Inteiro Teor
Número do processo: | 2.0000.00.384480-4/000 (1) |
Relator: | OSMANDO ALMEIDA | ||
Relator do Acórdão: | Não informado | ||
Data do Julgamento: | 25/03/2003 | ||
Data da Publicação: | 12/04/2003 | ||
Inteiro Teor: | |||
EMENTA: AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. DESPESAS CONDOMINIAIS APROVAÇÃO PELO CONSELHO CONSULTIVO AUSÊNCIA DE PRERROGATIVA REGIMENTAL- RECUSA INJUSTIFICADA RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. Não tendo sido objeto de deliberação e aprovação pela Assembléia Geral, mas apenas pelo Conselho Consultivo, que não está amparado em prerrogativa regimental para deliberar sobre o rateio de despesas urgentes e essenciais para a manutenção do Condomínio, injusta e indevida a exigência de que as despesas devidas pelos condomínios inadimplentes sejam suportadas pelos adimplentes. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 384.480-4, da Comarca de BELO HORIZONTE, sendo Apelante (s): ZILMA SUELI DE SOUZA e Apelado (s)(a)(s): CONDOMÍNIO EDIFÍCIO RESIDENCIAL CIDADE JARDIM, ACORDA, em Turma, a Primeira Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais DAR PROVIMENTO. Presidiu o julgamento o Juiz MOREIRA DINIZ (Vogal) e dele participaram os Juízes OSMANDO ALMEIDA (Relator) e PEDRO BERNARDES (Revisor). O voto proferido pelo Juiz Relator foi acompanhado na íntegra pelos demais componentes da Turma Julgadora. Belo Horizonte, 25 de março de 2003. JUIZ OSMANDO ALMEIDA Relator V O T O O SR. JUIZ OSMANDO ALMEIDA: Trata-se de APELAÇÃO interposta por ZILMA SUELI DE SOUZA, inconformada com a r. sentença de f. 76/77, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 8ª Vara Cível desta Capital, que julgou improcedente a AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO por ela aforada contra o CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO RESIDENCIAL CIDADE JARDIM, condenando-a ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em dois salários mínimos. Alicerçada nas razões de f. 78/87, traz a apelante o pedido de reforma, ao fundamento de que a sentença não se ateve às provas produzidas nos autos, tampouco às irregularidades ocorridas na Assembléia do condomínio, baseando-se em hipotética deliberação da dita Assembléia. Assinala que nas Assembléias realizadas, não houve quorum suficiente para decidir o problema da inadimplência, como determina o regimento próprio, o que torna ineficaz o rateio do valor dos inadimplentes, além do que, tal decisão não foi aprovada em Assembléia, porquanto iniciou-se a discussão do tema que não foi concluído, não tendo ocorrido a decisão da matéria que nem mesmo constou da ata a sua aprovação. Afirma que é legítima a taxa mensal do condomínio, calculada tomando-se por base a quota parte de cada condômino, proporcionalmente ao seu quinhão e não o valor referente ao quinhão de outrem, originado pelo inadimplemento, sob pena de locupletação alheia em detrimento daqueles que honram seus deveres. Assevera que a condenação da apelante ao pagamento de dois salários mínimos supera em muito o que determina a Lei Adjetiva, pois o valor da condenação é aproximadamente 80% do valor da causa. Com as contra-razões de f. 99/102 repele o apelado toda a argumentação desenvolvida pela apelante, em prestígio da sentença combatida, pugnando pelo não-conhecimento dos documentos trazidos com a apelação, após a fase instrutória. Recurso próprio e tempestivo, dele conheço, presentes os pressupostos de sua admissibilidade. Há interesse de agir e o pedido é juridicamente possível. As partes são legítimas e estão bem representadas. Não havendo preliminares suscitadas ou vistas de ofício, passo ao exame do mérito. Inicialmente, cabe registrar que as razões interpostas vieram acompanhadas dos documentos de f.90/97, que por sua vez não poderão ser conhecidos, pois já encerrada a fase de instrução processual. Assim sendo, a documentação juntada não será examinada visto que, além de violar a lei do rito pertinente à espécie, atenta contra o princípio do contraditório e do duplo grau de jurisdição, muito embora já tenha sido juntada anteriormente, tendo, via de conseqüência, sido objeto de anterior exame. O pagamento através de consignação é um meio indireto de que dispõe o devedor de exonerar-se do liame obrigacional, consistente no depósito judicial da coisa devida, nos casos e formas legais, tendo lugar quando se vislumbrar a ocorrência de quaisquer das hipóteses elencadas no artigo 335 do Novo Código Civil Brasileiro. Para que a consignação tenha efeito de pagamento, diz a lei (art. 336, CC) que o depósito deverá ser promovido no tempo e modo exigidos, ou seja, de acordo com os termos do negócio jurídico que lhe deu causa, do contrário, nenhuma será a sua eficácia. Aduz a apelante que não houve deliberação da Assembléia sobre o rateio das parcelas dos inadimplentes, pois na ata da Assembléia realizada em 19/10/01, houve discussão sobre os inadimplentes, mas não houve deliberação, em razão da ausência de acordo. Pelo exame dos autos, verifico que o Conselho Consultivo do Condomínio ora apelado se reuniu em 07/01/02, conforme se extrai da ata de f.55, sendo que naquela oportunidade, restou deliberado: “Ficou aprovado, ainda, a utilização dos recursos do fundo de reserva para liquidação das contas do condomínio. Considerando que a taxa de condomínio é o rateio das despesas, ficou aprovada a distribuição desse ônus entre os condôminos, sem data de término prevista e até a regularização da questão dos inadimplentes de forma que os recursos apurados mensalmente, sejam suficientes para fazer face às despesas correntes e habituais do condomínio”. É certo que as cláusulas relativas aos encargos, forma e proporção das contribuições dos condôminos para as despesas de custeio do edifício são, talvez, das mais delicadas numa Convenção de Condomínio. Por isso mesmo, devem elas ser estudadas com todo o critério para que não se transformem em fonte de desavenças e de litígios entre os condôminos. Segundo o Regulamento do Conselho Consultivo, constante às f.44/46 dos presentes autos, o Conselho Consultivo tem a finalidade específica de: “Art. 2º a) Resolver casos omissos de caráter urgente que sejam submetidos a sua apreciação pelo Síndico, evitando assim, a convocação de Assembléias Gerais Extraordinárias”; b)- Apreciar contas e relatórios, apresentando a respeito parecer à Assembléia Geral; c)- Aprovar concorrências e obras urgentes; d) – Designar o substituto do Síndico ou Sub-Síndico, em seus impedimentos e ausências; Aquele Regulamento dispõe em seu art. 11º: “Art. 11º ” O Conselho sugerirá à Assembléia Geral as providências que julgar necessárias “. Desta feita, não há prerrogativa regimental que autorize o Conselho Consultivo do Condomínio a deliberar sobre a questão da inadimplência. Ademais, em razão da relevância da matéria, o rateio somente poderia ser aprovado pela Assembléia Geral, que é soberana para deliberar sobre a questão. De tal sorte, não há nos autos a aprovação da Assembléia a respeito do rateio estabelecido, porquanto a ata da Assembléia Geral Extraordinária, colacionada às f.33/34, não faz menção ao rateio. In casu, não restou devidamente autorizada a cobrança do rateio das despesas dos inadimplentes, porquanto a deliberação não se deu de forma regular e legal, o que torna injusta a recusa do Condomínio-apelado. HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, a respeito dos requisitos da ação consignatória enumera: “Esse sucedâneo do pagamento é a consignação, cuja forma consiste no depósito judicial da quantia ou da coisa devida. O uso dessa via liberatória é franqueado ao devedor, tanto quando o credor se recusa injustificadamente a receber a prestação, como quando o devedor não consegue efetuar validamente o pagamento voluntário por desconhecimento ou incerteza quer em torno de quem seja o credor, quer em razão de sua ausência ou não- localização ao tempo do cumprimento da obrigação (Cód. Civil, art. 973)”. (grifei). (” Curso de Direito Processual Civil “, Forense 17ª edição, p. 12). À p. 18 daquela obra acrescenta o autor: “Ao permitir o depósito judicial liberatório, cuida a lei, pois, de contornar situações como: a) a da impossibilidade real do pagamento voluntário: 1. por recusa injusta de receber a prestação por parte do credor…” O doutrinador ULDERICO PIRES DOS SANTOS observa que: “Os pressupostos da ação consignatória são: a) uma obrigação a ser solvida; b) recusa injusta do credor em receber o que lhe é devido; c) haver dúvida sobre quem realmente deva receber; d) ser a prestação oferecida no lugar e tempo devidos e o pagamento nas condições ajustadas (Arts. 972 e 984 do Código Civil e 890 e 900 do Código de Processo Civil)”(” Teoria e Prática da Locação Imobiliária “, p. 159). Não se pode negar que o condomínio possui despesas inadiáveis, a assegurar a sua viabilização e manutenção. Entretanto, não se revela justo que os condôminos adimplentes devam arcar com as despesas dos inadimplentes, mormente quando o rateio de tais despesas não passou pelo crivo da Assembléia Geral nem foi levada a efeito a cobrança judicial dos condôminos inadimplentes. Extrai-se do entendimento jurisprudencial: “CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – REQUISITOS – A ação de consignação em pagamento tem como requisito básico a injusta recusa nascida da própria vontade do credor e somente é frutuosa proposta antes que o débito se contamine com a mora solvendi. (TRT 22ª R. – ROREO-0449/94 -). Cumpre ressaltar que o Regimento Interno do Condomínio do Edifício Residencial Cidade Jardim, constante às f.36/43, somente delibera a respeito das despesas ordinárias, nada dispondo sobre as despesas extraordinárias a serem suportadas pelos condôminos. O Novo Código Civil, traz em seu art. 1.334: “Art. 1334-Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados houverem por bem estipular, a convenção determinará: I- a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio. Portanto, se a convenção nada dispõe sobre as contribuições extraordinárias a serem suportadas pelos condôminos, visto que a mesma foi redigida sob a égide do Código de 1916, sendo defeso ao Conselho Consultivo deliberar sobre contribuição desta natureza, cuja competência é da Assembléia Geral. A propósito, oportuno gizar a lição de JOÃO NASCIMENTO FRANCO: ” As cotas relativas a despesas extraordinárias devem ser previamente aprovadas em Assembléia Geral Extraordinária, salvo quando se tratar de despesas urgentes, tais como, por exemplo, para obras exigidas pelas autoridades ou concessionários de serviços públicos, hipótese em que “a posteriori” o síndico presta contas e pede aprovação da Assembléia Geral ” (Condomínio, Ed. RT, 1997, p. 223) Não tendo sido objeto de deliberação e aprovação pela Assembléia Geral, mas apenas pelo Conselho Consultivo, que não está amparado em prerrogativa regimental para deliberar sobre o rateio de despesas urgentes e essenciais para a manutenção do Condomínio, injusta e indevida se mostra a exigência de que as despesas devidas pelos condôminos inadimplentes sejam suportadas pelos adimplentes, sem que a questão tenha passado pelo crivo da Assembléia Geral dos Condôminos. Por via de conseqüência, sem a aprovação pela Assembléia Geral não se reveste de legitimidade a exigência do condomínio em negar o recebimento da taxa devida pelo condômino, sem que esteja acrescida dos valores devidos pelos inadimplentes, sendo injusto o não recebimento do valor ofertado. O descontentamento da apelante está assentado no rateio das parcelas dos inadimplentes, porquanto não houve Assembléia regulamentar dos condôminos deliberando a respeito da questão, o que encontra apoio na norma legal. A recusa está assentada em causa justa, porquanto o condomínio está a exigir um valor que não foi fruto do exame por parte da Assembléia Geral, que é o órgão máximo deliberativo do condomínio. Ao impulso de tais considerações, DOU PROVIMENTO ao apelo, e reformo a r. decisão primeva para julgar procedente a Consignação ofertada pela apelante, ficando invertidos os ônus sucumbenciais, podendo o condomínio exigir da autora valores complementares caso venha a ser decidido pela Assembléia Geral dos condomínios, que é o órgão soberano para tal. Custas pelo apelado. JUIZ OSMANDO ALMEIDA f.rh. |