Inteiro Teor
Nº 70082523044 (Nº CNJ: 0224213-18.2019.8.21.7000)
2019/Cível
APELAÇÃO CÍVEL. CONDOMÍNIO. AÇÃO CONDENATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. RECONVOCAÇÃO DE ASSEMBLEIA CANCELADA. CRIAÇÃO DE COMISSÃO DE MORADORES PARA SUPERVISIONAR A ADMINISTRAÇÃO. DESCABIMENTO. SENTENÇA CITRA PETITA. INOCORRÊNCIA. eventuais irregularidades nas contas que devem ser examinadas em ação própria.
Sentença citra petita. Não há falar em sentença citra petita, tendo o julgador a quo decidido nos limites da demanda, com a adequada exposição dos fatos e fundamentando a sua decisão. Trata-se, em realidade, de inconformidade com o resultado da sentença de improcedência do pleito inicial. Além do mais, não está o julgador obrigado a enfrentar todas as alegações trazidas, mas sim, apontar as suas razões de decidir, observado o pedido inicial, o que ocorreu no caso em exame. Mérito. Os autores não atingem o quórum necessário para o fim de convocar assembleia geral, não havendo amparo legal para o seu pleito, de modo que não há falar em arbitrariedade praticada pelos demandados. Comunicação de convocação de assembleia efetuada por pessoa desprovida de poderes não constitui meio hábil a formalizar a convocação, o que, inclusive, justifica a sua suspensão. Ainda, a ?a criação da comissão de moradores para supervisionar a administração?, viola o disposto no artigo 1.356 do Código Civil, que estabelece competir ao Conselho Fiscal dar parecer sobre as contas do síndico, bem como a Convenção do Condomínio, que estabelece as funções do Conselho Consultivo Fiscal (artigos 19 e 20, alíneas b e d). No que tange às contas da administração do período objeto da demanda estas foram prestadas aos condôminos, sendo que eventuais irregularidades na prestação de contas podem ser questionadas em ação própria.
APELAÇÃO DESPROVIDA.
Apelação Cível
Décima Oitava Câmara Cível
Nº 70082523044 (Nº CNJ: 0224213-18.2019.8.21.7000)
Comarca de Porto Alegre
CARMEN MARIA WANKLER E OUTROS
APELANTE
CONDOMÍNIO EDIFICIO TERRA NOVA NATURE
APELADO
CLARICE SANTOS DOS SANTOS
APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento à apelação.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. João Moreno Pomar (Presidente) e Des. Nelson José Gonzaga.
Porto Alegre, 28 de novembro de 2019.
DES. HELENO TREGNAGO SARAIVA,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Heleno Tregnago Saraiva (RELATOR)
CARMEN MARIA WANKLER E OUTROS interpuseram recurso de apelação, nos autos da ação condenatória de obrigação de fazer em que demandam com CLARICE SANTOS DOS SANTOS E OUTRO, em face da sentença que julgou improcedente o pedido, constando em seu dispositivo:
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a Ação de Obrigação de Fazer ajuizada por Carmem Maria Wankler, Cibele Pilla Coutinho, Emmanuela Lang Santos Cardoso, Fabricio Prestes Soares, Fernanda do Amaral Coelho Koch, Isolda Maria Guerra Cesar, José Eduardo Donaire Del Rio, Marcelo Costa Seares e Marcia Maria Alves Dentice contra o Condomínio Edifício Terra Nova Nature e Clarice Santos dos Santos, o que faço com fulcro no art. 487, inciso I, do NCPC.
Condeno os autores no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios dos patronos dos demandados, que fixo em R$ 2.000,00, para cada um, como preconiza o art. 85, § 2º, do NCPC, considerando a natureza da causa, o trabalho realizado e o tempo de tramitação do processo.
Alega a parte apelante, em suas razões recursais, que a sentença ao indeferir pedido distinto do formulado na inicial desviou-se do objeto específico da demanda. Aduz que não foi postulada convocação de uma nova assembleia, mas sim a realização da assembleia prevista na ata da solenidade de 25/06/2015. Aduz que a sentença é citra petita, uma vez que deixou de analisar a integralidade dos fundamentos e dos pedidos dos autores. Pondera que o equívoco sentencial decorre da indevida equiparação do pedido ? de realização da assembleia para exame e aprovação do orçamento ? prevista na Ata de 25/06/2015 ? como se o pleito tivesse fundamento nos artigo 22, parágrafo único e 25 da Convenção Condominial, que preveem a convocação de assembleia geral pelo Conselho Consultivo ou por ¼ dos condôminos. Afirma que o fundamento postulatório nunca foi a convocação pela minoria ou pelo Conselho. Aduz que o pleito inicial se lastreia no retardamento injustificado da síndica ao cumprimento de seus deveres frente aos condôminos, na medida em que descumpriu expressa determinação contida na Ata da Assembleia Geral de 25/06/2015 e cancelou a Assembleia Geral Extraordinária já designada para 09/07/2015, que tinha como pauta a análise e aprovação da previsão orçamentária do período de 2015/2016. Argumenta que a não realização da assembleia em 09/07/2015 implicou graves prejuízos à correta gestão do condomínio. Sustenta que os prejuízos da manobra de cancelamento da assembleia geral pela apelada síndica foram significativos e que toda a situação poderá ter sido evitada se os réus tivessem cumprido as expressas deliberações da assembleia do dia 26/05/2015 e realizado a segunda assembleia para a data designada ? 09/07/2015, quando deveriam ter sido apreciadas as retificações das contas antes aprovadas e apresentado um novo plano orçamentário. Argumenta que a referida assembleia não aconteceu até a presente data, sendo tal elemento postulatório essencial, vide pedido, alínea d.1, do item 11. Requer o provimento do recurso para que seja reformada a sentença e analisado o pedido de realização da assembleia geral e esgotamento da pauta (fls.264/269).
Houve contrarrazões (fls.274/277).
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTOS
Des. Heleno Tregnago Saraiva (RELATOR)
Cumpre inicialmente observar que o presente recurso foi interposto de decisão publicada quando já em vigor o CPC/15, razão pela qual a sua admissibilidade deve ser analisada em conformidade com o novo regramento.
Por outro lado, a matéria de fundo deve ser examinada à luz da legislação anterior, por aplicação do princípio ?tempus regit actum?. Os atos processuais atacados foram praticados sob a égide do CPC anterior e restaram formados ainda dentro de tal período, restando agora apenas o exame da adequação à situação legal da época em que realizados.
O recurso não merece ser provido.
De início, não há falar em sentença citra petita, tendo o julgador a quo decidido nos limites da demanda, com a adequada exposição dos fatos e fundamentando a sua decisão.
Trata-se, em realidade, de inconformidade com o resultado da sentença de improcedência do pleito inicial. Além do mais, não está o julgador obrigado a enfrentar todas as alegações trazidas, mas sim, apontar as suas razões de decidir, observado o pedido inicial, o que ocorreu no caso em exame.
De fato, da análise da inicial, verifica-se que o objetivo da presente ação, ao menos do que se depreende da inicial, é a realização de Assembleia Geral ?originalmente convocada para 09/07/2015, mas cancelada arbitrariamente pela Síndica, que se recusa a apresentar, discutir e colocar em aprovação a previsão orçamentária para o período de 2015-2016?. Aduzem os autores que ?conforme ficou decidido em 25/06/2015, o síndico deveria convocar nova assembleia para os fins específicos de deliberar sobre o orçamento anual e quanto à implantação de uma comissão de moradores para acompanhar a execução orçamentária pela administração?. Asseveram que ?houve o descumprimento legal, pelos réus, em atender o deliberado na Ata da Assembleia de 25/06/2015 e sua recusa em realizar a Assembleia Geral convocada para 09/07/2015?.
Assim, como se pode perceber, o centro da questão seria o descumprimento por parte dos demandados do previsto na Assembleia Geral de 25/06/2015 e a recusa da convocação da Assembleia Geral Extraordinária para 09/07/2015, pugnado, assim, pela redesignação da data da mencionada assembleia, cujo cancelamento teria ocorrido por ato exclusivo da síndica. Postulam, portanto, os autores a realização da assembleia cancelada, conforme a ?ordem do dia?, já fixada em 09/07/2015 e arbitrariamente cancelada, com vistas à apresentação de orçamento e implantação da Comissão de Moradores para a fiscalização dos atos da administração e das despesas do condomínio.
Ora, apenas da leitura da inicial, verifica-se, claramente, que o objetivo dos autores é justamente determinar a realização da assembleia supostamente cancelada de forma arbitrária pela síndica.
Nessa esteira de raciocínio, diferente do apontado nas suas razões recursais, pretendem, de fato, os autores a convocação de assembleia, para o que falecem, realmente, de competência, conforme apontado pelo julgador a quo, verbis:
(…) a tentativa dos autores de convocarem uma Assembleia Geral, seja ela Ordinária ou Extraordinária, esbarra em impeditivos normativo e legal, senão vejamos.
Consoante o Parágrafo Único do art. 22 da Convenção do Condomínio:
?ARTIGO 22: A Assembleia Geral Ordinária se reunirá anualmente na segunda quinzena do mês de abril, em data fixada pelo Síndico.
Parágrafo Único: Se o Síndico não fixar data da Assembleia Geral Ordinária, até o dia 08 (oito) do mês de abril, esta poderá ser marcada pelo Conselho Consultivo-Fiscal ou por ¼ (um quarto) dos Condôminos.? (sublinhei)
No mesmo sentido, o art. 25 da Convenção, ao dispor que:
?ARTIGO 25: A Assembleia Geral Extraordinária se reunirá a qualquer tempo, convocada pelo Síndico, pelo Conselho Consultivo-Fiscal ou por no mínimo ¼ (um quarto) das unidades do edifício, sempre que o exigirem o interesse comum.? (sublinhei)
Tais dispositivos alinham-se à disposição contida nos artigos 1.350, § 1º e 1.355, ambos do Código Civil, senão vejamos:
?Art. 1.350. Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembléia dos condôminos, na forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger-lhe o substituto e alterar o regimento interno.
§ 1o Se o síndico não convocar a assembléia, um quarto dos condôminos poderá fazê-lo.
(?)
Art. 1.355. Assembléias extraordinárias poderão ser convocadas pelo síndico ou por um quarto dos condôminos.? (sublinhei)
Na peça exordial, os autores afirmam que, além dos suplicantes, mais 129 condôminos e/ou proprietários postularam a convocação de uma Assembleia Geral, postergada arbitrariamente pela síndica demandada.
Todavia, em que pese o Termo de Apoio e Anuência encartado às fls. 25/32, percebe-se que os autores não lograram atingir o quorum necessário para o fim de convocar uma assembleia geral, de modo que não vislumbro qualquer arbitrariedade na conduta dos réus, pois apoiada em dispositivos legais e normativos.
Desse modo, não se visualiza desacerto na sentença, que bem apanhou a questão posta, falecendo os autores competência para a convocação de uma Assembleia Geral, seja ela Ordinária ou Extraordinária, conforme supramencionado, tendo em vista que não atingem o quórum para convocação de assembleia, na forma do § 1º do artigo 1.350 do Código Civil
.
Além do mais, a convocação da fl.113 dos autos, para a assembleia a ser realizada na data de 09/07/2017, não foi, de fato, firmada pela síndica, mas sim por funcionária da Administradora Auxiliadora Predial, que não tinha poderes para convocar assembleias, conforme afirmado pelos demandados em sua contestação (fl.150), o que justificou a sua suspensão (fls.115/116).
E não somente isso, conforme igualmente, esclarecido pelos demandados, ?a criação da comissão de moradores para supervisionar a administração?, que consta como pauta da assembleia que seria realizada em 09/07/2015, viola o disposto no artigo 1.356 do Código Civil, que estabelece competir ao Conselho Fiscal dar parecer sobre as contas do síndico. Outrossim, a Convenção do Condomínio estabelece as funções do Conselho Consultivo Fiscal (artigos 19 e 20, alíneas b e d), fl.45. A rigor, aceito tal quadro, haveria a criação de uma espécie de controle de contas paralelo, o que se evidencia inviável dada a existência de órgão próprio (o Conselho Consultivo Fiscal) para tanto.
Por fim, no que tange às contas da administração do período objeto da demanda, estas foram prestadas aos condôminos (fls.89/97 e 176/186). Além disso, eventuais irregularidades na prestação de contas podem ser questionadas em ação própria.
Registro, porque oportuno, que, conforme asseverado pela síndica demandada, as contas foram prestadas nos autos da ação de prestação de contas (001/1.15.0158382-5), fl.222, bem como na ação de prestação de contas (001/1.18.0002103-9), ajuizada pelo Condomínio, conforme consulta ao sistema de informações deste Tribunal.
Diante do exposto, nego provimento à apelação. Por aplicação do disposto no artigo 85, 11, do CPC/15, majoro a verba honorária devida aos patronos dos demandados em R$ 500,00 (quinhentos reais).
Des. Nelson José Gonzaga – De acordo com o (a) Relator (a).
Des. João Moreno Pomar (PRESIDENTE) – De acordo com o (a) Relator (a).
DES. JOÃO MORENO POMAR – Presidente – Apelação Cível nº 70082523044, Comarca de Porto Alegre: \NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME.\
Julgador (a) de 1º Grau: EVELISE LEITE PANCARO DA SILVA
? Art. 1.350, § 1º Se o síndico não convocar a assembleia, um quarto dos condôminos poderá fazê-lo.
1