foi objeto do agravo de instrumento nº 2224345-22.2017.8.26.0000. Constou a seguinte ementa no acórdão por mim relatado:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONDOMÍNIO – TUTELA DE URGÊNCIA – DELIBERAÇÃO EM ASSEMBLEIA QUE ESTABELECEU PRAZO PARA LOCAÇÃO DE CURTA TEMPORADA – CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO QUE ERA SILENTE EM RELAÇÃO A ESTE PONTO –NECESSIDADE DE ALTERAÇÃO DA CONVENÇÃO COM O QUÓRUM PREVISTO NO ARTIGO 1.351 DO CC E CONVOCAÇÃO ESPECÍFICA DECISÃO REFORMADA. Agravo de Instrumento provido.”
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Constou do acórdão:
“A deliberação assemblear estabeleceu prazo para locação de curta temporada, alterando a Convenção que, em seu artigo 1º, dispõe que: “O uso do prédio e suas unidades autônomas é de caráter exclusivamente residencial e familiar, sendo vedado o uso comercial ou moradia coletiva em cada apartamento”, ou seja, era silente no tocante ao prazo que restou fixado na assembleia.
Se é assim, há necessidade de aprovação por 2/3 dos condôminos e convocação específica para o fim pretendido, nos termos do artigo 1.351 do Código Civil, não valendo aquela genérica que tratava de “apreciação, discussão e votação sobre adoção de medidas de segurança, devido à prática de locação de apartamentos por curta temporada”.
A este respeito, confira-se julgado desta Câmara:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. Ação anulatória. Tutela de urgência. Regulamento interno que proibiu locação de curta duração. Restrição ao direito de propriedade. Matéria que deve ser versada na convenção do condomínio. Requisitos autorizadores da medida concedida vislumbrados em sede de cognição sumária. Recurso desprovido.” (Agravo de Instrumento nº 2049382-35.2017.8.26.0000, Rel. Des. Milton Carvalho).
Ante o exposto, dou provimento ao recurso.”
Como se vê, a liminar requerida foi concedida pelo acórdão, de modo que a AGE de 25/10/2017 teve seus efeitos suspensos até final decisão a ser proferida na ação.
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Examina-se, pois, o mérito propriamente dito.
A magistrada entendeu que a locação por temporada praticada pela apelante, na verdade, se qualifica como sendo serviço de hospedagem, o que desvirtua a finalidade de uso permitida pela convenção condominial.
Ocorre que o objeto da ação é a aprovação, por AGE, de definição de locação de curta temporada como sendo aquela “superior a 90 dias”, subtendendo-se, portanto, que não serão permitidas locações com prazo inferior a 90 dias. Não consta na ata da referida assembleia qualquer disposição sobre o uso das unidades com a finalidade de prestação de serviço de hospedagem, ou de proibição de locação das mesmas para curta temporada.
Com efeito, a controvérsia instalada se refere à validade da AGE e, se válida, se poderia a mesma dispor sobre o prazo das locações por temporada praticadas pelos condôminos.
Pois bem. A questão da validade está relacionada ao quórum exigido para a aprovação de alteração de dispositivo da convenção condominial. Constou da ordem do dia “Apreciação, discussão e votação sobre adoção de medidas de segurança, devido à prática de locação de apartamentos por curta temporada.” (fls. 25). As alterações foram aprovadas por menos de dois terços dos votos dos condôminos (fls. 26/27).
O artigo 1º da convenção condominial vigente na data da AGE estipula que “O uso do prédio e suas unidades autônomas é de caráter exclusivamente residencial e familiar, sendo vedado o uso comercial ou moradia coletiva em cada apartamento”. O artigo 63 dispõe que “A presente convenção e regimento interno poderá ser alterada quando por deliberação tomada em assembleia geral do condomínio, exigido, para tanto, um quórum de votação que represente o mínimo de dois terços do terreno; nesta hipótese os votos serão somados de acordo com a participação de cada condômino no terreno do prédio (artigos 13 e 24)”.
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Como se vê, muito embora disponha o artigo 1º da convenção que o uso das unidades autônomas é estritamente residencial e familiar, a locação por temporada sempre foi permitida ou tolerada, tanto que na referida ata assemblear não constou a proibição da locação, e sim a fixação de prazo mínimo de 90 dias. Assim sendo, a alteração de finalidade de uso de unidade condominial, bem como a definição de locação por temporada devem constar da convenção condominial, a fim de que seja sanada a contradição que, de fato, causou a controvérsia instalada.
Nesse sentido, tem-se que a deliberação tomada na AGE de 25/10/2017 constituiu alteração de regra convencional, o que exigia o quórum estipulado no artigo 63 da referida convenção. Ademais, era caso de observância do disposto no artigo 1351 do Código Civil (“Depende da aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a alteração da convenção; a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária, depende da aprovação pela unanimidade dos condôminos”).
Verifica-se, pois, que não havia quórum para deliberar sobre a alteração de norma convencional que estipula a exclusividade de uso residencial da unidade imobiliária, bem como de definição de prazo mínimo para locação por temporada.
Assim sendo, a ação é julgada procedente para anular os efeitos da AGE de 25/10/2017 em relação à autora, com inversão dos ônus da sucumbência.
Por fim, os efeitos da AGE de 03/07/2018, supervenientes à sentença, não retroagem para modificar os fatos alegados na inicial, incidindo somente sobre locações por temporada posteriores à data de sua realização.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso.
Jayme Queiroz Lopes
Relator
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Voto nº 21940.
Apelação nº 1107975-65.2017.8.26.0100
Comarca: São Paulo
Apelante: Partibens Locações e Participações Ltda
Apelado: Condomínio Edifício King William
DECLARAÇÃO DE VOTO CONVERGENTE
Adotado o relatório do ilustre Relator Jayme Queiroz Lopes, depois de analisadas as razões apresentadas, conclui-se ser correta a solução dada ao presente recurso.
O apelado noticia a realização de Assembleia Geral Extraordinária, no dia 03/07/2018, por meio da qual, mediante deliberação com quórum de 2/3, foi incluído item na Convenção do Condomínio, determinando aos condôminos respeitar o prazo mínimo de locação de 90 dias (fls. 231).
Ocorre que essa deliberação não prejudica a análise do presente recurso, pois este processo trata de outra assembleia, qual seja aquela realizada em 25/10/2017 (fls. 06 e 89).
Frise-se, ademais, que a definição da validade dos efeitos da assembleia realizada em 25/10/2017 é imprescindível para se aferir a licitude dos atos praticados pelos condôminos entre uma e outra deliberação assemblear.
Com efeito, na medida em que a assembleia objeto da presente demanda não observou o quórum de 2/3, exigido para alterar norma convencional, era mesmo de rigor a anulação dos seus efeitos, consoante bem concluiu o ilustre Relator.
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Por tais fundamentos, acompanho integralmente o voto da
douta relatoria, para dar provimento ao recurso.
MILTON PAULO DE CARVALHO FILHO
3º Julgador
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Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:
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8 9 Declarações de MILTON PAULO DE CARVALHO FILHO 9AD2B7F
Votos
Para conferir o original acesse o site:
https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informando o processo
1107975-65.2017.8.26.0100 e o código de confirmação da tabela acima.