Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2017.0000763350
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1054907-95.2016.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que é apelante MARCELO HENRIQUE CORREA, é apelado CONDOMÍNIO EDIFÍCIO ECOLIFE PARQUE PRADO.
ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores KIOITSI CHICUTA (Presidente sem voto), FRANCISCO OCCHIUTO JÚNIOR E LUIS FERNANDO NISHI.
São Paulo, 5 de outubro de 2017.
Ruy Coppola
Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Apelante: Marcelo Henrique Correa
Apelado: Condomínio Edifício Ecolife Parque Prado
Comarca: Campinas 2ª Vara Cível
Relator Ruy Coppola
Voto nº 37.771
EMENTA
Ação de cobrança. Multa por infração às normas condominiais. Cerceamento de defesa inocorrente. Convenção condominial que prevê expressamente a possibilidade de imposição e cobrança de multa pelo síndico, mediante prévia aprovação do conselho consultivo. Multa aplicada sem a submissão da questão ao conselho, na forma prevista pela convenção. A oportunização do contraditório, por si só, não faz elidir a necessidade de observância ao regramento condominial, que faz lei entre as partes. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. Recurso provido.
Vistos.
Trata-se de ação de cobrança de multa condominial ajuizada por Condomínio Edifício Ecolife Parque Prado em face de Marcelo Henrique Correa, que foi julgada procedente pela respeitável sentença de fls. 65/67, cujo relatório se adota, para condenar o réu ao pagamento da multa, bem como das taxas condominiais que sobrevieram no curso da demanda. Carreou ao réu o pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da condenação.
Apela o réu (fls. 69/73) sustentando, em suma, cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide. No mérito, alega que a sentença não levou em consideração as alegações de que a aplicação da multa dependia de prévia aprovação pelo conselho consultivo do condomínio; e que a multa é nula pela capitulação
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
divergente dos fatos.
Recurso tempestivo e preparado. (fls. 74/75)
Contrarrazões a fls. 78/90.
É o Relatório.
O condomínio apelado ajuizou a presente demanda em face do apelante, pretendendo a cobrança de multa condominial em virtude de reiterada prática de atos de perturbação ao sossego e tranquilidade dos demais moradores, violando as cláusulas 6.3, VII, e 6.4, I e XI, da Convenção.
A sentença julgou procedente o pedido, pois entendeu o magistrado que o condomínio observou os meios de coibir a prática reiterada do réu como o envio de advertência e notificação
, ensejando a aplicação da multa.
Inicialmente, a preliminar de cerceamento de defesa arguida pelo réu não prospera.
O Código de Processo Civil, no tocante à questão da prova, adotou a teoria do convencimento motivado ou da persuasão racional do juiz, inexistindo em nossa legislação provas de valor preestabelecido, tendo o magistrado ampla liberdade na análise dos elementos de convicção coligidos aos autos, devendo, em qualquer caso, decidir fundamentadamente.
Tendo toda prova como objetivo a instrução da causa, para permitir a formação do convencimento do juiz, a este cabe conduzir o processo de modo a evitar a produção de diligências desnecessárias ou inúteis à solução da lide, nos termos do art. 370 do Código de Processo Civil de 2015, passando ao julgamento
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
antecipado da lide quando já estiverem presentes elementos suficientes à intelecção das questões debatidas na causa, proporcionando a justa composição da lide.
O E. STJ já deixou assentado que o magistrado tem o poder-dever de julgar antecipadamente a lide, desprezando a realização de audiência para a produção de provas, ao constatar que o acervo documental é suficiente para nortear e instruir seu entendimento, sendo de seu livre convencimento o deferimento do pedido para a produção de quaisquer provas que entender pertinentes ao julgamento da lide. (AgRg no Ag nº 693.982-SC, Rel. Min. Jorge Scartezzini – 4ª. Turma, in DJU de 20.11.2006)
No mérito, razão assiste ao réu apelante no que toca a alegação de não observância da cláusula 14.2.1 da Convenção pelo condomínio.
A referida cláusula é expressa no sentido de que “a multa será imposta e cobrada pelo síndico, com prévia aprovação do conselho consultivo , permitido recurso do interessado para a assembleia geral.”. (fls. 29).
Embora tenha havido advertência prévia (fls. 32/33) e somente após a reiteração da conduta apontada é que o síndico teria imposto a multa (fls. 34/35), tendo sido oportunizado o contraditório ao condômino, fato é que o autor deixou de submeter a questão ao conselho consultivo na forma prevista pela convenção condominial.
O próprio condomínio, aliás, confessou que não observou o procedimento, razão pela qual tentou justificar a legitimidade da multa com base em precedentes jurisprudenciais desta corte.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Todavia, anoto que os julgados colacionados não são aplicáveis ao presente caso, pois, embora tratem da possibilidade de imposição de multa pelo síndico sem a necessidade de ratificação, seja pelo conselho ou pela assembleia, em ambas as situações havia respaldo da convenção neste sentido o que não se verifica no caso em tela.
Aqui, é evidente que a convenção condominial deu, sim, poderes para o síndico aplicar e cobrar multa por infração às obrigações previstas pelas normas do condomínio, em consonância com o artigo 1.348, VII, do Código Civil; porém, também é fato que a cláusula 14.2.1 acrescenta expressamente a necessidade de “prévia aprovação do conselho consultivo”.
Vale dizer ainda que a circunstância de ter sido oportunizado o contraditório ao condômino, não faz elidir a necessidade de seguir o procedimento previsto na convenção, pois o regramento interno, conquanto deliberado em Assembleia, tem força de lei entre as partes, devendo, portanto, ser respeitado por todos, inclusive pelo próprio condomínio.
Neste sentido:
“Apelação Cível. Ação de Cobrança. Despesas Condominiais. Ação julgada improcedente. Multa por infração ao regimento interno e rateio de déficit do orçamento. Previsão condominial de ser a aplicação de multa ao condômino matéria de reserva de assembleia. Sanção não ratificada. Cobrança ilegítima. (…)”. (TJSP; Apelação 9169835-18.2009.8.26.0000; Relator (a): Hélio Nogueira; Órgão Julgador: 3ª Câmara Extraordinária de Direito Privado; Foro Regional III –Jabaquara – 4ª V.CÍVEL; Data do Julgamento: 12/12/2013; Data de Registro: 13/12/2013)
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Dessa forma, respeitado o entendimento monocrático, reformo a respeitável sentença para julgar improcedente o pedido de cobrança pela falta de legitimidade da multa como foi imposta.
Invertida a sucumbência, fica o autor apelado condenado ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa atualizado.
Ante o exposto, pelo meu voto, DOU PROVIMENTO ao recurso, nos termos acima alinhavados.
RUY COPPOLA
RELATOR