Inteiro Teor
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
Órgão 4ª Turma Cível
Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0703474-42.2019.8.07.0020
APELANTE (S) RESIDENCIAL TOP LIFE CLUB E RESIDENCE TORRES D,E,F
APELADO (S) CONDOMÍNIO RESIDENCIAL TOP LIFE CLUB E RESIDENCE
Relator Desembargador ARNOLDO CAMANHO
Acórdão Nº 1236443
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. CONVENÇÃO CONDOMINIAL. DIVISÃO EM SUBCONDOMÍNIOS.
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO CONSULTIVO. ELEIÇÃO INDIRETA. AUSÊNCIA DE
VEDAÇÃO LEGAL. ADMINISTRAÇÃO DE PARTE DAS ÁREAS COMUNS. NECESSIDADE
DE MODIFICAÇÃO DA CONVENÇÃO PELA ASSEMBLEIA.
1. Estando resguardada a votação direta dos condôminos na eleição para os subsíndicos que compõem o Conselho Consultivo, não ofende o disposto no art. 1.347, do CC, a previsão da convenção no
sentido de que a escolha do presidente daquele órgão, responsável pela gestão de parte das áreas
comuns do complexo residencial, seja feita pelos próprios subsíndicos.
2. Ausente expressa vedação legal à adoção de processos indiretos de escolha, a modificação do arranjo adotado na convenção depende de deliberação da assembleia geral, com quórum qualificado. Assim,
dadas as particularidades do condomínio a ser gerido, não cabe intervenção jurisdicional para suplantar a autonomia da vontade dos condôminos, cuja aquiescência com o modelo adotado é observada a partir da continuidade da própria sistemática estipulada por ocasião da instituição do condomínio.
3. Apelo não provido.
ACÓRDÃO
EDUARDO OLIVEIRA – 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador SÉRGIO ROCHA,
em proferir a seguinte decisão: NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 12 de Março de 2020
Desembargador ARNOLDO CAMANHO
Relator
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS – Relator
Residencial Top Life Club e Residence Torres D, E, F interpôs apelação contra respeitável sentença do MM. Juízo da 2ª Vara Cível de Águas Claras, que julgou improcedente o pedido declaratório de
nulidade do art. 9º, alínea h, da convenção condominial, que prevê que a eleição do Presidente do
Conselho Consultivo (Síndico Geral) será realizada pelos votos dos quatro subsíndicos dos
subcondomínios que compõem o condomínio apelado.
Em suas razões, o apelante alega, em síntese, que o previsto na convenção condominial fere o disposto no art. 1.347, do CC, quanto à competência da assembleia geral para eleger o síndico. Aduz que a
correta nominação do cargo como Presidente do Conselho Consultivo ou como Síndico Geral não é
uma questão de mera terminologia, pois as atribuições cometidas ao seu ocupante são efetivamente de síndico, o que atrai a observância da forma prevista em lei para a sua eleição, sob pena de invalidade
da convenção. Informa a criação de comissão de condôminos para debater a alteração da convenção.
Assevera que a sistemática de eleição adotada abre margem para manipulação de resultados, mormente porque os atuais subsíndicos são sócios de empresa de administração de condomínios e possuem
interesse pessoal em se manterem na administração do condomínio em questão, tendo se valido da
estrutura do próprio condomínio para angariarem apoio. Noticia irregularidades da gestão, inclusive
objeto de outra ação judicial. Sustenta ter havido falsidade ideológica por ocasião da rerratificação da ata da assembleia que elegeu indiretamente a atual Síndica Geral, quando foi consignado ter se tratado de eleição para o cargo de Presidente do Conselho Consultivo. Requer, ao final, o provimento do apelo para reformar a sentença, a fim de que seja declarada a nulidade do citado dispositivo da convenção
condominial.
Contrarrazões pugnando pelo não provimento do recurso e condenação do apelante por litigância de
má-fé.
É o relatório.
VOTOS
O Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO – Relator
Além das áreas comuns típicas das torres residenciais, o complexo conta com áreas comuns
compartilhadas entre os moradores, tais como os muros externos, gramados e jardins internos,
guaritas, equipamentos de infraestrutura, estacionamentos, e um extenso conjunto de espaços e
equipamentos de lazer, descritos no art. 8º, da convenção condominial. Por ter especial relevo para a
solução do caso, registre-se que a área de lazer, que constitui verdadeiro clube recreativo de uso
privativo dos moradores, consiste nos seguintes itens, descritos na alínea b daquele artigo:
“b) a portaria/guarita, áreas de circulação internas do condomínio, acesso às vias e
logradouros públicos e calçadas e área de lazer constituída por edificio principal com
dois pavimentos: o primeiro denominado ‘Semi Enterrado’ possuindo quadra de
‘squash’, sauna, área de descanso, vestiários, depósitos e área de circulação; área
descoberta com churrasqueira gourmet com ‘decks’ coberto e descoberto, instalações
sanitárias, área externas com campo de futebol, quadra poliesportiva, quadra de tênis e
playground, área com piscina para adultos, piscina infantil e piscina de raia circundadas
por deck, passarelas e pergolados; o outro pavimento denominado ‘Pilotis’ possui na
edificação principal: instalações sanitárias masculinas e femininas, salão de festas e
copa, web space, sala de carteado, circulação coberta, lounge, home cinema, sala de
jogos teen, salão de bilhar, espaço kid’s club e vestiário masculino e feminino, varandas,
terraços, circulação coberta, jardins externos e fonte, 17 (dezessete) vagas para
estacionamento descoberto e 47 (quarenta e sete) vagas de estacionamento de uso
comum para motocicletas” (ID 11500207, pág. 16).
Como se vê, a administração de tamanha área comum é tarefa significativamente distinta da
administração das torres residenciais, o que motiva a distinção entre as atribuições dos quatro
subsíndicos e as do Presidente do Conselho Consultivo, cargo ocupado cumulativamente por um
deles.
Neste panorama, não possui a relevância pretendida pelo apelante o fato de, nas diversas eleições para o cargo, ter sido adotada nomenclatura que não coincide exatamente com o previsto na convenção,
pois os termos adotados por força de costume dos moradores e da administração condominial não
interfere na análise da validade das deliberações frente à convenção ou à legislação civil. Dito isso,
importa verificar se a solução adotada na convenção para viabilizar a administração daquelas áreas
comuns do complexo residencial é compatível com o disposto no art. 1.347, do CC, ou, em outras
palavras, se tal norma legal teria caráter cogente e, portanto, inderrogável pela vontade dos
condôminos.
Pois bem. Considerando que cada um dos subcondomínios realiza a eleição direta para seus
respectivos subsíndicos, que integrarão o Conselho Consultivo, não se verifica incompatibilidade
entre a convenção e a lei. Trata-se de solução razoável que atende, ao menos até agora, aos interesses dos condôminos, sem alijá-los do processo eletivo pelo qual é viabilizada a administração do
patrimônio comum.
Note-se que a convenção condominial foi elaborada não pelos moradores, mas pela incorporadora do empreendimento imobiliário, o que é natural, já que, ao colocar as unidades individuais à venda,
faz-se necessário esclarecer aos potenciais compradores como se dará a fruição, custeio e
administração do conjunto de espaços comuns e equipamentos de lazer. Nada impede, porém, que os adquirentes venham a alterar a convenção, respeitado o quórum legal de dois terços (2/3), previsto no art. 1.351, do CC, o que aparentemente não ocorreu até o momento.
Percebe-se que o questionamento quanto à sistemática de “eleição indireta” já vem sendo levantado ao menos desde a assembleia geral extraordinária realizada em 30/3/15, ocasião em que ficou registrado em ata que “ficou acordado entre os presentes que caso haja alteração da Convenção, criando a
função do 5º (Quinto) síndico, será feita uma nova Assembléia para eleição do Mesmo” (ID
11500260, pág. 1). Na assembleia realizada em 25/4/19, em que foi noticiado aos moradores o
ajuizamento da presente ação, deliberou-se pela criação de uma comissão para avaliar propostas de
atualização da convenção, registrando-se o seguinte:
“3. Processo do Subcondomlnlo Saint Tropez em desfavor do Top Life ; O síndico
informou que o item é para conhecimento da AGE. Esclareceu que o processo está em
andamento, onde o Subcondomínio Saint Tropez entrou com ação refutando o ART 9 da
convenção alínea ‘h’. Explicou que o artigo deixa claro que os subsíndicos escolhem
dentre eles um Presidente do Conselho Consultivo, que exercerá a função de síndico
geral. A assembleia questionou a nomenclatura apresentada, em relação ao cargo de
Presidente. Foi mencionado que o Sr. Edmílson foi eleito, à época, síndico geral do
condomínio, e não presidente do conselho fiscal, como mencionado. Foi solicitado que o
Sr. Yano se manifeste em relação ao item, que por sua vez afirmou que o processo não é
para prejudicar o condomínio. O Subcondomínio entrou com o processo para retirada da
alínea ‘h’ do art 9, onde está determinado que são os subsíndicos responsáveis por
eleger um representante para o cargo de síndico geral. O Sr. Yano informou que foi
disparada uma mala direta aos moradores do Saint Tropez com informações sobre o
processo e a assembleia solicitou que ele proceda com o envio das informações do
processo para todos do Top Life. Foi sugerido que a administração do condomínio geral
coloque em pauta a mudança da convenção em relação ao artigo que trata sobre o
síndico geral ser escolhido pelos subsíndicos. Que seja feita uma assembleia aberta para
colher assinaturas suficiente para a mudança da convenção neste sentido. Foi sugerido
que seja feita uma revisão da convenção para que alguns pontos de interesse do
condomínio possam ser alterados. Foi decidido que será marcada uma assembleia
específica para tratar deste assunto. Foi sugerido a leitura do texto do comunicado que
poderá ser enviado por mala direta, para conhecimento do processo. Ficou decidido que
a Daniele irá disparar o texto para os moradores por mala direta” (ID 11500258, pág. 2,
com destaque no original).
Apesar de o apelante ter afirmado que juntaria aos autos um abaixo assinado dos moradores que
supostamente comprovaria o apoio da maioria dos moradores à proposta do subsíndico do
subcondomínio 3 (Saint Tropez), tal documento não foi juntado com a petição de ID 11500269.
Tampouco as partes noticiaram fatos posteriores quanto aos trabalhos da comissão criada para este
fim, ou quanto ao que decidido sobre o tema nas assembleias gerais, sejam as dos subcondomínios ou de todo o condomínio.
Portanto, percebe-se que a questão já é do conhecimento dos condôminos e simplesmente não houve, ao menos comprovadamente e até o presente momento, a deliberação da maioria qualificada no
sentido de alterar a sistemática de administração do condomínio, formatada quando o empreendimento de incorporação imobiliária foi concebido. Se é assim, deve-se concluir que os condôminos
escolheram, mesmo que tacitamente, pela manutenção da convenção, de modo que não se mostra
juridicamente adequado que tal alteração se faça pela via judicial. Afinal, se, por um lado, é certo que a legislação civil prevê a participação dos condôminos na eleição do síndico, por outro, é forçoso
concluir que não há expressa vedação à adoção de processos indiretos para a escolha daquele que irá
administrar apenas uma parte das áreas comuns, mormente quando se leva em consideração as
particularidades do caso, como a complexidade de tais áreas comuns e o fato de que os subsíndicos
são eleitos em votação direta.
No mais, as considerações relativas às motivações pessoais dos subsíndicos, relacionadas a supostos
interesses comerciais e de perpetuação “no poder”, além de não encontrarem amparo nas provas
constantes dos autos, não são suficientes para afastar as conclusões esposadas na respeitável sentença recorrida, pois bastaria que algum deles não fosse eleito nos respectivos subcondomínios para se
alterar a relação de maioria que teria se formado na condução do Conselho Consultivo. Ao contrário, se eles eventualmente estão sendo reconduzidos aos cargos, tal não significa outra coisa senão a
aprovação de suas gestões por parte das assembleias competentes, mesmo que tacitamente, o que
desaconselha a intervenção judicial ora pleiteada quanto ao modelo de administração da coisa comum.
efeito, o objeto da presente ação é a legitimidade abstrata do modelo participativo adotado na
convenção, em confronto com a legislação civil, e não qualquer vício concreto da manifestação de
vontade dos votantes, por si ou por seus mandatários.
Por fim, rejeita-se o pedido de condenação por litigância de má-fé, pois não se enquadra como tal a
mera adoção da via judicial para deduzir pretensão que, segundo o representante de um dos
subcondomínios, corresponde à vontade da maioria dos condôminos que representa. Com efeito, tal
condenação pressupõe a prática de atos processualmente desleais, previstos no art. 80, do CPC, sendo certo que a interposição de recurso é faculdade legalmente conferida às partes e não se verifica, no
caso concreto, que o ato processual tenha sido praticado com finalidade manifestamente protelatória.
Ante o exposto, nego provimento ao apelo.
Majoro os honorários advocatícios de sucumbência para R$ 3.000,00 (três mil reais), com fundamento no art. 85, §§ 8º e 11, do CPC.
É como voto.
O Senhor Desembargador SÉRGIO ROCHA – 1º Vogal
Com o relator
O Senhor Desembargador JAMES EDUARDO OLIVEIRA – 2º Vogal
Com o relator
DECISÃO
NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, UNÂNIME